36. Hapiness is a butterfly
Eu estava à beira de explodir. Caminhava de um lado para o outro na calçada, do lado de fora da lanchonete, os dedos cravando no couro da minha jaqueta e, ocasionalmente, nos meus próprios cabelos. A luz do letreiro brilhava acima de mim, piscando levemente, como se quisesse zombar da minha ansiedade.
Chequei o celular de novo. 19h57. Ainda faltavam alguns minutos, mas parecia que o tempo se arrastava só para me torturar. Nenhuma mensagem. Absolutamente nenhum sinal dela.
Por que ela está demorando tanto?
Meu pensamento veio com raiva, mas logo depois senti a culpa me esmagar. Calista tinha todos os motivos do mundo para estar confusa, para estar com raiva. As palavras daquele idiota do Robby ainda ecoavam na minha cabeça como um trovão, "Um idiota nunca muda."
Mas ele estava errado. Ele não sabia de nada.
Minha mandíbula estava travada, os dentes rangendo, enquanto tentava processar tudo. Eu sabia que as palavras dele tinham mexido com Calista. É claro que mexeram. Ela tinha ficado quieta o caminho inteiro para o aeroporto, o que só me deixou mais inquieto. Mas o que mais doía era saber que ela estava duvidando de mim, que talvez achasse que o Robby tinha razão.
Me encostei no poste de luz ao lado da lanchonete, olhando para a calçada, os braços cruzados com força contra o peito.
Eu não estava afim da Tory.
Só de pensar nisso eu ficava ainda mais irritado. Sim, eu tinha ficado em cima dela no começo. Mas não foi porque eu queria ela. Foi parte de um jogo. Uma jogada estúpida e infantil para desestabilizar Robby, para fazê-lo perder a cabeça. E claro, eu me aproveitei disso, porque na época eu era... Eu era um babaca.
Só que isso foi antes. Antes de eu conhecer Calista. Antes de eu perceber que ela era diferente de qualquer pessoa que já conheci.
Passei a mão pelo rosto, tentando afastar a sensação de sufocamento. Estava com raiva de mim mesmo. Com raiva de Robby. E, mais do que tudo, com medo do que estava por vir.
Mas e se ela decidir nunca mais querer me ver?
Essa dúvida me consumia como ácido. Nós mal tínhamos começado a reconstruir algo, ou pelo menos eu achava que estávamos. E agora parecia que tudo estava desmoronando de novo.
Olhei para o celular. 20h01.
Droga. Eu só queria que ela chegasse logo, que dissesse o que quer que fosse para acabar com essa espera infernal. Mesmo que fosse para dizer que não queria mais nada comigo, pelo menos seria uma resposta. Pelo menos eu saberia.
Engoli em seco, endireitei a postura e olhei na direção da rua. O coração estava disparado. Cada segundo parecia mais longo que o anterior. Eu só queria... Eu só queria ter uma chance de esclarecer as coisas. Uma chance de explicar, de me desculpar, de fazer com que ela acreditasse em mim.
E, acima de tudo, eu queria ter uma chance de não perdê-la.
Mas logo, me desvencilhei de qualquer pensamento, e levantei o olhar ao ouvir a voz dela.
— Aí, gênio.
O mundo ao meu redor pareceu congelar por um momento. Lá estava ela, a poucos metros de distância, caminhando na minha direção. Meu coração deu um salto tão forte que eu quase podia ouvi-lo. Havia algo no olhar dela, uma intensidade, algo que parecia diferente, como se carregasse um peso ou talvez uma clareza que antes não estava lá.
Minha garganta ficou seca enquanto ela se aproximava. Tentei organizar meus pensamentos, preparar algo para dizer, qualquer coisa que não fosse uma bagunça desesperada, mas antes que eu pudesse abrir a boca, ela me surpreendeu.
E me abraçou.
Forte.
