47. Kill this asshole

Quando aquelas palavras saíram da boca dela, "De termos algo com rótulo, gênio," senti meu mundo virar de cabeça para baixo, mas de um jeito que nunca pareceu tão certo. Levantei-me da cama num impulso, rindo, completamente desacreditado. Eu estava tão tomado pela felicidade que mal sabia como reagir. Passei as mãos pelos cabelos e me virei para ela, um sorriso tão largo no rosto que quase não cabia ali.

— Isso é sério? — Perguntei, ainda tentando processar o que ela acabara de dizer.

Calista coçou a nuca, um gesto tão típico dela que me fez sorrir ainda mais.

— É claro que eu tenho medo... — Ela respondeu, direta como sempre. — Silver, Kreese... Eles são monstros, Kwon. Mas deixar isso exposto só demonstra fraqueza. E eu cansei de ser fraca. Vou me arriscar sem pensar duas vezes.

Ela parou por um instante, seus olhos cravados nos meus. Então, cruzando os braços, me devolveu a pergunta.

— Mas e você?

Eu ri baixinho, ainda me sentindo nas nuvens, e dei alguns passos até ela. Segurei suas mãos, sentindo o calor delas contra as minhas. Olhei diretamente em seus olhos, tentando transmitir tudo o que eu sentia.

— Você nem precisava perguntar isso pra mim, dinamite. — Respondi, apertando suas mãos suavemente. — Eu faria de tudo pra que nada mais nos afastasse outra vez. Calista, eu... — Minha voz fraquejou por um segundo, mas continuei. — Só de pensar em te perder de novo, eu entro em desespero. É algo que eu definitivamente não posso suportar.

Apertei suas mãos um pouco mais forte, meu coração acelerado. Eu tinha planejado um momento muito diferente pra isso, mas, honestamente? Não dava pra esperar mais. Não depois de tudo que havíamos passado.

Ainda segurando uma das mãos dela, me ajoelhei na frente dela. Eu ouvi a risadinha dela, aquele som que sempre fazia meu peito aquecer. Olhei para cima, vendo o brilho curioso em seus olhos. Com a outra mão, levei-a até meu peito, como se estivesse jurando algo diante de tudo que importava no mundo.

— Calista... — Comecei, sentindo meu coração disparar. — Minha dinamite. A garota mais teimosa e complicada que eu já conheci, e, ao mesmo tempo, a pessoa que eu mais amo neste mundo. Alguém que passou a ser a coisa mais importante na minha vida em tão pouco tempo. — Fiz uma pausa, minha voz ficando um pouco mais trêmula. — Você aceitaria namorar com alguém tão tolo, idiota e impulsivo quanto eu?

O silêncio que seguiu foi como um peso esmagador. Ela não respondeu de imediato, o que fez minha mente começar a correr. Eu fiquei ansioso, mais ansioso do que jamais estive. Calista levou uma mão até o queixo, soltando um suspiro como se estivesse considerando seriamente minha pergunta.

— Eu não. — Ela começou, e eu senti meu coração despencar como se alguém o tivesse jogado de um penhasco. Meu cenho franziu involuntariamente, e minha boca se abriu para protestar, para dizer qualquer coisa, mas antes que eu pudesse reagir, ela continuou. — Eu não conseguiria ficar mais um segundo sequer sem poder te chamar de meu.

Ela riu, aquele riso doce e travesso que era tão característico dela.

— É claro que eu aceito, gênio.

Foi como se todo o ar que havia deixado meus pulmões voltasse de uma vez. Meu sorriso se abriu, genuíno, incapaz de ser contido. Sem pensar duas vezes, me levantei e a puxei para um beijo.

Foi um beijo longo, profundo, e carregado de todo o desejo, todo o amor que eu guardei por tanto tempo. Cada segundo parecia uma explosão de emoções. Eu a segurei com cuidado, tentando não apertar demais, mas também não a soltar. Calista retribuiu o beijo com a mesma intensidade, e eu sabia que ela sentia o mesmo que eu.

Naquele momento, tudo parecia certo. Nada mais importava. Nem Silver, nem Kreese, nem o mundo lá fora. Era só eu e ela, finalmente juntos como sempre deveria ter sido. Quando nos afastamos, ainda ofegantes, nossas testas se encostaram, e eu sorri.

— Você realmente me ama, hein? — Provoquei, com um tom brincalhão.

Ela revirou os olhos, mas tinha um sorriso no rosto.

— É, gênio. Eu te amo. E agora você é oficialmente meu. Não se esqueça disso.

— Nem por um segundo. — Respondi, selando aquele momento com mais um beijo, já ansiando por tudo que nos esperava daqui pra frente.

Eu estava no meio daquele momento perfeito, minha testa ainda encostada na de Calista, o sabor do beijo dela ainda presente, quando ouvi uma batida na porta. Suspirei, frustrado. Não dava pra ter um segundo de paz? Um único momento sem que alguém interrompesse? Olhei para Calista, que soltou uma risadinha, como se estivesse achando graça na minha irritação.

Antes que pudesse responder, a porta se abriu, e Kenny entrou no quarto, todo empolgado, chamando-a como sempre fazia.

— Minha irmãzona do karatê!

O sorriso no rosto de Calista iluminou o quarto.

— Kenny! — Ela respondeu, a voz animada, e abriu os braços para ele, que veio correndo para abraçá-la como se não houvesse amanhã.

— Ei, ei — Interrompi, estalando os dedos e soltando um assobio para chamar a atenção. — Vai com calma, garoto. Ela tá machucada, sem muito abraço e aperto!

Antes que pudesse continuar, ouvi a voz de Zara no corredor, meio zombeteira.

— Para de ter ciúmes do garoto e vem pegar uma água. Deixa eles conversarem.

Bufo, cruzando os braços. Não era ciúmes. Tá, talvez um pouco. Mas eu tinha minhas razões, e Zara sabia disso. Lancei um último olhar para Calista, que agora ria baixinho enquanto conversava com Kenny, e saí do quarto, tentando ignorar a sensação incômoda que sempre me acompanhava quando outra pessoa tomava meu espaço ao lado dela.

