04.  ╱ complexo wayne.

OS SONS DOS PASSARINHOS invadiam o ambiente pelas janelas abertas. Os raios de sol filtravam-se pelas brechas das cortinas, enquanto a brisa gélida tomava conta do local. Nia estremeceu, puxando o cobertor devagar até seu corpo. Ao trocar de posição, o móvel onde dormia rangeu, e um riso nasalado ecoou tão próximo que ela sentiu a respiração quente contra seu braço. Virando-se de imediato, tateou debaixo de sua almofada, encontrando uma de suas facas e a apontou, abrindo os olhos lentamente.

Era Cinco, a observando com um olhar curioso. Nia o empurrou para longe, lembrando-se de que havia dormido no sofá da Morty's Television e Rádio, o que também era a casa de Elliott, sem que percebesse. Suspirando fundo, ela largou a faca sobre a mesa de centro, entre papéis amassados, e esfregou os olhos afastando os cabelos curtos do rosto, vendo Cinco ainda a observá-la atentamente.

― O que você está fazendo? ― ela perguntou, levantando-se atordoada enquanto tentava se acostumar com a realidade. ― Estava cogitando a ideia de me matar?

― Não, você que estava falando sobre matar alguém. Agora sou eu que pergunto: com quem você estava sonhando? ― Cinco arqueou a sobrancelha, fazendo Nia sorrir enquanto se levantava. ― Não pense que vai escapar dessa pergunta.

― Já estou escapando... ― retrucou, caminhando em direção à cozinha. Cinco se teletransportou, parando na frente dela, e Jittatad bufou impaciente. ― Tá bom, Cinco, estava sonhando com aquele trio de platinados que nos perseguiu... Eles mataram Hazel e tentaram nos matar. E eu irei acabar com eles se nos perseguirem novamente.

― Claro, porque eu vi você lutar com alguém ― respondeu ele, ultrapassando Nia, que franziu a testa, incrédula. ― Ah! Espera, eu vi você humilhar o Diego.

― O que temos para comer? ― perguntou, ignorando-o, enquanto abria os armários. Tirou uma caixa de cereal e pegou uma tigela. ― Falando nisso, como foi ficar preso no tempo?

― Bom... um tanto caótico e solitário ― murmurou Cinco, dirigindo-se à cafeteira e apertando vários botões. Nia revirou os olhos, observando-o. ― Aliás, o que você disse ontem a Luther...

― Eu não estava errada. Egoista? Sim, eu posso ter sido, mas você não sabe o que é estar presa na mente de alguém, ouvindo os mesmos murmúrios repetidamente. Não é pior que estar preso no tempo, mas eu ainda suportei muita coisa que qualquer outro ser humano não suportaria ― desabafou, cruzando os braços e tirando o cobertor dos ombros. ― Por isso, Sir Reginald Hargreeves me manteve em sigilo. Eu soube muito sobre vocês e ele me via como um perigo para a "humanidade".

Cinco olhou para ela de maneira curiosa, tentando desvendar a origem de tudo aquilo e o que mais poderia estar escondido. Ele não tinha respostas, mas Nia possuía explicações que eles ainda não eram aptos ao entendimento, assim como a sua conexão com todos eles, embora não fosse da forma que imaginava.

Num mundo onde eles eram os heróis, ela era apenas um dos testes desenvolvidos para monitorá-los.

Nia se sentou no balcão, enquanto Cinco cruzava os braços, ouvindo o som da cafeteira começando a funcionar e o café a coar. Mordendo os lábios, Jittatad sabia o quão difícil era falar sobre aquilo, sobre quem realmente era. Ela evitava compartilhar seus sentimentos, mas isso não impedia que sorrisos e piadas cômicas fizessem parte de seu dia, apenas para esquecer quem realmente era.

Ela não tinha escolhido ser uma heroína.