Por um segundo, fiquei congelado, sem acreditar. O calor dela contra mim, os braços ao meu redor, o cheiro familiar de shampoo que me fez sentir como se o chão parasse de tremer. Depois de alguns instantes, finalmente soltei o ar que nem percebi que estava prendendo e retribuí o abraço, meus braços se fechando ao redor dela como se temesse que ela desaparecesse se eu a soltasse.
— Calista... — Comecei, mas a voz morreu na garganta, substituída por um riso surpreso e, finalmente, aliviado. Eu estava sorrindo, um sorriso genuíno que parecia iluminar o vazio que vinha carregando.
Quando ela se afastou, olhei para ela, tentando decifrar o que estava acontecendo. Meu coração estava acelerado, não de nervosismo ou ansiedade, mas de algo que parecia muito próximo da felicidade.
— Você... Se lembrou? — Perguntei, a voz quase falhando na metade da frase.
Mas antes que eu pudesse terminar, ela levantou as mãos e segurou meu rosto, os dedos quentes contra minha pele.
— Sim — Disse ela, com uma firmeza que me pegou de surpresa. — Mas isso não é o mais importante agora.
Eu abri a boca, mas ela já estava me puxando pela mão, não me dando tempo de processar tudo. O toque dela era firme, decidido, mas ao mesmo tempo transmitia uma espécie de conforto que me fez sentir algo raro, paz.
Por um instante, senti como se algo finalmente estivesse certo, como se o buraco no meu peito tivesse sido preenchido.
Deixei que ela me puxasse, meu peito cheio de uma satisfação plena enquanto atravessávamos a porta da lanchonete. Estar com ela ali, assim, me fez sentir como se eu pudesse enfrentar qualquer coisa. Não sabia o que viria depois, mas, naquele momento, estava disposto a descobrir, desde que fosse ao lado dela.
Quando nos sentamos, um de frente para o outro, eu senti como se o tempo estivesse desacelerado. Meu coração batia tão forte que parecia ecoar na minha cabeça. A mesa entre nós parecia um campo minado, e eu não sabia qual passo seria o mais seguro.
Calista colocou as mãos sobre a mesa, seu olhar sério, mas não frio. Ela parecia decidida, firme, o que só aumentava a mistura de alívio e nervosismo no meu peito.
— Vou te contar toda a verdade — Começou ela, a voz equilibrada, mas carregada de significado. — Mas também quero ouvir a verdade de você.
Eu franzi o cenho, hesitando por um instante. Claro, já imaginava sobre o que ela estava falando. Tory. Era óbvio. O fantasma das palavras de Robby ainda estava pairando sobre nós, um peso que parecia querer nos esmagar.
Ela cruzou os braços, se encostando na cadeira com uma postura que deixava claro que não ia aceitar nada além da verdade.
— O que Robby disse não ficou claro para mim, então espero que me explique bem. Eu só quero a verdade, Kwon. Só isso. — A voz dela era firme, mas não agressiva, o que de alguma forma tornava a pressão ainda maior.
Respirei fundo, tentando organizar meus pensamentos, mas principalmente tentando ignorar o nó na garganta que parecia querer me sufocar.
— Ok... — Comecei, a voz um pouco rouca. — Eu vou te contar.
Parei por um segundo, buscando coragem nos olhos dela.
— O Robby não mentiu quando disse que eu fiquei em cima da Tory no começo. — Levantei a mão rapidamente, tentando conter a possível reação dela. — Mas isso não foi porque eu tinha algum sentimento por ela ou algo assim. Foi porque eu era um idiota. E não é como se tivesse rolado algo entre nós, não teve nada...
Ela continuava me encarando, o olhar como uma lâmina, cortando qualquer possibilidade de fuga.
— Foi antes de te conhecer. — Continuei, a voz ficando mais firme à medida que as palavras saíam. — Eu estava tentando desestabilizar o Robby. Ele era meu maior oponente, e eu queria que ele perdesse. Achei que provocar ciúmes nele seria uma boa estratégia.
