5. Queimando
🦋 CALLIE
Eu me sentia culpada, talvez. Encontrando Rafe Cameron as escondidas depois do trabalho ou no horário de almoço. Amassos no carro, no banheiro ou em qualquer lugar que seja difícil de nos ver. Ele não gostava, é claro, ou pelo menos fingia que não mas eu sentia dever de fazer isso. Não queria que JJ descobrisse essa situação da pior maneira possivel mas também não queria contar sem antes saber o que nós tinhamos.
E o que estava acontecendo? Eu não sabia.
Era bom e parecia errado o que tornava tudo ainda pior. Parecia que eu tinha uma certa espécie de vício em cometer erros e eu não estava me importando de erras em suas mãos. Rafe era alto, gostoso e cheirava muito bem, além disso era engraçado e as vezes falava umas coisas completamente malucas. Eu gostava de passar meu pouco tempo livre com ele e principalmente gostava de quando não conversávamos.
A noite do cinema ao ar livre era hoje e eu me encontrava praticamente escondida atrás de uma cerca, esperando por ele que havia me mandado mensagem há alguns minutos. Consigo vê-lo chegar.
— Está uma gata Callie Atwood... — ele diz conforme se aproxima.
Não consigo evitar o sorriso bobo que surge em meus lábios.
— Para com isso.
E ele para. Seu corpo grande me empurra contra a cerca e seus lábios vão até os meus num convite para um beijo. Suspiro quando sua língua entra em contato com a minha, seu quadril contra o meu, suas mãos em meu pescoço... Tudo em um ritmo lento, quase torturante. E isso era bom, eu não queria que acabasse.
— Ei Rafe — ouço dizerem e parecia ser de perto.
Me afasto e consigo ver no rosto de Rafe uma pequena pontada de raiva. Ele dá de ombros.
— Dá pra parar de agarração? Temos outras coisas pra resolver — Topper diz. Sua presença também faz com que eu feche a minha cara.
Rafe dá as costas pro amigo num gesto claro de desprezo.
— Dá um tempo Topper, devia tomar conta da sua vida quem sabe assim sua namorada não estivesse sumida.
Topper pragueja alguma coisa que não entendo enquanto tentava controlar o sorriso. A rusga no meio da testa de Rafe e seu mau humor por termos sido interrompidos me causa uma sensação gostosa que beirava a infantilidade.
— Isso foi rude — comento, puxando ele pra mim pela gola de sua camisa.
Sua expressão se mantém emburrada.
— Ele me irrita.
— Então porque é amigo dele?
— Acho que pode chamar de tédio.
Me inclino e selo nossos lábios novamente, sentindo os músculos de seu rosto relaxarem. Sua mão desce pelo meu braço e sobe novamente até a lateral de meu seio, ele me frustra ao não aperta-lo e sim deixar seus dedos gentilmente roçarem pelo mamilo. O puxo mais pra mim, querendo sentir seu calor em cada parte do meu corpo e ele entende bem o meu recado, levando sua mão até minha bunda e coxa que estavam de fácil acesso graças ao meu vestido.
Seus lábios se afastam dos meus e Rafe se inclina pra baixo para encosta-los em meu pescoço. Os arrepios percorrem meu corpo se intensificando mais e mais a cada segundo então percebo o que estava prestes a acontecer numa praça lotada de crianças.
Empurro seu peito de leve.
— Rafe eu tenho que ir...
— Fica comigo — pede, passando a mão por seus cabelos.
Nego com a cabeça, fugindo do espaço encurralado em que ele havia me metido.
— O JJ está aqui e ele não vai gostar muito de me ver com você.
Sua expressão se torna dura.
— Qual é o lance entre vocês afinal?
— Ele é meu melhor amigo, daquele tipo que você já viu de fraldas... — explico, ajeitando meu cabelo.
— Então porque se importa tanto com a opinião dele sobre nós?
— Eu ainda não contei e quero que seja eu a dizer isso — digo, me aproximando dele e tentando fazer com que ele entenda. — Ele pode ser bem emotivo quando quer.
Sua mão foge da minha quando tento toca-lo.
— Que merda — pragueja, dando de ombros. Rafe leva a mão a cabeça como se subitamente estivesse com dor.
— Não precisa ficar chateado com isso...
— Como não? — ele grita me fazendo dar um passo pra trás. — Está me escondendo como se eu fosse a porra de um fugitivo.
— Não aumente o tom de voz! — grito de volta.