Do lado de fora, Axel estava encostado na parede, com os braços cruzados, o olhar vagando. Troquei um breve aceno de cabeça com ele, mais por educação do que por vontade. Nossa relação ainda era... Complicada, pra dizer o mínimo. Mas, por respeito à Calista, havíamos chegado a um entendimento básico. Um tipo de trégua. Não era amizade, mas pelo menos não estávamos prontos para nos matar toda vez que nos víamos.

Segui Zara em direção à cantina, tentando afastar os pensamentos que insistiam em me puxar de volta para Calista. Ela estava bem agora, mas eu ainda me sentia culpado por tudo o que tinha acontecido. E, mais do que isso, a raiva que eu sentia de mim mesmo era quase insuportável. Como eu deixei isso acontecer? Como eu a deixei chegar ao ponto de acabar num hospital por minha causa?

— Tá quieto demais. — Zara disse, interrompendo meus pensamentos. Ela pegou duas garrafas de água da geladeira e pagou antes de me entregar uma. — No que tá pensando?

Bebi um gole da água, tentando organizar minhas ideias.

— Nada. Só... Tentando processar tudo.

Ela me olhou de canto de olho enquanto caminhávamos até uma mesa.

— Você sabia que ela tá pensando em ir pro Miyagi-Do?

Assenti, soltando um suspiro.

— Sim. Até chamei ela pra voltar pro Cobra Kai. Mas... Sei que não é o lugar mais seguro pra ela agora.

Zara se sentou, apoiando os cotovelos na mesa enquanto me analisava.

— E você? Se importa com isso?

Bebi mais um gole da água, tentando ganhar tempo. Finalmente, suspirei e balancei a cabeça.

— Não. Quer dizer... Me importo, claro, mas não do jeito que você acha. Eu odeio pensar nela longe de mim, mas, se é o que ela precisa pra ficar segura e em paz, vou apoiar. Mesmo que doa.

Zara soltou um suspiro, olhando para a garrafa d'água em suas mãos.

— Eu odeio isso também. Odeio o fato de não estarmos na mesma equipe. E odeio ainda mais que ela vai treinar com o Robby.

— Robby? — Franzi o cenho, sentindo meu estômago revirar ao ouvir o nome. — Por que isso importa pra você?

— Porque ele tem um jeito com as pessoas. — Ela respondeu, soltando um riso seco. — E, sinceramente, ele é o oposto de você. Calista pode acabar...

— Nem começa, — Interrompi, levantando uma mão. — Eu confio nela. E sei que ela me ama. Não tem nada que aquele idiota possa fazer.

Zara deu de ombros rindo, claramente brincando, mas havia uma expressão pensativa no rosto dela.

— Espero que você esteja certo. Porque, olha, a gente sabe que o Terry tá perdendo o controle. O Iron Dragons não é um lugar pra ela.

— Eu sei disso. — Respondi, a voz firme. — E, honestamente, não importa onde ela esteja. Enquanto ela estiver bem, é o que importa. E ela sabe que sempre pode contar comigo, não importa o que aconteça.

Zara sorriu de lado, aparentemente satisfeita com a resposta.

— Bom, então acho que estamos na mesma página.

Assenti, mas a culpa ainda me corroía por dentro. Enquanto esperávamos o médico liberar a alta de Calista, meus pensamentos voltaram para Maria e Yuri. Eles achavam que podiam mexer com ela sem consequências? Que podiam usar meu passado contra mim e sair impunes? Não. Eles iam provar do próprio veneno. Eu faria questão disso.

Nós voltamos para as cadeiras em frente ao quarto dela. Eu estava inquieto, mexendo na garrafa d'água, impaciente. O tempo parecia se arrastar, e cada segundo parecia mais um teste de resistência. O médico demorava demais, e a ideia de Calista ainda deitada naquela cama me deixava desconfortável. Quando ele finalmente entrou no quarto e disse que ela estava liberada, senti um alívio imediato. Levantei-me rapidamente, ajeitando o casaco, e me aproximei dela.

— Vou te levar pro hotel. — Eu disse, já decidido. — Se você quiser.

Antes que ela pudesse responder, Kenny saiu logo atrás dela, empolgado como sempre.

— Ei, irmãzona, o Larusso tem um quarto de hóspedes sobrando! Ele disse que você pode ficar lá por enquanto. É super tranquilo, porque o Chozen tá dormindo na casa da piscina. E eles são pessoas confiáveis, juro.

Eu não consegui esconder minha expressão de desagrado. Claro que ele falaria isso. Kenny parecia adorar qualquer oportunidade de sugerir que ela se aproximasse do Miyagi-Do. Olhei para Calista, esperando que ela fosse recusar a ideia, mas, para minha frustração, ela me lançou um olhar calmo e disse.

— Vai ficar tudo bem, Kwon. Eu conheço os Larusso. Eles são boas pessoas. Conheço todo mundo de lá muito antes do Sekai Taikai.

Respirei fundo, apertando o maxilar. Eu odiava a ideia de ela ficar lá, mas, no fim, sabia que não tinha muita escolha. Se era isso que ela queria, quem era eu para dizer não?

— Tudo bem. — Respondi, a voz um pouco mais firme do que eu pretendia. — Mas eu vou com você até a casa do Terry. Você vai precisar fazer as malas, e, se ele estiver lá, eu vou enfrentar aquele desgraçado. Não vou deixar ele te impedir de sair.

Antes que ela pudesse dizer qualquer coisa, Zara se levantou do banco, ajeitando o rabo de cavalo.

— Eu vou também. — Anunciou, cruzando os braços com um ar determinado.

Axel, que estava encostado na parede o tempo todo, afastou-se e deu um meio sorriso, típico dele.

— Se vocês acham que vão fazer isso sem mim, estão muito enganados. Eu também vou.

Kenny, sempre o animado, deu um leve empurrão no ombro de Calista, zombando como sempre.

— E eu vou ficar de vigia, caso o velhote resolva dar as caras.

Calista começou a rir, balançando a cabeça e olhando para todos nós.

