2.Um acordo quebrado
"Silent, as a witness
Make your heart race, with a death kiss
I'm a soldier, in a blood war
In the peace corp, I am everything you will ever be"
Sua mente estava turva, sentia-se carregar pelos arredores sem compreender.
-- Minha senhora acorde. -- A voz doce da mulher que tinha praticamente como uma irmã ecoou e nem assim conseguia despertar, mesmo que seus olhos estivessem abertos e a ausência de cores indicava que sua alma não estava presente, aquele corpo passou a ser momentaneamente uma mera casaca.
-- Ela não está mais aqui! -- As palavras de seu pai tornaram tudo pior, sentia como se seu ser estivesse condenado a os escutar e sentir, porém não poderia fazer nada.
-- Tragam Hanâmi até aqui, se for preciso, implorem. Ofereçam ouro, deem tudo o que ela quiser! -- A voz veio de sua mãe que observava seu corpo nos braços robustos de seu cavaleiro, suas mãos estavam presas no vestido como se o segurasse e ninguém conseguia desfazer tal pressão, adentrando o palácio notando como seus cabelos enormes pareciam sem vida apesar de impecáveis e ainda sustentando a coroa.
-- Droga por que a deixamos tentar? -- O pranto silencioso da mulher que lhe deu a vida era sentido por todos, como se uma faca lhe cravasse o peito. Sn a filha única e herdeira de duas linhagens malditas, sobrenomes temidos e que sempre foram desprezados e agora estava ali a deriva entre ambos os mundos como se a alma pairasse pelo purgatório e o corpo ainda pertencesse à terra, mas como chegou a tanto?
Se recobrava de ter saído do culto do paraíso eterno completamente sã e agora sentia a alma lutar para retornar ao corpo que lhe pertence.
As portas foram abertas com força e a dama de vermelho passou, atrás de si seis cavalheiros trajando roupas pretas e com os rostos cobertos, na cintura a correia com suporte para a espada.
-- O que quer comigo Luzia? -- Os lábios levemente repuxados e carnudos da mulher de orbes violeta chamava atenção pela naturalidade em meio a pele escura e os fios pretos que ondulavam perfeitamente pelas costas.
-- É a Sn, ela não está bem. -- Sua mãe tentou manter-se calma enquanto um dos cavalheiros adentrou a frente da mulher:
-- A princesa não lhe deve ajuda. -- A voz dele saiu firme e pode ser visto o emblema cravejado com o selo imperial ao lado direito do peito.
-- Se ela não vai ajudar por que veio? -- A voz veio de seu pai que encarava a todos de maneira rude.
-- Meça suas palavras plebeu.
Não importa o título honorífico que sua família portasse, aos olhos dos de sangue real sempre seriam plebeus, porém a garota de orbes violeta ergueu a destra.
-- Já basta, estou aqui a pedido de minha mãe. Lady Tsubaki e apenas vim lhe informar que será a última vez que terá direito a pedir-lhe algo. Vocês são hipócritas e me escorraçaram quando passei pelo mesmo, agora que direito acham que tem de me pedir ajuda quando se trata do seu sangue?
A mulher riu de leve, achando hilário, Hanâmi Rengoku esposa de Kyojuro o primeiro filho da dinastia das chamas, apenas correspondeu ao chamado por ordem de sua mãe, a garota não era cruel tão pouco lhe faltava empatia, mas seus pais foram verdadeiros atrozes na vida alheia e se não fosse por um pacto bem amarrado a mesma não estaria aqui. De certa forma via agora a oportunidade de devolver o mal que lhe fizeram e de graça, afinal de contas os justos pagam pelos culpados.
Hanâmi se aproximou lentamente passando a mão por seu corpo sem encostar como se sentisse o véu da morte que pairava por seu corpo tentando o entender, sentia o pulso doer e a frieza do ambiente que agora exalava de seu corpo e pela primeira vez lhe tocou puxando a mão ao qual foi cortada e tirando o tecido que haviam amarrado conforme tentavam lhe despertar.
Os orbes da mulher vislumbraram a marca descrente e um sorriso de lado beirou ao desgosto.
-- Com tantos demônios para lidar, vocês escolheram logo um da corte infernal? Não sei se são azarados ou burros.
-- E não há nada que você possa fazer? -- Sua mãe perguntou levando a morena a suspirar, a contragosto ela retirou a luva e olhou para cada um:
-- Não trabalharei sem contrato.
-- Bruxa! -- Seu pai se descontrolou e rapidamente um dos guardas que acompanham a princesa sacou a espada e a pressionou contra o pescoço.
