◞ 𓍢 𝟬𝟮. O PASSADO
O ANO ERA 2012. Alice Kobayashi tinha por volta de seus 15 anos de idade, basicamente, o auge da adolescência. Conhecida por todos como "a filha do escritor maluco", não tinha amigos. Seu único amigo era o próprio irmão mais velho que, estranhamente, não era vítima como ela. A maioria dos alunos sempre ficavam longe para não ter sua imagem relacionada a garota ─ pois isso significaria ser atormentado quase todos os dias em forma de bullying. Seja ele psicólogo e às vezes, físico.
Apesar de todos os problemas, a Kobayashi era muito mais simpática naquela época. Interessada, curiosa, boa ouvinte e feliz. Seus hobbies favoritos eram escutar música, ler, assistir animes, escrever, desenhar, praticar esportes e outras coisas que poderiam ser motivo para iniciar uma conversa. No entanto, mesmo sem fazer nada com ninguém ou agir como uma verdadeira filha da puta, eles insistiam em seguir a monarquia e ignorar. Uma monarquia de cabelos longos, pretos, maquiagem e salto baixo, chamada Sakura Uzumaki.
Sakura Uzumaki, Yuno Yoruichi, Yagami Kurosaki, Himiko Kaneki e Shou Nakamoto eram os piores daquele colégio. Liderados pela riquinha mimada Uzumaki, outra garota e mais três garotos fechavam o clube mais arrogante, ruim e desprezível do Otonokizaka High School. E qual seu alvo principal? Alice.
Esperando que a primeira aula começasse, Alice caminhava pelo corredor de fora, que dava acesso a uma grande varanda para o pátio do colégio. Com seus fones de ouvido de fio, a garota escutava seus jpop e kpop da época. Dançava e cantarolava pelos corredores, ignorando todos aqueles idiotas que ela torcia para mais nunca ver na vida depois do colégio. O cabelo longo e com mechas loiras balançava para lá e para cá, sacudindo por causa de seus passos de dança na ensaiados.
Suas playlists era sempre aleatórias e com músicas de muitos estilos diferentes. Desde músicas extremamente agitadas, até aquelas mais depressivas. Dando a exemplo segundo atrás, quando estava escutando a música japonesa Shinunoga E-Wa de Fuji Kaze e agora, a nova sensação do momento, Gangnam Style, do rapper coreano Psy.
─ Areumdawo sarangseureowo geurae neo hey geurae baro neo hey... ─ Cantarolava pelo corredor, ensaiando os mesmos passos do clipe da musica. ─ Areumdawo sarangseureowo geurae neo hey geurae baro neo hey... ─ Apesar de nunca ter sequer feito uma aula, sua voz era doce e muito boa. ─ Jigeumbuteo gal ttaekkaji gabolkka...
De longe, uma figura masculina, alta e de mesma idade entrou no corredor. Trajando seu uniforme escolar, olhava para os lados, parecendo um pouco perdido. Mantinha o tempo todo a mão nos bolsos da calça de cetim, o que parecia ser uma mania, a julgar pela expressão física de conforto.
O garoto de cabelos pretos encarou o meio do corredor, dando atenção a Kobayashi que dançava sem perceber que estava sendo observada. Seus olhos percorreram o corpo da moça de cima abaixo, mas não com um olhar pervertido ou de quem tinha outras intenções. O que ele queria mesmo era acompanhar seus passos e tentam identificar qual música ela estava escutando. Deixou que um meio sorriso escapasse dos lábios, achando completamente engraçado aquela felicidade tão natural.
Aos poucos foi se aproximando na intenção de escutar seu cantarolar. Seus passos eram leves como os de um gato e mesmo com as botas pretas pesadas, não era possível notar sua presença de imediato. Ele transbordava calmaria, atenção e curiosidade, analisando cada movimento que Alice fazia. Cada passo, cada expressão, cada palavra que saia da sua boca. Chegou tão perto que finalmente pode identificar qual era a canção, já que, por não ligar muito para clipes musicais, não sabia de nenhuma coreografia. Então, seria impossível adivinhar.