Tudo começou quando ela ainda era criança. Seus poderes se manifestaram em sonhos premonitórios. Sua mãe sabia exatamente para quem ligar quando isso acontecesse, e foi assim que Reginald Hargreeves soube que queria manter a tailandesa afastada dos outros adotados, mas não completamente. Com o treinamento básico para acessar sua capacidade mental, Nia conseguia, através de desenhos, mostrar o que via na cabeça das outras pessoas. Mesmo que fosse uma dor insuportável, Reginald prometia que tudo iria melhorar com o tempo.

Quando dominou seus dons de entender e ler a mente, e compreender os sentimentos dos outros, Reginald retornou, desta vez para testá-la. E assim fez, colocando Jittatad à distância dos outros, lendo a mente de cada um dos adotados da Umbrella Academy e relatando seus medos e pensamentos.

Isso foi apenas o começo de um ciclo sem fim.

Tão complicada e indecifrável quanto a Constante de Planck, a mente humana, especialmente daqueles com habilidades, era um mistério. Seus sonhos se tornavam os sonhos dos outros. Dia após dia, ela conhecia cada um daqueles que eram como ela. Descrevia tudo em enormes relatórios para Reginald, trabalhando sempre como uma cobaia, uma máquina. Recebeu a tatuagem da Umbrella Academy quando dominou seus dons de combate, mas nunca esteve lado a lado com aqueles cujas mentes vasculhava.

Então, como se pressentisse a morte em suas veias, tudo acabou.

O dia em que esteve presa na mente colapsada do Número Seis, que carregava o mesmo desejo de orgulhar Reginald, foi um dia que jamais queria ter vivido. A morte de Ben foi compartilhada em sua mente; sentiu cada dor, cada grito, e por minutos seu cérebro parou de funcionar como se parte dela tivesse morrido. Mas depois, quando seu cérebro não recebeu mais nenhum sinal da mente de Ben, seu corpo despertou, e ela nunca mais foi a mesma.

Perdeu metade de seus dons, e entrar na cabeça de alguém se tornou seu maior medo. Reginald Hargreeves nunca mais procurou por Nia Jittatad depois daquele dia. Ele a culpava por não tê-lo salvado.

― Você ainda consegue? ― Cinco perguntou, movendo a ponta do dedo enquanto fitava Nia, que suspirou, encerrando sua história. ― Ainda consegue ler nossas mentes?

― Nem se eu quisesse ― respondeu. Descendo do balcão, observou a cafeteira. ― Depois da morte de Ben, a única mente conflituosa que acessei foi a de Luther. A culpa que ele sentia me afetava profundamente. Por anos, ouvi ele dizer que Reginald o mandou para a Lua por nada. Ficava acordada por noites e noites, presa na mente dele, até que um dia qualquer consegui sair. E agora, não quero ouvir nada, nem hoje, nem amanhã.

― Isso daria um bom livro ― comentou Cinco, pegando uma caneca, fazendo Jittatad rir e revirar os olhos. ― Você praticamente morreu e voltou à vida. É a primeira vez que vejo alguém capaz disso.

― E espero ser a única. ― Sorriu de lado, pegando sua xícara de café.

Com a xícara azul nas mãos, caminhou até o que Elliott chamava de "sala de estar", que ficava sob a loja de televisores. Sentou-se no sofá onde antes dormiria, cruzando as pernas de modo simples. Ouviu o ranger da porta do quarto de Elliott, que acabava de acordar. Gentilmente, Nia acenou com um sorriso de lado. Cinco o ignorou, caminhando até o quadro de fotos com seus irmãos.

― Quais são os planos para hoje? ― Nia perguntou, observando o garoto. Cinco a fitou brevemente e fez o sinal do número quatro com as mãos. ― Eu gosto do Klaus, ele é divertido.

― É, talvez. ― Voltou a fitar as fotos.

Nia pegou o recorte de jornal com a fotografia do Número Dois.

Pensando no que ele poderia ter feito com sua faca, sorriu de forma espontânea, atraindo um olhar desconfiado de Cinco. Sabia o quão disfuncional aquela família poderia ser, conhecia cada um perfeitamente antes de tudo começar a desmoronar: Ben morrer, as brigas, Luther se culpando, e Reginald se tornando ainda mais severo até que todos resolveram se separar.

Depois disso, já não sabia se haviam permanecido os mesmos ou se tinham se tornado ainda piores.