Me inclinei um pouco para frente, tentando demonstrar a sinceridade que estava gritando dentro de mim.
— Mas eu nunca senti nada por ela, Calista. Nada. E, pra ser honesto, ela também nunca sentiu nada por mim. Não foi nada além de uma tentativa idiota de mexer com o Robby.
Houve um silêncio que pareceu durar uma eternidade.
Ela não respondeu de imediato, apenas ficou me observando, pensativa. Eu podia ver a engrenagem girando em sua mente, como se estivesse analisando cada palavra que eu tinha dito, tentando decidir se acreditava ou não.
Meu peito apertava mais a cada segundo de silêncio. A possibilidade de que ela pudesse não acreditar em mim, ou pior, de que isso pudesse ser o ponto final para nós, era como um peso esmagador.
— Calista... — Chamei, a voz quase em um sussurro.
Ela ainda não respondeu, mas o olhar dela mudou um pouco. Talvez um pouco menos duro, talvez um pouco mais... Introspectivo.
Eu tentei não me mexer, não parecer ansioso, mas era difícil. Muito difícil. Aquela espera, aquele silêncio, era mais torturante do que qualquer golpe que já levei no tatame.
Os segundos que Calista demorou para responder pareceram intermináveis, cada batida do meu coração ecoando como um tambor. Então, finalmente, ela suspirou, descruzou os braços, e suas palavras quebraram o silêncio.
— Eu nunca tive nada demais com o Robby, Kwon. — Ela começou, sua voz séria, mas com um tom mais leve do que eu esperava. — Isso foi coisa do passado, há quase dois anos.
Meu coração desacelerou um pouco, embora eu permanecesse atento, absorvendo cada palavra dela como se minha vida dependesse disso.
— Foi só um beijo... — Continuou ela, inclinando um pouco o queixo, como quem se força a ser sincera. — Um beijo cheio de rancor, pra falar a verdade. E mesmo naquele momento, eu sabia que não sentia nada por ele. E ele também não sentia nada por mim.
As palavras dela ressoaram em minha mente, uma onda de alívio tomando conta de mim. O peso de todas as minhas inseguranças começou a se dissipar, como neblina sob o sol.
— As palavras dele no fliperama foram um exagero, só pra te irritar. — Ela deu de ombros, como se encerrando o assunto. — A única pessoa com quem eu realmente desejei estar foi com você.
Meu peito se aqueceu, uma satisfação que eu não conseguia esconder. Um sorriso começou a aparecer no meu rosto antes que eu pudesse evitar, e percebi que o calor nas minhas bochechas me entregava completamente.
— Bom... É claro que sou irresistível. — Soltei, tentando disfarçar minha felicidade com uma piadinha, mesmo sabendo que ela veria através disso.
Ela revirou os olhos, soltando uma risadinha que só fez meu sorriso aumentar. Mas então, a expressão dela mudou. A leveza foi substituída por algo mais pesado, mais sério.
— Mas isso, porém, não é o suficiente. — A voz dela ficou mais firme, e senti meu coração apertar novamente.
Eu me inclinei um pouco para frente, franzindo a testa.
— Como é?
Ela respirou fundo, as mãos se unindo sobre a mesa, como se precisasse se preparar para o que estava prestes a dizer.
— Kreese me ameaçou, Kwon.
As palavras dela foram como um soco no estômago.
— O quê? — Minha voz saiu mais alta do que eu pretendia, cheia de indignação.
— Durante aquele período em que eu simplesmente desapareci sem deixar qualquer vestígio, antes do acidente.... — Ela continuou, mantendo a calma que eu claramente não conseguia. — Ele deixou bem claro que se eu me aproximasse de você, ele faria alguma coisa. Eu não sabia o que exatamente ele quis dizer... Mas conhecendo Kreese, não era só conversa.
Meu punho se fechou involuntariamente sobre a mesa.
— E por que você não me contou isso antes?
Ela desviou o olhar por um instante, mordendo levemente o lábio inferior antes de voltar a me encarar.
