21, perda total

FOI DIFÍCIL ENTRAR NA CASA dos Thornton sem que Cristina a visse mas Sarah, com sua paciência e perseverança, esperou até que a mulher saísse de casa, finalmente deixando o caminho livre até o quarto de hóspedes. A situação com a senhora Thornton era algo que ainda precisava ser resolvido mas no momento a garota já estava satisfeita por pelo menos Topper ter aceitado a relação entre ela e Nicholas.

Faziam alguns dias que Sarah não via Claire e a inabilidade de Nicholas de explicar o que havia acontecido estava tomando todos os seus neurônios com teorias que a deixavam maluca. Então a melhor opção foi vir até ela pessoalmente e tentar entender o que de tão ruim aconteceu. Rafe provavelmente deve ter feito alguma coisa dado seu histórico um tanto problemático.

Sarah não sabia se aguentaria mais uma grande decepção que envolvesse seu irmão.

O quarto estava uma zona, com malas e roupas espalhadas por todo o lugar e uma pilha de louça suja em cima da escrivaninha. E bem ali, no meio da bagunça, estava Claire deitada na cama em posição fetal e completamente coberta pelo edredom. Sarah só a identificou graças a cabeleira castanha que escapava pelo travesseiro.

Não era bem assim que a garota esperava encontrar Claire.

— Levanta daí, coisinha — disse Sarah, abrindo as cortinas com um movimento decidido e um tanto indelicado.

Claire grunhiu e virou para o outro lado, mas o sol não deu trégua, atravessando as pálpebras dela como uma lâmina quente. Com um suspiro de frustração, ela finalmente se sentou, os cabelos bagunçados caindo sobre os olhos e felizmente sobre seus hematomas. A presença de Sarah é uma surpresa indesejada, afinal, Claire estava a evitando desde sua expulsão de casa.

— Sarah? — murmurou, piscando para se ajustar à luz. — O que está fazendo aqui?

— Tentando salvar a sua sanidade mental, é o que estou fazendo — diz, puxando o cobertor que cobria as pernas de Claire.

A garota fecha a cara.

— Não preciso de ajuda, estou bem.

— Ah, claro. Por isso você está há três dias trancada nesse quarto chorando por causa do meu irmão.

Ok, talvez ela tivesse chorado um pouco e se lamentado um monte com os Thornton mas qual era o problema nisso? É um comportamento totalmente saudável. O que não é saudável é ignorar seus sentimentos.

— Vai passar — respondeu Claire, seca.

Sarah cruzou os braços, não convencida.

— O que ele fez?

Claire franze o cenho, incomodada por Sarah presumir que o problema era o comportamento de Rafe. A culpa de tudo sempre recaía sobre ele.

— Nada — Claire responde, se levantando. — Eu falei umas coisas, ele não gostou.

— Devem ter sido coisas bem terríveis.

A garota hesitou, os olhos desviando para o chão. Ela não conseguia pensar em algo horrível o suficiente para se comparar ao que ela havia feito.

— Foram — confirma, passando a mão por seus cabelos ainda colados ao seu pescoço.

A presença de Sarah já estava começando a deixa-la nervosa.

— O que foi que você disse?

— Nada que seja da sua conta — rebateu, cruzando os braços.

Sarah abre a boca, se fingindo de ofendida.

— Então já podemos parar de falar sobre você e focar no meu plano?

Claire arqueou uma sobrancelha.

— Que plano?

— Nick está jogando futebol com o Topper — Sarah explica, se sentando na cadeira da escrivaninha. — Vamos lá assistir.

Futebol com Nick e Top? Ela vê os dois todos os dias e não gostava nem um pouco de assistir esportes que não envolviam carros e Mônaco. Era uma péssima maneira de anima-la.

— Passo.

Claire pega o cobertor que Sarah havia tirado dela e o coloca de volta na cama, se preparando para voltar pra lá e continuar sentindo pena de si mesma. Talvez realmente não fosse a melhor maneira de lidar com tudo mas ela nunca havia se sentido desse jeito, então nada mais justo do que experienciar a fossa de maneira completa.

— Sério que vai continuar se lamentando por causa do Rafe?

Claire suspirou profundamente enquanto se sentava na cama, tentando manter a calma.

— A gente não escolhe o que sente, Sarah.