― Elliott, foi você mesmo quem revelou essas fotos? ― Cinco questionou, olhando o mural e as paredes cheias de artigos.

― Claro, não posso deixar isso na Fotomat do bairro. ― Comendo cereais na tigela, ele se aproximou fazendo sinal de vigilância com os dedos. ― O governo tem olhos por toda parte.

― E como tem certeza de que ele não está te observando nesse momento? Somos "intrusos" na sua residência. ― Brincou Nia, colocando a xícara sobre a mesa de centro, fazendo Elliott refletir sobre aquilo. ― Estou brincando, mas isso não descarta a ideia de ser meia verdade.

Observando Cinco retirar a caixa de fitas da Kodak de seu bolso, Elliott virou de costas para ele, verificando as probabilidades das palavras de Nia serem verdade.

― Não vi uma câmara escura ― comentou Cinco.

― Eu transformei o armário. ― Elliott apontou na direção do enorme armário de madeira ao canto de sua sala, fazendo Nia o encarar.

Franzindo a testa desconfiada e bebericando de seu café, Nia observou Cinco pegar uma caneta em cima da escrivaninha e riscar algo atrás da caixa. Notando que o garoto a observava, arqueou as sobrancelhas e o ignorou de modo sério.

― Pode revelar isso? ― Entregando para Elliott, que encarou a caixa, observou Nia se levantar mastigando os cereais de argolas azuis.

― "Filmagem dos Frankels." ― proferiu ao ler. Olhando para ambos de modo descontraído, fita Cinco. ― Amigos seus?

― Primos do lado da minha mãe-robô. ― O encarou de modo sério, retirando uma risada de Jittatad. ― Dá para revelar ou não?

― Calma lá! ― Nia interrompeu, bagunçando os cabelos de Cinco que se afastou mau humorado. ― Ele estava brincando sobre a mãe-robô, na verdade é do nosso Chimpanzé quase mordomo. Tipo um Alfred Pennyworth.

― Tem como responder logo a minha pergunta? ― Cinco retirou as mãos de Nia de cima de si e voltou a ajeitar seus cabelos minimamente penteados.

Elliott acenou com a cabeça.

― Quanto tempo? ― questionou Nia, apoiando-se sobre a escrivaninha e balançando suas pernas. ― Estamos meio ocupados, então se puder ser em menos de uma hora.

― Certo, mas é que meu acido acético está acabando. ― Virou-se de costas explicando, atraindo a atenção de ambos. ― A Beeker's Cameras está aberta hoje, mas fica a 3 km. Teria que pegar um ônibus. ― Elliott pousou a mão no queixo, pensativo. ― Por outro lado, a Gibson's fica a dez quadras, mas teria que ir pelo parque e tem aquelas pombas...

― Elliott! ― exclamou Nia.

― Umas cinco, seis horas. ― Fitou Cinco que assentiu. Nia arqueou as sobrancelhas, e revirou os olhos, finalmente aceitando. ― É o mais rápido que posso.

Escutando um ruído do rádio ao lado na escrivaninha, Nia o observou com curiosidade, movendo seus dedos sobre o botão para estabilizar a antena e a frequência correta. Então, escutou:

"Atenção, todas as unidades, temos um código 3-15 no Sanatório Holbrook."

Nia trocou olhares com Cinco, que arqueou as sobrancelhas aproximando-se e aumentando o volume.

― O que diabos seria um código 3-15? ― indagou o menor à espera de uma resposta imediata.

― Fugitivos à solta ― responderam Nia e Elliott quase simultaneamente, com Elliott ainda de boca cheia, atraindo o olhar de Nia.

"Vinte e cinco pacientes escaparam." Continuou o locutor. "Muitos estão armados e são perigosos".

― Claro, era óbvio que aquele idiota ia fazer merda ― Nia resmungou, claramente irritada. ― Não devíamos ter contado ao Batman que ele precisava pegar o Coringa. Agora, veja o problema que temos.

― Quem seria esse Batman? ― perguntou Elliott, agachado ao lado dos dois, que ouviam atentamente o rádio.