— Vocês são os melhores amigos que alguém poderia ter. — Ela disse, e, por um momento, parecia que toda a tensão havia deixado o quarto.

Mas é claro que eu não ia deixar aquele momento passar em branco. Com um sorriso malicioso, passei o braço ao redor dos ombros dela e completei.

— E o melhor namorado.

Ela revirou os olhos, como sempre fazia quando eu fazia algum comentário que misturava provocação e carinho. Zara, no entanto, arregalou os olhos e praticamente deu um pulo de onde estava.

— É sério? — Ela disse, animada. — Finalmente vocês entregando um pouco de migalhas pra maior torcedora dessa dupla explosiva!

Antes que eu pudesse responder, Kenny aproveitou a deixa e zombou, com aquele sorriso arteiro no rosto.

— E a aliança, hein? Cadê?

Dei de ombros, tentando parecer despreocupado, mas o sorriso no meu rosto não dava muito espaço para isso.

— Foi tudo às pressas. — Expliquei, olhando para ele. — Mas pode deixar, tô providenciando algo que realmente sele isso — Então apontei para ele. — E você, Kenny... Pode tirar o olho. Calista tá oficialmente comprometida agora.

Kenny levantou as mãos em rendição, rindo.

— Claro, claro. — Ele respondeu, com aquele tom de quem ainda estava se divertindo com a situação.

Olhei para Calista, que estava rindo baixinho, provavelmente achando graça de tudo isso. E, por um momento, esqueci toda a tensão, toda a culpa. Estar com ela, com eles, me lembrava que, apesar de tudo, eu não estava sozinho. Nós tínhamos um ao outro. E isso era o suficiente pra me manter de pé e pronto pra enfrentar o que viesse pela frente.

O carro seguia pela estrada com um clima que misturava leveza e apreensão. Zara, sempre cheia de ideias mirabolantes, estava dirigindo o carro que, de acordo com ela, havia "pegado emprestado" do Silver. Não era exatamente o tipo de coisa que me deixava confortável, mas, dado o contexto, ninguém ali parecia muito preocupado com moralidades. E se era um carro do Terry, eu sinceramente não dava a mínima, inclusive estava louco por um drift com a nave, quem sabe fundir o motor? Seria interessante.

Não demorou muito até chegarmos à mansão do Terry. Só o portão imponente já era o suficiente para lembrar a todos que estávamos entrando no território de um homem perigoso. Porém, para nosso alívio, Axel comentou enquanto descíamos do carro.

— Ele não está. Passei no dojô mais cedo e vi ele e a sensei Wolf. Devem estar resolvendo alguma coisa.

Calista suspirou, ajustando a mochila nas costas.

— Provavelmente planejando vingança contra os antigos rivais do karatê. — Ela disse, em tom de cansaço.

Todos soltamos um riso leve. Eu completei, tentando quebrar o clima pesado que parecia pairar no ar.

— Deixa que eles se matem. Dá mais tempo pra planejarmos sua fuga.

Ela sorriu, aquele sorriso que sempre fazia meu peito parecer mais leve, como se, por alguns segundos, o mundo não fosse tão caótico quanto parecia.

Entramos na casa, e meu primeiro pensamento foi como o lugar parecia completamente vazio de vida. A mansão era impressionante, claro, pé-direito alto, mármore por todos os lados, lustres enormes, mas era fria. Tudo tinha um tom cinza, impessoal, como se ninguém realmente morasse ali. Era uma prisão luxuosa, e, honestamente, não conseguia imaginar a Calista crescendo nesse lugar.

Quando subimos até o quarto dela, no entanto, tudo mudou. Eu parei na porta por um momento, olhando para aquele espaço, e um sorriso involuntário surgiu no meu rosto. Era como se aquele quarto fosse um pedaço dela no meio de um ambiente que não fazia sentido. As paredes tinham pôsteres de personagens da Disney, algo que ela amava mais do que admitia. Uma prateleira cheia de discos de bandas antigas cobria uma parede, e, de alguma forma, tudo aquilo fazia sentido. Música sempre foi algo que a definia.

E, claro, lá estava ele, na cama, o coelho de pelúcia, Gênio. Eu me aproximei, pegando o pequeno coelho nas mãos, e senti um aperto no peito. Lembrei do dia em que pedi ele de volta. Um gesto estúpido, movido pela minha raiva e sensação de traição, quando, na verdade, eu estava sendo um idiota por interpretar as coisas erradas, mais uma vez.

Sem perceber, me sentei na cama, segurando o coelho e deixando os dedos deslizarem pelo tecido macio. Os outros também se espalharam pelo quarto. Zara começou a ajudar Calista a organizar as coisas, enquanto Axel foi direto para a porta da frente, dizendo que ia ficar de vigia. Kenny já tinha sumido, anunciando que ia verificar a garagem.

Fiquei observando o quarto enquanto Zara ajudava Calista com as malas. Aquele lugar dizia tanto sobre ela, e eu não conseguia evitar um comentário provocativo.

— Agora faz sentido aquela playlist de trilhas sonoras da Disney que você ouve. Você é uma fã lunática. — Brinquei, cruzando os braços e encarando-a com um sorriso desafiador.

Calista, claro, revirou os olhos.

— Provavelmente o seu quarto tem pôster de mulher de biquíni. — Ela rebateu, com o tom seco que eu já conhecia tão bem.

Eu ri, aproveitando a deixa.

— Como você adivinhou?

Ela pegou um travesseiro e, antes que eu pudesse reagir, jogou na minha cara. Não era muito pesado, mas o suficiente pra me fazer rir enquanto o segurava e olhava pra ela, que estava com aquele olhar desafiador que eu amava tanto.

Foi nesse momento que Zara saiu do banheiro, carregando uma pequena coleção de produtos para cabelo nas mãos.

— Cali precisa de tudo isso e mais um pouco... — Ela disse, colocando os frascos sobre a cama. — Finalizar esses cachinhos lindos não deve ser fácil.

Calista pegou os frascos e começou a rir.

— Não mesmo. — Respondeu, sem nem tentar negar.