— Mas escolhe como lida com isso — retrucou, com firmeza. — E você está escolhendo o pior jeito possível.

— Eu só... sinto falta dele, tá legal? — admite, desviando o olhar. Agora ela conseguia entender o Nicholas, é realmente bem difícil expor seus sentimentos em voz alta.

Sarah estreitou os olhos, estudando o rosto cansado da amiga e então se sentou ao seu lado na cama.

— Claire, nunca imaginei te ver assim — Sarah murmura, colocando sua mão no ombro da amiga. — Isso não combina com você.

— Pode parar de falar de mim?

— Só se você colocar uma roupa decente e for comigo ao jogo.

Claire revirou os olhos, irritada e um tanto derrotada. Talvez se ela a convencesse de que estava bem Sarah a deixasse em paz.

— Eu odeio você — Claire resmunga, se pondo de pé.

— E eu te amo. Anda logo.

Sarah espera alguns minutos até Claire sair do banheiro exalando cheiro de sabonete e shampoo. Os cabelos da garota pingavam em sua blusa e seu rosto tinha um aspecto bem melhor do que quando havia chegado aqui.

— Isso serve? — perguntou Claire, exibindo a roupa que havia escolhido às pressas.

A blusa tinha as mangas curtas e a gola alta, escondendo as marcas de seu pescoço. Ela também vestia uma saia preta rodada, o que causa uma pequena rusga no meio da testa de Sarah. O estilo de Claire cedo ou tarde tendia para o clássico, deixando claro que ela não havia crescido na ilha. A blusa de gola alta também gerava estranheza, afinal, Sarah não se lembrava da última vez que Outer Banks esteve realmente fria.

— Eu jamais usaria isso, mas combina perfeitamente com você — Sarah provocou, com um sorriso de lado.

Claire revirou os olhos e se virou para o espelho, jogando todo o cabelo pro lado direito do pescoço para prender seu cordão em volta dele. Sarah se levanta abruptamente da cama ao perceber uma marca avermelhada escapando da gola alta, bem na parte de trás da nuca da garota.

— O que é isso? — indaga, soando alarmada.

— O quê?

— No seu pescoço — explica, colocando seu dedo no exato local da marca que via.

Claire se retrai, desviando do toque e jogando seus cabelos de volta pro lugar. Suas mãos começam a suar frio.

— Não é nada — murmura, procurando seus sapatos.
Onde ela havia deixado os sapatos?

— Claire... Me deixa ver isso — Sarah pede, com as mãos esticadas em direção a amiga.

— Dá pra parar? — retrucou, desviando.

Sarah avançou um passo, a determinação visível em seus olhos.

— Você está machucada!

— Não, eu não estou.

Isso não a convence.

— Foi o Rafe, não foi?

— Não!

— Me diga a verdade!

— Essa é a verdade!

Sarah estreitou os olhos, a frustração crescendo junto com a preocupação.

— Então é por isso que está aqui — Sarah murmura, várias teorias se formando em sua cabeça. — Ele perdeu a cabeça e te machucou... Como ele pôde?

Claire explodiu, virando-se de uma vez.

— Ouça com atenção, Sarah: não foi o Rafe!

— Até quando vai defender ele? — a garota grita em resposta, sentindo um gosto amargo em sua boca. — Ele não merecia o meu amor e com certeza não merece o seu.

— Não foi o Rafe! — gritou, a voz tremendo enquanto seus sentimentos ameaçavam transparecer.

Que merda! Agora tudo o que ela fazia envolviam lágrimas.

— Então o que aconteceu?

Claire hesitou, os olhos marejados desviando para o chão. Ela não queria ter essa conversa com Sarah agora, e nem nunca na verdade. Já era difícil que Rafe a odiasse, o que ela faria se perdesse a amiga também? Talvez gerasse algum problema pra Nicholas, talvez ele se afastasse dela a pedido de Sarah. Claire entenderia isso mas não diminuiria a dor de estar completamente sozinha.

— Eu não quero falar sobre isso, tá legal? — Claire murmura em resposta, sentindo que estava prestes a desmoronar.

— Você está tremendo — Sarah diz e Claire imediatamente cerra os punhos.

— Não estou não.

