CAPÍTULO 56 - CAEL MARTEL
Cael Martel
NARRADO POR CAEL MARTEL
Procurei desviar meus pensamentos dando uma volta no longo hospital. Tinham tantas pessoas, com tantas roupas diferentes. Uns eram enfermeiros usava uniformes azuis-marinhos, os médicos usavam jalecos brancos, o pessoal da faxina usava uniforme azul. Me sentia no celeiro, mas sem tantos cheiros e alegrias. Eu estava pensando "Como tudo era diferente há um ano". Todos em Poti paravam o que estava fazendo quando eu chegava, pelo simples respeito que tinham por mim. Eu era chamado de o Rei da montanha. E eu era, realmente era.
- Minha irmã está lá dentro ainda, mas já estamos indo! – disse a miniatura do Yuri me acordando do sonho – Voce ficou bem melhor sem aquela cabeleira, sabia?
- Obrigado! Já estava em tempo de tirar. Sua irmã parecia um pouco nervosa, ela melhorou?
- Não é para menos! O Yuri ama agir por impulso. Gostaria de ter o tamanho dele e bater a cabeça dele no concreto, mas não posso!
"Quanto amor!"
- Talvez o gene explosivo esteja no nosso sangue. Eu também tenho meus dias explosivos.
- Se está no nosso sangue, então sou adotado ou o gene pulou uma pessoa. Eu não tenho nada de explosivo. Se perde muito tempo ficando irritado.
- Graças a ele podemos ficar no hospital, não foi?!
- E, por causa dele, podemos não ficar, não é? Por favor, não faça essa cara – disse ele abrindo um sorriso – fico feliz por vocês dois, sabia?
- Obrigado!
- Eu nunca vi meu irmão assim. Tão conectado em alguém. O que é que esteja fazendo, estás fazendo direito.
- Apenas retribuindo todo carinho que ele me da. Eu sempre ouço as pessoas falarem o quão ruim ele foi.
- Ele destruiu nossa família. Ele destruiu nosso circulo de amizade. Ele destruiu a empresa do nosso pai. Ele fez o Brasil todo amá-lo e depois odiá-lo. Esse Yuri que você está vendo, é uma anomalia.
- Ele apenas não poder ter mudado? Esse Yuri monstro não pode ter morrido?
- Você mudou as coisas do ponto de vista dele, isso eu assumo. Mas a cabeça dele não é das melhores. As drogas danificaram muito do certo e do fácil. Mas eu acredito em você e acredito que ele não vai voltar a ser o que era.
- Eu não vou deixar ele voltar a ser o que era. Acreditem em mim – disse dando o soquinho (amigo) que o Yuri me ensinou.
- Nós acreditamos em você. Não acreditamos no Yuri. Por favor, se um dia vocês... pensarem em largar. Me avise em primeiro lugar.
- Eu não penso em lrgar do Yuri. Fica frio. Lá, aonde vivemos, seria impossível dele sair e fugir. Mas, fique sabendo que qualquer coisa será o primeiro a ser avisado.
- Obrigado! – disse o rapaz dando um sorriso amarelo.
Depois de andarmos quase 01 kilometro dentro do hospital, eis que surge a
Yara chorando. Ela abraçou o Yago que fez sinal de não entender.
- aconteceu alguma coisa com o Yuri? – perguntei sem entender nada.
- Lógico que aconteceu! Você.
- Yara? – chamou a atenção o irmão.
- É verdade! O que você prometeu a ele para ele não querer mais voltar para nossa casa?
- Não fiz nada!
- Entenda, meu irmão jamais escolheria viver no meio do mato, se não houvesse nada em troca. Não basta ser rico e ter milhares de cabeça de gado, agora quer ficar com meu irmão? Sua bicha enrustida! Paga de machão e fica dando o rabo escondido. Não contente tá comendo meu irmão.
- Não acredito que o termo "comer meu irmão" seja ofensivo ao Cael!
- Vai tomar no seu cu também Yago.
Olhei para os olhos do irmão, na tentativa de buscar um auxilio, mas ele apenas sinalizara para eu entrar no quarto do Yuri. Mais que depressa passei pela porta e lá estava ele, em pé, usando apenas um short do hospital ao lado de dois enfermeiros. A cama do Levi estava vazia.
- Hora do banho – disse ele todo sorridente.
- Não quer ajuda? – perguntei aos enfermeiros.
- Ok, você até pode dar banho nele, mas tem uma ordem lá na frente que é para você ficar apenas no horário de visitas.
- Tudo bem, eu vou logo após o banho – respondi enquanto eles pegavam suas coisas e saiam do quarto.
- Então que o meu amor me abandonou? – disse ele vindo com muita dificuldade me dar um beijo.
Apenas abracei e o levei para dentro do banheiro. Hoje ele ficou espantado com os hematomas que tomavam conta do sei peito, das suas costas, abdômen e glúteo. Estavam cor de berinjela. Era até impossível saber que uma pessoa estivesse viva com aquelas manchas todas. Até o pinto dele tinha pegado a coloração roxa.