Aquele momento, por mais simples que fosse, me deu uma sensação de calma que eu não sentia há muito tempo. Não era o lugar, não era o contexto,era ela. Era Calista. Mesmo em meio ao caos, ela conseguia fazer tudo parecer menos pesado.

E, naquele quarto que era a personificação de quem ela era, tive certeza de uma coisa, faria qualquer coisa para protegê-la. Ela merecia mais do que aquela casa fria. Merecia mais do que todo o peso que carregava. E, acima de tudo, merecia alguém que nunca mais soltasse sua mão.

⋆౨˚ ˖

O dia finalmente chegou. O ônibus do Cobra Kai estava mais silencioso do que o normal, mas a tensão era palpável. Cada um ali tinha sua maneira de lidar com o peso da competição. Alguns conversavam animadamente sobre estratégias, outros mantinham os olhos fixos na janela, perdidos em pensamentos. Eu me encaixava na segunda categoria.

Estava sentado ao lado de Yoon, que não parava de tagarelar sobre um golpe novo que a sensei Kim tinha ensinado no treino daquela semana. Era algo sobre um movimento de contra-ataque que exigia precisão e velocidade extremas. Eu ouvia metade das palavras, assentindo de vez em quando para parecer educado, mas minha cabeça estava em outro lugar.

Meu foco não estava em técnicas novas. Não estava em quem lutaria primeiro ou no placar geral. Meu foco era Yuri. Ele era a única coisa na minha mente naquele momento. A lembrança da última luta contra ele ainda queimava dentro de mim. Ele não só tinha me derrotado, mas também ferido Calista, emocional e fisicamente, com aquela foto... Tudo isso enquanto eu estava vulnerável, distraído... Fraco. Mas não dessa vez.

Meus punhos estavam cerrados sobre os joelhos enquanto eu olhava para frente, encarando o corredor do ônibus. Meu queixo estava travado, e eu podia sentir a energia pulsando nos músculos, como se cada fibra do meu corpo estivesse pronta para explodir.

Foi quando Kreese passou pelos corredores, com aquele andar firme e autoritário. Ele parou no meio do ônibus, seu olhar analisando cada um de nós. Seu tom de voz era frio e calculado, mas cheio de autoridade.

— Hoje é o dia. Não importa quem esteja na sua frente, vocês serão implacáveis. Vocês não hesitarão. Sem fraquezas. Sem compaixão.— Ele disse, sua voz grave cortando o silêncio como uma faca.

Então ele olhou diretamente para mim. Não apenas olhou, seus olhos me perfuraram, como se quisessem arrancar algo de dentro de mim. Um pequeno sorriso surgiu no canto de sua boca, e foi aí que percebi, ele estava zombando de mim. Ele sabia o motivo pelo qual eu tinha perdido a última luta. Sabia que minha cabeça estava em Calista, que eu hesitei por me importar demais.

— Sem compaixão. — Ele repetiu, mantendo o olhar fixo em mim por um momento a mais antes de seguir pelo corredor.

Eu não desviei o olhar. Não dessa vez. Deixei que ele visse a determinação que queimava dentro de mim. Ele podia pensar o que quisesse. Sim, eu ainda me importava com Calista mais do que qualquer coisa nesse mundo. Mas aquilo não era uma fraqueza. Não mais. O que ele não entendia – o que nunca entenderia – era que meu sentimento por ela não me enfraquecia. Pelo contrário. Era minha maior motivação.

Se Yuri achava que podia repetir o que fez, estava enganado. Ele não tinha ideia de quem eu me tornara desde aquele dia. Eu estava mais forte, mais focado. E, dessa vez, eu não iria hesitar. Não importava o que acontecesse, Yuri pagaria pelo que fez. Mas eu não precisava recorrer a truques sujos ou desleais para derrotá-lo. Eu o destruiria no tatame, onde realmente importava.

Olhei para Yoon, que ainda estava falando sobre o golpe. Ele parecia tão tranquilo, tão distante do peso que eu carregava. Me ajeitei no banco e respirei fundo. O barulho do motor do ônibus parecia ressoar dentro de mim, como o compasso de um relógio que contava os segundos até o início da competição.

Quando finalmente chegamos ao local, o movimento do ônibus parando me trouxe de volta à realidade. O som das portas se abrindo foi o sinal de que era hora de agir. Enquanto os outros começavam a descer, peguei minha mochila e me levantei, passando pelo corredor com um único pensamento na mente.

Yuri não teria chance. Eu faria ele provar do próprio veneno. Não por raiva, não por vingança cega, mas porque eu precisava mostrar que, mesmo com todas as adversidades, eu era mais forte.

E, acima de tudo, porque eu queria que Calista visse o que ela sempre acreditou, que eu não era apenas um lutador. Eu era alguém disposto a ir até o fim por aquilo que importava. E ela importava mais do que qualquer coisa.

O ginásio do All Valley tinha algo especial. Era menor que o ginásio onde o Sekai Taikai estava acontecendo antes, mas ainda assim, carregava uma energia única. Aquele ambiente tinha um peso histórico, como se cada canto estivesse impregnado com as batalhas que moldaram a história do karatê na região. Respirei fundo antes de descer do ônibus, tentando controlar a tempestade que rugia dentro de mim.

A raiva. Era tudo o que eu conseguia sentir naquele momento. Não estava nervoso, nem ansioso. Não havia dúvidas ou inseguranças. Só raiva. Uma raiva que eu vinha alimentando desde a última luta contra Yuri, desde cada comentário provocativo de Kreese, desde cada vez que vi Calista sendo machucada pelo sistema do qual eu mesmo fazia parte.

Finalmente desci do ônibus ao lado de Tory, mantendo a postura firme. Como líderes do time, tínhamos que ser os primeiros a entrar, a mostrar confiança, força e determinação. Não era algo difícil para ela, mas para mim, a raiva já fazia esse papel. Não havia espaço para outra coisa. Nossa equipe nos seguia logo atrás, todos com olhares sérios e determinados.