— Claire — Sarah suavizou o tom, aproximando-se. — Eu me importo com você. Se o Rafe fez isso, você pode me contar. Nós vamos dar um jeito.

Claire fechou os olhos, respirando fundo. Ela não aguentaria toda essa situação por nem mais um minuto. Era detestável que toda a culpa sempre recaísse para o garoto.

A melhor maneira de lidar com uma ferida é esterilizando ela logo, por mais que doesse.

— Foi o seu pai, tá legal?

O rosto de Sarah congelou.

— O quê?

— Olha... O que eu vou dizer não é bom. Não é nem um pouco bom e provavelmente você vai me odiar por isso.

— O que você... O que quer dizer com isso?

— Dá pra se sentar? — Claire pede, apontando pra cama.

Sarah obedeceu, sentando-se lentamente na beira da cama, sentindo a ansiedade crescer dentro de seu peito. A garota observa enquanto Claire anda de um lado para o outro, lutando contra as palavras que insistiam em ficar presas em sua garganta.

— O Ward estava fazendo ameaças. Contra o Rafe, contra o que estamos tentando construir na Cameron Development. Eu quis conversar, sabe? Fazer com que ele mudasse de ideia.

Sarah apenas a olhava, esperando.

— Então ele disse que ia entregar o Rafe. Disse que ia acabar comigo. E... Eu falei algumas coisas ruins pra deixá-lo irritado. E ele me atacou.

— Ele te atacou? — Sarah repete, tentando entender aonde isso iria chegar. Era assustador pensar no rumo das atitudes de seu pai, atacando até mesmo Claire que nunca sequer havia levantado a voz para ele.

Claire assentiu, a voz falhando.

— Eu levei uma arma comigo — admite, desviando o olhar. — Fiquei com medo de encará-lo sozinha e pensei que seria bom ter algo pra me defender.

A essa altura Sarah já sabia o que vinha a seguir, mas mesmo assim, não foi nem um pouco fácil ouvir.

— Ele me enforcou, Sarah. Eu achei que fosse morrer e por isso atirei nele. Ele está morto.

Claire espera que Sarah diga alguma coisa, que tenha alguma reação, mas nada acontece por alguns longos segundos.

— O Rafe sabe e é por isso que estou aqui.

Sarah piscou várias vezes, tentando absorver o que acabara de ouvir. As lágrimas se acumulam em seus olhos enquanto a garota respira profundamente, tentando controlar os sentimentos controversos que cresciam em seu peito.

— Você matou ele?

— Eu matei.

Sem hesitar, Sarah se levantou e a abraçou, envolvendo-a com força. Muitos sentimentos cresciam dentro da garota, mas nenhum deles era o suficiente para não entender o que Claire havia feito. Sarah teria feito o mesmo em sua situação.

Algumas pessoas apenas não são boas, por mais que você as ame.

— Eu sinto muito — Claire murmura, sentindo as lágrimas de Sarah pingarem em sua roupa.

Sarah se afasta, olhando nos olhos tristes da amiga.

— Não, Claire. Eu sinto muito. Ele sempre... Acho que meu pai nunca se importou de verdade com a felicidade de outra pessoa além dele e pensar que ele te machucou. Como ele me machucou...

— O Rafe me odeia — é a única coisa que Claire diz, a única coisa que importava para ela.

Sarah balança a cabeça em negação.

— Ah, ele não odeia.

— Odeia sim. Eu só... Eu não soube mais o que poderia fazer eu... Eu não quis mata-lo, Sarah. Eu não quis.

Bem, isso não era totalmente verdade, mas as vezes uma pequena mentira era o melhor a ser dito. Claire observa enquanto a garota assente, tentando secar as lágrimas que tomavam seu rosto. Sarah sabia que seu pai não merecia nenhuma delas.

— Eu sei que não.

— Você não me odeia? — Claire pergunta, estranhando a reação amena de Sarah.

— Você é praticamente minha irmã mais velha.

— Eu matei o seu pai.

— Eu sei. Mas eu conheço você assim como eu conhecia ele e eu sei... Eu sei que não teve outra escolha e acredite: eu também escolheria você. Eu só... Eu vou precisar de alguns minutos.

— Certo.