─ Oppan gangnamseutail... gangnamseutail... ─ Cantou mais alto, imitando um dos passos mais famosos: o de fingir que estava cavalgando. ─ Eh, sexy lady o o o oppan gangnamseutail...
Embalada completamente pelo ritmo da música, seus pés se movimentavam cada vez mais rápidos. O fio do fone de ouvido balançando para lá e para cá, enquanto sua mão esquerda segurava seu precioso iPod que ganhou do pai quando fez aniversário no ano passado. A saia acima do joelho e a gravata listrada vermelha e preta acompanhavam o ritmo de seu corpo. Ainda no refrão e fazendo o passo mais famoso da atualidade, Alice girou, mas o que ela não esperava era dar de cara com um garoto.
Assustada, sem querer soltou o iPod. Seus os arregalaram e ela gritou como se acabasse de ter visto uma assombração. Todos do pátio olharam para a larga varanda do primeiro andar e observaram a cena. O garoto, que se manteve tranquilo durante a situação, salvou tanto o iPod de estilhaçar no chão, quanto a própria garota de cair para trás quando, pela grande sorte que ela tinha, escorregou nos próprios passos.
Ele manteve suas mãos respeitosamente no meio das costas dela e analisou mais uma vez para ver se estava tudo bem. O coração dos dois palpitaram como um veículo de formula 1, entregando que aquela cena havia proporcionado um certo nervosismo. Alice, de olhos arregalados, engoliu seco. O rapaz, de olhos gentis, sorriu ladino para a Kobayashi.
─ Eh... Oi? ─ Foi a primeira coisa que saiu da boca da estudante. Sua reação era não conseguir ter reação diante daqueles olhos profundos do desconhecido.
─ Oi. ─ Respondeu sem parecer preocupado. Aquela resposta assustou um pouco Alice, porquê ela não sabia o que falar depois daquilo, tendo em vista que havia travado completamente.
─ Tem como... Eh... ─ Sem conseguir completar a frase, olhou para as mãos dela abraçando sua cintura.
O garoto soltou um "ah" e sinalizou que havia entendido. O silêncio depois disso foi muito constrangedor, porquê Alice não conseguia nem mesmo olhar para os olhos do menino. Ele até que tentou de diversas vezes iniciar a conversa e mudar o assunto, mas ela acabava virando o rosto para não encara-lo.
─ Seu iPod. ─ Ele estendeu a mão, mostrando o aparelho.
─ Me desculpa, eu não te machuquei, não é? ─ Falou rapidamente, demonstrando claramente nervosismo. A voz alta e os olhos assustados. Podia jurar que ela era uma rapper.
Uma risada escapou do jovem que havia voltado a ter suas mãos nos bolsos da calça. Achou extremamente fofo o nervosismo da Kobayashi.
─ Não não. ─ Disse sorrindo.
A conversa se manteve novamente silenciosa por mais alguns segundos, até que novamente o rapaz conseguisse achar um assunto para falar.
─ Ah... Você é a Alice? ─ Perguntou ao olhar o nome dela no pequeno broche do uniforme (小林アリス). Todo estudante tinha para ser mais fácil de ser identificado. ─ Meu nome é Chishiya. Shuntaro Chishiya.
Foi quando ele disse seu nome que os olhos envergonhados de Alice conseguiram encarar Chishiya. Ele era o garoto transferido com quem faria uma visitação pelo colégio antes da hora do almoço.
─ Você é o novato! ─ A voz elevou-se sem querer. Dessa vez, foi ela que riu da forma que falou. ─ É um prazer conhecer você.
Alice o cumprimentou como os japoneses tinham o costume. Curvou seu tronco para frente, com as costas retas, braços ao lado do corpo e os olhos para frente. Chishiya, por educação, fez o mesmo.