Quando entramos no ginásio, as arquibancadas explodiram em gritos. O nome "Cobra Kai" ecoava pelo ambiente, junto com assobios e aplausos. Eu sabia que, mesmo com toda a sujeira que Kreese e Silver trouxeram para o nome do dojô, o Cobra Kai ainda tinha fãs. Muitos idolatravam Kreese, mesmo depois de ele ter sido preso, e essa devoção era uma energia que permeava o ginásio.

Meus olhos varreram o local, absorvendo tudo. Foi então que a vi.

Calista.

Ela estava do outro lado do ginásio, vestindo o quimono branco do Miyagi-Do. Meu coração deu um salto inesperado, como se, por um instante, a raiva que eu sentia tivesse sido substituída por algo mais quente e reconfortante. Faziam dois dias que não nos víamos, e mesmo assim, parecia muito mais tempo. Ela estava rindo de algo que conversava com Devon Lee e Samantha Larusso. Aquele sorriso... Era como se ela estivesse exatamente onde deveria estar, no lugar certo, com as pessoas certas.

Observei enquanto elas começavam a repassar algumas katas juntas. Calista se movia com uma graça que parecia natural, mas eu sabia o quanto ela era dedicada. Tão dedicada que até aquele momento, com toda sua beleza e leveza, parecia surreal. Ainda assim, eu não pude evitar um sorriso.

— Kwon, foco — Ouvi Tory me chamar, e balancei a cabeça, voltando à realidade.

Mas antes de desviar o olhar, pensei no quanto Calista era perfeita em qualquer coisa que fazia. No entanto, para mim, ela brilhava de verdade era no combate. Cada golpe, cada chute, era como se ela tivesse nascido para aquilo. Eu ainda achava que o Cobra Kai era o lugar perfeito para ela. Se não fosse Kreese e toda sua manipulação, nós estaríamos lado a lado agora, como a dupla implacável que sempre fomos.

Enquanto isso, Devon e Samantha começaram a mexer nos detalhes do quimono dela, ajustando a faixa, e Calista jogou a cabeça para trás rindo de algo que elas disseram. Era um som tão genuíno que me desarmava completamente.

Voltei o olhar para a arquibancada do Cobra Kai. Não era hora para distrações, não importava o quanto meu coração dissesse o contrário. Eu precisava focar. Hoje era o dia de acertar as contas, de mostrar que eu não era o mesmo garoto que perdeu para Yuri da última vez. Eu era muito mais.

Enquanto Kreese subia para a área dos treinadores, me aproximei de Yoon, que já falava sobre como queria enfrentar alguém do Fúria de Pantera, afinal, ele não lutaria mais, a partir de agora, seriam apenas os líderes. Ele parecia empolgado, mas eu não. Meus olhos estavam no tatame.

Hoje, eu não só lutaria por mim. Lutaria por tudo o que acredito, por cada vez que Calista sofreu, e por tudo o que me foi tirado. E Yuri... Ele que se preparasse. Hoje eu não teria piedade.

Eu estava sentado com o restante do time, as mãos apoiadas nos joelhos e o olhar fixo no tatame. Não porque eu estava nervoso ou algo assim, meu foco era completamente em outra coisa. Axel Kovacevic contra Robby Keene. Uma luta que eu nunca pensei que ficaria tão intrigado em assistir.

A verdade é que eu não tinha um lado nessa briga. Não gostava muito de nenhum dos dois. Axel era irritante e tinha todo aquele histórico de gostar da Calista, algo que sempre me incomodou mais do que eu gostaria de admitir. Robby, por outro lado, era só... Robby. Arrogante, convencido e ainda mais insuportável desde que eu e Calista começamos a nos envolver, ele teve um passado com ela, e isso era o pior de tudo. Mas, no fundo, ver qualquer um deles apanhando parecia satisfatório.

No entanto, Axel surpreendeu há poucos dias quando veio até mim. Ele não pediu desculpas, nem tentou passar pano para o passado. Ele foi direto ao ponto, admitindo que ainda tinha sentimentos pela Calista, mas deixando claro que torcia por nós dois. Isso... Bem, isso foi o suficiente para me fazer baixar a guarda. Só um pouco. Não que eu tenha passado a gostar do cara, mas reconheço a sinceridade. Por isso, minha torcida hoje era para o Iron Dragons.

Eu ainda queria que o Miyagi-Do perdesse no geral. Não importava se Robby fosse da mesma equipe da Calista agora. Na minha cabeça, só uma pessoa daquela equipe merecia subir ao pódio, e era ela. Eu queria que nós dois, lado a lado, segurássemos o troféu de campeões no final, e saber que Samantha cedeu a liderança para ela, só a fazia se sentir mais determinada a vencer.

Minha atenção voltou para o tatame quando o juiz chamou os nomes de Axel e Robby. Os dois se posicionaram, e eu percebi que Robby parecia um pouco mais confiante do que o normal. Não que fosse surpresa, ele sempre foi cheio de si. Axel, por outro lado, estava sério. Focado. Eu já sabia que ele era bom, mas nunca tinha realmente parado para analisar seu estilo. Era forte, direto, mas ao mesmo tempo calculado. Ele não dava aberturas.

Do outro lado do ginásio, vi Calista. Ela estava de braços cruzados, o olhar atento no tatame. Minha visão periférica captou Robby lançando um olhar na direção dela antes da luta começar, mas ela não reagiu. Só manteve aquela expressão que parecia dizer, "Vamos ver no que isso vai dar."

A luta começou, e o ginásio ficou em silêncio por alguns segundos antes de explodir em gritos e aplausos. Axel era forte, isso era evidente. Ele tinha a vantagem física e uma técnica impecável. Mas Robby... Robby era ágil. Ele se movia com uma velocidade que parecia impossível de acompanhar. Os dois trocaram golpes rápidos, cada um tentando encontrar uma abertura no outro, mas Axel era uma muralha. Ninguém conseguia acertá-lo diretamente.

Até que Robby conseguiu.

Um chute rápido e certeiro no rosto de Axel. O som ecoou pelo ginásio, seguido pelos gritos da torcida.

— Ponto do Miyagi-Do! — Anunciou o juiz.