Como esperado, não foi nem um pouco divertido assistir os garotos jogarem futebol no clube, principalmente por haver tantas pessoas ali em volta deles. Claire não entendia muito sobre futebol mas era de se perceber que Nicholas tinha um talento real para o esporte, o que arrancava palmas de quem observava e suspiros das garotas da arquibancada. Ele tinha um pequeno fã clube, é claro, talvez o único garoto da ilha a ter esse feito.

Claire estudou a expressão de Sarah por todo o jogo, refletindo se as garotas gritando por Nicholas a incomodava ou se na verdade ela estava prestes a explodir e decretar seu ódio pela assassina do pai.

O jogo acabou e ela não tinha uma resposta.

Foi difícil manter uma conversa em grupo sem acabar desviando a atenção de volta aos seus pensamentos. Qualquer um ali perceberia que havia algo errado com Claire mas os que não sabiam sobre o que aconteceu não se importavam o suficiente para perguntar.

A reunião do time só acaba no fim da tarde e quando a tortura parece ter chegado ao fim Sarah e Nicholas decidem que o melhor a se fazer antes de voltar pra casa é jantar. Claire aceita, afinal, o pior já havia passado. Ela escolhe um prato mas não consegue realmente comê-lo, apenas beliscar algumas partes, por mais que a comida a lembrasse da França.

Não era tão bom quanto em casa de qualquer maneira.

O restaurante estava movimentado, mas Claire mal percebia o ambiente ao seu redor. Sentada à mesa encarando seu prato pela metade, ela sentia o peso de suas escolhas consumir seus pensamentos. O que ela faria agora? Parecia inevitável ficar paralisada enquanto esperava pelo pior.

A garota respira profundamente, observando a boca de Sarah e Nicholas se mexer enquanto conversavam sobre algo. Ela só conseguia focar em não chorar. Talvez fosse necessário bater na porta de Rafe e se humilhar mais um pouco... Claire com certeza não se importaria em vê-lo novamente, mesmo que fosse para ser escorraçada.

— Hm, Claire... — Sarah murmura, chamando a atenção da garota. — Não olha agora, mas...

Claire se virou antes mesmo de Sarah terminar a frase, contrariando o aviso. Seus olhos pousaram na entrada do restaurante, onde Rafe estava parado acompanhado por uma mulher loira. Lindo como o inferno, é claro, mas tão distante de seu toque. Quem era ela? O que ele fazia aqui com ela? Claire não sabia que o tipo dele eram garotas siliconadas.

Por um instante ela sente uma raiva descomunal, a mesma raiva que sentiu antes de enfiar três balas no peito de Ward.

— Eu não acredito — ela murmurou, a mandíbula travada.

— Quem é aquela? — perguntou Sarah, franzindo o cenho. Ela não estava feliz com a situação no momento, se sentindo culpada por ter tirado Claire de casa para isso. — Ela parece meio... Velha pra ele, não acha? — completou, tentando aliviar o clima.

Claire não respondeu. A fúria crescente em seu peito parecia sufocá-la e a náusea era palpável. Que maldito sentimento era esse que a deixava tonta?

— Acho que vou vomitar — ela declarou, empurrando a cadeira para trás.

— Claire... — Nicholas começou, mas ela já estava de pé, indo em direção ao banheiro.

Nicholas hesitou por um momento, trocando um olhar com Sarah antes de se levantar e segui-la. Graças aos céus Rafe parecia não tê-los visto, evitando uma situação ainda pior entre eles. O garoto o conhecia o suficiente para saber que ele podia ser bem cruel quando queria.

No banheiro, Claire estava de frente para o espelho. Suas mãos apertavam as laterais da pia enquanto ela tentava regular sua respiração. Uma única gota de suor escorre por sua testa, retratando bem a dificuldade que ela tinha em não vomitar.

— Claire — Nicholas chamou, entrando no banheiro apenas alguns segundos após ela. Ninguém se importou por aquele ser o banheiro feminino.

Ela ergueu o olhar, o reflexo no espelho revelando seus olhos brilhando de raiva, mágoa, ciúme.

— Eu vou matar aquela vadia — ela soltou, sem filtro.

— Você precisa parar de dizer essas coisas — Nicholas respondeu, cruzando os braços. — Eu vou acabar acreditando.

— De onde ela saiu? — Claire ignorou o comentário, girando para encará-lo.

