008 • Omissões.

𝗔𝘀 𝗺𝗮𝗻𝗵𝗮̃𝘀 𝗲𝗺 𝗔𝗹𝗲𝘅𝗮𝗻𝗱𝗿𝗶𝗮 costumam ser tranquilas, mas hoje uma sensação de inquietação paira no ar. O sol mal nasceu quando saio para uma caminhada, tentando aliviar a tensão que cresceu nos últimos dias. A presença do grupo de Rick trouxe mais do que novos rostos; trouxe incerteza.

Caminho até o muro, onde vejo Tobin fazendo sua ronda matinal. Ele acena para mim e retribuo o gesto, mas minha mente está longe. Tento me concentrar no que precisa ser feito para manter a segurança da comunidade. Ainda estou perdida em pensamentos quando vejo Enid sentada em uma das vigias, com um olhar distante. Aproximo-me lentamente.

— Enid? — Chamo suavemente, tentando não assustá-la. Ela se vira, com uma expressão de surpresa que logo se suaviza em reconhecimento.

— Oi. — Ela responde, sua voz um pouco mais forte do que um sussurro.

— Tudo bem? — Pergunto, me sentando ao lado dela. Ela dá de ombros, mantendo o olhar no horizonte.

— Só... pensando. — Responde após uma pausa. — Esse lugar... é seguro mesmo?

Suspiro, entendendo seu ceticismo.

— Mais seguro do que lá fora, isso é certo. — Digo, tentando oferecer algum consolo. — Mas temos que fazer nossa parte para manter isso assim.

Ela acena, mas seu olhar ainda é distante.

— Eu costumava pensar que não poderia confiar em ninguém. — Confessa, sua voz trêmula. — Mas agora... estou tentando.

— É bom tentar. — Concordo, colocando uma mão reconfortante em seu ombro. — E é bom manter um pouco de desconfiança também. Nos mantém vivos.

Enid sorri levemente, e por um momento, a tensão diminui. Levanto-me, pronta para continuar minha caminhada.

— Se precisar de algo, estou aqui. — Digo antes de me afastar.

Continuo andando até chegar ao lago, onde Ron está sentado sozinho, jogando pedras na água. Ele parece absorto em pensamentos, mas levanta a cabeça quando me aproximo.

— Ei. — Digo, me sentando ao lado dele. Ele me lança um olhar breve antes de voltar sua atenção para o lago.

— Ei. — Responde, lançando outra pedra que salta duas vezes antes de afundar.

— Pensando em Enid? — Pergunto, sabendo a resposta.

— Sempre. — Responde com um suspiro. — Mas... acho que ela nunca vai confiar em mim completamente.

— Ela confia mais do que você pensa. — Digo, tentando animá-lo. — Só precisa de tempo.

Ron acena, mas seu olhar permanece sombrio.

— E quanto a você? — Pergunta de repente, me pegando de surpresa.

— O que tem eu? — Pergunto, confusa.

— Você parece... distante. Como se estivesse aqui, mas não realmente aqui. — Ele explica, me olhando diretamente nos olhos.

Desvio o olhar, pensando nas palavras dele. Ele tem razão, mas não posso me permitir ser fraca agora.

— Muita coisa na minha cabeça. — Respondo evasivamente. — Mas estou aqui, sempre. Para você, para todos nós.

Ron acena, parecendo aceitar minha resposta. Ficamos em silêncio por um tempo, apenas observando o movimento da água.

Depois de deixar Ron no lago, volto para a comunidade. Caminho até o depósito, onde Carol está reorganizando os suprimentos. Ao me ver, ela esboça um sorriso educado, mas meus olhos não conseguem esquecer a ameaça que ela fez a Sam.

— Carol. — Chamo, minha voz firme. Ela se vira, parecendo um pouco surpresa com o tom.

— Sim? — Responde, levantando uma sobrancelha.

— Precisamos conversar. — Digo, fechando a porta do depósito atrás de mim.

— Sobre? — Pergunta, cruzando os braços.

— Sobre ameaçar crianças. — Digo diretamente, vendo-a ficar tensa.

— Eu estava... tentando ensinar uma lição. — Diz ela defensivamente.

— Não usamos o medo para controlar nossas crianças. — Respondo, mantendo minha voz firme. — E não vamos começar agora.

Carol me encara, seus olhos desafiadores.

— Às vezes, o medo é a única coisa que funciona. — Retruca.

— Não aqui. — Digo, aproximando-me um pouco mais. — Esta é uma comunidade, não uma prisão. E não vou tolerar ameaças contra minha família.

Ela fica em silêncio por um momento, depois acena lentamente.

— Entendi. — Diz finalmente. — Não vai acontecer de novo.

— Melhor não. — Digo, virando-me para sair. — Porque se acontecer, não será só conversa. — A encaro de cima abaixo. — E não pense que vai nos roubar e sair por aí como se nada tivesse acontecido. — Me viro sem escutar sua resposta, mas vejo que ela adota uma postura mais rígida.