- Eu tô muito feio! Olha essa quantidade de roxos. Olha meu pinto roxo – mostrou ele numa careta - eu tô parecendo um cadáver ambulante.
- É normal! Os hematomas descem e chegam até a genitália. E que história é essa de tomar banho sem a minha pessoa?
- Eles que chegaram já me tirando da cama! Eu não estou com muita moral para dizer "não".
- Você não está com moral com ninguém, quer dizer! Não tem noção o quão cuzão você foi com as pessoas que lutaram para ficar aqui com você.
- Eu já pedi mil vezes desculpas. Eu nem sei mais posso fazer. Eu vou tentar falar com o médico e pedir desculpas, mas não briga comigo. Não agora que você vai precisar ir embora.
Deixei ele nu e depois tampamos todos os curativos com bandagem para que não molhasse. Peguei a bucha e o sabonete e esfreguei cuidadosamente sua pele. Depois o ajudei a se enxugar e a se deitar na cama.
- Por que você não tira a sua roupa e toma um banho comigo? – perguntou ele excitado.
- Primeiro: estamos num hospital e, segundo, eles precisam apenas de mais um motivo para foder de vez contigo aqui dentro.
- Sua irmã se mostrou um pouco agressiva comigo, mas eu nem fiz nada. Não entendi o motivo dela estar assim.
Ele me explicou toda a história que envolvia a sua irmã e seu maravilhoso plano de trazer os Martel para morar em Poti.
- Ela está enciumada porque eu vou me casar com você. Ela queria que eu fosse pra Sampa e voltasse a frequentar festas e conseguir levanta uma grana com meu nome, assim como eu fazia antes de te conhecer!
- E... você? – perguntei sentindo meu peito arder.
- Que pergunta idiota, não acha? A aliança já está na minha mão esquerda e, não tenho pretensão alguma em tirá-la. Você está bem teimoso nesse assunto, não acha?
- Não, eu não acho!
- Nossa, que consideração você após aquele belo jantar que fizestes para mim e após cuidar de mim no hospital.
- Aquele dia, quando o touro te levantou para o alto e, que eu pude ver o chifre atravessado no seu peito. Eu senti meu mundo cair. Eu não sentia uma dor tão grande desde que perdi o Cauê. Ai você começou a cuspir bolas de sangue. Você não falava nada com nada. Ai eu pensei que havia lhe perdido. Lembro na madrugada que você chegou, os médico me liberaram para te ver antes de você operar. Como ainda não havia um quarto especifico, eu precisaria esperar no saguão com as demais pessoas. De hora em hora, apareciam médicos e enfermeiros que entregavam aos parentes, os pertences dentro de uma sacolinha e lhes davam a noticia que o paciente não havia sobrevivido. Eu tinha visto, por cima, uma cinco famílias recebendo aquele noticia fatídica.
- Que horror Cael!
- Horror foi quando um médico e um enfermeiro chegou com suas coisa. Eu tremia, não conseguia respirar, não conseguia piscar, apenas chorava.
"Você é o parente do Yuri Martel?
- Sim!
- Aqui estão os pertences dele.
- Não fala isso pra mim Doutor! Não fale que se foi – disse levando minhas mãos a boca
- Esse ainda não! Ele é muito forte. Se existe um Deus, ele parabenizou o Yuri com uma nova vida!
-Trouxemos os pertences dele, pois ele ficara na UTI essa noite. Avisaremos assim que ele descer para um dos quartos!"
- Credo! Então eu me desculpo mais uma vez pelo meu ato de infantilidade.
- Eu te amo Yuri e, dessa vez, eu não saberia como sobreviver sem você! Eu acho que morreria junto.
- Nada! Trabalhamos muito para fazermos uma nova vida!
- Sem você? Jamais!
No final das contas, o médico acabou dando-me uma segunda chance, mas sempre enaltecendo que era uma exceção. Acabamos recebendo alta 08 dias após a sua entrada. O Yuri ainda tinha dificuldades em caminhar, foi embora ainda de muleta. A viagem que demoraria no máximo 03 horas, acabou ficando um 05 horas, pois ele reclamava de dor ao passar em buracos. Entramos em Poti já no meio da tarde.
- O que são essas pessoas? – perguntei as várias pessoas que circulavam pela cidade.
Havia mais pessoas que o habitual e não era para romaria. Eram pessoas trajadas de festa de peão, com copos de cerveja na mão e carros de som na rua. Aceleremos até chegar o topo na montanha. O Cael apenas parava para dar "Oi" aos mais íntimos e dizer que eu precisaria descansar. Chegamos em casa, limpei os seus curativos, tomamos banho e nos deitamos num colchão na sala. Ficamos namorando até quase a noitinha.