— Acho que ela era do colégio, formanda enquanto ele estava no primeiro ano — ele respondeu, evasivo. Hanna Davis era bem conhecida em Outer Banks. Antiga princesa Kook, seu posto foi tomado por Sarah quando sua familia faliu. Até hoje ela não lida muito bem com a vida de Pogue.

— Você a conhece? — a voz de Claire era uma mistura de curiosidade e irritação.

Nicholas hesitou, coçando a nuca.

— Dá pra se dizer que sim.

Pela expressão dele, Claire já havia entendido tudo.

— Não acredito nisso.

— Olha... Só não comenta nada com a Sarah, tá legal? — Nicholas pede. Algumas informações não precisam ser compartilhadas.

— Eu não tô nem aí se você já transou com ela — Claire disparou, gesticulando bruscamente. — Ela vai é transar com o Rafe!

A garota avança em direção a porta mas Nicholas entra na frente dela, impedindo que ela passe.

— Ei, ei, nada disso — Nicholas tentou acalma-la, levantando as mãos.

— Eu vou bater nele... Vou bater nos dois! — Claire tentou desviar, os punhos cerrados.

— Você não vai querer criar uma cena aqui, Claire. Não na frente de todo mundo.

— Eu não me importo! — ela retrucou, os olhos faiscando.

— Devia. Você não sabe o que ele pode falar ou como vai reagir. Tem que manter a cabeça fria — ele insistiu, sua voz firme.

Claire ficou imóvel por um instante, encarando Nicholas. Sua respiração era irregular, mas, aos poucos, ela se obrigou a respirar fundo. Era difícil pensar direito com toda essa... Tristeza. A magoava profundamente ficar longe dele, mais do que ela conseguiria admitir em voz alta, e doía mais ainda saber que seu sofrimento era merecido.

— Eu não consigo fazer isso — admitiu, sua voz embargada.

Certo, agora ela ia chorar. Tinha como ficar pior?

— Consegue, sim. Fica fria — Nicholas respondeu, com um tom mais suave.

Ela desviou o olhar, derrotada, enquanto suas lágrimas escorriam por seu rosto. Nicholas permanece em silêncio, ainda sem saber o que fazer nessas situações. O garoto nunca havia precisado consolar Claire em nada, não até agora.

— Vamos embora — Claire pede, passando a mão pelo rosto para limpar suas lágrimas.

Seu rímel fica borrado em volta dos olhos.

— Me espera no carro — ele pede, quase uma ordem, saindo sem olhar para trás.



Sarah observava Nicholas enquanto ele passava as mãos pelos cabelos, visivelmente exausto. Havia algo diferente nele, uma vulnerabilidade que ela não costumava ver com frequência. Era claro que ele realmente se preocupava com o bem estar de Claire como se a garota fosse parte de sua própria família. Sarah compreendia isso. Ambos estavam preocupados com a situação em que estavam mas não o suficiente para deixar transparecer alguma coisa, a cabeça de Claire já parecia ter preocupações o suficiente.

— Ela está bem? — Sarah perguntou, quebrando o silêncio.

— Roubou um calmante da minha mãe e dormiu... — Nicholas respondeu, um suspiro escapando. — Ela não tem dormido muito bem.

— Ela me contou o que aconteceu — disse Sarah, a voz baixa.

Nicholas desviou o olhar, como se estivesse esperando por essa conversa.

— Eu sinto muito, Sarah. Eu não te contei porque...

— Não se preocupe. — Sarah interrompeu, balançando a cabeça. — Ela é sua amiga, nossa amiga. E meu pai... Ele era uma pessoa horrível. Eu demorei muito pra ver isso.

Nicholas assentiu, mas seu olhar permaneceu distante. Ele se sentia mal por tudo o que havia acontecido entre eles e ter escondido uma informação dessas não o ajudava apesar de saber que nunca trairia Claire, nem mesmo por Sarah Cameron.

— Como você se sente com isso? — perguntou, ainda sem encara-la nos olhos. — Sabe... Tudo bem ficar triste.

Um longo suspiro escapa da boca de Sarah enquanto ela parece refletir sobre o que sentia nesse momento. Eram muitas coisas, na verdade.

— Na verdade, eu me sinto... — ela faz uma pausa, pensando se realmente deveria dizer a frase a seguir. — Estranhamente aliviada. Não sei se faz sentido.