A manhã se transforma em tarde, e o sol está alto quando vejo Rick e Daryl carregando algumas caixas para o depósito. Decido que é hora de uma conversa mais direta com Rick, sem rodeios.

— Rick. — Chamo, enquanto ele coloca a caixa no chão. Ele se endireita e me olha, seus olhos azuis fixos nos meus.

— Precisamos falar sobre Carol. — Digo, sem preâmbulos.

Ele franze a testa, mas acena.

— Já falei com ela. Vai pegar leve daqui para frente. — Responde.

— Isso não é suficiente. — Digo, cruzando os braços. — Preciso ter certeza de que ela não vai representar uma ameaça. Não posso permitir que ela coloque todos em risco.

Rick suspira, passando a mão pelo cabelo.

— Ela só quer proteger o grupo. — Diz ele, mas vejo a dúvida em seus olhos.

— Eu também. — Respondo. — Mas aqui, fazemos isso de outra maneira. E você precisa garantir que ela entenda isso.

Ele acena novamente, mas seu olhar é distante.

— Vou garantir. — Promete finalmente.

Quando a noite cai, a comunidade começa a se acalmar. As luzes das casas se acendem, e a vida dentro dos muros de Alexandria parece quase normal. Caminho até minha casa, sentindo o peso do dia em meus ombros.

Encontro Sam na sala, brincando com alguns blocos, e ao seu lado estão Kash e Sariah. Eles conversam em voz baixa, mantendo uma atmosfera tranquila. Me sento ao lado deles, observando Sam concentrado em sua construção.

— Tia, posso dormir aqui hoje? — Pergunta Sam, levantando os olhos brilhantes para mim.

— Claro. — Respondo, assentindo. — Vou preparar uma cama para você.

Kash olha para mim com um leve sorriso, enquanto Sariah se inclina mais para perto.

— Foi um dia longo, não é? — Comenta Kash, sua voz suave.

— Sim, bastante. — Concordo, deixando escapar um suspiro. — Mas conseguimos manter as coisas sob controle.

Sariah acena, seus olhos cheios de compreensão.

— Estamos fazendo o melhor que podemos. — Diz ela, firmemente. — E vamos continuar assim.

Levanto-me e começo a arrumar um espaço para Sam dormir, enquanto ele continua a brincar com seus blocos, agora sob o olhar vigilante de Kash e Sariah. O silêncio entre nós é confortável, uma pausa necessária após os eventos do dia.

Depois de colocar Sam na cama, volto para a sala. Kash e Sariah ainda estão lá, agora conversando em voz baixa sobre as próximas etapas para manter a segurança da comunidade.

— Precisamos garantir que todos entendam as novas regras. — Diz Kash, olhando para mim. — Não podemos permitir mais incidentes como o de ontem. — Eles já sabem o que aconteceu, já que eu fiz questão de dexá-los atentos ao novo grupo.

— Concordo. — Respondo, cruzando os braços. — E precisamos estar prontos para qualquer coisa. Rick e seu grupo podem ser uma adição valiosa, mas precisamos ter certeza de que estão alinhados conosco.

Sariah assente, a determinação em seus olhos clara.

— Estamos juntos nessa. — Diz ela, firmemente. — E vamos garantir que nossa comunidade continue segura.

Aceno, sentindo a mesma determinação. A sobrevivência em Alexandria não é apenas uma questão de segurança física, mas de garantir que todos estejam preparados para os desafios que virão.

Não gosto de ver o quanto a minha filha foi forçada a amadurecer. Não a vejo como a minha menininha de treze anos, quando falo com ela, sinto-me dialogando com uma adulta. Isso não é normal, mas é o necessário para a sobrevivência nos dias de hoje.

Enquanto a noite avança, Sariah se levanta, dando um beijo na bochecha de Kash antes de se despedir e ir para o quarto. Ficamos em silêncio por um momento, até que Kash quebra o silêncio.

— Quando você vai contar a ela que Rick é o pai dela? — Pergunta ele, sua voz calma e séria.

Me viro para encará-lo, surpresa com sua pergunta direta.

— Não sei se é o momento certo. — Respondo, ponderando sobre as palavras. — Ela acabou de começar a se sentir segura aqui. Não quero mexer com isso agora.

Kash assente, mas seus olhos permanecem firmes.

— Ela merece saber a verdade, Roselyn. E quanto mais cedo melhor. — Insiste ele, colocando a mão sobre a minha.

Suspiro, sabendo que ele está certo, mas ainda relutante em enfrentar essa conversa.

— Eu entendo. — Digo, agradecendo-lhe a sinceridade. — Mas precisamos abordar isso com cuidado. A última coisa que queremos é desestabilizar tudo o que construímos aqui.

Kash assente novamente, mas há uma determinação em seus olhos que não posso ignorar.

— Vou pensar sobre isso. — Prometo, desviando o olhar.

Por toda a noite a conversa de Kash ressoa em minha mente, lembrando-me da complexidade de nossas vidas aqui em Alexandria. A ideia de revelar a verdade para Sariah é assustadora, mas sei que é inevitável. E com essa consciência, estou determinada a encontrar a melhor maneira de proteger a minha menina. Mesmo que possa machucá-la.