Eu vi Axel cambalear um pouco, mas ele não caiu. Robby deu um passo para trás, preparando-se para o próximo movimento, e eu olhei para Calista novamente. Ela continuava com os braços cruzados, mas sua expressão tinha mudado. Não era surpresa, nem preocupação. Talvez... Um pouco de admiração? Como se dissesse: "Nada mal, Keene."

Aquilo me irritou um pouco, mas eu não podia culpá-la. Robby tinha sido seu amigo, e quase namorado — o que me faz arder em raiva só de lembrar —, no passado, mas agora... Bem, agora ele era só mais um babaca.

A luta continuou, e dessa vez Axel estava visivelmente mais agressivo. Ele avançava com golpes potentes, forçando Robby a recuar. O equilíbrio da luta estava mudando. Foi então que aconteceu.

Axel acertou um golpe devastador na perna de Robby. O som foi seco, e Robby caiu no chão quase instantaneamente, agarrando a perna enquanto gritava de dor.

O ginásio ficou em silêncio por um momento. Tory foi a primeira a reagir, gritando o nome dele enquanto corria para o tatame. O juiz imediatamente parou a luta, e Robby foi levado para a enfermaria.

Axel ficou parado no centro do tatame, respirando pesadamente. Ele não parecia arrependido. Apenas esperava as instruções do juiz. Eu, por outro lado, estava confuso.

Olhei para Calista. Ela estava com a mesma expressão que eu, uma mistura de surpresa e preocupação.

— O que aconteceu? — Murmurei, mais para mim mesmo do que para ela.

Ela me olhou de longe, quase como se estivesse lendo meus lábios. Respondeu baixo:

— Não faço ideia.

Nos comunicamos sem precisar de palavras, algo que só nós dois conseguíamos fazer. Era estranho e reconfortante ao mesmo tempo.

Um temporizador apareceu no placar enquanto levavam Robby. Quinze minutos. Esse era o tempo que Robby tinha para se recuperar e voltar ao tatame. Se não voltasse, Axel enfrentaria outro lutador do Miyagi-Do.

Eu não conseguia tirar os olhos de Axel. Ele parecia calmo, quase frio, enquanto voltava para o canto dele. Mas por dentro, eu me perguntava, o que diabos ele estava tentando fazer? Ele tinha vencido o ponto, mas agora... Isso parecia mais do que estratégia. Era algo pessoal. E isso me deixava inquieto. Ele estava jogando sujo?

Os últimos cinco minutos pareciam uma eternidade. O ginásio estava carregado de tensão. Ninguém dizia nada, a única coisa que se ouvia eram os sussurros entre as equipes e o som abafado das arquibancadas. Quando Robby finalmente voltou ao tatame, eu observei com atenção. Ele estava mancando visivelmente, a perna machucada dificultando cada passo, mas tinha aquele olhar no rosto, aquele olhar que dizia: "Eu não vou desistir."

Do meu lado, alguém murmurou algo sobre ele ser louco, mas eu apenas continuei observando. Então ouvi a voz de Calista do outro lado, conversando com Samantha e Devon.

— Isso me lembra a luta entre Lawrence e Larusso, em 84. Daniel venceu mesmo com a perna machucada.

Eu revirei os olhos, mas não pude deixar de pensar,ela estava certa. Será que a história se repetiria? Será que Robby conseguiria vencer Axel mesmo naquele estado?

A luta recomeçou. Robby estava mais lento, mas usava a cabeça. Ele evitava colocar muito peso na perna lesionada e compensava com sua outra perna e golpes rápidos com os braços. Axel, por outro lado, parecia mais calculista. Ele mantinha sua postura, os movimentos firmes, mas era claro que ele estava esperando algo.

Então Robby encontrou sua oportunidade. Com uma agilidade impressionante, mesmo no estado em que estava, ele avançou, girando o corpo e acertando um chute certeiro no abdômen de Axel. O som do impacto ecoou, e o juiz levantou a bandeira.

— Ponto para o Miyagi-Do!

O placar mudou, e Robby estava a um ponto de vencer. Eu vi Axel dar um passo para trás, respirando fundo, com a expressão de quem não estava nada satisfeito. Os dois se afastaram para falar com seus senseis, e foi aí que percebi algo estranho.

Wolf, o sensei de Axel, se aproximou dele. Ao invés de um incentivo normal, ele cochichou algo no ouvido de Axel, e o olhar de Axel se desviou momentaneamente para Robby. Ele parecia hesitar. Wolf não gostou. De repente, ele agarrou o pescoço de Axel, os dedos firmes como um grilhão, e disse algo que parecia mais uma ordem do que um conselho.

Eu franzi o cenho, cruzando os braços. De onde eu estava, não dava para ouvir, mas o gesto não parecia nada amistoso. Axel olhou para Wolf como se quisesse protestar, mas então voltou ao tatame, o rosto duro como pedra.

— O que diabos está acontecendo? — Murmurei para mim mesmo.

Os dois voltaram à luta. Dessa vez, Robby estava mais agressivo, claramente tentando encerrar o combate. Ele se aproximava rápido, usando a perna boa para chutar e os braços para atacar o tronco de Axel. Era impressionante como ele conseguia manter a velocidade mesmo com a limitação. Robby se esquivava com maestria, e Axel parecia recuar mais do que o normal, como se estivesse esperando o momento perfeito.

Então aconteceu. Robby avançou para um chute lateral que parecia ser o golpe final. Mas Axel, com reflexos rápidos, segurou a perna dele no ar. Tudo aconteceu em segundos. Axel girou o corpo e acertou uma cotovelada brutal no joelho de Robby.

O som foi horrível. Um estalo seco, seguido pelo grito de dor de Robby, que ecoou pelo ginásio. Ele caiu no chão, segurando a perna com ambas as mãos, se contorcendo de dor. O juiz imediatamente parou a luta, mas o dano já estava feito.

— Falta para Axel Kovacevic! — Anunciou o juiz, mas sem expulsão.

Eu me levantei imediatamente, descrente.

— Isso não é ilegal?! — Ouvi a voz de Calista gritar, mas ninguém parecia ouvir.