Rafe me encara por alguns segundos até que a rusga entre suas sobrancelhas some. Conseguia ver seu peito subindo e descendo devagar.
— Tá... Foi mal.
Dou de ombros.
— Eu tenho que procurar o meu pai.
Sinto seus dedos quentes segurando os meus e quando olho em seus olhos tenho a certeza de estar vendo um cachorro que caiu da mudança.
— Callie, me desculpa — ele pede.
Reviro os olhos enquanto ele me beija. Lento e doce, fazendo com que eu me sinta querida.
— Posso te ver mais tarde?
Assinto.
— Vou te esperar acordada.
Me afasto, ajeitando meu vestido e cabelo com medo de estar muito na cara que estava escondida dando uns amassos em alguém. A praça estava cheia e o filme já havia começado o que significa que passei mais tempo com Rafe do que deveria.
Vejo Kiara acenando com a mão, bem do outro lado do gramado mais perto da tela. Ela estava sentada em uma das cadeiras e JJ e Pope estavam bem ao seu lado.
— Por que precisam de mim? — pergunto, assim que me sento entre eles.
— Bom, estamos com um problema — JJ começa.
— Na verdade eu estou com um problema — Pope corrige.
Kiara revira os olhos, sem paciência.
— Dá pra falar logo?
— Afundei o barco do Topper — Pope confessa em um tom mais baixo.
— O quê? — exclamo.
JJ faz sinal de silêncio com os dedos.
— Aqueles idiotas desceram a porrada no Pope ok? — ele murmura, inclinando a cabeça pra mais perto de mim. — A gente só quis se vingar.
— Mas agora parece que eles descobriram e então querem se vingar de volta — Kie completa.
— Espera, que idiotas?
— O Topper e o Rafe, quem mais? — Pope responde.
Meu peito dói um pouco ao pensar nisso, ao pensar em Rafe batendo no Pope, ao pensar nele fazendo chacota com meus amigos. O sentimento de decepção cresce em meu peito e dói como a porra de um tapa.
— Está prestando atenção no que eu falei? — JJ pergunta, passando a mão na frente do meu rosto.
— Claro — murmuro em resposta mesmo não tendo ouvido uma palavra do que ele disse.
— Certo, temos que manter a distância e precisamos da sua ajuda pra isso — Pope prossegue. — Só Deus sabe o que esses daí podem aprontar.
— Não quero ser obrigado a usar minha arma.
— Arma? — Pope indaga.
— Aqui está cheio de crianças! — Kiara exclama, mesmo não podendo falar muito alto.
— Não acredito que trouxe isso pra cá, JJ! — o reprimo. — Devia ter isolado essa merda no mar.
— Precisamos nos defender tá legal? — ele se defende. — É só pra assustar.
Cruzo os braços, me afundando em minha cadeira.
— Bem, está funcionando. Eu estou um pouco assustada.
A verdade é que eu não estava muito interessada no filme. Estava me controlando para não olhar pra trás a procura de Rafe e acabar dando na cara o que estava acontecendo, até porque eu sei que isso é um segredo só por minha causa.
Minha inquietação me faz beber muito refrigerante e isso enche minha bexiga rapidamente.
— Preciso ir ao banheiro, acham que conseguem sobreviver sem mim? — pergunto, finalmente.
— Sim — Pope e Kie respondem em uníssono.
— De jeito nenhum — JJ rebate, fazendo com que eu o encare sem nenhum humor. Ele sorri amarelo. — Foi só uma piada Ellie... Bom xixi ou... Cocô. Sei lá.
— Você é um idiota — murmuro dando de ombros.
Não consigo ver Rafe enquanto sigo pro banheiro. Não era lá o local mais limpo do mundo e tinha uma fila gigantesca de pessoas na minha frente o que me toma muito tempo, mas pelo menos eu não sentiria mais esse desconforto. Lavo minhas mãos pelo menos três vezes e saio de lá.
Tento procurar meus amigos no lugar onde estávamos mas não os encontro, o que me deixa um pouco perdida. Vejo a distancia Kiara correr para trás da tela que estava do outro lado do gramado. Espero pra ver se algo acontece mas nenhum deles aparece, me gerando certa preocupação. Sigo em direção a tela, desviando pelas pessoas no caminho e tentando não atrapalhar ninguém.
Uma chama alaranjada brilha bem na minha frente no momento em que consigo chegar até o telão. JJ e Pope estavam embolados no chão com Rafe e Topper enquanto Kiara tentava separa-los de alguma maneira enquanto gritava coisas que eu não conseguia entender.
