Parte 2 - Um Amor Para Recordar

Chapter ²⁄₂
1400 words

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– Agora, Jackie – Falei. –, tópico 7: “Alguma memória marcante com ele antes de Watkins Glen, 73”.

     O senhor de idade olhou para o teto, pensativo, logo se voltando para a câmera novamente.

     – Como me esquecer daquele passeio que fizemos nas Cataratas do Niágara, entre o GP do Canadá e o dos EUA? Foram, com certeza, dias muito legais.

     E como em todas as vezes que trocávamos de assunto, me afundei em minhas mais doces recordações... de quando ele me chamava de mon cherie, dos beijos doces ao som das imensas quedas d’água daquele lugar, meu rosto refletido em seu óculos escuros quando ia abraçá-lo, das vezes que eu brincava sobre estar cansada apenas para François me carregar no colo em alguns momentos.

     Sentia tanta falta daqueles tempos que, toda vez que me lembrava, via o quanto era feliz. E, de repente, notava meu olhos marejarem.

     Estava chegando a hora.

     – Watkins Glen tinha tudo para ser um bom grande prêmio. Meu último titulo já estava garantido, o que nos dava bastante segurança. Ken Tyrrel estava ciente que eu iria pendurar as chuteiras após aquela corrida, e já tínhamos planos quanto a quem iria tomar as rédeas – Jackie fez uma pausa, se recompondo. – Eu tinha convidado Ronnie Peterson e François para um jantar, na véspera dos treinos classificatórios. Foi aí que eu disse à eles que iria aposentar, apenas para os dois. E, depois de Ronnie ir embora, nós fomos em um cantinho e...

     – Maddie, preciso te contar uma coisa.

     Eu estava deitada no sofá, apreciando um pouco da programação de TV estadunidense, quando ele entrou no quarto de hotel.

     – O que foi, Francis?

     Ele se sentou, eu logo colocando minha cabeça em seu colo.

     – Jackie vai se aposentar após esse GP. Mas olhe, ele disse que deixou conversado com o Ken que eu deveria ser promovido à primeiro piloto.

     Me levantei, num salto.

     – I-isso é sério!?

     – Sim! Incrível, não é?

     Abrimos uma garrafa de champagne para comemorar as boas novas, porém, a felicidade só durou mais algumas poucas horas.

     Logo antes dele entrar no carro naquele fatídico 6 de outubro de 1973, lembro-me de quando achamos um armário de vassouras e bem... nos pegamos lá dentro. Não fizemos nada demais, mas mesmo assim eu gostava de repassar aqueles momentos na minha mente, pelo simples motivo de que aquela havia sido uma das últimas conversas que tive com Francis.

     E sobre o que estávamos falando? O tema que seria o mais doloroso para mim depois daquele dia; o futuro que quase tivemos.

     – Você é o amor da minha vida – Passou as mãos por meus cabelos. – Nunca tive tanta certeza quanto tenho agora.

     – Eu também, mon amour – Me aconcheguei em seu peito, sentindo o traje da Tyrrel roçar em mim. – Eu vou te amar para sempre

     Aquela frase reverbera em meu coração toda vez que me recordo dele. Até os dias de hoje, sei que aquilo era verdade. Não era apenas paixão, mas sim algo mais forte, um vínculo verdadeiro que nunca poderia ser quebrado, no máximo, enfraquecido... mas que nunca deixaria de existir.

     Pensava que nada poderia nos separar até lhe dar um último beijo, antes dele entrar em seu carro. O que deveria ser apenas mais uma sessão de classificação havia se tornado o dia mais trágico de minha vida inteira.

     – O que está acontecendo? – Eu me perguntei enquanto via todo aquele alvoroço, preocupada.

     Haviam anunciado, nos alto-falantes, que um carro da Tyrrel havia batido. Logo pensei em Chris Amon, que estava por conta do terceiro monoposto da equipe naquele fim de semana. Na época, era comum alinhar mais de dois pilotos no grid em algumas situações.

     – Um acidente nos “esses” – Alguém me respondeu. –, mas não sei com quem foi, moça.

     Abri uma garrafa de Coca-Cola (uma daquelas de vidro. Não se usava muito plástico para essas coisas) e me sentei no chão, perto da geladeira privativa do box, para não atrapalhar o fluxo intenso de pessoas indo e vindo em virtude daquele acontecido.

     Ainda com o refrigerante na mão, decidi que seria melhor sair dali e perguntar novamente sobre a situação. No momento em que fiz isso, vi um piloto correndo pela pit-lane, aos prantos. Soube de imediato que era José Carlos Pace, o aniversariante do dia, só pelas cores de seu uniforme.

     – Moco!? – Fui atrás dele, o chamando pelo apelido.

     O piloto da Surtees se virou, as lagrimas descendo pelo o seu rosto como um rio. Me preocupei ainda mais.

     – O que está acontecendo?

     – P*** m****! – Exclamou, se descabelando. – Eu...

     Logo em seguida, vi Jackie estacionar seu carro nos boxes. Quando notei que ele jogava seu capacete branco e xadrez fora com brutalidade, percebi que havia algo de errado e fui correndo para saber o quê.

     O escocês estava cobrindo seu rosto com as mãos, chorando desesperadamente e em choque.

     – Jackie?

     – Que inferno! – Berrou, se debatendo no carro. – Não, não, não...

     Foi aí que uma falta de ar enorme tomou conta de mim, um sentimento de agonia e aflição deixando meu coração na mão e as pernas bambas. A garrafa de Coca escorregou, caindo no chão e se espatifando.

     – O François, e-ele... e-ele...