─ Também é um prazer conhecer você. ─ Respondeu a gentileza. ─ Ótimos passos de dança... ─ Shuntaro continuou puxando assunto. Talvez não deve-se falar sobre aquilo depois de ver como ela ficou com vergonha, mas queria quebrar o clima.
─ O quanto você viu daquilo? ─ Ela se perguntou, implorando para que não tivesse sido muito.
─ Quer que eu fale a verdade ou quer que eu minta? ─ Chishiya devolveu a pergunta. Continuou com o assunto ao perceber que Alice não parecia estar mais tão nervosa ou envergonhada quanto antes.
─ Mente. ─ Respondeu na maior sinceridade do mundo.
─ Eu não costumo aprender coreografias de músicas, mas olha, agora tenho certeza que posso dançar ela completamente. ─ O rapaz não poupou nem um pouco e falou exatamente o que pensava. Mesmo que tivesse feito ela escolher entre mentir ou falar a verdade, de uma forma ou de outra, ele diria a verdade.
Alice, involuntariamente, desferiu um soco sem muita força no ombro do rapaz. Tinha esse mesmo costume com seu irmão, quando ele lhe irritava, falava ou fazia alguma bobagem. Chishiya encarou seu ombro por alguns segundos e acariciou o mesmo. Nenhuma garota que conheceu havia batido nele ─ mesmo que fraco, e isso o deixou um pouco surpreso. Principalmente, para um primeiro encontro. No entanto, não se sentiu desconfortável. Parecia que os dois já se conheciam há muito mais tempo.
Quando percebeu o que havia acabado de fazer, a jovem inflou as bochechas e coçou a cabeça, tentando disfarçar.
─ Então... ─ As bochechas infladas deram uma nova sonoridade para a palavra. Um tom abafado. ─ Qual sua turma? Você já sabe?
Shuntaro mexeu no bolso esquerdo da calça e tirou um papelzinho branco no formato de quadrado. Eram as anotações mais importantes que o diretor havia colocado, como a letra e o número da sala, número do armário em que colocaria suas coisas e o nome de sua guia escolar ─ que nesse caso, era Alice. Como não sabia onde encontrar aquelas informações, estendeu o papel para que a garota pegasse.
Kobayashi entendeu e também estendeu sua mão, pegando o papelzinho e lendo.
─ Olha, a sua sala é a mesma que a minha! ─ A garota disse sorrindo. Era a primeira vez que estava conversando normalmente com alguém da sua sala. Não por obrigação de trabalho em dupla ou em grupo, mas como um possível amigo. ─ E o seu armário é um dos últimos, já que é em ordem alfabética.
─ Então isso quer dizer que seremos amigos? ─ Perguntou animado, sorrindo como se esperasse um "sim" como resposta.
Shuntaro Chishiya não era muito de fazer amigos, mas gostou da ideia de ser amigo da doidinha. Alice, por outro lado, não sabia se essa seria a melhor escolha para o rapaz. Se isso acontecesse, ele poderia virar mais uma das vítimas do grupo do terror ─ e ela o queria deixar ciente dessa situação.
─ Sobre isso... ─ Começou a falar, tentando bolar uma explicação resumida para os fatos presentes. ─ As pessoas aqui não gostam nenhum pouco de mim. Se virar meu amigo, a Sakura Uzumaki e o grupo de vilões dela vai acabar perseguindo você também.
─ Está preocupada comigo? ─ Por um momento, Chishiya achou que provocar fosse uma boa ideia.
─ Estou falando sério.
─ Eu não... ligo? ─ Não foi bem uma pergunta. Estava mais para uma resposta com tom de deboche. Não para ela, mas sim para aqueles que implicavam com ela. ─ Pelo menos tenho sua atenção só pra mim.
