65 - Meu Ponto de Paz
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20 de Abril
Depois de uma manhã cheia de risadas pelas ruas de Milão, seguida de um almoço animado com as meninas do time, Petra e Julia voltaram para o hotel em um silêncio confortável. O dia havia sido leve, mas ao mesmo tempo, trazia consigo uma sensação de cansaço emocional para Petra, uma que Julia começava a perceber mais profundamente. Elas não comentaram nada durante o trajeto de volta, mas Julia sabia que algo estava se passando dentro de Petra.
Assim que chegaram ao quarto, Petra jogou-se na poltrona próxima à janela, enquanto Julia foi direto para o banheiro. O som da água correndo no chuveiro preenchia o silêncio do ambiente, mas Petra parecia alheia ao mundo ao seu redor. Seus olhos fixaram-se na vista da cidade, mas não viam nada além de memórias. O sol estava começando a se pôr, tingindo o céu de um laranja suave, mas tudo o que Petra sentia era uma tristeza silenciosa que havia se tornado sua companheira desde a morte da mãe.
Minutos depois, Julia saiu do banheiro, enrolada em uma toalha, secando os cabelos com outra. Ela parou por um momento, observando Petra em sua posição familiar, em frente à janela, imóvel, os olhos perdidos. A visão de Petra assim, absorvida em seus pensamentos, era uma cena que Julia começava a reconhecer, mas que ainda a incomodava. Havia algo de intocável em Petra nesses momentos, como se ela estivesse em um lugar onde ninguém podia alcançá-la.
— Você adora ficar assim, olhando o nada, não é? – brincou Julia, tentando aliviar o peso no ar.
Petra riu levemente, sem desviar os olhos da janela, mas a risada não atingiu seus olhos. Julia percebeu de imediato. Ela conhecia Petra o suficiente para saber quando algo estava fora do lugar. Caminhou até a cama, sentando-se na beirada, ainda secando os cabelos, mas sem tirar os olhos da morena. Havia uma melancolia no rosto de Petra, algo que Julia sabia ser mais do que apenas o cansaço físico.
— Está pensando nela? – perguntou Julia, sua voz suave, quase um sussurro, como se não quisesse perturbar o momento, mas ainda assim precisasse trazer a verdade à tona.
Petra não respondeu imediatamente. Ela continuou olhando pela janela, como se procurasse uma resposta nas nuvens, no horizonte, em algum lugar distante. Finalmente, depois de um longo suspiro, ela falou, sua voz baixa e carregada de emoção.
— Vê-la partir daquele jeito... – começou Petra, sua voz trêmula. — É uma dor que nunca vai passar, Ju. A gente acha que com o tempo vai melhorar, que a dor vai diminuir, mas ela só muda de forma. Ela fica mais... silenciosa, mas está sempre aqui. Como uma sombra.
Julia sentiu o peso das palavras de Petra como se fossem suas. Ela se levantou da cama e caminhou até a janela, parando ao lado de Petra, sem dizer nada por um momento. Ela sabia que aquele era um assunto delicado, algo que Petra raramente falava, mas quando o fazia, Julia sabia que era importante estar ali, simplesmente presente.
— Sei que é difícil – começou Julia, com cautela, escolhendo as palavras. — Mas parece que, de algum jeito, você está encontrando uma forma de seguir em frente, mesmo que ainda esteja doendo.
Petra virou-se para olhar Julia, seus olhos cheios de uma tristeza profunda, mas havia também algo mais. Talvez fosse aceitação, talvez fosse a compreensão de que, apesar da dor, ela ainda estava ali, vivendo, continuando. Julia, mesmo sem palavras, estendeu a mão e segurou a de Petra.
— Seguir em frente... – Petra sussurrou, quase para si mesma. — É estranho, não é? Como se seguir em frente significasse esquecer, e eu nunca quero esquecer dela.
— Você nunca vai esquecer – afirmou Julia, apertando a mão de Petra. — Isso não é esquecer, amor. É... aprender a viver com a falta, com a ausência. E continuar amando, mesmo que a pessoa não esteja mais aqui fisicamente. Mas sabendo que ela ainda continua sendo uma parte sua.
— Às vezes me sinto tão egoísta... – confessou Petra, sua voz embargada. — Como se eu não devesse estar aqui, jogando vôlei, me divertindo, enquanto ela... enquanto ela não está mais aqui. Como se eu estivesse traindo a memória dela.
Julia sentiu um nó na garganta ao ouvir aquilo. Ela sabia que a dor de Petra ia além da perda. Havia uma culpa persistente, uma sensação de que ela não tinha o direito de continuar vivendo sua vida plenamente.
— Petra, vocês duas passaram por muitas coisas, mas sua mãe te amava mais do que qualquer coisa nesse mundo, eu tenho certeza disso, sei que tiveram momentos em que você sentiu uma certa mágoa por tudo que passou e, apesar disso, você também a ama. E eu tenho certeza de que a última coisa que ela iria querer é que você parasse de viver por sentir culpa pelas coisas que já aconteceram – disse Julia com firmeza, mas sua voz era suave. — Ela estaria orgulhosa de você. Pelo que você conquistou, pelo que você ainda vai conquistar. O que você está fazendo, seguir em frente, jogar, viver... é uma forma de honrar a memória dela, de fazer o que ela não pôde. Não de traí-la.