     Ao ouvir isso, me desmontei no asfalto quente da reta dos boxes, chorando de forma inconsolável. Foram minutos tão traumáticos que minha mente simplesmente os apagou da memória. Apenas me lembrava de rolar pelo chão enquanto algumas pessoas tentavam ajudar de alguma forma, e de quando eu e Jackie choramos abraçados durante, no mínimo, uns dez minutos.

     – Os fiscais nem abriram seus kits médicos porque dava para ver que ele estava morto – Gesticulou, tentando manter contato visual com a câmera. – Havia sido uma batida muito violenta, brutal. Quando cheguei no local, vi a maior parte dele no carro, junto com a cabeça. A outra estava no chão, perto do que restou da frente do monoposto. Foi a cena mais perturbadora que já vi na minha vida... ei, você está bem?

     – Sim, pode continuar – Funguei o nariz.

     – Eu sei bem o que é, Madeleine. Se quiser parar a entrevista para uma pausa, compreen...

     – Não, vamos terminar isso.

     Escutar Jackie falar sobre o acidente foi como se eu tivesse pegado uma faca e passado por cima daquela cicatriz, a abrindo novamente. Mas, eu sabia que relembrar tais coisas era necessário.

     Eu estava fazendo aquilo pelo Francis. Queria eternizar sua memória, mostrar quem era o rapaz doce e gentil por trás de toda aquela carnificina pela qual era, na maioria das vezes, conhecido.

     Valia a pena sofrer por ele.

     – Tenho que falar uma coisa – Stewart suspirou. – Talvez seja tarde demais para isso, mas sinto que deveria te contar.

     Fiquei curiosa, me inclinando na direção do ex-piloto, sentando na ponta da cadeira.

     – Posso falar em particular ou quer gravar?

     – Sim, sim... Conan, continue o vídeo.

     O rapaz bateu uma continência informal e sorriu, prestativo.

     – Logo na véspera do acidente, quando contei para Cevert e Peterson que iria me aposentar, meu colega de equipe me chamou para conversar em particular. O que aconteceu naquela hora foi o seguinte...

     Quis fechar os olhos e imaginar aquelas cenas, mas não conseguia tirar minha atenção dos de Stewart por nada naquele mundo.

     – Jackie – O moreno disse, se apoiando na parede enquanto acendia um cigarro. – Queria pedir sua opinião.

     – Para o quê, exatamente?

     Ele sorriu, de ponta à ponta.

     – Eu estava pensando em uma coisa, sabe? Como você entende bem disso, vim discutir.

     – Fale, meu amigo. Sou todo ouvidos.

     O francês tirou algo do bolso. Era uma caixinha preta de bom tamanho. No momento em que ele a abriu, revelando seu conteúdo, Jackie o abraçou.

     – François iria pedir sua namorada em casamento logo após a corrida ou, pelo menos, depois da conquista de uma pole position. Naquela noite, ele me mostrou o colar e o anel de solitário que daria para Madeleine. Fiquei muito feliz, mas sabemos que... nós sabemos o que aconteceu. Meu amigo me entregou o conjunto, para que sua companheira não o achasse na mala se ela vasculha...

     Desabei ali mesmo. Não consegui conter as lágrimas que desciam em meu rosto, muito menos o que sentia ao escutar aquilo.

     – Madeleine, ei – Jackie saiu do enquadramento da câmera e me abraçou, como fez no dia que Francis faleceu. – Ouh, vem cá. Por favor, me perdoe... pode chorar, isso...

     Fiquei em silêncio, processando tudo aquilo. Imaginei nós dois no altar, meu amado me fitando com aqueles lindos olhos azuis e sorrindo da forma mais meiga o possível. A igreja toda em festa após a troca de votos, a chuva de arroz, a lua de mel, os filhos que nunca havíamos tido.

     Por que nem todas as histórias de amor, por mais sublimes e intensas que sejam, não conseguem ter um final feliz?

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Um vídeo diretamente de Mônaco... aonde, presumo eu, ele deu "aquele"  pit-stop polêmico para fazer as necessidades fisiológicas que vimos na introdução.

A depressão que prometi estou entregando, né? Bem, eu não quis entrar muito em detalhes sobre o acidente do Cevert, porque realmente é algo pertubador. Porém, qualquer pesquisa no Google, você já consegue achar textos e mais textos sobre a situação que ocorreu com ele.

Um dia, Cevert admitiu à Jackie Stewart que fazia os esses em uma marcha diferente da que os outros pilotos usavam. Pelo o que Jackie constou ao ir no local, a combinação velocidade mais elevada + ondulações no asfalto foi um fator crucial para que a batida acontecesse. Porém, há outro divisor de águas nisso; foi encontrado vômito no capacete de François. Teria ele batido ao ter sua visão obstruída ou aquele ter sido uma espécie de reflexo pré ou pós mortem que ocorreu após o choque? Como telemetria era apenas uma palavra chique naquela época, escolho acreditar nesta última versão.

Bem, a história poderia bem acabar aqui, mas se lembram do final mais otimista que escrevi? Posto em breve. Porém, se quiser algo 100% angustiante, pronto!!! Acabou ksksksks. Não prometo que o fim ficou bom, mas eu tentei...

Até então, o que acharam? Curtiram? Devo trazer mais contos neste formato ou continuar só com as longfics? Me deem um parecer aí, pessoal. Quero ouvir vocês!!!

Tô matutando umas ideias aqui... que tal Monza 1978 no POV do Riccardo Patrese ou algo com o nosso querido Elio de Angelis!? Depois faço se este escrito tiver boa recepção.

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