Os paramédicos invadiram o tatame enquanto Tory corria para o lado de Robby. A perna dele estava em um ângulo estranho, e eu sabia que aquilo não era algo que ele conseguiria superar. Não naquele dia.

O juiz conversou com os paramédicos, e alguns minutos depois veio o anúncio:

— Robby Keene sofreu uma lesão séria e está fora da competição. A próxima luta entre Axel Kovacevic e Miguel Diaz será realizada amanhã.

As arquibancadas ficaram em um misto de vaias e murmúrios. Eu não conseguia acreditar no que tinha acabado de acontecer.

Do outro lado do tatame, Calista parecia em choque, os olhos fixos em Axel enquanto ele voltava para o canto dele. Algo estava errado. Muito errado.

Eu não pensei duas vezes. Ignorei os olhares dos outros e fui até ela. Quando cheguei, ela me olhou com os olhos arregalados, ainda tentando processar tudo.

— O que tem de errado com o gigantão? — Perguntei, quase sem fôlego. — O cara parecia descontrolado e impiedoso.

Calista balançou a cabeça, como se não soubesse por onde começar.

— Foram Wolf e Silver — Ela disse, com a voz baixa, quase um sussurro. — Eles planejaram isso.

Eu franzi o cenho, esperando que ela continuasse.

— Olha para o pescoço dele.

Eu olhei na direção de Axel e percebi, pela primeira vez, um hematoma visível na lateral do pescoço dele.

— Eles machucaram ele para que ele fizesse exatamente o que eles mandam. Silver deve ter pago o árbitro para garantir que aquele golpe não fosse suficiente para desclassificar ele.

Calista desviou o olhar, como se estivesse enojada.

— Ele fez o mesmo por mim, Kwon. Quando eu quebrei o nariz da Maria... Ele jogou sujo por mim. Esse é o jogo deles.

Minha cabeça estava fervendo. Wolf, Silver, e agora Axel... Tudo isso era uma jogada manipulada, controlada. Eu sabia que os Iron Dragons eram implacáveis, mas agora estava claro que era mais do que isso. Estavam jogando sujo.

E eu ainda tinha que enfrentar Yuri em breve, mas a única coisa na minha mente agora era, o que aconteceria depois de tudo isso? Miguel era um novo oponente, e será que ele podia ser tão bom quanto Robby?

Calista colocou a mão no meu ombro, me puxando de volta para o momento. Eu ainda estava pensando na sujeira que Wolf e Silver haviam armado, mas o toque dela, mesmo simples, me trouxe para o agora. Eu a encarei, e ela olhou na direção do tatame, onde Yuri já estava se ajeitando, o corpo tenso e o olhar fixo em mim.

— Acaba com ele de uma vez, gênio. — Disse ela, com aquele tom típico que misturava sarcasmo e confiança.

Aquilo me fez abrir um sorriso de canto. Era exatamente o empurrão que eu precisava.

— Como você quiser, dinamite. — Respondi, usando o apelido que eu sabia que a fazia revirar os olhos.

Sem hesitar, subi no tatame. Meu coração estava batendo forte, mas minha mente estava limpa. Enquanto ajustava o quimono, vi Yuri sorrir de canto, aquele sorriso irritante que ele sempre tinha.

— Está pronto para a segunda dose? — Perguntou ele, cheio de arrogância.

Alonguei o pescoço lentamente, abrindo os braços como se fosse abraçar a luta que estava por vir.

— Já tava na hora. Vamos ver do que você é capaz.

O árbitro anunciou a luta e, ao sinal, tudo começou.

Eu e Yuri nos aproximamos, circulando como dois predadores medindo o oponente. Ele veio primeiro, tentando um golpe direto com o punho, mas eu o bloqueei com facilidade, lendo cada movimento dele como se fosse um livro aberto. Porém, ele era rápido. Aproveitou o impulso do bloqueio e deu um golpe lateral com a perna, atingindo minha coxa. O impacto foi forte, me derrubando no chão.

— Ponto para Yuri Hernandez!

Eu bati no tatame com o punho, frustrado. Respirei fundo, enquanto me levantava devagar. Olhei de canto para Calista, que estava me observando com atenção. Seus lábios se moveram em um murmúrio que só eu poderia entender.

— Você consegue.

Assenti para ela, jogando os ombros para frente, sentindo minha determinação crescer. Passei a língua pelo interior da bochecha, ignorando a dor na perna e prometendo a mim mesmo: "Ele não vai me acertar mais. Nenhum golpe."

O árbitro deu o sinal para continuar. Dessa vez, eu estava completamente focado. Yuri tentou avançar com uma sequência de socos rápidos, mas eu bloqueei cada um deles, como se já soubesse exatamente o que ele faria. Ele tentou chutes altos, ataques inesperados, mas nenhum deles passou pela minha guarda.

E então, vi a abertura. Um pequeno descuido no movimento de defesa dele. Girei meu corpo com um chute alto, minha perna atingindo a lateral da cabeça de Yuri. O impacto foi suficiente para derrubá-lo no chão, e o juiz marcou o ponto.

— Ponto para Kwon Jae-Sung!

Mas eu não parei. Antes que ele pudesse se levantar completamente, agarrei-o pelo pescoço com meu antebraço, forçando-o para baixo. Ele tentou socar meu rosto, mas com um movimento rápido, girei o corpo dele, derrubando-o novamente no tatame como se ele fosse feito de papel.

Mais um ponto para mim.

Eu estava no controle agora. Apenas mais um ponto, e a vitória seria minha.

Nós nos levantamos, e Yuri avançou com tudo. Ele soltou um grito de raiva, tentando intimidar, mas eu não hesitei. Quando ele tentou me acertar com um soco direto, desviar foi quase instintivo. Segurei o braço dele, torcendo o antebraço de forma que ele gemeu de dor. Não perdi tempo e atingi a lateral da perna dele com um chute firme, o suficiente para garantir que ele sentiria a dor por dias.

Ele tropeçou, quase caindo, mas ainda se manteve em pé. E então, eu vi minha chance.