Os gritos se intensificam do outro lado da tela, mostrando que provavelmente já haviam percebido as chamas. Eles não paravam nem assim acumulando angústia em meu peito.
— Rafe! — eu grito.
Seus olhos encontram os meus e imediatamente sua mão afrouxa a gola de JJ. Ele puxa Topper pelo peito, o tirando de cima de Pope e de perto do fogo. Me mantenho estática conforme ele se aproximava, sem saber o que fazer. Sem saber se batia nele ou o abraçava. Sem saber se deveria manda-lo pro inferno. As chamas se intensificam fazendo com que meu pulmão arda e imediatamente começo a tossir.
— Você tem que sair daqui — Rafe diz, puxando o meu pulso.
Tendo me desvencilhar dele, vendo as chamas refletidas em seus olhos no meio da fumaça.
— Me solta.
— Callie — ele insiste.
— Eu falei pra me soltar! — grito.
Empurro seu peito com a mão livre e giro meu pulso buscando me libertar. Funciona. Seu rosto fica duro enquanto ele me encara mas não me preocupo com sua reação, apenas saio correndo em direção aos meus amigos que se afastavam devagar.
Os sigo até a kombe, parada há alguns metros da entrada do parque. Nos apoiamos nela, tentando recuperar nosso fôlego enquanto uma expressão aliviada tomava conta de nosso rosto. Mas não no de JJ.
— O que foi aquilo? — JJ pergunta, ainda com a respiração descompassada.
Conseguia ver as marcas de soco em seu rosto assim como no rosto do Pope, os passos mancos não os deixavam esconder que haviam se machucado. Engulo em seco, tirando meu cabelo de meu rosto suado.
— Aquilo? — tento ganhar tempo.
Precisava de uma desculpa, qualquer uma.
— Com o Rafe, Callie.
Respiro profundamente numa tentativa de me dar tempo pra projetar uma resposta.
— Ele estava debochando da...
JJ bate a porta da kombe com violência, fazendo com que eu e Kie pulássemos pra trás.
— Ele queria que você fosse embora com ele! — grita.
Fecho meus olhos sentindo um mix de emoções dentro de mim. Eu queria sair correndo e queria chorar, não conseguia suportar a vergonha que sentia nesse momento depois de tudo o que aconteceu.
— JJ — Kiara o censura, sem sucesso.
— Está trepando com ele?
— Não, tá legal? — respondo, sentindo as lágrimas se acumularem em meus olhos. — A gente só...
— Está ficando com ele não é? — me interrompe. — Não é?
Minhas lágrimas começam a escorrer e um soluço desolado escapa de minha garganta.
— Me desculpa.
— Não acredito nisso — ele continua gritando. — Eu não acredito nessa merda. Ele espancou o Pope!
Pope dá de ombros e olha pro chão, fazendo com que eu me sinta ainda pior.
— Eu não sabia disso! — tento me defender.
JJ se aproxima, apontando o dedo pro meu rosto.
— A gente costumava falar mal dele... Fazer piada com o cabelo lambido e os sapatênis. Você só pode estar ficando maluca.
Olho de soslaio esperando que um deles diga alguma coisa mas ninguém me defende e então eu entendo. Não havia defesa pra isso, pra eles eu era uma traidora.
— Ele não é tão ruim — é a única coisa que consigo dizer.
A expressão incrédula de Kiara faz com que eu me arrependa por ter dito isso.
— É, claro que não — JJ ironiza. — Estamos todos fodidos aqui mas ele não é tão ruim.
— O que quer que eu diga? — grito de volta, minha visão turva por conta das lágrimas. — Eu sinto muito JJ! Eu não queria que descobrisse desse jeito, queria conversar com você, queria que me entendesse.
— Te entender? Em pensar que eu quase me senti mal pela nossa discussão.
— Não se atreva a falar sobre isso como se ficar com o Rafe seja comparado a sua falta de compromisso comigo — berro, apontando meu dedo pro seu peito.
Me deixava irada o fato dele querer me pintar como um monstro só porque fiquei com um garoto. Eu não sabia do que estava acontecendo, não tinha como eu saber que o problema entre eles era assim tão sério.
— Ele é mau, Callie. É egoísta, violento e instável e com certeza não se importa com você, só com ele.
— Igual a você! — rebato.
A expressão de JJ se desmancha e ele abre a porta da kombe.
— Não vou ficar aqui ouvindo isso — diz, pulando pro banco do passageiro.