― Imagine o Batman, certo? Só que muito pior que ele, tipo um cosplay de baixa renda ― Nia respondeu, fixando o olhar em Elliott com o maxilar tenso.

Cinco se levantou, atraindo a atenção dela.

― Vai lá, revela o filme pra mim ― disse ele. ― Eu volto assim que puder.

― Cinco, espera por mim! ― Nia exclamou, mas antes que pudesse segui-lo, ele desapareceu, deixando a caneta sobre a mesa.

― Parece que ele não se importa com você ― comentou Elliott, com a boca cheia.

― Seria estranho se ele se importasse, a gente nem se conhece direito. ― Nia foi até sua maleta de facas e a destravou, surpreendendo Elliott. ― Espero que quando eu voltar, você pare de falar de boca cheia, ou isso aqui vai parar na sua língua.

Ela mostrou um shuriken, depois o guardou na bota, vendo Elliott assentir, espantado. Nia riu enquanto trancava a maleta com sua digital.

― Eu só estava te assustando, adorei a sua cara. ― Ela riu, passando por ele. ― Você deveria ter visto.

Parando em frente à janela, onde podia ver seu reflexo, Nia ajustou o coldre de facas na perna e o outro que atravessava seu tronco. Pegou cada faca cromada, colocando-as organizadamente. Girou uma kunai no dedo e o guardou no bolso traseiro da calça preta.

Ajeitou a camiseta branca com o logo da Umbrella Academy no peito, pegou a tigela de cereais, deu uma última colherada e bebeu o restante do café.

― Está com fome ainda? ― perguntou Elliott, vendo-a com um olhar enigmático.

― Abrir portais gasta muita energia, e eu começo a comer muito. Por isso, vou levar isso comigo. ― Nia abriu o armário de Elliott e pegou um pacote dos biscoitos que mais gostava. ― Café evita que Cinco colapse, e cookies me fazem não desmaiar.

― Então pode levar. ― Elliott analisou a caixa de fitas que Cinco o entregou. ― Se precisar de algo, só me avise.

― Obrigada, depois eu retribuo. ― Nia sorriu pegando a caneta que Cinco deixou para trás. ― Até mais tarde!

Fechando os olhos, Nia concentrou-se nos últimos rastros de Cinco enquanto usava a caneta como uma ligação até ele. Os fragmentos azuis começaram a surgir pelas pontas de seus finos dedos e fazendo um sulco com as mãos, o portal se abriu. As suas pupilas encontraram a luz e o brilho que refletiu em suas íris, ela deu um passo e logo sentiu o impacto da realidade.

Olhando em volta, estava sentada na traseira de um ford cortina, deparando-se com Cinco que a encarou com as sobrancelhas levemente unidas.

― Quem é você? ― A mulher sentada ao banco do passageiro perguntou ao se virar para trás encarando Jittatad. A tailandesa franziu o cenho. ― E por que você tem o cabelo igual o meu?

― Ao menos o meu não parece que foi cortado por uma tesoura cega ― retorquiu. ― Mas afinal, sou Nia.

― E eu o querido irmão dele. ― Cinco se apoiou entre os bancos da frente dando um sorriso à mulher e logo virando-se a Diego. ― Quer nos contar algo, Número Dois?

― Que vocês me deixaram apodrecendo no hospício? Acho que isso já todos aqui sabem ― rebateu Diego um tanto desapontado. Ajeitando o retrovisor, ele observou a tailandesa. ― Oi Nia!

― Oi Diego! ― ela respondeu arrancando um sorriso dele.

Cinco estreitou as sobrancelhas e trocando olhares com a mulher no banco dos passageiros, olhou primeiro para Nia e depois para Diego. Estava completamente confuso.

― Eu vou fingir que vocês não estão dando em cima um do outro apenas com um 'oi' ― comentou Cinco tentando colocar os pensamentos em ordem. ― E você deveria saber que te deixamos lá justamente para protegê-lo de você mesmo.

― Isso é muito meigo da parte de vocês. ― A desconhecida ao lado sorriu alegremente apertando ao ombro de Diego. ― São tão adoráveis por pensarem assim no irmão de vocês.

