19, cara a cara
O SOL ILUMINAVA O ROSTO sereno de Rafe, que ressonava profundamente envolto em seu sono profundo. Claire mal consegue tirar os olhos dele, hipnotizada pela curva de seu nariz, o formato de seus lábios, por seus músculos marcados... A garota sentia que podia ficar ali pra sempre — o observando pra sempre.
As coisas ficam diferentes quando você assume seus sentimentos para si mesma. Ela não tinha mais medo ao praticamente perder o ar só de olhar pra ele. Apesar de sentir que deveria.
Para sua surpresa Rafe dá um sorriso de canto, fazendo com que as bochechas de Claire fiquem vermelhas.
— Está me olhando? — ele pergunta, ainda de olhos fechados.
A garota não consegue evitar em abrir um sorriso.
— Um pouco, talvez.
Ele abre seus olhos, virando seu rosto em direção a garota descabelada ao seu lado na cama.
— Senti sua falta enquanto dormia — Rafe murmura, acariciando a bochecha de Claire. — Não sonhei com você dessa vez.
O coração de Claire quase pula de seu peito.
— Já que você me chutou a noite inteira acho que isso é uma coisa boa — ela murmura em resposta, se inclinando em direção a ele e beijando seus lábios.
— Você está linda, princesa.
Claire sorri e isso faz com que ele sorria também.
— Você também, Cameron.
Ele levanta da cama, sentindo a brisa fresca contra seu corpo nu. Eles tinham fugido para o barco na noite passada graças a presença indesejada de Jacques nos últimos dias. O pai de Claire havia decidido passar alguns dias na ilha na companhia da filha e é claro que sua trupe de seguranças e assessores estavam junto dele, ocupando todos os quartos da casa.
Jacques reclamava o tempo todo, principalmente sobre o clima e as pessoas, mas pagava o jantar nos melhores restaurantes da ilha todas as noites. Ele também se encarregou de realizar a transação referente a mais uma parte do ouro, o que com certeza contribuiu para o bom humor de Rafe, apesar de sua presença constante em casa estar o irritando um pouco.
Era difícil passar um tempo sozinho com Claire quando o pai dela estava em casa. Ele queria tê-la, prova-la em sua boca mas com Jacques ali tudo parecia impossível. Por isso eles vieram pro barco, pra ter um pouco de privacidade e fazer algum barulho.
Rafe e Claire não gostavam de ser silenciosos.
— Pra onde vai? — Claire pergunta, também se pondo de pé.
Rafe quase se esquece do que tem que fazer ao vê-la nua vindo em sua direção.
— Tenho que resolver uma coisa... — murmura, colocando sua cueca.
— Que coisa?
— Nada pra se preocupar — ele responde, se aproximando dela e usando seus dedos para afastar seu cabelo castanho. — Eu garanto.
Isso não a deixa feliz.
— Então por que não me diz?
— Já está tarde, por que não vamos almoçar no píer? — sugere, desconversando. Ele mal olha nos olhos dela enquanto dá de ombros.
— Rafe...
— Claire — ele a interrompe, antes que ela continue. — Quando tudo estiver certo eu prometo que te conto, pode ser?
Isso a frustra de maneiras que parecem difíceis de explicar. Claire sente vontade de gritar, de jogar tudo no chão e fazer disso um escândalo. Ela não queria mais ser assim... Mimada, inconsequente, impaciente. E esse pensamento é o único que toma sua mente quando ela concorda.
— Certo.
Rafe sorri com o canto da boca, correndo seus olhos pelo corpo da garota que reluzia embaixo da luz do sol que invadia o quarto pela porta da cabine.
— E vista uma roupa, antes que eu te jogue naquela cama de novo — ele ameaça, apontando pra ela.
— Acho que vou ficar assim mesmo — é o que Claire responde, se aproximando dele.
Em um movimento rápido Rafe a pega no colo, fazendo um grito espontâneo sair da boca da garota. Ele a joga na cama, subindo de cima dela em seguida.
— Karma — ele murmura contra o ouvido de Claire.
É o suficiente para que a garota leve suas mãos até a barra da cueca de Rafe.
Rafe Cameron era um cara romântico, o que não cansava de surpreender Claire. Ele não queria a companhia da garota para assistir filmes, preferia leva-la a restaurantes e ouvi-la falar sobre o que mais a interessava. Música na maioria das vezes. Gostava de se deitar no sofá enquanto ela tocava, de vê-la dançando pela casa com seus fones de ouvido e de irrita-la até que ela perdesse a razão.
Bom, nem sempre ele era assim tão romântico, mas não podia evitar em apreciar cada pequena reação de Claire ao longo dos dias.
