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Sonhos se tornam realidade, se você desejá-los o suficiente.

ㅡ J. M. Barrie.


QUANDO SONHAMOS, somos livres.

Quando vivemos, somos prisioneiros.

Prisioneiros de um sistema opressor que a cada dia força os mais novos a crescerem o mais rápido possível.

Forçam crianças a serem adolescentes, forçam adolescentes a serem adultos, e cobram desses jovens, recém adultos, um preço alto demais.

Jovens deveriam ser jovens, deveriam cantar até suas gargantas doerem, deveriam rir até às lágrimas brotarem no canto de seus olhos e respirar ser algo dificultoso.

Jovens e crianças deveriam sonhar.

Deveriam viver.

Deveriam ser felizes.

Entretanto, a cada dia que se passa, a maturidade chega mais rápido do que deveria.

E então, os jovens param de sonhar.

Porque eles não têm mais tempo para coisas assim, não têm mais motivos para acreditar em magia e em contos de fadas, às vezes nem querem.

Porque eles viram o mundo real cedo demais, e a crueldade os transformou, os assombrou para sempre.

E agora a maioria dos jovens tem almas de velhos, porque não permitiram que eles sonhassem um pouco mais, porque o mundo é cruel e defeituoso e mesmo que as pessoas tentem, isso nunca mudará. 

Elizabeth não acreditava em nada mais.

Ela parou de acreditar aos sete anos. Jovem demais, ainda uma criança.

Ela parou de acreditar depois de sua avó a contar que seu pai tinha simplesmente ido embora, deixando apenas uma carta para Adelaide, pedindo para que ela cuidasse da neta por um tempo.

Henry Darling nunca voltou.

E Elizabeth "cresceu" aos sete.

E ela dizia que estava bem com isso, dizia que não se ressentia com o pai, que não se ressentia consigo mesma.

Mas era uma grande mentira.

Uma das várias mentiras que Elizabeth costumava contar para si mesma.

Ela não estava nada bem com isso, e ela se ressentia e muito.

Entretanto, a Darling gostava de mentir para si mesma, bom não poderíamos julga-la, já que mentir para si mesma a ajudava a seguir em frente.

A prejudicava? Com toda a certeza. Mas ainda sim a fazia seguir em frente.

E era isso que importava não é?

Seguir em frente.

Mesmo quando você não faz ideia do porquê. Mesmo quando tudo que você quer fazer é desistir.

O som estridente do despertador soou em um quarto pintado de vários tons de azul.

O quarto de Wendy Elizabeth Darling.

Beethoven, um São Bernardo enorme levantou abruptamente do tapete que adormecia ao escutar o barulho do despertador se despedaçando na parede oposta.

Aquilo costumava acontecer na maioria das manhãs, e Beethoven continuava se assustando, não que pudéssemos culpa-lo, sua dona, Elizabeth, costumava ser um tanto imprevisível, então a cada movimento dela o cão se mantinha atento, nunca se sabe quando ela iria derrubar algo, ou cair, ou até mesmo jogar coisas em um acesso de raiva.

Sim, Elizabeth odiava acordar cedo.

Bom, de certa forma, a maioria das pessoas sensatas, sejam elas mais velhas ou novas, odiavam acordar cedo. Já que muitos costumavam trocar o dia pela noite.

Esse não era o caso de Elizabeth, a garota não costumava ficar acordada até muito tarde, John López, melhor amigo da garota, costumava dizer que ela tinha a alma de uma velhinha de oitenta anos, uma velhinha muito rabugenta, ele ressaltava.

ㅡ Eu assustei você de novo amigão?

Uma voz feminina abafada, pelo travesseiro que agora cobria seu rosto, soou.

O cachorro latiu animado ao ouvir a voz da dona e correu até ela, pulando na cama da mesma.

ㅡ Beethoven! ㅡ Elizabeth gritou ao ser pisotiada e sufocada pelo cachorro de quase 80kg.

O cachorro latiu, enquanto tentava enfiar sua grande cabeça debaixo do travesseiro da garota para lamber seu rosto.

ㅡ Beethoven! ㅡ Elizabeth empurrou o cachorro para o lado e tirou o travesseiro de cima de si, respirando fundo e se recuperando de seu quase esmagamento.

ㅡ Eu queria ter 10% da sua energia amigão. ㅡ a garota murmurou e o cachorro pulou encima dela lambendo seu rosto.

ㅡ Você é uma coisinha fofa. ㅡ Lizzie afinou a voz enquanto distribuía beijinhos na cabeça de Beethoven.

O celular da garota tocou, atraindo sua atenção.

A foto de um garoto na tela, e o nome John brilhando.

John López, também conhecido para Lizzie como Jonny, idiota ou melhor amigo.