Chishiya sorriu mais uma vez para ela e tirou a mão do bolso apenas para ter o prazer de bagunçar os cabelos sedosos dela. Anotou mentalmente quanto ela era preocupada com outras pessoas, mesmo que não as conhecessem. Não expressava isso com tanta clareza, mas indiretamente, demonstrava gentileza e acolhimento.
─ Ei! ─ Reclamou a Kobayashi.
─ Vai me mostrar nossa sala ou não? ─ Shuntaro perguntou ao olhar para as salas atrás deles.
Ela concordou balançando a cabeça.
Alice guiou Shuntaro Chishiya até a salva 2-C, no segundo andar. A maioria dos alunos entre as salas pararam para olhar o aluno novo, o que sempre acontecia quando alguém era transferido ou formavam novas turmas. Mesmo em um colégio tão grande, com diversas turmas e salas, todos ali já haviam visto o rosto dos outros. Ficava claro quando era um novato.
Ao chegar na frente da sala 2-C, do segundo ano do ensino médio, a Kobayashi abriu a porta e ofereceu para que ele entrasse. Assim como no corredor, todos olharam para ele ─ principalmente as garotas. Chishiya olhou para os lados, sem tirar as mãos dos bolsos para cumprimentar ou sequer dar um sorriso gentil. Sua expressão era neutra, tranquila e sem muita animação. As pessoas acompanhavam cada passo que ele dava e se perguntavam porquê Alice Kobayashi que estava o acompanhando.
Não muito depois uma garota loira, com mechas rosas na parte de trás do cabelo, se aproximou dos dois. Ela parou bem ao lado de Alice e pousou o braço por cima do ombro da menina, mas quase escorregou quando a própria Kobayashi desvencilhou para o lado, saindo de perto dela. Na mesma hora, pelo pouco que escutou sobre Sakura Uzumaki, identificou que era ela. Os trejeitos, a pose de superioridade e o sorriso de um milhão de dólares que Uzumaki achava que enganaria qualquer um.
─ Você é novo aqui? ─ Perguntou a Chishiya, com as mãos para trás.
─ Você já me viu aqui antes? ─ Shuntaro rebateu, ela negou. ─ Então respondi a sua pergunta.
─ Ah, que besteira a minha! ─ Ela riu exageradamente, dando um tapinha no ombro dele. Chishiya olhou para o local do tapa e encarou a menina, que ficou intimidada. ─ Meu Deus, acho que estou um pouco nervo...
─ Então, qual é mesmo o meu armário, Lice? ─ Chishiya ignorou Sakura e ficou ao lado de Alice.
Sem saber como agir ao ser chamada pelo apelido, Alice sacudiu a cabeça e jogou esse pensamento para o lado. Fez o mesmo que Shuntaro, ignorando a Uzumaki e o levou até o armário dele. Os armários eram contados em ordem alfabética verticalmente. Tinham seis fileiras verticais e quatro horizontais. A de Chishiya era o primeiro armário da sexta fileira. Ficando na frente apenas de mais três alunos.
─ A chave é essa aqui. ─ A garota tirou o objeto do bolso de sua saia e entregou na mão dele. ─ Seu armário é esse aqui... o 21. ─ Tocou com a ponta do dedo no armário dele. ─ Agora vamos só colocar seu nome... ─ Alice pegou um quadradinho retangular já cortado, uma caneta e ofereceu para que pegasse. ─ Escreve aqui.
─ Escreve você. ─ Disse, mas Alice não entendeu se foi uma grosseria ou se ele estava pedindo para que a mesma escrevesse. ─ Eu gostei da sua letra. ─ Chishiya apontou para o nome do armário dela. Ele gostaria de ter a mesma grafia em seu armário.
A Kobayashi riu, achando o garoto muito mandão e até mesmo esquisito. Um sorriso desacreditado e surpreso. Shuntaro sorriu de volta para ela e não deu o pé para trás, esperando que seu nome fosse escrito pelas mãos da sua nova amiga ─ que ele não deixaria em paz. Alice disse que tudo bem, escreveu o nome do Shuntaro no papelzinho e colocou dentro do acrílico transparente.