Nia franziu o cenho por um instante, antes de sutilmente retirar uma das facas da manga de sua jaqueta, debruçando-se por cima do banco.

― Em nenhum momento mencionei que eles eram meus irmãos. Aqui temos um latino, um americano e uma tailandesa. Você só poderia julgar que fôssemos irmãos se soubesse quem somos. ― As palavras de Nia despertaram a atenção de ambos irmãos, que se entre olharam. ― Sinto que tem alguma coisa errada em você e eu vou descobrir o que.

― Ela é assustadora ― comentou a desconhecida dando um sorriso nervoso. ― Ela é sempre assim?

― Só quando não gosta de alguém ― Cinco murmurou, fitando Nia. ― E normalmente ela costuma gostar das pessoas, até de estranhos.

― 'Tá legal, já me perturbaram o suficiente. ― Diego interrompeu destravando as portas do carro. ― Vocês três, deem no pé!

Nia arqueou as sobrancelhas, ofendida.

― Estamos tentando te ajudar, não te prender novamente ― ela rebateu. ― A não ser que sejamos obrigados a isso.

― Se livra da maluca e vem com a gente ― disse Cinco. ― Temos negócios importantes. Coisas importantes para resolver com um prazo de dez dias, e não temos mais dez dias!

― Não vou a lugar nenhum com vocês ― Diego suspirou, recostando no banco. ― Isso tudo é problema seu. Aliás, isso só começou por causa de você e da Vanya.

― Por que vocês nessa família nunca chegam a um consenso de tentarem se ajudar? ― Nia perguntou. ― Sério, você não é o primeiro e com certeza não é o último que "não se importa com o fim do mundo" porquê isso é culpa do Cinco.

― A culpa não é exatamente minha ― ele defendeu-se antes de abrir a janela do carro encarando Diego. ― E se você não vai nos ajudar, então não atrapalhe ― observando um guarda que passava do outro lado da rua, Cinco gritou: ― POLICIAL!!!

Shhhhh!!! ― Diego puxou Cinco para dentro do carro novamente, segurando-o pelo ombro. ― O que diabos você está fazendo?

― Soube que há uma recompensa por vocês dois ― Cinco ameaçou. ― E bem, eu estou afim de sair daqui e ter uma vida muito boa, não me interessa se isso significa entregar vocês para a polícia.

Todos ficaram em silêncio, como se questionasse as palavras de Cinco ou se realmente ele seria capaz de fazer tal coisa sem dar a mínima.

― Ele está blefando ― apontou a desconhecida.

― Não... ele não está ― murmurou Diego antes de deixar um suspiro resignado escapar pelos lábios enquanto ajeitava os cabelos medianos. ― Beleza, eu vou com vocês.

― Isso significa que vou junto? ― indagou a mulher ao lado de Número Dois.

― Não que você vá servir para alguma coisa ― Nia disse quase inaudível, mas mesmo assim foi capaz de atrair a atenção da mulher. ― A decisão é do Número Dois, não minha.

― Eu levo a maluca então ― Diego proferiu por fim. ― Aliás, o nome dela é Lila.

― Que combina com Nia ― ela deu um meio sorriso à tailandesa, que a fitou de mau humor. Assim como Cinco, ela não a via somente como uma doida maluca, na verdade, ela até poderia ser mais do que isso. ― Para onde vamos?

Nia rapidamente segurou o ombro de Número Dois e Lila e em um sulco os três foram teletransportador para a fachada da loja de Elliott. Diego, que tentava recuperar o ar, olhou ao redor com a mão sobre o peito, enquanto Jittatad seguia a frente, entrando no local com Lila e Cinco, que apareceu de súbito, acompanhando-a.

― Nunca mais faça isso, tá legal? ― Diego apontou em direção a Nia, que notou que ele ainda estava um pouco atônito. Um sorriso lhe escapou dos lábios. ― Seu número é o Zero, não é? Então, todos nós viemos depois de você?