Eles eram amigos á aproximadamente três anos. Mas a conexão deles era tamanha, que eles sentiam que se conheciam por toda a vida.

ㅡ Por que ce tá me ligando? ㅡ a voz da garota soou confusa assim que ela se desvencilhou de Beethoven e atendeu à chamada.

John não ligava para ela. Ele costumava apenas mandar áudios intermináveis sobre assuntos diversos pela manhã.

Na realidade os áudios tinham em média trinta segundos, entretanto, Lizzie era uma pessoa bastante dramática.

Nossa, sua grossa. ㅡ a voz do garoto soou do outro lado. ㅡ Bom dia amigo lindo, como você tá? A quê devo o prazer da sua rara ligação? ㅡ o garoto afinou á voz e tentou, sem sucesso, imitar á voz de Elizabeth. 

Lizzie deu uma risadinha.

ㅡ Primeiro, eu não falo dessa forma ridícula. ㅡ a garota rebateu enquanto acariciava Beethoven que agora estava deitado em suas pernas.
ㅡ Segundo, eu não sou grossa. Você nunca me liga. Eu to confusa. ㅡ ela se defendeu.

Isso é uma calúnia, eu sempre te ligo. Além disso, sua voz é ainda mais ridícula do que minha imitação digna de Oscar.

Elizabeth riu e negou com a cabeça.

ㅡ Você pode só dizer o que é tão importante, que você não poderia esperar uma hora até nos encontrarmos pra ir pra aula? Você aprontou o quê dessa vez?

Você pensa tão mal de mim Lizzie querida. ㅡ o menino fingiu tristeza.
Eu não posso estar ligando pra saber como minha maravilhosa amiga dormiu?

ㅡ John, enrolação nunca foi sua praia. Fala logo. ㅡ Lizzie pressionou.

Tá bom, chata. Eu quero sair hoje pra assistir aquele filme de terror que estreou essa semana. ㅡ o garoto confessou.

ㅡ Primeiro, por que você não poderia me contar isso pessoalmente? Segundo, é uma quinta-feira. E não tem sessão cedo, minha avó ainda tá com aquele papo estranho de não me deixar sair á noite.

Adelaide Russel era uma senhorinha excêntrica e que levava a etiqueta e os modos muito a sério.

E dês do aniversário de dezesseis anos de Elizabeth, o que aconteceu á alguns meses atrás, a senhorinha havia proibido a garota de sair à noite.

O que Elizabeth achou uma grande besteira, já que ela saía á noite antes disso, além disso, a avó nunca deu uma explicação concreta para Lizzie, e a garota estava começando a desconfiar que a sanidade mental de sua avó não estava lá essas coisas, principalmente depois de Adelaide colocar um cadeado enorme na janela de Lizzie.

Sua avó ainda tá neurótica com essa coisa de não te deixar sair?
ㅡ John perguntou e Lizzie se pegou assentindo. Ela riu levemente de si mesma e murmurou um "sim" para John.

Eu já desconfiava disso, por isso te liguei. Tem uma sessão às cinco e meia. Eu liguei pra sua avó ontem à noite dizendo que temos um trabalho para fazer e que você vai chegar em casa hoje lá para sete da noite. ㅡ o garoto confessou e Lizzie arregalou os olhos. ㅡ Ela concordou depois de muito esforço da minha parte, por isso te liguei pela manhã, pra te explicar tudo e você não ser pega de surpresa quando sua avó falar sobre isso com você. ㅡ ele explicou.

ㅡ Você armou isso tudo pelas minhas costas sem saber se eu iria concordar ou não com o plano? ㅡ Elizabeth fingiu estar chocada.

Elizabeth, eu te conheço. Você é uma delinquente, é claro que você iria concordar com o plano. ㅡ John rebateu.

Lizzie riu.

ㅡ Sim, eu iria concordar. ㅡ ela confessou. ㅡ Mas não custava nada falar antes.

Você trabalha melhor sob pressão. ㅡ John comentou. ㅡ Além disso, considere isso uma pequena vingança por você ter armado um encontro às cegas com a louca da Miranda Williams.

Elizabeth riu ao se lembrar do ocorrido.

Miranda era uma garota da escola dos dois, e ela era absurdamente obcecada por John, ela fazia de tudo para ter a atenção e carinho de John, inclusive irritar e diminuir Elizabeth, entretanto, John nunca iria sair com Miranda, o López nunca sairia com uma garota que fosse menos que gentil com Elizabeth.

Mas cansada da perseguição e perturbação de Miranda em sua vida, Lizzie armou um encontro para os dois, Lizzie não sabe o que John fez, mas Miranda nunca mais correu atrás dele, ou pertubou Lizzie.