Nicholas observa enquanto ela cruza os braços, como se tentasse se proteger da estranheza do momento. Ele não a julgava por isso, não após saber tudo o que a garota já havia passado nas mãos de Ward.

— Acho que faz — Nicholas respondeu simplesmente, olhando para ela com compreensão.

Por um instante, o silêncio se instalou entre eles, pesado mas não insuportável. Sarah hesitou antes de falar novamente.

— Precisamos falar sobre o John B — sua voz era firme, mas o olhar suplicante. — Você tem evitado o assunto desde...

— É porque não quero falar sobre ele — Nicholas cortou, sua voz endurecendo.

— Nicholas... Eu preciso que você me diga como se sente.

Como ele se sente. Por que as garotas tinham essa mania terrível de querer que ele expressasse seus sentimentos? Alguns sentimentos simplesmente não eram bonitos para serem ditos em voz alta.

— Como eu me sinto? — indaga, aumentando o tom de voz. — Eu o odeio! E eu odiei o fato de você ter ido atrás dele!

— Você mentiu pra mim! O Big John está morto! Ele precisava de mim! — Sarah rebateu, tentando se explicar, tentando faze-lo entender.

— Mas e eu, Sarah? E quando eu precisei de você?

Ela engole em seco, perdendo subitamente a capacidade de se defender. Não havia defesa pra isso. Sarah o deixou de lado junto com sua vida de Kook enquanto se aventurava numa busca por ouro e numa paixão avassaladora. Mas amor... O amor de verdade. Essa palavra só tinha significado quando a garota olhava nos profundos olhos azuis de Nicholas.

Ele se levanta, sabendo que nenhuma palavra sairia da boca de Sarah. Se ela queria que ele expressasse seus sentimentos então havia conseguido. Ele falaria sobre eles, sobre cada um deles.

— Eu não aguento mais sentar aqui e fingir que as coisas que você faz não me machucam! — diz, começando a andar de um lado para o outro, cada palavra carregando o peso de sua mágoa. — Você jogou sua vida no lixo! Virou tudo de cabeça pra baixo por causa dele! Como eu poderia competir com isso?

Nicholas parou, finalmente encarando Sarah, com seus olhos brilhando de frustração e dor. A garota deixa algumas lágrimas escorrerem por seu rosto, sentindo a culpa se apossar de cada um de seus nervos. O que ela pensou? Que voltaria e recuperaria tudo o que jogou fora assim tão fácil?

— Tem certeza que quer estar comigo? — o garoto pergunta, a dor palatável em seu tom de voz. — Eu não posso viver minha vida achando que eu sou o prêmio de consolação! Isso não é justo... Não quando eu passei minha vida inteira amando você.

O lábio inferior de Nicholas treme, expressando bem a profundidade de suas emoções. O garoto se sentia engasgado, como se algo estivesse o sufocando. Uma única lágrima se forma no canto se seu olho e ele se apressa em seca-la. Sarah se levanta lentamente, se aproximando de Nicholas com cautela com seus grandes olhos castanhos tomados por lágrimas.

— Nick... Eu amo o John B. Amo a Kiara, o Pope, a Cleo e o JJ. Amo cada um deles. — Sua voz era serena, mas firme. — Mas eu amo mais você.

Nicholas dá de ombros, se recusando a deixar que aquelas palavras amolecessem seu coração por mais que elas realmente o fizessem.

— Eu não me arrependo do que fiz, não me arrependo do que vivi — Sarah continuou. — Mas me arrependo por ter te magoado tanto. Nunca foi minha intenção.

Ela deu mais um passo em sua direção, colocando sua mão delicadamente no braço dele. O olhar de Nicholas sobe da mão de Sarah até seus olhos.

— Você não precisa se preocupar com ninguém no mundo... Meu coração sempre foi seu. Desde criança, desde sempre.

Nicholas abaixou a cabeça, os ombros tensos.

— Só não minta pra mim — ela disse, a voz agora quase um sussurro.— E eu jamais esconderei algo de você. Nunca. Você é meu melhor amigo, Nick...

— Eu não sei se consigo fazer isso — ele admitiu, a voz embargada.

