ɪɪɪ


Eu estou vivendo uma ilusão? Eu quero fugir. Eu sinto que estou perdendo o controle. Talvez eu devesse me deixar ir, porque isso é tão previsível.
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─ Cadê você?


Sua voz baixa e grave entregava seu descontentamento, sobrevoava com Vhagar pela baía tentando se convencer que encontraria algo ali.



Alguém.


Daor, daor, daor... - Suspirou fundo. Qogralbar, skoriot issi ao? - Disse mais para si tentando se consolar. ─ Você tem que estar em algum lugar.


Seus ombros tensionaram quando não obteve nenhum sinal. Nem o mais mínimo possível.


Comandou pela última vez naquela tarde fria para Vhagar voltar, não tinha esperança


Se foi.


Se foi.





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Alicent andava de um lado para o outro, roendo o pouco das unhas que ainda restavam e as peles mortas. Otto a olhava com desdém, vez ou outra mudando a direção para Helaena que bordava algo, ou Aegon que estava esparramado pela cadeira de madeira com puro tédio estampado no seu rosto.


O Hightower mais velho revirou os olho, quase ficando sem paciência para aquela espera maldita.


Foi quando dois guardas que estavam de sentinela em frente a porta da sala dos conselheiros anunciaram a chegada do segundo príncipe mais velho que a rainha se acalmou. Arrumou suas vestes e foi até seu garoto, segurando ao redor de seus braços e sorrindo calorosamente em sua direção.


Ele estava molhado, frio e quase pálido. O chão começava a ficar do seu mesmo estado, mas isso não importava, apesar da roupa estar desconfortável, quase fazendo-o sufocar.


Mas Aemond não saberia dizer ao certo se era culpa das roupas molhadas ou culpa das terríveis lembranças.


─ Graças aos sete você está aqui, querido. - Finalmente soltou aquela respiração tensa que guardava no seu peito. ─ Estava tão preocupada.



Aemond não falou nada, reprimindo o gosto amargo ao escutar novamente sobre as preces da sua mãe. Permaneceu em silêncio e gostaria que continuasse assim.


─ Como foi com Lorde Baratheon em Ponta Tempestade?



As primeiras coisas que vieram na sua cabeça foram apenas os flashbacks de horas atrás.


Vhagar indo atrás de Arrax.


Vhagar destroçando aquele pequeno dragão com medo.


Lucerys caindo da maior das alturas.


Lucerys morrendo com seu dragão.


─ Aemond.


Seu avô tirou-o da sua própria prisão mental.


─ A casa Baratheon jurou lealdade a Aegon quando ele for coroado.


─ Oh! Que notícia excelente. - A rainha conseguiu suspirar aliviada. ─ Minhas preces não foram em vão.



─ Não, mãe...


─ Você não está esquecendo de nada, Aemond?


A mão do falecido rei levantou. Caminhou até o príncipe e ergueu o pequeno papel com a escrita fresca.


─ O que é isso, meu pai?



─ Oh, bem... por onde devo iniciar? Talvez pelo fato de que meu neto agora é um assassino de parentes?



O falatório do homem mais velho surpreendeu todos da sala, Aegon levantou o olhar para o irmão com os cílios arregalados, bateu as duas mãos na mesa deixando de escanteio a cadeira de madeira.


Ele sorriu.


Ele deu uma risada escandalosa.


─ Não me diga que ele...


─ Você foi atrás de Lucerys Velaryon com Vhagar, você foi atrás de um garoto, do filho de Rhaenyra Targaryen com o maior dragão existente. Você assassinou o sangue da sua irmã! - Otto jogou o papel no seu rosto, o segundo filho mais velho desviou o rosto. ─ Você estava com a cabeça aonde, Aemond?



─ O que... I-isso não é verdade, não é, meu filho?



Percebendo que ele não respondeu, desesperadamente Alicente segurou nos seus braços com força, estava sentindo o desespero subir por suas veias, os cabelos desengrenhados, a face vermelha e no ponto para ter um colapso, ela olhou no único olho de seu filho com horror.


─ Você não fez isso, não foi?


Mais uma vez, silêncio.


Silêncio.


─ ME RESPONDA, ME RESPONDA QUE NÃO, AEMOND! - A Rainha exasperou, soltou bruscamente o braço do filho e se afastou colocando a mão na cabeça. Sor Criston Cole tentou se aproximar mas ela o impediu com um acenar de mãos. ─ O que você fez, o que você fez...


Balbuciou para si mesma, colapsando aos poucos sentindo as lágrimas descerem. Voltou seu olhar para o filho que se mantinha distante, sem capacidade de gerar ao menos uma frase, se aproximou e levantou a mão, pronta para dar um tapa em seu rosto e assim o fez.


Aemond sentiu a pele arder, apertou o punho e engoliu a seco.


Foi a primeira vez que sua mãe olhava para ele como costumava olhar para Aegon.


Com decepção.


Foi a primeira vez que ela bateu nele.


─ Nossa chance de termos um acordo com paz se foi, a última esperança se foi, Aemond. E é tudo culpa sua.



─ Mãe, você quer que eu pegue o trono de minha irmã e acha mesmo que não teríamos guerra de qualquer maneira?



A mulher olhou mortalmente para o filho mais velho que tampouco se importou.


Sem mais confusões, ela saiu da sala sem ao menos olhar para Aemond. Seu avô, por fim, virou-se para olhá-lo, também uma última vez.



─ Você só perdeu um olho. Como pode ter ficado tão cego?