— Porque eu achava que me afastar seria o suficiente. Que se eu ignorasse, ele desistiria. Mas, depois de tudo... — Ela parou por um momento, como se ponderando as palavras. — Não sei mais se é o certo.
Eu respirei fundo, lutando contra a raiva que estava se formando.
— Ele não vai nos afastar, Calista. — Minha voz saiu firme, quase desafiadora. — Nem ele, nem o Terry, nem ninguém.
Ela me olhou, um misto de apreensão e esperança nos olhos, mas não respondeu de imediato. Fiquei esperando, o silêncio entre nós agora carregado de algo diferente. Determinação.
O silêncio entre nós era tão pesado que parecia uma presença física. Então, finalmente, ela falou, sua voz soando mais suave, mas ainda firme.
— A gente vai ter que fingir que não está junto.
Eu já ia protestar, indignado, mas ela me cortou antes que eu pudesse dizer qualquer coisa.
— Só quando o Kreese e o Silver estiverem por perto. — A expressão dela era séria, mas havia uma ponta de vulnerabilidade nos olhos marejados. — Não posso voltar para o Cobra Kai, Kwon.
Minha mão bateu na mesa antes que eu pudesse me conter, o som alto fazendo algumas pessoas na lanchonete olharem em nossa direção.
— Você não pode continuar nas mãos do Silver. Calista! — Eu praticamente rosnei, minha voz cheia de frustração.
Ela soltou uma risada curta, sem humor, os olhos brilhando mais intensamente com as lágrimas que ela parecia determinada a conter.
— E acha que vai ser melhor sob o radar do Kreese? — Ela cruzou os braços, inclinando-se para frente. — Se eu tentasse enfrentar os dois, tudo seria muito pior.
Eu respirei fundo, tentando acalmar o turbilhão de emoções dentro de mim. Passei as mãos pelo rosto, sentindo o cansaço emocional me atingir como uma onda.
— Então o que vamos fazer? — Perguntei, minha voz mais baixa, quase um sussurro. — Vamos ter que ficar nos vendo escondidos? Agir como desconhecidos durante a competição?
Ela assentiu, a expressão agora mais suave, mas ainda carregada de determinação.
— Exatamente isso. — Ela suspirou. — Mas as coisas vão ficar melhores depois do campeonato. Aí, a gente pode... — Ela hesitou por um segundo, os lábios formando um leve sorriso. — Aí a gente pode ter algo com rótulo.
Eu não consegui evitar o sorriso que se espalhou pelo meu rosto. Sua fala imediatamente me levou de volta ao hotel, quando ela disse aquelas mesmas palavras.
— Você tem um talento incrível pra me desarmar. — Eu disse, revirando os olhos e soltando um riso abafado.
Ela arqueou uma sobrancelha, um sorriso de canto surgindo enquanto ela inclinava a cabeça de leve.
— É impossível ficar irritado com você, sabia?
— Bom, eu tento. Acho que é quase um dom. — Ela retrucou com um sarcasmo característico, antes de virar-se para chamar o garçom. — Vamos pedir batata frita. Estou precisando de carboidratos pra compensar todo esse drama.
Eu ri, genuinamente desta vez, e pela primeira vez naquela noite, senti uma pequena faísca de leveza. Por mais complicada que a situação fosse, eu sabia que estava ao lado da única pessoa que fazia tudo valer a pena.
Saímos da lanchonete com um clima bem mais leve do que o que tínhamos quando entramos. A conversa sobre coisas banais foi um alívio para a mente, e por alguns minutos, me senti como se tudo ao nosso redor pudesse ser deixado de lado. Mas, ao pisarmos na calçada, vi Calista lançar olhares atentos para os dois lados da rua, sua expressão retornando a um alerta que me lembrou o porquê de tudo isso.