A manhã do dia seguinte é tranquila. Sam, Sariah, Kash e eu estamos sentados em torno da mesa. Cada um em silêncio aproveitando de sua refeição com calma.

— Você vai para a enfermaria hoje? — A voz suave da minha filha é o que quebra o silêncio.

— Não, querida. — Kash responde tomando um gole de seu café. — Hoje é Pete quem fica. Não temos muitos feridos, ele dá conta. — A menina assente com um sorriso fraco nos lábios.

— Então você fica em casa o dia todo hoje...? — Pergunta como quem não quer nada, Kash, já a conhecendo bem, ri negando.

— Queria! — Dá risada. — Vou dar uma olhada no perímetro. — A encara. — Você quer algo, amor? — Ela nega com a cabeça. Amo o carinho envolvido entre eles, me faz sentir segura, caso algo aconteça comigo, saber muito bem que a minha filha não vai estar sozinha.

— Pensei que poderíamos passar a tarde juntos. — Mexe o garfo preguiçosamente pelos ovos fritos.

— E podemos! — O homem afirma. — Quando eu voltar, prometo te encher de beijinhos e abraços, neném! — Se estica por cima da mesa para apertar as suas bochechas. Todos nós rimos enquanto ela tenta se esquivar de seu toque com um grande sorriso no rosto.

— Eu não sou mais neném, dinheiro. — Gargalho do apelido.

— Você vai ser nossa neném para sempre, aceite isso. — Digo entrando no assunto. Olho para Sam também. — Não pense que você escapa disso, mocinho. — Mexo com ele. — Meu bebêzinho....! — Digo com uma voz manhosa brincalhona enquanto dou casquinhas no mais novo que se contorce mais do que uma lacraia.

— Tia, para! — Sam ri, tentando fugir das minhas cócegas.

Kash olha para mim, um leve sorriso no rosto, mas seus olhos ainda refletem a seriedade de nossa conversa da noite anterior. Sei que ele está esperando o momento certo para falarmos mais sobre isso.

Depois do café da manhã, Sariah se dirige ao jardim para cuidar das plantas, enquanto Sam decide brincar no quintal. Kash se prepara para sua ronda no perímetro, mas antes de sair, ele me puxa para um canto da sala.

— Precisamos conversar mais uma vez sobre a Sariah. — Diz ele, baixinho, para que ela não ouça.

— Eu sei. — Respondo, já prevendo o que ele vai dizer. — Ainda estou pensando em como e quando contar.

Kash assente, seus olhos cheios de preocupação e carinho.

— Quanto mais cedo você contar a ela que Rick é o pai dela, melhor. — Ele segura minhas mãos. — Vai ser difícil, mas ela precisa saber a verdade. E eu vou estar com você para tudo, assim como estive antes da gravidez e durante.

Suspiro, sentindo o peso da decisão.

— Sei que está certo. — Digo, olhando nos olhos dele. — Mas não quero machucar ela. Não agora.

— Eu entendo. — Kash responde suavemente. — Só acho que ela merece saber a verdade, para que possa entender seu passado e quem ela realmente é. E se Rick não aceitar, pelo menos teremos feito a nossa parte em contar. Amor não vai faltar para Sariah, isso eu prometo.

Assinto, agradecida pelo apoio inabalável de Kash.

— Obrigada por estar ao meu lado, Kash. — Digo, apertando suas mãos. — Sei que posso contar com você para tudo.

— Sempre. — Ele diz, me dando um beijo rápido na testa antes de sair para sua ronda. — Lembre-se, estamos juntos nisso. Vamos passar por qualquer coisa juntos.

Enquanto vejo Kash se afastar, sinto o peso da verdade que ainda não revelei a Sariah. Decido focar no presente, garantindo que ela continue se sentindo segura e amada em Alexandria. Essa verdade virá à tona no momento certo, mas até lá, protegê-la e cuidar dela será minha prioridade.

Penso em como abordar a conversa com Sariah. Ela é forte e inteligente, mas ainda é uma criança, e a revelação sobre Rick pode ser um choque grande demais. Não posso evitar para sempre, mas também preciso encontrar o momento certo. Enquanto isso, dou o meu melhor para manter a normalidade em nossa vida, mesmo no meio de um apocalipse.

Saio para o quintal e vejo Sariah cuidando das plantas com dedicação. Sam corre pelo gramado, rindo e brincando. Observar essas cenas cotidianas me dá forças para enfrentar o que está por vir. Por agora, vou aproveitar esses momentos simples e felizes.

O sol brilha forte no céu, e o dia segue seu curso. Cada um de nós tem suas tarefas e desafios, mas enfrentamos tudo com coragem e resiliência. Alexandria é nossa esperança, um refúgio no meio do caos, e faremos o possível para proteger este lugar e as pessoas que amamos.


Um capítulo apenas para não ficar sem nada.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top