Para seu desapontamento, Claire almoça praticamente em silencio, parecendo um tanto pensativa. Ela conversa por alguns minutos sobre a empresa, comenta alguma coisa ou outra sobre Vivaldi mas logo desiste de manter um diálogo, se perdendo em seus próprios pensamentos.
Claire volta pra casa sozinha, deixando a preocupação sobre os segredos de Rafe tomar conta de sua mente. Ela se senta em frente o piano e martela as teclas com violência, criando a melodia melancólica de Rachmaninoff sem nem mesmo perceber. Era o que ela costumava tocar quando estava nervosa.
Um único nome pairava sobre sua cabeça: Ward.
Ele estava na ilha há alguns dias e desde sua chegada Rafe andava um tanto preocupado, inquieto na hora de dormir e as vezes até mesmo distraído. Rafe não conversava com ela sobre seu pai e isso a deixava irritada e até mesmo magoada, como se ele não confiasse nela o suficiente para lhe contar seus problemas.
— Claire? — Jacques murmura, colocando a cabeça dentro da sala.
Automaticamente os dedos de Claire param.
— Papa — murmura, tentando afastar seus pensamentos. — Oi.
Ele se aproxima, se sentando na poltrona no canto da sala. Claire se vira para acompanhar seus movimentos.
— O que houve? — ele pergunta, cruzando suas pernas. — Parece pensativa.
A garota acena com a cabeça, dispensando a preocupação.
— Nada, eu só estava... Pensando.
Para sua sorte, Jacques não era um homem muito observador quando se tratava dos sentimentos alheios. Sua praticidade o impedia de ver alguma profundidade por trás das emoções.
— Onde estava?
— Eu fui ver o Nick... — a garota mente, encarando o semblante sério de seu pai. — Ele precisou de mim.
Mas até mesmo Jacques — com toda sua insensibilidade — sentia que alguma coisa parecia errada. Ele se levanta, indo até sua filha e se sentando ao seu lado no banco do piano.
— Você está esquisita — observa, colocando sua mão cuidadosamente sob os ombros de Claire.
Ela sobe seus olhos até os dele.
— Estou triste por estar indo embora — mente novamente, sabendo que esse ainda não era o momento certo para falar sobre Rafe.
— Está mesmo? — o mais velho questiona, levantando um de suas sobrancelhas numa expressão desconfiada. — Algo me diz que vai adorar ficar aqui enfiando seu nariz nos negócios dos Cameron e bem... Tocando de novo.
— Pai...
— Foi muito bom, tenho que admitir — ele a interrompe, torcendo o nariz. — Fazia tempo que não te ouvia tocar.
— Eu não costumo ter muito tempo livre — Claire rebate, soando amargurada.
— Está ocupada trabalhando de verdade.
— A música pode ser um trabalho.
— Pra morrer de fome?! — indaga, aumentando o tom de voz.
A garota suspira — é claro — já sabendo que toda essa discussão não levaria a lugar nenhum. Era por isso que Claire não gostava de expor seus sentimentos e vontades para o pai, ele não se importava de verdade com nenhuma delas.
— Eu não vou morrer de fome, eu sou herdeira — responde, cruzando seus braços.
Ela os descruza imediatamente quando se vê agindo como mimada de novo.
— Mas o dinheiro acaba! — Jacques exclama, se pondo de pé. — Eu acabo! Se não gerir nossa empresa... O que vai fazer? Vender o sonho da nossa família como se não fosse nada?
— Não! — responde imediatamente. — Eu... Eu quero tocar piano, quero fazer faculdade de música e depois talvez eu...
— Não me venha com mentiras! Eu sempre te dei tudo o que você queria. Todos os sapatos, as roupas, os diamantes. Dei amor, atenção. E a única coisa que eu queria em troca é que você cuidasse da empresa da família, aquela que seu bisavô criou.
Claire engole em seco.
— Papa...
— Você é boa — ele continua. — É a melhor que já ouvi e sabe que já pude apreciar boas músicas mas precisa se lembrar de onde veio, precisa saber que família é pra sempre. No final das férias o Marcus estará aqui pra te buscar, vamos voltar pra casa e você vai pensar direito. Entendeu?
— Mas e o que eu quero, pai? — ela pergunta, sentindo a frustração tomar conta de si. — E o que vai me fazer feliz?
Ele dá de ombros, dispensando a pergunta.
— Você tem uma vida toda pra isso.
Claire abre a boca, pronta para rebate-lo, mas no exato momento Javert coloca a cabeça dentro da sala, fazendo com que a coragem da garota desapareça.