Antes que eu pudesse dizer algo, senti suas mãos agarrando meu colarinho, me puxando com força. E então, sem aviso, seus lábios tocaram os meus. Por um breve momento, o mundo inteiro pareceu se dissolver. O barulho da rua, as luzes dos carros, até mesmo o peso da situação. Nada disso importava. Só ela.
Surpreso, mas sem hesitar, retribuí o beijo no mesmo instante. Foi intenso, cheio de tudo o que havíamos guardado por tanto tempo, o medo, a raiva, o carinho, e principalmente, o alívio de finalmente termos aquele momento. Quando ela se afastou, eu fiquei por um segundo parado, ainda tentando processar o que acabara de acontecer.
— Finalmente, depois de dias, você não me bateu por tentar te beijar. — Soltei com um sorriso sarcástico, tentando esconder o quão bobo me sentia por dentro.
Ela riu, aquele som familiar e inconfundível, e deu um leve tapa no meu peito.
— Admita, Kwon. Você sentiu falta disso.
— Talvez. — Brinquei, mas a verdade estava estampada no meu rosto.
— Vou te mandar mensagem. — Disse, afastando-se com um olhar que era um misto de seriedade e diversão.
— Até logo, Dinamite. — Respondi, deixando escapar um sorriso largo enquanto a via se afastar.
Ela se virou por um instante, mandando um beijo no ar de forma exageradamente sarcástica.
— Haha, muito engraçadinha. — Retruquei, fazendo uma careta.
Nós dois nos viramos, indo em direções opostas. Ainda assim, meu peito parecia que ia explodir. Não conseguia apagar o sorriso do rosto, e aquela sensação de euforia me acompanhou o caminho inteiro. Por mais complicado que fosse o que nos esperava, pela primeira vez em dias, eu me sentia realmente esperançoso.
A rua parecia ainda mais deserta enquanto eu caminhava, a escuridão apenas quebrada pelos postes de luz enferrujados. A sensação de alívio que havia me preenchido momentos antes estava se dissipando com cada passo. Quando a tela do meu telefone brilhou, interrompendo meus pensamentos, o nome na notificação fez meu estômago se revirar.
Sensei Kreese.
Li a mensagem rapidamente: "Encontre-me no dojô em vinte minutos." Abaixo, um endereço que reconheci de imediato. Meu peito se apertou. O tom seco e direto da mensagem era tão típico dele que eu mal conseguia pensar em outra coisa a não ser no que estava por vir. Será que ele sabia sobre mim e Calista? Ele sempre teve olhos e ouvidos por toda parte. O pensamento fez a raiva subir como fogo pelo meu peito, mas, por ora, precisava controlar isso.
Pedi um táxi e, durante o trajeto, olhava pela janela sem realmente enxergar a paisagem. Meus pensamentos estavam a mil. O que Kreese queria comigo? E por que ali, especificamente? Eu estava inquieto, tamborilando os dedos na perna, tentando ignorar a sensação incômoda de que esse encontro não seria apenas sobre estratégia ou treinos.
Quando o táxi finalmente parou em frente ao endereço, desci devagar, respirando fundo para tentar conter a apreensão. O lugar era... Deprimente. O pequeno centro comercial estava claramente mal cuidado, com placas desbotadas e vidros empoeirados. O dojô do Cobra Kai estava em um canto, com as palavras escritas na fachada em um letreiro que já parecia desgastado pelo tempo.
Parei por um momento, observando o lugar. Este era o início de tudo, o primeiro terreno de batalha que moldou tantos lutadores ao longo dos anos. Era impossível não sentir o peso da história que aquele lugar carregava. Mas agora, com Kreese me chamando ali, o sentimento que predominava era o de algo prestes a acontecer, algo que eu precisava enfrentar, gostasse ou não.
Me aproximei da porta, sentindo o suor frio escorrer pela nuca. A raiva ainda queimava em meu peito, mas agora, misturava-se à tensão crescente. Pus a mão na maçaneta, hesitando por um breve momento antes de girá-la e abrir a porta, ciente de que, a partir daqui, qualquer coisa poderia acontecer.