─ Você pode sentar onde quiser, aqui não tem lugares marcados... Mas alguns fazem questão disso e acabam discutindo com os outros. ─ A maioria dos alunos quase sempre se sentavam nós mesmos lugares ou nos mesmos lados que estavam seus outros amigos. Então, apesar de não ser uma regra, raramente os alunos mudavam de lugar. ─ O resto das coisas eu falo quando eu te mostrar o resto do colégio.
─ Onde você se senta? ─ perguntou.
─ Naquela ali, porque? ─ Alice apontou para a segunda cadeira no canto da parede. Normalmente sentava nas primeiras cadeiras.
─ Vou sentar naquela ali então. ─ Chishiya apontou para a cadeira ao lado da dela.
Mais um comentário como aquele e todos achariam que os dois já se conheciam e estava juntos. Desde o primeiro momento, até ali, Chishiya fez questão de ficar colado nela, escutando o que a mesma tinha para falar e pedindo coisas que duas pessoas que acabaram de se conhecer não falariam. Incluindo, querer sentar do lado dela e sorrir descaradamente. Aquele tipo de "afeto" vindo de outro colega não era comum na vida da Kobayashi.
Perdida em seus devaneios, só se ligou que a aula estava prestes a começar quando um aluno gritou "o professor está vindo" e todos correram para se sentar. Alice caminhou até sua cadeira, colocou a mochila pendurada na bancada da sua mesinha e se sentou. Chishiya fez o mesmo, se sentando onde havia dito que se sentaria. A todo momento ele olhava para o lado e espiava para ver o que a garota estava fazendo. Por mais que fosse estranho, ela não se sentia desconfortável.
ALICE EXPLICOU TODAS as regras escolares, mostrou cada local possível do colégio Otonokizaka e como funcionava a hierarquia escolar. Chishiya ficou calado a maior parte do tempo, analisando cada espaço e cada aluno. Encarava por várias vezes os olhos brilhantes e a boca carnuda da Kobayashi, se sentindo confortável com a presença de uma pessoa que parecia ser tão verdadeira. Alice demonstrava ser ela mesma, com suas próprias ideias, comentários engraçados e análises prontas sobre a vida adolescente.
Admirava sua sinceridade.
─ Eu preciso falar com o diretor. Ele já entregou seu horário, não foi? E também o cardápio semanal? ─ O garoto concordou. Havia recebido todos assim que chegou no colégio. ─ Está na hora no almoço, então você pode pegar sua bandeja e ir para sala. Tenho certeza que você é o assunto do dia.
Os alunos na hora da refeição sempre pegavam suas bandejas no refeitório e iam comer na sala de aula com seus colegas e até professores. De acordo com o sistema educacional, isso os ajuda a construírem relacionamentos positivos. Depois do almoço e do horário de descanso, eles iam limpa o colégio.
─ Então vou ter que conversar com eles? ─ Parecia um desafio angustiante. Não é que Chishiya tivesse odiado todos seus colegas de classe, é que ninguém mais havia chamado atenção. ─ Parece tortura.
─ Você não é obrigado a falar com ninguém, mas eles vão querer saber sobre você. ─ Alice deu uma piscadinha para ele, dando a entender que seria atormentador a quantidade de perguntas sobre o novato. Ele, sem querer deixa-la ir, segurou a mão dela. ─ Vai fazer amigos, Chishiya!
Alice soltou a mão do garoto e o mandou ir embora. Nem mesmo olhou para trás ou caiu no drama desnecessário que ele estava prestes a fazer. Ele é muito emocionado, pensou.