— Monsieur Bertrand, o piloto já chegou — Javert anuncia.
É um alívio tanto para Jacques, quanto para Claire que seja a hora dele finalmente ir embora. Um suspiro sai da boca de Jacques, que se vira em direção a sua filha com aqueles olhos azuis e adocicados de quem preferia fingir que nenhuma discussão tinha acontecido.
— Tenho que ir, nada de aprontar ouviu? — ele diz a Claire, a envolvendo em um abraço.
Claire aperta seu pai contra si, sentindo o cheiro de seu perfume francês e o alivio de ter mais algum tempo para pensar antes de vê-lo novamente. Ele beija o topo de sua testa.
— Claro.
— Je t'aime, princesse.
Rafe entra em casa com passos lentos, em completo silêncio. Sem pensar muito, caminhou até a mesa e puxou uma cadeira, sentando-se ali com um cansaço evidente. O garoto não devia estar em casa tão cedo mas pareceu impossível focar no trabalho após o encontro um tanto desastroso com seu pai.
Ward Cameron realmente tinha o poder de acabar com todo seu bom humor.
O garoto estende a mão até a garrafa de café, servindo um pouco para si em um xícara. Ele a leva aos lábios, sentindo o sabor amargo se espalhando pela boca enquanto ele permanecia em silêncio. É quando Claire entra na cozinha, a sua procura graças ao barulho da porta. Os dois se encaram por um breve segundo, e é o suficiente para que a garota perceba que havia algo errado com ele.
Claire o observa enquanto Rafe mantém seu olhar fixo em um ponto distante, sua mente parecia estar longe, ocupada com alguma preocupação invisível aos olhos. Havia uma inquietação em seus movimentos, como se o simples ato de estar ali, em casa, naquele momento, fosse um erro. A garota se aproxima em passos lentos, parando bem ao lado dele.
— Você tá bem? — ela pergunta, sentindo Rafe a envolver com um dos braços e aperta-la contra si.
— Estou — o garoto responde, olhando para Claire.
Ambos se encaram, sabendo que ele estava mentindo. Rafe também sabe que ela percebe.
— Na verdade... Já sentiu que tudo que faz é errado? Não sei se faz sentido.
— Sinto isso pelo menos umas cinco vezes por dia — Claire admite, com um sorriso.
— Eu tô numa situação que se eu faço o que é melhor pra mim eu vou acabar... Vou acabar sendo inflexível com outra pessoa.
— Quem? — é a primeira coisa que ela pergunta.
O garoto revira os olhos.
— Esqueci que você é intrometida.
E ele desviava do assunto como se fosse um arame farpado.
— Tem que se proteger Rafe, se não fizer isso quem vai fazer por você?
— Eu entendo — murmura em resposta, brincando com os dedos de Claire. — Mas se eu cuidar de mim mesmo eu vou acabar machucando uma pessoa que eu gosto... Que eu amo.
Claire franze as sobrancelhas, subitamente entendendo do que isso tudo se tratava.
— Não pode mais ter medo de fazer o que acha certo.
— Eu não...
— Você não é um mauricinho que só se preocupa com seu status, você só quer provar o seu valor... Eu conheço você. Você não é como seu pai.
Rafe ergue seus olhos até os de Claire, se sentindo um pouco confuso com suas palavras. Como se a garota estivesse dentro de sua mente e pudesse ver cada uma de suas preocupações que envolviam seu pai. Ele se sentia ameaçado, acuado, com medo... E de alguma maneira Claire parecia entender perfeitamente a origem disso.
— Espera... Por que...?
— Eu sei que está falando do seu pai — a garota admite, com um sorriso. — Eu te conheço, esqueceu?
Rafe não consegue encara-la enquanto a abraça, a apertando contra ele e deixando seu cheiro entrar por seu nariz. Claire fazia com que seus problemas parecessem pequenos só por ele saber que ela estava ali, bem ao seu lado, pronta pra apoia-lo em qualquer situação. Ele nunca havia se sentido dessa maneira... Tão compreendido, tão confortável, tão em paz.
Conforme as horas passavam Claire sentia o peso de uma tempestade interna que ameaçava cada vez mais seu equilíbrio. Sempre que pensava em Rafe... O pensamento vinha acompanhando de um calor afetuoso aquecia seu coração, mas junto com ele vinha uma agonia persistente, quase insuportável. Como se todo o futuro do garoto estivesse amarrado a presença maligna de Ward. Ela queria protegê-lo, queria vê-lo feliz, vê-lo livre de todas as amarras que o mantinham preso em uma vida que parecia uma sombra do que ele merecia. E ela sabia, com uma certeza incômoda, que enquanto Ward estivesse no caminho, essa felicidade seria impossível.