O mundo pareceu desacelerar ao meu redor. As vozes da multidão se tornaram um som distante, abafado. Tudo o que eu via era Yuri à minha frente, vulnerável. Levantei meu punho, pronto para o golpe final. Meu corpo se moveu como se fosse automático, direcionando o soco diretamente para o centro do rosto dele.

O impacto foi decisivo. O som foi surdo, mas claro o suficiente para ecoar na minha mente. Yuri caiu no tatame, o corpo mole, completamente nocauteado.

O árbitro ergueu o braço, anunciando o fim da luta.

— Vitória para Kwon Jae-Sung!

Eu permaneci parado por um segundo, ofegante, sentindo o suor escorrer pela minha testa. A adrenalina ainda corria no meu corpo, mas então ouvi os gritos da arquibancada. Olhei para Calista. Ela estava sorrindo, um sorriso pequeno, mas verdadeiro, e isso bastou para mim.

Eu desci do tatame, sabendo que a luta estava longe de acabar. Mas, naquele momento, eu era o vencedor, e Yuri... Era história.

Enquanto eu caminhava de volta para a equipe, o som da torcida ainda ecoava pelo ginásio. Meus músculos ainda estavam tensos, mas a sensação de vitória era inebriante. A cada passo, ouvia meus companheiros do Cobra Kai me parabenizando, batendo em meus ombros ou me cumprimentando com sorrisos. Quando cheguei perto de Yoon, ele estendeu o punho e fizemos nosso toque habitual, uma batida que parecia ainda mais significativa naquele momento.

— Mandou bem, cara! — Disse Yoon com um sorriso de aprovação. Então, ele inclinou a cabeça ligeiramente na direção de algo atrás de mim. — Mas acho que o grande prêmio tá te esperando ali.

Franzi a testa por um momento, mas quando me virei, entendi imediatamente o que ele quis dizer. Lá estava Calista, parada um pouco mais afastada, com aquele sorriso que me desarmava toda vez. Meus lábios se abriram num sorriso genuíno antes que eu pudesse controlar. Não precisei dizer nada, ela já estava vindo.

Ela correu na minha direção, os passos rápidos ecoando no tatame, e antes que eu percebesse, estava em meus braços. O impacto do abraço foi caloroso, cheio de energia, e eu a segurei firme, girando-a no ar enquanto a risada dela se misturava ao barulho ao nosso redor. Quando a desci, ela me surpreendeu com um selinho rápido nos lábios.

— Eu sabia que você venceria — Disse ela, o tom cheio de confiança. — Mas vou admitir que fiquei surpresa com o quão rápido você acabou com ele.

Suspirei, ainda sorrindo, e decidi provocá-la.

— Talvez o ciúmes tenha me motivado. — Fiz questão de dar uma piscadela brincalhona.

Ela riu, balançando a cabeça, antes de me dar um soquinho no peito.

— Bobo.

Eu ainda segurava a mão dela quando nossos olhares foram atraídos para o outro lado do tatame. Lá estava Terry Silver, observando tudo com aquele olhar de puro veneno, cortante como lâminas. Seus olhos passaram por mim, por Calista, e depois voltaram para mim, como se ele estivesse planejando exatamente como nos destruir.

Não pude evitar. Meu lado provocador falou mais alto. Levantei a mão e fiz uma manivela lenta, mostrando o dedo do meio com um sorriso debochado no rosto. Com a outra mão, passei o braço pelo ombro de Calista, apertando-a de leve contra mim, enquanto mantinha aquele sorriso desafiador estampado.

O rosto de Silver se contraiu, e mesmo de longe, dava para ver o sorriso enraivecido dele. Ele não gritou, não fez nenhum escândalo, mas eu sabia que ele estava indignado. Cada músculo da expressão dele era um reflexo de sua frustração, e isso só me fez sorrir ainda mais.

— Você sabe que ele vai acabar arrancando nossas cabeças, não é? — Murmurou Calista ao meu lado, a voz carregada de humor, mas também com um leve tom de preocupação.

Dei uma risadinha nervosa, ainda olhando para Silver.

— É, tenho certeza disso — Respondi. Então, me virei para ela, soltando a frase que eu sabia que a faria rir. — Mas eu já liguei o "que se dane". E você?

Ela gargalhou, aquele som leve e relaxado que fazia meu coração acelerar.

— Ah, você vai ver quando eu derrotar a chica ali — Disse ela, apontando na direção de Maria, que estava do outro lado do ginásio, conversando com algumas pessoas do time dela.

Meu sorriso ficou ainda maior. Calista tinha esse jeito destemido e impulsivo que combinava perfeitamente com ela. Inclinei-me para beijar sua bochecha, deixando minha voz cheia de orgulho.

— Estou contando com isso.

Ela riu e olhou de novo na direção do Myiagi-Do, como se estivesse conferindo o tempo.

— Eu preciso voltar pra minha equipe. — Disse ela, sua mão ainda na minha por um segundo.

Eu a segurei firme, como se quisesse transferir toda a minha confiança para ela.

— Você vai detonar ela — Falei, com uma certeza que vinha de algum lugar profundo dentro de mim.

Calista assentiu, seus olhos brilhando com a determinação que eu tanto admirava. Ela então se afastou, voltando para o Myiagi-Do, onde Devon e Sam já a esperavam. Enquanto eu a observava ir, não pude evitar o sorriso que continuava no meu rosto.

Minha atenção foi interrompida por Sensei Kim, que se aproximou com aquele olhar sério de sempre.

— Kwon, volte para sua equipe. Agora. — Disse ela, sua voz firme, mas sem perder o tom de autoridade.

Respirei fundo, jogando os ombros para trás, e acenei para ela, me juntando novamente ao Cobra Kai. No fundo, eu sabia que as coisas ainda estavam apenas começando. As lutas seguintes seriam ainda mais intensas, mas, por enquanto, eu tinha a certeza de uma coisa, Calista e eu estávamos prontos para enfrentar qualquer coisa. Juntos ou separados, íamos derrubar quem estivesse no caminho.

Obra autoral ©

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