O som do sino da porta ecoou pelo pequeno dojô, ressoando como um lembrete de que não havia volta. Quando meus olhos se ajustaram à luz forte do ambiente, fiquei surpreso ao encontrar o local bem iluminado e, mais ainda, ao ver todos os outros membros da equipe já lá dentro.
Yoon estava parado ao lado de Han, ajustando a faixa do quimono com sua típica expressão séria. Tory, encostada em uma das colunas, olhou rapidamente para mim antes de desviar o olhar, o que já era mais do que ela costumava fazer. Sensei Kim estava ao lado de Kreese, com a postura rígida e o olhar afiado que sempre fazia questão de deixar claro que não aceitava nada menos que perfeição.
Hesitei por um momento, mas avancei para o tatame. Um alívio passageiro percorreu meu corpo, se eles estavam aqui, talvez não fosse algo exclusivamente contra mim.
Sensei Kim quebrou o silêncio primeiro, a voz dela cortando o ar como uma lâmina.
— Está atrasado, Kwon.
Inclinei levemente a cabeça em sinal de respeito, sem deixar de perceber o tom de reprovação.
— Desculpe, sensei.
Yoon, sempre prático, jogou o quimono para mim. Peguei no ar e rapidamente o vesti por cima da roupa, amarrando a faixa enquanto sentia o olhar de todos sobre mim. Cada movimento parecia pesado, como se a tensão no ambiente me forçasse a me mexer mais devagar.
Kreese finalmente deu um passo à frente, a expressão rígida como sempre. Ele não gritou, não precisou. Sua voz grave e firme tinha o peso de um comando militar.
— Vamos deixar algo bem claro agora. Isso aqui não é mais brincadeira. Por pouco não fomos eliminados da competição de forma definitiva.
Ele deu uma pausa, os olhos percorrendo cada um de nós como se quisesse cravar suas palavras em nossas almas.
— Vocês foram trazidos de volta por um motivo, vencer. E não há espaço para falhas. Não há espaço para fraquezas. Não há espaço para erros.
Eu engoli em seco, sentindo o peso da expectativa. Kreese continuou.
— O que vem a seguir será mais difícil do que qualquer coisa que vocês já enfrentaram. Se acham que o treinamento até agora foi pesado, não viram nada ainda. Com as semifinais se aproximando, não temos mais tempo para descanso. A partir de hoje, a maior parte do seu tempo será passada aqui, neste tatame.
Ele fez uma pausa, e o silêncio no dojô era quase palpável. A respiração de cada um parecia presa, esperando o próximo comando. Kreese ergueu um dedo, apontando para todos nós.
— Vocês não estão aqui para ser bons. Vocês estão aqui para serem os melhores. E para isso, não há espaço para compaixão. Não há espaço para piedade. Se alguém vacilar, será removido. Não há segundas chances.
Minha mente rodava com as palavras dele. Eu sabia que Kreese era duro, mas o tom dele agora era diferente, mais carregado. Eu podia sentir a pressão sobre todos nós aumentar, como uma nuvem pesada pairando sobre o tatame.
Sensei Kim deu um passo à frente, complementando as palavras de Kreese com sua voz gelada.
— Vocês vão lutar até não poderem mais. E, quando isso acontecer, vocês vão continuar. Porque só os imbatíveis têm lugar no Cobra Kai.
Olhei para o grupo. Os rostos de Yoon e Han estavam impassíveis, como se já estivessem acostumados a essa pressão. Tory estava com o olhar fixo no chão, mas eu sabia que ela estava absorvendo cada palavra. Quanto a mim? A raiva e a determinação estavam crescendo, alimentadas pelo fogo que Kreese e Kim sempre souberam acender.
Eu estava ali para vencer. Não importa o custo.