Derrubar Ward, afastá-lo de Rafe, poderia trazer alívio e liberdade a ela, mas o que isso implicaria para ele? Será que isso o faria feliz?
Claire só consegue imaginar que o lugar de Ward era em Guadalupe... Bem longe dessa ilha e longe do filho, incapaz de machuca-lo como sempre fazia. A garota encara a tela de seu celular com o endereço enviado por Javert, endereço que ela mesma havia pedido para que ele conseguisse. Ela encontraria Ward lá e o convenceria a sumir de vez da vida de todos eles. Custe o que custar.
A garota caminha pelo antigo galpão de pesca, completamente abandonado, com passos lentos e firmes. O lugar cheirava a peixe podre e água salgada e estava repleto de materiais de pesca e construção, fazendo com que a garota torcesse o nariz conforme se aproximava. Ward estava lá, sentado virado pro mar em uma cadeira de balanço, encarando o final de tarde que se formava no horizonte. O barulho de passos chama a atenção de Ward, que se põe de pé imediatamente ao perceber a presença da enteada.
Ele tira o boné de sua cabeça, revelando seu olhar um tanto surpreso pela visita inesperada.
— Eu sabia que te encontraria aqui — Claire murmura, cruzando os braços.
— Claire?
Ela sorriu levemente, mas não havia calor naquele sorriso. Ward nunca havia sido sua pessoa favorita e a cada descoberta que a garota fazia sobre seu padrasto, seus sentimentos por ele ficavam ainda piores.
— Oi, Ward. Tudo bem?
Não é nenhuma surpresa quando Ward sorri, amargamente.
— Olha só, minha doce enteada. Admito que não esperava sua visita hoje.
A expressão que surge no rosto de Claire deixa claro que a presença dele não lhe trazia qualquer prazer.
— Eu com certeza não queria ver você, mas as circunstâncias me trouxeram a esse fim de mundo — a garota resmunga, fazendo uma careta enojada ao olhar o ambiente em que estava. — Não dava pra arrumar um lugar melhor?
Ward estreitou os olhos, desconfiado.
— Você quer alguma coisa — ele disse. Não em tom de pergunta, era uma completa afirmação.
Claire cruzou os braços e ergueu uma sobrancelha, implacável. Ela tinha vindo aqui para resolver o problema e não sairia sem que isso acontecesse.
— E eu geralmente consigo o que eu quero — rebateu, se aproximando de Ward. — Quero que vá embora.
Ward soltou uma gargalhada, irônica e dura.
— O Rafe te mandou vir aqui?
— O Rafe nem sonha que eu estou aqui — admite, se aproximando ainda mais. — Vai ser nosso segredo, certo?
Ele a encarou, tentando sondar suas intenções.
— O que pretende com...
Antes que pudesse completar a frase, ela o interrompeu, a voz cheia de desprezo.
— Não está cansado de destruir a vida de todos em volta de você? — questiona, aumentando o tom de voz. — Da Sarah, da Wheezie, minha mãe... Vivendo como fugitivas por conta dos seus pecados, roubando cervejas para não morrer de sede.
Ward se inclinou para frente, com uma expressão amarga no rosto. Ele sempre soube que Claire era uma garota petulante, mimada, que se achava capaz de tudo mas é claro que sua capacidade de confronta-lo era uma surpresa e tanto.
— E o que você sabe sobre mim? Viveu enfurnada na sua bolha parisiense, ignorando sua mãe como se ela fosse algum tipo de praga.
— Minha relação com minha mãe não é da sua conta.
Ward deixou escapar um sorriso de escárnio.
— Mas a minha com meus filhos é da sua? — ele rebate, aumentando seu tom de voz. — Eu estou tentando consertar as coisas!
Claire deu um passo à frente, encarando-o com firmeza. Ward era como o filho, um tanto explosivo e egocêntrico, capaz de qualquer coisa para ter o que quer. Tudo o que a garota precisava fazer era provoca-lo, até que ele perdesse sua cabeça... Não iria demorar.
— Só com a Sarah, certo? Mas e o Rafe? Tem semanas que vivo com ele naquela casa e tudo o que eu vi foi um garoto tentando tomar as rédeas da própria vida. Ele consegue a cruz, e você tenta tirá-la dele; ele começa uma vida, e você ameaça tomá-la... O que pretende com isso, Ward? Tem medo de que ele seja um homem melhor que você? Tem medo que ele consiga aquilo que você jamais conseguiu?