Petra ficou em silêncio por um longo momento, suas emoções se misturando enquanto olhava nos olhos de Julia. Ela sabia, no fundo, que Julia estava certa. O que ela mais desejava era ver Petra feliz, realizada. Mas, mesmo sabendo disso, a culpa e a tristeza ainda eram sentimentos difíceis de conviver.
— Você tá certa... – admitiu Petra, sua voz fraca, como se finalmente estivesse soltando uma parte do peso que carregava. — É difícil, mas talvez eu consiga aceitar isso aos poucos.
Julia apenas assentiu, sem pressioná-la a continuar. Ela sabia que, para Petra, cada passo nesse caminho era lento e doloroso, mas também sabia que estar ali, ao lado dela, já era uma forma de ajudá-la a seguir em frente.
— Você já pensou em falar com alguém sobre isso? – perguntou Julia, cautelosa. — Tipo, um terapeuta? Não pra resolver tudo de uma vez, mas talvez pra ajudar a processar... sabe, você passou por tanta coisa em tão pouco tempo. E levando em consideração os últimos anos...
Petra suspirou, passando a mão pelo cabelo de maneira nervosa.
— Já pensei, sim, Ju. Mas sempre fico adiando. Acho que tenho medo de que, se eu falar em voz alta, tudo isso vai ficar ainda mais real.
— Eu entendo. Mas falar pode ser justamente o que você precisa. Guardar tudo só pra você... acaba pesando mais – disse Julia, sua voz cheia de preocupação genuína.
Petra olhou para Julia, absorvendo aquelas palavras. Havia uma verdade nelas, uma que Petra sabia, mas ainda não estava pronta para enfrentar totalmente.
— Talvez eu deva tentar – disse Petra finalmente, sua voz baixa, mas com um tom de resolução. — Acho que estou pronta pra... pelo menos, tentar.
Julia sorriu, um sorriso suave e encorajador, e apertou a mão de Petra mais uma vez, ela percebeu que adorava segurar a mão da morena sempre que tinha a chance, esse pensamento a fez sorrir ainda mais.
— E eu vou estar aqui com você, em cada passo – prometeu Julia. — Sempre que precisar.
As duas ficaram em silêncio por um tempo, apenas olhando a vista da janela enquanto o sol terminava de se pôr, pintando o céu com as cores do crepúsculo. O momento era tranquilo. Era como se, naquele instante, Petra estivesse começando a aceitar a dor, não como uma inimiga, mas como parte de sua jornada. E Julia, ao seu lado, era o porto seguro que Petra sabia que sempre poderia recorrer.
— Você sabe que é meu ponto de paz, né? – disse Petra, quebrando o silêncio com um sorriso fraco, mas genuíno.
Julia virou-se para ela, seus olhos brilhando com um misto de carinho e alívio.
— E você, minha tempestade mais bonita – respondeu Julia com um sorriso travesso, mas cheio de amor.
Petra riu, um som leve e genuíno, e puxou Julia para perto, envolvendo-a em um abraço apertado. Por um momento, as palavras não eram necessárias. A conexão entre elas, o amor e a compreensão, eram suficientes.
Quando finalmente se afastaram, Julia olhou para Petra com um olhar determinado.
— Agora, que tal você começar a se arrumar pra irmos enconrtar Marco e Antonella? Acho que você precisa de uma boa comida italiana pra continuar esse processo de cura – brincou ela, tentando aliviar o clima pesado.
— Comida italiana sempre ajuda – respondeu Petra, sua voz mais leve, enquanto as duas começavam a se preparar para sair.
Quando Petra estava entrando no banheiro, Julia riu e brincou — Antonella vai te mimar, com certeza deve estar preparando as comidas favoritas da... como ela te chama mesmo? Ah, lembrei. Mia bambina.
Petra saiu do banheiro com uma expressão de fingida indignação.
— Tá me chamando de mimada, Isabelle?
— Tá me chamando de Isabelle, Elizabeth – respondeu Julia, provocando, enquanto se aproximava de Petra. Com um sorriso travesso, ela roubou um beijo e virou para escolher uma roupa.
Petra a segurou, passando o braço pelos ombros de Julia.
— Que isso, Bergmann? Beija direito.
Julia, sorrindo, fez o que Petra pediu, inclinando-se para dar um beijo mais profundo.
— Será que vão perceber se demoramos um pouquinho pra chegar? – brincou Petra, com um brilho travesso nos olhos.
— Nada isso, mocinha. Não vamos deixá-los esperando – disse Julia, ainda segurando a cintura de Petra.
— Ah, amor. Só um pouquinho – Petra fez uma voz chorosa que arrancou uma risada de Julia.
— Viu só? Mimada. Estou indo me arrumar, e você não demora nesse banho – respondeu Julia, piscando para Petra enquanto a empurrava para o banheiro de novo.
Petra sorriu, um calor confortável preenchendo seu peito. Os momentos com Julia traziam um pouco de normalidade à sua vida, e enquanto se preparava, ela não conseguia deixar de pensar em como aqueles pequenos instantes ao lado da ruiva a ajudavam a enfrentar os dias mais difíceis.
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oi vidas
saudades de quando eu conseguia escrever mais de um capítulo no dia 😭
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