-- Meça suas palavras, porco, está diante de uma das próximas rainhas e apesar da lady ser benevolente, seu sangue não é.
-- Deixe-o comandante. E se apressem em derramar seus sangues em uma taça de ouro, pelo estado dela, não durará muito. Comandante entregue a adaga ao pai, já que está com a língua afiada, será o primeiro.
Feito como ordenou, a adaga não foi posta na mão do senhor e sim lhe exigido que estendesse e assim cortada com certa rudeza por parte do homem de rosto marcado e olhos tão violetas quanto os dela. Um a um os membros da família obedeceram a jovem e futura rainha cortando a palma de sua mão esquerda ou direita e deixando o sangue pingar na taça, por último fora entregue nas mãos dela, Hanâmi Rengoku olhou o cálice e sorriu observando a marca do corte em sua própria mão quando fora oferecida como sacrifício vivo e agora era ela a caminhar entre eles, uma baita de uma ironia. Mergulhando os dedos indicador e médio da mão direita na taça e desenhando um círculo pequeno de invocação no próprio pulso esquerdo, caminhou até o local do corpo semimorto de Sn e elevou a taça jogando o sangue impuro sobre o corpo de donzela.
-- Hakai Satsu -- Pronunciou em um sussurro e automaticamente as portas e janelas foram abertas, as velas do local apagaram e um leve susto ecoou pela boca daqueles que se expressaram, a mulher sorriu aliviada vendo que a convocação deu certo. As luzes retornaram e agora no centro do local, mas precisamente a frente da garota um homem como marcas pelo corpo estava ajoelhado.
-- O que você quer comigo filha expurgada? -- ela revirou os olhos deixando a curta provocação de lado, lidar com demônios sempre colocava os humanos na berlinda, pois, suas vidas não valem nada comparadas a de seres milenares.
-- Lorde. -- Meneou com a cabeça. -- Houve um engano a respeito de uma serva. -- Tentou barganhar observando a face do pai de Sn se retorcer, o idoso achava um absurdo serem obrigados a tratar demônios com tanto decoro e ainda assim vivia sobre a prática e o estigma de uma família que os venerava.
-- Hanâmi sabe muito bem que não há enganos, se foi parar em nossas mãos é por que mereceu isso. -- As palavras dele eram direcionadas apenas a elas, como se mais ninguém existisse.
-- Diga-me o nome da mulher em questão e talvez eu possa averiguar. -- Apesar de sério, o olhar ainda possuía um leve brilho direcionado a futura rainha.
-- Sn Nethuns Amarantis. -- Pronunciou lentamente e ele riu de leve.
-- Só pelo fato de ser uma Amarantis e continuar viva deveriam estar de joelhos agradecendo, ela em breve retornará para esse mundo, mas não pertencerá mais a vocês.
Ele sorriu para a dama tocando em sua mão e puxando-a em direção aos lábios, beijando o dorso.
-- ENTÃO TUDO ISSO FOI PARA NADA? SÓ PARA UM DEMÔNIO ENCOLEIRADO QUALQUER CLARAMENTE AMANTES DESSA BRUXA VAGABUNDA NOS DIZER O ÓBVIO?! -- A voz de seu pai ecoou e sim, você podia os ouvir sentindo sua mente vagar pelo limbo, no entanto, não poderia ver o que ocorreria:
Os olhos frios e cruéis de um demônio que se aproximava calmamente do responsável pelo clã tão rápido que a mulher não pode fazer nada, assim como a destra que se fechou no pescoço, esmagando a traqueia aos poucos o tirando do chão e o observando adentrar em desespero, seu corpo ressoava lentamente, às mãos arranhavam em vão o braço forte e os olhos aos poucos jaziam sem vida.
O choro até então mudo de sua mãe ecoou, estava prestes a perder o marido e nem sabia se a filha conseguiria retornar. O sangue escorreu pelo nariz daquele que se tornava a vítima e uma voz ecoou na cabeça de Sn.
"Eu te deixo despertar, te ajudo até mesmo a salvá-lo, mas em troca disso será somente minha."
Sn ficou em desespero, pela primeira vez desde que entrou em um estado vegetativo o corpo se moveu apertando o tecido trocado com firmeza e a voz de Hanâmi ecoou:
-- Akaza mate-o mais devagar por-favor, faça-o apreciar o sofrimento. -- Os olhos da mãe de Sn se alarmaram, afinal ele era apenas um pai querendo sua menininha de volta, mas o demônio sabia exatamente o porquê de tais palavras e assim o fez, folgando os dedos e os pressionando lentamente enquanto os olhos da morena se fixavam nas reações de seu corpo.