A garota acha que ele deve ter comido um rio de comida e fingido esquecer a carteira. Isso parecia algo que John faria.

ㅡ Bom dia Wendy, querida. O café já está servido. ㅡ a voz de Adelaide soou ao lado de fora do quarto e batidas soaram. ㅡ E quantas vezes eu já disse para deixar o cachorro lá fora? Ele vai acabar quebrando meus vasos caros.
ㅡ Adelaide reclamou e Lizzie revirou os olhos.

ㅡ Bom dia vovó. Já estou indo.
ㅡ Elizabeth murmurou. A garota queria reclamar, dizer que não queria ser chamada de Wendy, dizer que Beethoven era um São Bernardo deverás educado e que ele nunca corria pela casa.

Mas Elizabeth se calou, como vinha fazendo dês do seu aniversário de dezesseis anos, onde sua avó passou a agir totalmente estranho, totalmente diferente do que costumava ser, de quem ela costumava ser.

ㅡ Melhor eu ir me arrumar. ㅡ Lizzie murmurou após suspirar uma e outra vez.

Melhor mesmo. Nos vemos logo delinquente. ㅡ John disse e desligou à chamada.

Elizabeth deveria ter ido contra o plano, ou não, já que tudo aconteceria de formas parecidas, não importa qual escolha Lizzie tomasse.

ㅡ Você sabe que não precisa me acompanhar até em casa né? Nós somos vizinhos, minha casa é na frente da sua. ㅡ Elizabeth resmungou enquanto atravessava a rua com John ao seu lado.

As estrelas e a lua brilhavam no céu iluminando a rua que não tinha quase nenhuma movimentação.

O vento gelado havia deixado às bochechas de Elizabeth coradas.

ㅡ Eu estou sendo um cavaleiro.
ㅡ John rebateu.

Elizabeth soltou algumas risadinhas até não se aguentar e começar a gargalhar. John que estava um pouco mais á frente se virou e revirou os olhos para a cena.

ㅡ Você sendo um cavaleiro? Que piada engraçada. ㅡ Lizzie disse enquanto secava às lágrimas.

John empurrou a garota com sua mão direita e Elizabeth tropeçou e quase caiu.

ㅡ Cale-se. ㅡ John resmungou.

ㅡ Eu quase caí de cara no asfalto, seu idiota. ㅡ Elizabeth reclamou recuperando o equilíbrio.

ㅡ E seria muito bem feito. ㅡ John disse e Elizabeth revirou os olhos destrancando à porta.

Ela mal havia entrado quando sua avó apareceu no corredor, olhos arregalados, mãos tremendo, bochechas vermelhas de raiva.

ㅡ Onde você estava? ㅡ a senhorinha elevou o tom de voz.

ㅡ Eu me atrasei um pouco vó. Só isso. ㅡ Elizabeth se defendeu.

Era a verdade. John havia dito que ela chegaria por volta das sete, mas na realidade já eram mais de oito da noite.

ㅡ Eu te disse para não ficar na rua á noite. Disse para não sair. Por que você nunca escuta? Por que você sempre desobedece? Eu faço tudo por você! ㅡ Adelaide continuou a elevar o tom de voz.

John que estava parado atrás de Elizabeth, se aproximou devagar e segurou á mão da amiga quando a viu começar a tremer.

Elizabeth apertou á mão dele fortemente.

ㅡ Sinto muito vovó. ㅡ Elizabeth abaixou o olhar envergonhada e triste.

ㅡ Sentir muito não vai mudar às coisas. ㅡ Adelaide disse e Elizabeth se encolheu, a mão de John nunca deixando a dela. ㅡ  Os Thompson iriam vir jantar aqui em casa, mas eles não vinheram porque você não estava aqui.

ㅡ O que os Thompson iriam querer comigo? ㅡ Elizabeth perguntou confusa, o que uma das famílias mais ricas e importantes iria querer com uma adolescente?

ㅡ Eles iriam trazer o filho para que você o conhecesse. ㅡ Adelaide comentou.

ㅡ E por que eu deveria conhecer o filho deles? Eu não preciso de mais amigos. ㅡ Elizabeth disse.

ㅡ Seria preferível que a noiva conhecesse o noivo antes de se casar não é? ㅡ Adelaide murmurou.

Elizabeth arregalou os olhos confusa.

ㅡ Noiva? O quê?

ㅡ Eu ofereci a sua mão em casamento para o filho dos Thompson.
ㅡ Adelaide confessou.  

Foi como se um balde de água fria tivesse sido jogado em Elizabeth, foi como se ela tivesse sido jogada em um rio com uma correnteza forte demais e ela consequenteme estivesse se afogando.