O som dos golpes no saco de pancadas preenchia o ar, abafado pelo meu esforço e pelo suor que escorria dos meus cabelos. Cada soco, cada impacto era como um grito silencioso da minha frustração. A sala estava iluminada demais, os ecos dos comandos de Sensei Kim ricocheteando pelas paredes. Tudo parecia girar em torno de controle, força e obediência. E eu precisava parecer imbatível, mesmo que o cansaço queimasse cada fibra do meu corpo.
Enquanto socava, senti um peso diferente na atmosfera. Sem precisar olhar, sabia que era ele. Kreese. A aproximação dele era como um peso invisível, uma força sufocante que se arrastava pelo chão. Não parei. Continuei socando, focando no som do impacto, como se pudesse ignorar o fato de que ele estava bem ali.
— Como está a garota? — A voz dele veio baixa, carregada daquele tom que parecia sempre esconder uma ameaça.
O saco de pancadas balançava à minha frente, mas minhas mãos pararam no mesmo instante. Fiquei em silêncio por um segundo, respirando fundo antes de responder, mantendo meu olhar fixo no material desgastado.
— Por que você se importa, sensei? — Perguntei, tentando soar indiferente.
Eu sabia que não devia provocá-lo, mas as palavras saíram quase como um reflexo. Ele sempre jogava esses comentários para me testar, para tentar me tirar do eixo. Kreese deu um meio sorriso, inclinando a cabeça como se eu tivesse acabado de dizer algo engraçado.
— Eu arcaria com as consequências. Foi o que fiz na delegacia, não foi?
Soltei uma risada curta, sem humor. Era o máximo que eu podia fazer para esconder o quanto aquela conversa estava me irritando. Voltei a socar o saco de pancadas, dessa vez com mais força.
— Isso não apaga a culpa. — Minha voz saiu mais firme do que eu esperava.
Antes que eu pudesse desferir outro golpe, Kreese segurou o saco de pancadas com força, o material parando de balançar no mesmo instante. Ele se inclinou levemente para frente, o olhar dele me atravessando como uma lâmina.
Eu recuei as mãos, ajeitando minha postura, erguendo o queixo. Não ia mostrar que aquilo me afetava, mesmo que cada instinto meu estivesse gritando para sair correndo.
— Agora as coisas estão resolvidas. A garota está segura. Do lado que ela sempre deveria estar, do lado de Silver.
Essas palavras me atingiram como um soco no estômago. A raiva cresceu no meu peito, mas eu a mantive enterrada, trancada. Eu sabia que ele estava esperando uma reação, algo que confirmasse suas suspeitas.
— Você deveria manter distância, garoto. Ou as coisas podem voltar a se complicar. — A voz dele estava mais baixa, quase um sussurro. Mas cada palavra era uma ameaça clara.
Eu não podia fazer nada além de assentir, mantendo o rosto neutro.
— Sim, sensei. — Minha voz saiu firme, obediente, exatamente como ele queria ouvir.
Ele permaneceu ali, me encarando por alguns segundos. Meu coração estava acelerado, mas eu o mantive mascarado por uma fachada de calma. Finalmente, Kreese soltou o saco de pancadas e se afastou, caminhando para o outro lado do dojô, como se nada tivesse acontecido.
Assim que ele se afastou, soltei o ar que estava segurando. Passei as mãos pelo rosto, tentando processar tudo. Cada palavra dele era um lembrete de que Calista e eu estávamos pisando em terreno perigoso. Eles achavam que tinham vencido, que tinham nos separado. E era exatamente isso que precisavam acreditar.
Eu voltei ao saco de pancadas, socando com força renovada. Isso não era o fim. Não para mim, e com certeza não para Calista. Se eles acham que eu vou desistir tão fácil, estão subestimando a pessoa errada.
Obs: Capítulozinho mais curto só pra ter essa conversa que eles precisavam, creio que vou postar outro capítulo hoje ainda, ou amanhã cedo, agora as coisas vão ficar mais emocionantes, então acredito que vou fazer mais capítulos, porém menores, ou divididos em mais partes, pra ter um suspense maior 🤭.
Obra autoral ©
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