― Isso é uma boa pergunta, acho que deve guarda-lá para quando um dia reencontrarmos com Reginald. ― Nia o fitou brevemente, diminuindo os passos para que ele ficasse ao seu lado. ― Mas, se ele me chamou de Zero e não um de vocês, deve ter uma explicação plausível. Como eu realmente ser a primeira de tudo.

― Ah, não me diga! ― ele riu, sardônico. ― Eu poderia jurar que ele tinha te chamado de Número Zero porquê ele jogava muito Mortal Kombat na infância e o personagem dele era o Sub-Zero. ― Nia o empurrou pelo ombro, dando risada. ― Não vai me dizer que você também congela as coisas.

― Não exatamente, ela tem o seu poder e alguns outros que ainda não sei da existência além dos meus ― Cinco comentou ao ultrapassa-los.

Diego cedeu os passos, observando Nia.

― Isso explica as facas... na verdade, isso explica muita coisa ― ele pensou alto demais, atraindo a atenção dela. ― É por isso que você e a Kitana nunca foram vistas no mesmo lugar.

― Como voltamos no tempo, talvez a Kitana tenha sido inspirada em mim. ― Nia deu um meio sorriso, colocando uma mecha do curto cabelo atrás da orelha. ― Você é um idiota, Número Dois.

Escutando o engatilhar de arma soar em suas costas, Nia virou-se sutilmente encontrando Elliott tremendo mais que uma vara verde enquanto os quatro trocavam olhares, fitando-o. Nia deu um passo, mas Elliott apontou a espingarda à ela, que recuou colocando as mãos para cima, com um breve sorriso.

― Elliott, tenho certeza que você quer estar do nosso lado, está bem? ― Nia tentou conforta-lo. ― Agora, abaixe a arma...

― Ou o quê? ― perguntou Elliott, mal conseguindo empunhar a arma. ― Por que eu não deveria atirar em vocês?

― Porquê eu sou a Nia e tenho uma faca ― ela disse, criando uma ilusão com a mão fazendo aparecer sua faca cromada. ― Me explique qual é o problema, Elliott, e tudo ficará bem.

― Onde conseguiram a filmagem dos Frankels? ― ele aproximou-se com a arma apontada para Nia, que passou a faca da mão esquerda para a direita em uma ilusão. ― A verdade, desta vez.

Cinco franziu o cenho assim como Nia, que trocou olhares com ele sem compreender a pergunta. Cogitava que talvez ele tivesse visto a fita.

― Vocês conhecem esse maluco? ― perguntou Diego, atraindo a atenção de Elliott, que apontou a arma desta vez para ele. ― Não aponte para mim.

― Acabamos de conhecer, vamos dizer que é... inofensivo ― Cinco respondeu, colocando a mão nos bolsos do uniforme e aproximando-se de Elliott. ― Você viu a fita?

― Vocês são ou não inimigo do povo? ― indagou ele.

Trocando olhares, Nia deu de ombros.

― Isso é subjetivo... ― respondeu Diego.

― É, dependo do povo ― complementou Cinco.

― Se o povo quiser nos matar, é inimigo ― finalizou Nia.

Elliott ponderou, mas assim que Cinco deu um passo, o dedo dele quase pressionou o gatilho o suficiente para disparar, mas ele ainda segurou. Quando Jittatad moveu lentamente os dedos, ele apontou a arma para ela que revirou os olhos.

― Está bem, vamos fazer do jeito mais difícil ― ela disse desaparecendo com as facas e encarando Elliott que arregalou os olhos. ― Número Cinco?

― Que jeito mais difícil? ― indagou Elliott, recuando.

― Você vai saber. ― Cinco arregaçou as mangas do uniforme e torceu o pescoço. ― Em um... dois... três!

Quando Elliott disparou, imediatamente Nia e Cinco teletransportaram agarrando a arma e o a mão de Elliott com o tiro abrindo um buraco no teto. Usando um pouco mais de força, Nia arrancou a arma das mãos dele arremessando para Diego que travou a arma e retirou o cartucho de munição jogando em cima do sofá.

― Onde está as filmagens? ― perguntou Cinco, encarando-o mau humorado.