E afogando.

ㅡ Você fez o quê senhora Russell? ㅡ a voz de John trouxe Elizabeth para a superfície novamente. A garota segurou a mão do amigo como se ele fosse sua tábua da salvação.

Sua vó estava louca? Elizabeth se perguntou. Casamento arranjado em pleno século vinte e um?

ㅡ Os Thompson são uma ótima família, Alex é um bom garoto, eles cuidaram de Wendy. ㅡ Adelaide disse.

ㅡ Eu não vou casar com ninguém.
ㅡ Lizzie encontrou sua voz novamente.

Adelaide encarou a neta, como se sua rebeldia fosse um sacrilégio, como se Elizabeth estivesse estragando tudo.

ㅡ Mas é claro que irá. Já está decidido. ㅡ Adelaide disse com convicção.

ㅡ Você não pode decidir por mim vovó. ㅡ Elizabeth murmurou.

ㅡ Claro que posso. Tenho esse direito dês do dia que seu pai te abandonou e eu impedi que você fosse para um orfanato. ㅡ Adelaide retrucou.

As palavras da mais velha foram como uma punhalada no coração frágil de Elizabeth. Foram como uma queimadura de terceiro grau na pele. John ofegou atrás de Lizzie, surpreso

demais para gritar com a velhinha como ele bem gostaria.

ㅡ Eu te odeio. ㅡ o sussurro de Elizabeth ecoou pela casa e a garota correu escada a cima, soltando a mão de John no processo.

Mal sabia a garota que aquelas seriam as últimas palavras que ela diria para a avó.

Lizzie chorou até que seus sentidos ficaram entorpecidos.

Ela não conseguia sentir nada.

Os sentimentos haviam simplesmente sumido.

John continuava ligando, continuava mandando mensagens, mas Elizabeth não queria conversar, não queria companhia.

Bom, ela queria Beethoven alí com ela, mas sua avó havia o colocado para fora pela tarde, e tudo que Elizabeth menos queria era ver ou ouvir a avó.

Adelaide não tinha o direito de citar Henry, simplesmente não podia.

Mas tudo que ela disse é verdade, a vozinha interior sussurrou na mente de Lizzie, zombando.

Tudo que Adelaide disse era verdade, mas ainda assim doía como o inferno.

Por que sua vó estava tão diferente? Onde estava a doce e compreensível Adelaide Russell?

Casar aos 16? Elizabeth nunca aceitaria isso. Ela não poderia. Não mesmo, principalmente com alguém que ela não conhecia e não amava.

Ela preferia morrer á ser infeliz dessa forma por toda a vida que ela tinha pela frente.

Elizabeth se levantou, olhando para as estrelas pela janela trancada.

Uma prisioneira.

Era isso que ela era agora.

Prisioneira.

Lizzie olhou para o lado, sua estante de livros brilhando com algumas luzinhas. Um título parecia mais iluminado que os outros.

PETER PAN ㅡ J. M. BARRIE

Lizzie riu levemente sem achar de fato engraçado. Como ela odiava esse livro, uma vez ele havia sido o seu preferido, mas agora? Agora ela odiava esse livro.

Mas uma sensação de vitória passou pela garota lembrando que sua avó a proibiu de ter ou ler este livro e John havia comprado contrabandiado o livro para dentro da casa de Lizzie como um presente de aniversário.

Elizabeth voltou à olhar para às estrelas e fechou os olhos, desejando ser uma delas, desejando que sua mãe estivesse alí, que seu pai estivesse alí.

Desejando...

ㅡ Eu desejo nunca crescer. ㅡ ela desejou com todo o coração, a noite pareceu ficar mortalmente quieta e Lizzie abriu os olhos, na sua visão periférica ela ainda conseguia enxergar o livro de J. M. Barrie. ㅡ Se você é real, venha me provar isso. E eu prometo, prometo que voltarei a acreditar. ㅡ Elizabeth desafiou e sorriu cansada caminhando até sua cama e se deitando adormecendo rapidamente.

Em algum lugar, algo, ou alguém escutou o sussurro enviado pelas estrelas e pelo vento. Um sorriso malicioso coloriu a face daquele que agora sabia onde encontrar a herdeira Darling.

Era hora do jogo começar.

E que às estrelas tenham piedade de todos.


!

¡ O que acharam do primeiro capítulo? Gostaram?

¡! Eu não quero enrolar muito não, então no próximo capítulo o Peter vai aparecer.

Sei que tudo pode parecer confuso no começo, mas eu prometo que tudo tem um motivo e prometo que tudo vai fazer sentido no futuro.

¡! Não se esqueçam de votar e comentar <3.

Por hoje é só, mas nos vemos em breve .

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