-- Se quiser que sua filha volte, é melhor começar a implorar pela vida. -- Hanâmi sugeriu e o homem se negou.
-- Há vamos humano fraco, faça pelo menos com que essa patética cena valha a pena. -- A cara tediosa de Akaza sempre a deixava incrédula, ele só encontrou um humano forte o suficiente ao qual respeitava e o mesmo havia se casado com a mulher ao qual ele almejava ter. -- É melhor você gritar, do contrário sua filhinha vai ficar presa para sempre no inferno.
Era vergonhoso, intimidador e humilhante. Em todos esses anos de servidão Desmond Amarantis nunca precisou se submeter e agora desviava o olhar para as suas mãos que pareciam apertar cada vez mais forte o tecido e por um momento os olhos dele recorreram ao do demônio, se submeteria por ela, faria de tudo para tê-la de volta, esse é o dever de um pai.
O pedido de socorro saiu em um sussurro, com Akaza esmagando cada vez mais forte a traqueia do homem e novamente Sn pareceu pairar pelo local.
"E então vai salvá-lo? Ou posso trazê-lo para me servir? Só pela afronta que fez a Hanâmi sei que levará cem mil chibatadas." Uma risada ecoou em seu lugar.
"Homens humanos não são tão inteligentes, não é? Pelo menos os da sua família, mas as mulheres... Ah, as mulheres são divinas!" As últimas palavras saiam com tanto deleite que mesmo não o enxergando, você tinha cem por cento de certeza que ele lhe sorria de maneira lasciva.
"Akaza já está cansando, ele vai matá-lo, se quiser salvá-lo deve me aceitar por completo. Quem sabe o tipo de diversão que teremos não é mesmo? E você veio aqui para salvar as almas desse seu clã imundo, então termine seu sacrifício."
A crueldade das palavras equiparava-se a um verdadeiro martírio e por mais que você não tivesse prática das vertentes de seu clã e tentasse mudar as coisas, um império construído sobre o sangue de inocentes dificilmente será abençoado com a bondade ou uma segunda chance. Sem mais escolhas, sua percepção aos poucos foi tomando forma e agora entendia que em momento algum sua alma deixou o recanto que agora se assemelhava ao purgatório, frio, inóspito e inquietante. Um deslizar suave a agonizante perdurou por seu corpo mesmo que ninguém estivesse lhe tocando e em desprezo sua alma bradou: a morte nunca lhe pareceu tão temível quanto o escuro, frio e inabitado limbo aparentava ser, sem querer postergar a sensação de sofrimento que passava por seu corpo Sn se deu por vencida em um sussurro que por todos foi escutado:
-- Eu aceito.
E como se o tempo houvesse parado todos os sons emudeceram, o corpo de seu pai caiu no chão e agora ele levava a destra ao pescoço tossindo e acariciando a pele completamente machucada, Akaza se virou indo em direção à morena e respirou fundo:
-- Ela fechou o contrato com o diabo. -- Ironizou observando-a pôr as luvas.
-- Mas todos vocês são demônios -- Hanâmi comentou, tendo o dorso da esquerda beijado por ele.
-- Se acha que fui difícil de acordar imagina um demônio cujo passatempo são belas mulheres, a sua amiga tem um gosto desgraçado e acabou e quebrar o acordo que protegia todo um clã para salvar um único ser humano.
E com essas palavras o demônio sumiu. Os olhos de Sn se arregalaram e a mesma sentou de uma vez sentindo o peito doer, demorou a reconhecer o local ao qual estava e quando o fez encontrou o pai curvado no chão, seus olhos, no entanto, percorreram os de Hanâmi que de leve reluziam pena.
-- Me diga que você não se apresentou a corte demoníaca.
Sn a encarou confusa e a morena de olhos violeta suspirou virando-se de costas e preparando-se para ir embora.
-- Você não sabe nem ao menos o que fez. Espero que se prepare para o que estar por vir. -- A mulher saiu acompanhada pela curta armada de seis homens que lhe protegiam e seus olhos continuavam sem entender o que lhe foi dito, sem saber que ao longe, mais precisamente do lado externo da mansão, um par de olhos arco-íris observava o local, aquela era a primeira vez que estava livre em setecentos anos, encarou a lua e sorriu calmamente enquanto as presas reluziam mediante o luar.
Deixaria que você aproveitasse o desentendimento, afinal curtiria ao máximo a liberdade que conquistou a força convicto de que não voltaria para o inferno.
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Pentagrama por Scruuffy no devinart
Sem previsão de postagem dos capítulos
Música - Let it die - Ozzy Osburne
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