― Na câmera ― respondeu Elliott com as palavras falhando. Arqueando as sobrancelhas, Nia pisou sobre o pé dele, que grunhiu de dor. ― Está... está na cozinha. O filme está na cozinha.

Cinco foi diretamente para a cozinha enquanto Nia sentava Elliott em uma cadeira, com Diego o segurando observando-a procurar por fitas isolantes na gaveta. Prendendo firmemente os punhos no descanso de braço da cadeira, entretanto, ao tentar prender a outra mão, ele começou a gritar por ajuda enquanto soltava-se das fitas. Nia imediatamente conjurou uma faca, fincando-a na cadeira entre os dedos dele que arregalou os olhos, horrorizado.

― Se você facilitar o meu trabalho, eu não terei que ser indelicada, Elliott ― ele hesitou, mas assentiu. Nia foi observada por Lila, mas ao encara-lá, ela deu meia volta. ― Eu não sou sua inimiga.

― Quando eu me soltar, irei contar a todos o que fizeram! ― exclamou Elliott. ― Eu vi as filmagens!

― Tem como você calar a boca dele? ― perguntou Diego, fitando-a com os braços cruzados.

― Só apagando ele. ― Nia arrancou um pedaço da fita com os dentes e a colocou na boca de Elliott, silenciando-o. ― Talvez assim funcione afinal.

Diego se aproximou enquanto Nia tentava segurar os pés de Elliott para prendê-los com as fitas. Agachando-se ao lado dela, que assoprava os cabelos que iam para frente do rosto, Diego ajudou-a passar a fita, prendendo-o firmemente.

― Obrigado pela faca ― agradeceu Diego. ― Ajudou bastante na fuga.

― Você deu uma faca para ele? ― indagou Cinco surgindo ao lado deles. Nia revirou os olhos empurrando Diego, que apenas ponderou. ― Onde foi que eu me perdi no nosso plano, Número Zero?

― Eu pensei que se Diego acreditasse que estávamos o ajudando, talvez ele resolvesse nos ajudar ― ela respondeu, encostando-se na mesa recebendo um olhar incrédulo de Cinco. ― E funcionou. Não precisa me agradecer.

― E se não tivesse funcionado? ― ele indagou. Cinco poderia estar preso no corpo de uma criança, mas seu humor carrancudo era como o do exato velho que ele é. ― Número Dois não é mais aquele adolescente idiota que você lia a mente! ― Cinco apontou em direção de Nia antes de dar de ombros. ― Ele ainda continua sendo um idiota, mas ainda age como um inconsequente as vezes.

Diego olhou de Cinco para Nia, claramente ofendido.

― Que história é essa que você lia minha mente?

― Você me conhece há dois dias, não têm porque querer ficar sabendo de mim agora. ― Nia deu as costas lançando um sorriso ladino para Diego. ― Perderia toda a graça.

― Ela é sempre assim? ― perguntou Lila, aproximando-se de Diego. ― Atraente?

― Eu... eu acho que não. ― Diego gaguejou, antes de franzir o cenho observando Lila. ― E que pergunta foi essa?

Nia empurrou a cadeira de Elliott até a cozinha que Cinco isolava as janelas com jornais e fitas para escurecê-la e enfim poder verem as filmagens que Hazel havia lhes deixado. Aproximando-se da câmera, verificando se o filme estava correto, suspirou.

― Já cogitou a possibilidade de você ser uma variante? ― perguntou Cinco, atraindo a atenção de Nia, que cruzou os braços e o observou, encostando-se no balcão. ― Isso explicaria você ter nossas habilidades.

― É mais provável vocês serem minhas variantes, já que tenho os poderes de quase todos ― respondeu Nia, pensativa. ― Mas, eu não sou um experimento. Eu não fui criada, eu nasci assim.

― De outro planeta, talvez? ― Cinco cogitou. ― Outra realidade?

― Ficção demais. ― Nia bufou. ― Apesar de acharmos que temos essa resposta, só Reginald sabe a nossa verdadeira origem, ou melhor... quem sou e o que eu sou.