Caminhado em passos curtos e lentos, chegou na sala do diretor. Conversou com ele por alguns minutos, explicando que havia acabado de apresentar todo o colégio para o aluno novo. Mitsubishi agradeceu e como recompensa, deu um bombom de chocolate para a aluna. Alice, fingindo que estava tudo bem, aceitou, mas não demorou muito para que ela jogasse no primeiro lixeiro que visse no corredor. Ela o odiava. O odiava por todas às vezes que contou a ele que estava sendo vítima de bullying e ele disse que era coisa da cabeça dela. Que os alunos não faziam isso.
Com medo de que ela abrisse a boca se pedisse transferência e queimasse a imagem do colégio, o diretor a ameaçou. Prometeu que se ela falasse algo para o pai ou para qualquer outra pessoa, faria de tudo para queimar ainda mais a imagem de Kotaka Kobayashi. Ele sabia que Alice nunca faria nada para prejudicar seu pai.
Suspirou pesadamente.
Um grito quase saiu quando ela foi puxada pelos cabelos para o auditório no seu caminho de volta para a sala de aula. Seu corpo foi jogado contra o piso de madeira e a porta fechada na sua frente. As luzes estavam apagadas e o que iluminava o ambiente eram as janelas transparentes da sala. O sol de meio-dia translucidava, mas não queimava tanto como na temporada do verão japonês. Risadas e murmúrios ecoavam pelas paredes do ambiente, achando graça de ver um corpo assustado largado sob o chão frio.
─ Parece que ela não é mais tão corajosa quanto antes, não é pessoal? ─ A voz masculina se pronunciou em meio as risadas.
Ele se aproximou e tocou na perna de Alice. Foi subindo aos poucos, com os dedos alisando sua pele macia e lhe causando angústia e nojo. Antes que pudesse subir ainda mais e continuar violando o corpo de uma garota, a Kobayashi recuperou a consciência perdida por míseros minutos e chutou o rosto do rapaz. Ele soltou um grito de dor e pôs a mão por cima do nariz ensaguentado.
─ Sua vagabunda! ─ Rosnou Yuno Yoruichi, desferindo um tapa no rosto de Alice.
─ Ai está nossa pequena e raivosa Alice! ─ Himiko Kaneki gargalhou, se agachando na sua frente. Alice a empurrou para trás e se levantou, ficando em posição de defesa. ─ Ei garota!
─ Qual o seu problema? Por acaso não transou ontem? ─ Shou Nakamoto tentou se aproximar, mas ela juntou os punhos próximo do rosto e andou um pouco para trás. Ele parou, a olhou de cima abaixo e riu. ─ Não tem problema, eu gosto das mais difíceis!
─ Espera. ─ Sakura Uzumaki saiu de trás dos dois garotos e encarou o rosto avermelhado da garota que mais odiava. ─ Antes eu preciso testar se minha chapinha está muito quente... Não quero queimar o cabelo.
─ Vocês ouviram, peguem ela. ─ Yagami Kurosaki, o último garoto do grupo e constante ficante da Uzumaki, ordenou.
Shou Nakamoto e Yuno Yoruichi se entre-olharam e avançaram na direção de Alice. Ela, que havia começado a fazer karatê desde o ano passado e sabia de alguns golpes, desferiu o primeiro soco no rosto de Yuno. Nakamoto, que a puxou pelo cabelo novamente, levou um chute na costela, do lado esquerdo. Yuno chutou bem no meio do estômago da Kobayashi, a derrubando no chão por causa da dor. Achando que dessa vez conseguiria segurar a garota, Shou pisou em sua perna, mas como consequência, levando outro chute. Dessa vez, no calcanhar.
─ Qual o problema de vocês? Não conseguem segurar essa filha da puta? ─ Kurosaki gritou com os dois.
Cansado de esperar, o mais velho dos três correu atrás da Kobayashi e a segurou pelo braço. Alice mordeu o braço dele, mas Yagami não a largou. Era a primeira vez que eles conseguiram conte-la. A maioria das vezes eram abuso psicólogo ou tentativas físicas de machuca-la, mas Alice sempre conseguia bater em algum deles e fugir. Infelizmente, dessa vez, não foi o que aconteceu.