— Não estou pedindo que fique — grito, dando de ombros.
— Vá pro inferno — ele grita, conforme eu me afasto dele e de toda essa merda.
— Vá você!
Ando quase dois quilômetros até em casa em tempo recorde graças a raiva dentro de mim. Raiva essa que com toda a reflexão que fiz pelo caminho havia se tornado tristeza. Meu pai me manda mensagens dizendo que ia jantar com os amigos e seu bom humor me faz ter vontade de atirar meu celular longe. Graças a Deus havia ido embora, não precisava estragar a sua noite também.
Estou na porta de casa quando ele me chama.
— Callie.
Meu corpo respondeu ao seu chamado imediatamente. Rafe havia descido do carro em que Topper dirigia, um daqueles carros bem caros e que impressionam qualquer um. Topper sobe seu video escuro, impedindo que eu o veja enquanto Rafe se aproxima de mim sem hesitar, mesmo eu tendo certeza que minha expressão não é amigável.
— É sério? — pergunto, cruzando os braços.
— Não posso me explicar?
— Explicar o quê? Eles são meus amigos Rafe.
— Eu sei e eu sinto muito — diz, se aproximando e me permitindo ver seu rosto machucado. — Eu sinto muito por ter machucado eles e principalmente por ter te magoado. Eu não queria isso.
— Não importa mais — sou firme, sentindo a mágoa tomar conta de mim.
— O Topper provocou o Pope, tá legal? Eu admito isso mas então ele começou a apanhar e eu tive que defende-lo, é o que qualquer amigo faria. E sei que você faria o mesmo.
— E no cinema? — pergunto, não muito convencida das suas desculpas.
— Dois contra um não ia ser justo. Eu não tenho nenhum problema com eles mas eu tenho que defender quem está comigo. Acha que pode entender isso?
Gemo de frustração por novamente ter sido capaz de entender o seu lado. Rafe se aproveita por eu ter abaixado a guarda e segura a ponta de meus dedos.
— Pode por favor parar de socar a cara deles? — eu peço.
Ele sorri pra mim.
— Não vai mais acontecer, eu prometo.
Encaro seu rosto tão bonito pensando se estou me deixando levar por ele, pensando se ele realmente merece minha dúvida. Sua mão quente contra a minha afasta esses pensamentos me deixando apenas com uma questão na cabeça.
— O JJ me odeia — me lamento.
— Ele não odeia. Logo ele vai perceber isso e se por acaso não perceber é porque ele é um idiota.
Rafe abre os braços e me aninha em seu peito. Consigo ouvir seu coração bater rápido e forte, quase como se a adrenalina tomasse conta do seu corpo.
— Eu estou cansada — admito, escondendo meu rosto contra seu tronco. — Trabalhar quase todos os dias, lidar com clientes sem um pingo de educação, voltar pra casa e ter que ajeitar tudo, lembrar meu pai de tomar os remédios, enfrentar a realidade terrível de que eu não posso mais me comportar como adolescente...
— Mas você é adolescente — ele me interrompe mas continua afagando minhas costas.
— Não sou mais. Tenho muito com o que me preocupar, eu só... Queria ser inconsequente — admito. — Voltar a aprontar por ai sem me importar com o dia seguinte mas eu não posso mais. Talvez seja por isso que o JJ tem me chateado tanto... Eu o invejo.
Invejava suas aventuras, seus amigos e toda a adrenalina. Invejava seus dezesseis anos.
Rafe me afasta cuidadosamente e usa sua mão pra erguer meus olhos até os seus.
— Podemos sair amanhã, ir pra qualquer lugar, você escolhe. Pra longe da ilha.
Seu convite me arranca um sorriso mas a realidade impede qualquer chance de aventura.
— É o solstício de verão, esqueceu? Seu pai é o homenageado.
Ele geme em frustração.
— Não me importo com isso.
— Por mais tentador que pareça seu pai não vai gostar disso e eu preciso bastante do dinheiro que vão dar aos garçons.
— Vai ficar sexy de gravata — ele murmura no meu ouvido.
Isso me gera um arrepio e não consigo evitar o sorriso.
— Acho que posso dizer o mesmo de você.
Rafe se aproxima, selando nossos lábios em um beijo doce, mesmo com o gosto de cerveja que sua língua tinha. Eu gostava como ele sempre queria me beijar, gostava da maneira que me beijava.
— Então até amanhã? — ele pergunta quando eu me afasto.
— Até amanhã.
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