Ward cerrou os punhos, o olhar cheio de ira.
— Deixa eu te dizer uma coisa. Eu sou o rei daqui e eu vou conseguir de volta o que é meu, não importa o que custe.
Claire balançou a cabeça, desdenhosa.
— Até mesmo se custar a felicidade do seu filho? — gritou, erguendo as mãos em descrença. — Você pode ter qualquer vida, em qualquer lugar...
— Ele só está livre por minha causa! — Ward grita em resposta. — Toda a vida que ele tem é graças a mim! Você acha que o Rafe tem condições de construir alguma coisa? Ele é instável! Ele destrói tudo que toca!
Claire o observava, impassível. Ela o odiava. Odiava sua incapacidade de ver o quão bom seu filho tentava ser, o quanto Rafe se esforçava para ser visto por ele.
— Nós dois sabemos que o Rafe não tem nada a ver com sua escolha de voltar pra essa ilha. Tudo pra você sempre foi sobre a Sarah, as vontades dela, seus caprichos. Você jogaria a Wheezie e o Rafe numa fogueira se isso fosse fazer a Sarah feliz.
Ward a olhou, furioso, com um misto de desprezo e ressentimento.
— Você é igualzinha ao seu pai. Acha que pode tudo.
— Na verdade, nós temos certeza, porque não nos achamos os reis do mundo só por ter dinheiro nessa ilha patética e minúscula — rebate, avançando na direção dele. — Eu poderia comprar você e sua vida na porra do meu cartão de crédito! O que eu quero saber, Ward, é o que vai fazer a respeito disso?
Ward estreitou os olhos, a voz escorrendo veneno.
— Ele matou a xerife! Não eu.
Claire não recuou.
— Nós dois sabemos que ele fez isso por você, e, pra falar a verdade, isso não faz de você uma pessoa melhor. Está bem longe disso.
Num gesto impulsivo, Ward avançou sobre ela, segurando-a pelos ombros com força. Claire manteve-se firme, seu olhar desafiador cravado no dele. Ward queria acabar com ela, acabar de uma vez com qualquer um que se metesse em seu caminho, tudo o que ele via na sua frente não era a filha de sua esposa e sim uma pedra no seu sapato.
Claire sorri, negando-se a fazer careta por mais que o aperto de Ward em seus ombros machucasse.
— O que você vai fazer? — ela questiona, sentindo o ódio esquentar seu rosto. — Arrumar mais um corpo pra desovar? Eu acho que não... Sabe por quê? Porque você não tem essa coragem.
O rosto de Ward se contorceu de raiva. Ele afasta suas mãos do ombro de Claire, as levando até o pescoço da garota. Claire perde todo o ar conforme encarava os olhos violentos de seu padrasto, com suas pupilas dilatas, expressão animalesca. Suas costas batem violentamente contra a parede enquanto Ward a estrangulava, aplicando toda sua força contra o pescoço da garota, força o suficiente para tira-la do chão.
Tudo que ela via era Rafe, por trás das íris escuras de seu pai, um garoto feliz sem ter que viver nas sombras de Ward.
— E o que você vai fazer a respeito? — Ward indaga, observando com satisfação enquanto os olhos de Claire se enchem de lágrimas. O rosto da garota estava vermelho, quase roxo, e isso o enchia de prazer.
Ela força seus lábios a se mexerem.
— Escolher... ele.
Sua mão alcança a lateral de sua calça num movimento rápido. Ela retira a arma destravada que havia levando consigo e a aponta contra o peito de Ward, atirando três vezes. Os dois caem no chão.
Claire tomada por adrenalina mal consegue forçar o ar a entrar em seus pulmões, permanecendo de bruços enquanto se recuperava. É prazeroso quando o ar chega ao seu cérebro, permitindo que ela voltasse a raciocinar. A garota se vira na direção de Ward, observando seu corpo estirado no chão, rodeado por uma poça de sangue, com seus olhos azuis a fitando como se a julgasse por todos os seus pecados.
Morto. Como a porra de um milagre.
Vários minutos se passam até que Claire consiga se levantar, sentindo seu pescoço latejar. Ela se equilibra com a arma em mão, tentando se afastar de Ward enquanto cambaleava para longe de todo aquele sangue.
Claire tira seu cabelo do rosto e posiciona a arma na lateral de sua calça, se aprontando para sair dali com a mesma calma em que havia entrado. Ela se vira para Ward, dando mais uma boa olhada em seus olhos arregalados.
— Xeque-mate, cuzão — ela murmura, sentindo sua garganta arranhar com cada sílaba.
E então segue seu caminho para longe dali.
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