Os outros dois rapazes ajudaram Kurosaki a segura-la. O mais velho prendeu as pernas com as próprias mãos, Yuno e Shou pegaram os braços e Himiko a cabeça, para não deixar que ela gritasse. Sakura esticou seu braço para cima do palco e pegou a chapinha ligada. De maneira calma e maligna, se aproximou dos amigos dando pulinhos. O sorriso horrendo e os olhos maldosos focavam na fumaça que saia do aparelho. Não era apenas uma fase adolescente ou pela popularidade, Sakura Uzumaki era uma pessoa ruim. Não só ela, como todos eles.
─ O que vocês estão fazendo? ─ Uma voz grossa gritou, assustando os alunos. Era Chishiya, que havia seguido os cinco para ver para onde eles estavam indo.
Shuntaro se espantou ao ver quem estava sendo mantida de refém por eles. Aproveitando a distração dos cinco, Alice se soltou mordeu a mão de Himiko e se soltou dos rapazes. Ignorando momentaneamente a dor profunda, ela correu tão rápido que chegou na porta do auditório em segundos. A raiva subiu e seu sangue ferveu na mesma hora quando Chishiya olhou para o braço de sua amiga. Avermelhado, queimado e exposto. Com certeza, ficaria uma marca futuramente. Nunca imaginou que algo banhado em tanta maldade e sangue frio pudesse acontecer com alguém próximo dele ─ mas aconteceu.
─ Você precisa ir para a enfermagem. ─ Seria melhor que num deles tocasse e fosse direto para a enfermeira. Ela saberia melhor do que ninguém como cuidar e assim, evitaria até mesmo uma infecção.
─ Escuta, vamos embora. ─ Alice pediu, não precisava de mais ninguém se envolvendo em seus problemas.
─ Se vocês encostarem nela de novo, eu vou acabar com vocês. ─ Foi a última coisa que Shuntaro falou antes de fechar a porta e levar Alice para a enfermagem.
O HORÁRIO DO ALMOÇO já havia acabado e as aulas voltaram, mas Shuntaro Chishiya continuou acompanhando Alice Kobayashi na enfermaria. Mesmo que não pudesse ficar com a mais nova amiga e tivesse que voltar para a sala, sobretudo por ser seu primeiro dia no colégio, a enfermeira Sayuri Hana disse aos professores que ele estava com dor de cabeça. Por isso, ficou na enfermaria.
Hana gostava bastante da jovem Alice e de seu irmão mais velho Dori. A enfermeira era doce, gentil e muito preocupada com os alunos, sempre fazendo de tudo para ajuda-los quando for necessário. Sabia que as aulas eram os puxadas, que os alunos estavam constantemente cansados e de basicamente tudo que acontecia, e que os professores e diretores escondiam dos pais ou da imprensa.
─ Está doendo menos? ─ Hana perguntou a paciente, recebendo um balançar de cabeça como positivo. ─ Posso perguntar o que aconteceu?
─ Derrubei café quente no braço. ─ Mentiu. Apesar de não concordar em mentir sobre algo assim, Shuntaro não falou nada. Respeitou sua opção de não contar nada.
─ Foi isso mesmo? ─ A enfermeira perguntou para Chishiya, pois queria confirmar.
─ Ela acabou de falar, não? ─ Retrucou, mas sem grosseria. Ele sabia que Hana percebeu que era mentira dos dois.
─ Cuide disso. ─ Sayuri segurou o braço da Kobayashi, analisando bem o curativo que havia feito. O sangue do machucado ainda manchava a gaze e demoraria mais do que esperava para cicatrizar. ─ E você, cuida dela... ─ Hana apontou para Chishiya. ─ É a primeira vez que vejo ela com alguém que não seja o irmão. Se for amigo dela, cuide dela... Ela é muito teimosa.