― Tem interesse em saber? ― perguntou ele, descendo de cima do balcão. ― Podemos tentar descobrir quando sairmos daqui.

― Acho que quanto menos sabermos, melhor.

Ligando a câmera, tanto Lila quanto Diego se reuniram na cozinha quando o filme começou a passar. Ao lado de Número Cinco, Nia trocou olhares sutis com o adolescente, que também não compreendia ao certo no que um casal se filmando poderia ser importante para o propósito deles.

― É... não é querendo cortar o clima ― iniciou Diego. ― Mas por que que a gente tá vendo isso mesmo?

― Acho que Hazel nos deu a filmagem errada ― comentou Nia. ― Certeza que isso deveria ser para Agnes.

― Vocês dois conseguem ficar quieto? ― reclamou Cinco. Diego revirou os olhos e continuou encarando a filmagem enquanto Nia fitava o melhor. ― Obrigado!

― Olha a data ― sussurrou Nia, observando Cinco franzir o cenho confuso. ― É daqui seis dias. É no dia da morte do JFK.

― Por que? ― Cinco perguntou, ainda confuso. ― Qual o sentido disso? O que o fim do mundo tem haver com o Kennedy?

E para a infelicidade de ambos, Diego também havia notado a data no canto da imagem. Em um salto, ele desceu do balcão dando uma risada como se estivesse a ponto de colapsar, apontando para eles e para a imagem.

― Puta merda! Eu disse! O Kennedy vai morrer, é nossa chance de salvá-lo! ― Diego estava mais empolgado do que qualquer outro. Arrancando olhares desacreditados de Zero e Cinco. ― Isso é a nossa chave para conseguir impedir o assassinato dele!

― A morte do Kennedy já aconteceu uma vez, nosso foco agora é ir embora daqui, Diego. ― Cinco tentou trazê-lo de volta a realidade. ― Isso não deve ser sobre a morte dele, pode na verdade nos ajudar a voltar para casa.

― 'Tá, mas o que o Hazel te disse exatamente? ― indagou Diego. Todos observavam o filme com atenção, tentando compreender o que poderia ali ser algo útil.

― Ele foi morto antes de poder explicar qualquer coisa que soubesse, mas ele deixou isso ― respondeu Nia acenando com a cabeça para o filme. ― Seja lá o que queria nos dizer, deve estar nessa gravação.

Todos se assustaram com o som do disparo, Diego se inclinou observando a imagem enquanto todos corriam assustados da cena do assassinato. Nia estreitou os olhos tentando compreender os mínimos detalhes, tentando descobrir o que Hazel queria os mostrar. Não havia nada de diferente do que sabiam. Pessoas assustadas e desesperadas correndo de um lado para o outro, gritando ou escondendo-se atrás dos carros enquanto deixavam o desfile.

Cinco acelerou às filmagens, mas antes que continuasse a avançar mais, Nia fez um sinal para ele parar e quando a imagem ficou estática. Diego, Nia e Cinco franziram seus cenhos, antes de sentirem-se atordoados com o choque de realidade que os havia atingido.

― Como isso é possível? ― perguntou Cinco, confuso.

― A verdadeira questão é: ele teve essa mesma aparência por mais de 50 anos? ― Nia olhou os irmãos, que também pareceram tão confusos quanto ela. ― Não faz sentido, faz?

― Não, isso é impossível ― murmurou Diego balançando a cabeça negativamente. ― Isso com certeza é impossível.

― Claramente, não é ― rebateu Número Cinco.

Observando a imagem do velho com o seu usual monóculo, guarda-chuva, chapéu de brim e suas roupas cinzentas, Nia apertou os punhos, sentindo a ansiedade começar a consumi-la.

― O que vocês estão vendo de tão interessante? ― perguntou Lila se juntando à eles. Ela observou a imagem e então os fitou. ― Quem é esse?

― Reginald Hargreeves... ― sussurrou Nia, sua voz falhando.

― O nosso pai ― respondeu Diego e Cinco em uníssono.

⋯ ⁺ ZERO: UMBRELLA ACADEMY
✿⠀·  ☂️⠀.  carter dardenne, 2020

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