O que ele teria que fazer para esquecer isso? Para apagar toda a mágoa e rancor que parecia ter feito morada em seu peito? Será que isso era possível? Talvez os dois apenas estivessem fadados ao fracasso...

— Me deixa te ajudar — Sarah pediu, seus olhos fixos nos dele. — Me deixa te mostrar que vale a pena.

Nicholas não respondeu imediatamente, mas a raiva que antes queimava em seus olhos parecia ter se apagado, substituída por uma tristeza resignada. Ele suspirou. Só havia uma maneira de que isso desse certo e precisaria de muito esforço mútuo. Remoer o que aconteceu não ajudaria no processo e talvez fosse a hora de deixar pra trás o que já passou.

Sarah o abraçou, apertando-o contra si. E pela primeira vez desde que ela havia voltado pra sua vida não havia nenhum tipo de resistência da parte de Nicholas. Ele faria com que isso desse certo, e o garoto não sabia, mas Sarah estava decidida a fazer o mesmo.


A cabeça de Rafe parecia prestes a colapsar a qualquer momento. Uma parte dele ainda insistia em sentir falta de Claire. Do seu cheiro doce, seus pijamas provocativos e aquele pequeno soluço que ela dava no final de cada uma de suas risadas. A cada minuto longe parecia que seu cérebro encontrava mais e mais maneiras de faze-lo se lembrar dela, o que não ajudava nada a concluir a leitura dos documentos empilhados em sua mesa.

Havia uma primeira pilha de documentos que deviam ser lidos e uma segunda, e hipotética, de quantos ele tinha concluído. Nenhum, é claro.

Apesar disso, seu sofrimento era evidente a qualquer um que tivesse contato com ele. No caso, todos os empregados que cuidavam da manutenção de Tannyhill, que estavam um tanto curiosos pela ausência de Claire e súbita melancolia de seu chefe. E Ward... Após a perda, na cabeça de Rafe, ele havia se tornado o melhor pai de todos. Era difícil não pensar nele, difícil saber que jamais o veria novamente e mais difícil ainda enfrentar o fato de que tudo isso era culpa de Claire.

Aquela garota era sua ruína. Ele soube no momento em que Rose a trouxe pela primeira vez, com aquele laço gigante na cabeça.

De nada parecia ter adiantado sair para jantar e arejar a cabeça e os dois copos de whisky. Tudo ainda parecia uma merda, como nos dias anteriores. Ele desejava que Claire nunca tivesse feito o que fez, então tudo estaria bem, pelo menos por enquanto.

Ele resmunga quando a campainha soa, indo em direção a porta em passos firmes. Já era tarde da noite e poucas pessoas teriam a petulância de incomodar alguém uma hora dessas. Será que era Claire? Ela tinha a chave mas talvez não quisesse entrar na casa após sua expulsão.

É uma mistura de alívio e decepção quando Rafe abre a porta, vendo um garoto alto e loiro parado na sua frente.

— Hm. Aqui é a residência dos Cameron? — o garoto perguntou, ajustando os punhos do paletó, como se cada movimento fosse calculado. O sotaque francês denunciou sua origem antes mesmo que ele pudesse se apresentar.

Rafe arqueou uma sobrancelha, já pressentindo onde aquilo iria chegar.

— É. E você é? — respondeu, seco, estudando o estranho à sua frente.

— Eric — o garoto sorriu de lado, como se o nome fosse uma credencial por si só. — Estou procurando a Claire. Ela está?

Rafe cruzou os braços, o sorriso irônico crescendo no rosto.

— Ela não mora mais aqui.

Ele observa enquanto o francês a sua frente franze o cenho, a expressão confiante vacilando por um instante.

— Sabe pra onde ela foi? Só tenho esse endereço e...

— Não, não sei — Rafe interrompeu, o tom carregado de sarcasmo. — Experimenta bater de porta em porta. Talvez funcione.

Eric piscou, surpreso com a resposta, mas Rafe já estava fechando a porta abruptamente, deixando o francês parado na varanda, ainda processando o que havia acabado de acontecer. Pelo visto levar Claire de volta pra casa seria uma missão mais difícil do que ele esperava.





Meu cérebro está FRITANDO de ideias!!
Próximo capítulo vai ter Rafe e Claire frente a frente sim!!! Não esqueçam de votar, o número de votos caiu nos últimos capítulos 😪

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top