─ Claro. ─ Ele concordou com a enfermeira.
A mulher mais velha, por volta dos 30 anos de idade, com cabelos castanho escuro no ombro, deixou os dois sozinhos e saiu da sala. Os dois jovens ficaram em silêncio durante meia hora. Chishiya queria muito saber o que tinha acontecido e como chegou aquele ponto, mas daria tempo a Alice e não queria ser ainda mais inconveniente. Seus olhos iam o tempo todo de encontro com o machucado enrolado em um curativo, se lembrando dele sem a pomada ou a gaze.
─ Para de olhar, é esquisito. ─ Incomodada, falou. Não queria receber olhares de pena, principalmente de alguém que nem conhecia.
─ Tá bom. ─ Concordou, virando-se para frente.
─ Vai pra aula.
─ Eu não. Porquê iria pra aula, se posso ficar aqui sem fazer nada? ─ Arqueou a sobrancelha, dizendo isso para deixar o clima mais leve. ─ E você ouviu, não ouviu? Ela me mandou cuidar de você.
─ Você está me irritando!
Chishiya ignorou a reclamação da jovem. Ele pôs a mão no bolso da própria calça, tirando seu próprio iPod e um fone de ouvido de fio. Plugou a ponta na entrada do iPod e colocou um dos fones. O moreno olhou para a Kobayashi, oferecendo o outro fone livre para ela. Alice não queria, mas ele insistiu tanto e tanto, que preferiu colocar na esperança de que ele falasse a boca e não tocasse no assunto.
Os dedos do rapaz apertaram o botam de passar várias vezes, tentando escolher a melhor música para os dois. Não sabia qual o gosto dela, então, escolheu a música "Shinunoga E-Wa" de Fuji Kaze, por pura sorte. Ao apertar o play, a melodia inicial com as teclas do piano suaves encantando a canção e a voz suave introdutória foram rapidamente reconhecidas por Alice.
─ Você estava me escutando cantar outra música além daquela? ─ Kobayashi perguntou, voltando ao momento em que o viu pela primeira vez.
─ Não, porquê?
─ Não... nada. ─ Negou, não queria dar mais brecha para que ele enchesse seu saco com "deve ser o destino" ou "sabia que éramos parecido". Era clichê demais e Alice odiava criar expectativas para serem logo mais destruídas.
─ Você gosta dessa música? ─ Chishiya, que deu de ombros com a fala dela, perguntou para saber se a música estava boa. Ela concordou balançando a cabeça. ─ Ótimo.
Dori Kobayashi chegou na enfermaria assim que soube do ocorrido. Foi ver sua irmã e saber se ela estava bem. Perguntou o que tinha acontecido, mas mais uma vez sua irmã mentiu. Mentiu por não querer que ele se preocupasse demais com ela e acabasse seu ensino médio brigando com os outros. Mentiu achando que aquilo era para o próprio bem da família. Dori conheceu Chishiya, agradeceu por ajudar sua irmã e, também por ser o primeiro amigo que Alice havia feito em anos, convidou para jantar com eles depois do colégio. Queria conhecer melhor o novato.
Alice Kobayashi e Shuntaro Chishiya passaram o resto do dia na enfermaria, esperando apenas a hora para ir para casa. Embora Alice tivesse dito a Chishiya que não precisava ir até a casa dela e muito jantar com eles, implorando mentalmente que o novato desistisse, não foi o que aconteceu. Shuntaro fez questão de aceitar o convite e logo depois do colégio, avisou aos seus pais que chegaria mais tarde e foi jantar com os Kobayashi. Ele conheceu um pouco mais da família e se entendeu muito bem com o pai de Alice, o senhor Kotaka e também com Dori.
Foi então no dia 1 de Abril do ano de 2012, onde toda a história de amor deles começou.
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CHESHIRE
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