Dito isso, se foi, assim como o guarda da Rainha.


─ Que show, irmão. - Aegon se aproximou e passou o braço por seus ombros. ─ Nunca achei que fosse sentir orgulho de um... uma pessoa igual você.



Ele deu uma risada alta, voltando até seu vinho.


─ Vamos sair hoje pela noite, vamos comemorar! Que o bastardo esteja queimando nas maiores chamas do inferno agora. - Encheu um dos copos livres com o líquido vermelho e o colocou a força na mão alheia, mas foi em vão já que o mesmo jogou o corpo para longe com força. ─ Que carismático.


Se afastou.


Helaena estava calada, mas murmurando sempre.


Ela levantou, Aemond a seguiu com o olhar até que a irmã parou a sua frente.


─ Você sempre estava em lamúrias pelo olho de nosso sobrinho, o olho que ele devia  a você, agora você o matou, e nem ao menos conseguiu o olho dele no processo.


Ela estava amarga, era a primeira vez que Aemond via ela assim.


Foi doloroso.



─ Muito bem, irmão. Parabéns pela conquista, afinal.


Seu olhar era sombrio, Helaena sentiu o coração doer quando escutou a confissão.



Seu sobrinho etava morto.


Eles nunca se falaram.


Mas ela sentiu a notícia como se uma faca estivesse sendo cravada em seu peito.


Ela também fora embora.


Ele desabou na cadeira, sentindo-se sem forças.


─ Não desobedeça seu futuro rei, vamos comemorar. Isso requer uma grande festa, de fato.


Aemond não negou.


Mas não aceitou.





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O salão fedia.


Não ao mal odor, mas fedia.


As mentiras, as pessoas sem caráter, pessoas sem escrúpulos.


Pessoas iguais a ele, mas que ele se recusava colocar em comparação.


Os presentes eram todos apoiadores de Aegon, eram silenciosos, mas o irmão tinha um pequeno triunfo de pessoas que o apoiavam. Não podiam se mostrar porque seriam traidores da coroa, mas com o rei morto, Porto Real estava instável.


Mais do que já era.


─ Não há muito do que citar, ergam suas taças e glorifiquem o assassino de Lucerys Velaryon Strong, o bastardinho da princesa Rhaenyra.



Escutando os gritos e vendo as gotas de vinho caírem no piso, ele tentou, tentou como o inferno se sentir tão glorioso como seu irmão o fez parecer.


E enquanto via aqueles rostos tão humilhantes o desejando parabéns, elas haviam voltado.


As vozes.


Ressoando na sua cabeça como um disco arranhado.


Por que?



Por que você fez isso?


Monstro.


Assassino!


Assassino de parentes!


Você deveria morrer.


Morra, morra, morra...


─ Pelo menos tente sorrir.


Aegon disse sentando novamente ao seu lado.


─ Estou agradecido.


─ Hum... - O mais velho riu. ─ Se você diz.


Aemond não respondeu, apenas olhou para frente vendo todos aqueles homens sorrindo e conversando animadamente. Quis curpir na cara de cada um.


Ele se virou para a lareira tentando se livrar da sensação fria do seu corpo, por mais que já tivesse se secado da tempestade.


─ Você se arrepende mesmo ou só quer se convencer disso para se sentir melhor? Acho que isso é pior que a culpa, irmão.


Mais uma vez, ele não teve capacidade de responder, apenas olhou para as chamas fortes, cada vez mais intensas. Aegon riu alto e voltou com a atenção para seu corpo de vinho, mas alternando o olhar no irmão.


─ Deixa de tolice, você gostou da sensação de ter matado o bastardo. - Deu um gole no líquido alcoólico. ─ Fomos criados pelos resquícios da dor, Aemond. Somos podres por dentro, nosso destino é causar desgraça. É isto. É de ser assim.





O mais novo sentiu seu irmão se aproximar e ficar atrás de si pela poltrona.


─ Não devemos nos importar com ninguém a não ser nós mesmos.


Dito isso, ele se afastou, Aemond tomou um gole do vinho tentando ignorar o gosto mais amargo que o normal descendo por sua garganta, com muita dificuldade também ignorando o nó se formando no estomago.


Eles falam que ele deveria estar feliz.


Mas estava tão infeliz.


O desconforto tomando conta do seu âmago.


Aemond se retirou até seus aposentos e se preparou para dormir.








Mas ele não dormiu aquela noite, na calada da madrugada o príncipe estava sentado em frente ao largo espelho, olhando para sua pedra azul relusente através do reflexo.


Por que?



Por que você fez isso?


Monstro.


Assassino!


Assassino de parentes!


Você deveria morrer.


Morra, morra, morra...

Morra, morra, morra...

Morra, morra, morra...



─ Por que?


Aemond quebrou o espelho, o único do quarto a fim de se desfazer da imagem que viu através dele.


─ Me deixa em paz. - Múrmurou consigo mesmo vendo sua mão sangrar, os cacos espalhados. ─ Eu queria você morto.



─ Não, não queria.



A imagem distorcida continuou se aproximando.


─ Se quisesse, você não estaria deixando a culpa o consumir, tio. Eu ao menos sou real, é apenas uma façanha dos seus arrependimentos.



─ Sim, você não é real. - Repetiu mais pra si mesmo. ─ Não é.


Enfiou os dedos nos fios que já estiveram perfeitamente arrumados naquela noite.



─ Mas continuo sendo recriado por você, apenas para vocêse afogar nas próprias mentiras. Espero que nunca volte a superfície então.

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