- Agora eu entendo quando você ficava nervoso por falta de sexo – disse arrancando gargalhada – é foda você fiar ao lado de quem se ama e não poder fazer nada.
- Não fez porque não quis. Meu pau estava funcionando normal no hospital.
- Não mesmo! Perder a chance de ficar ao seu lado por causa de sexo? E foi bom vê-lo assim, machucado, você ficou bem menos safado e mais romântico. Mais devagar.
- Eu nunca o vi reclamar de fazer mais rápido. Pelo contrário, vejo cada dia com mais vontade e mais safadinho também!
- Mas deveríamos fazer devagar, às vezes, sabia?
- Por mim, todos os dias meu amor! Comigo não tem dessa. Se você chegar mais safado, vamos fazer mais safado e, se chagar mais romântico, faremos mais românticos.
- Dúvida, mas vamos acreditar que você mudou.
Nos trocamos e sentamos nas cederias ao lado de fora da sede. Estava fazendo um belo pôr-do-sol. Daqueles com o Sol bem vermelho e frio. A cidade estava ficando cheia. Dava para ouvir, bem de longe, o som dos carros com músicas altas. Eu lembro muito de ver isso em cidades do interior paulista, mas jamais imaginei aqui.
- São aquilo que eu e você sonhamos.
- Mas... ainda faltam...
- 01 semana Yuri! Daqui 01 semana essa cidade estará lotada. Por que essa cara? – perguntei ao vê-lo com semblante triste.
- Daqui 01 semana eu não serei mais "O Cara". Lutei tanto para ficar de fora da nossa festa.
- Eu juro que não ligo para nada disso. Prefiro você comigo ao vê-lo em pedaços. Não sinta-se na obrigação de nada e com ninguém! A não ser com seus irmãos. Quero saber, como é que você pretende traze-los se não vamos mais ficar aqui na montanha?
- Eu não posso deixar meus irmãos sozinhos. Seria muita injustiça com eles.
- Tipo, você foi jogado na montanha. O que deve aos seus irmãos?
- Eu não acredito que esteja falando isso! Eles são meus irmãos.
- Entenda que a montanha não é mais nossa Yuri e nem nós pretendemos ficar em Poti. E o nosso sítio no Uruguai não são para muitas pessoas, não é como a montanha que há dezenas de casas.
- Você não precisa dar desculpas. Apenas diga que os não quer. Eu entendo que não ficaremos na montanha. Eu já pensei em tudo. Meu já estou bolando o que faremos na nossa nova vida.
- Já está bolando que vamos fazer? – perguntei rindo da sua cara.
- Sim, deixei de considerar a montanha a nossa casa desde quando chegamos aqui das nossas férias.
- O quê?
- O que o quê? Não posso deixar meus irmãos sozinhos. Precisamos...
- Pula essa parte. O que dissestes no final.
- Não considero a montanha mais a minha casa. O que está me olhando? Isso é uma verdade!
- Acho que já entendi todo o problema! Quer dizer, é apenas um pressentimento. Não posso afirmar.
- Pressentimento do quê?
- há anos atrás só haviam as duas montanhas, depois chegaram meus avós e começaram o cultivo. Aqui era pequena o suficiente para cidade e então fizeram uma pequena igreja no meio do caminho. Sempre houve excelentes colheitas. Depois chegou o gado que fora multiplicando de forma exagerada. A vila de Poti precisaria crescer. Depois chegou o Santo Padre aonde milagres e mais milagres foram fazendo. Minha vacas, desde que cheguei aqui com o Cauê, sempre foram conhecidas por, em alguma parte da vida delas, criar gêmeos. Depois criou-se as represas e a montanha fora ganhando vida e mais vida. A minha primeira vaca, aquela no qual fui deixado na porteira, estava com data marcada para morrer. Então, como um milagre, ela ficara prenha. Era um animal muito velho. Eu mesmo chamei duas vezes o doutor para sacrificá-la, mas quando chegava aqui, eu desistia. Pelas lembranças do Cauê. Lembro de ficar ao seu lado no dia que ela pariu. Mas ela era tão velha que seria impossível ela sobreviver. Foi quando no seu ultimo suspiro, quando seus olhos se fecharam, eu abracei com toda força e então ela se levantou. De lá pra cá, me consideravam benzedeiro. E ai, muitos anos depois, você apareceu na montanha. No inicio você detestava esse lugar, mas depois pediu até para morar aqui para sempre. Foi quando eu te joguei no meio de dezenas de touros, você conseguiu outro milagre. Você podia domar touros.
- Você quer dizer que não posso mais domar o Zebu, porque disse que não sinto mais a montanha como minha casa.
- Entenda Yuri! Tudo isso aqui, montanha, o gado, as represas, as plantações, a pessoas que vivem aqui, que vivem em Poti, que vivem na outra montanha, todos nós, de certa forma, estamos interligados.
- Cael, eu nunca acreditei nada disso. Você sabe!
- Nem no dia que domou o Zebu?
Ele me fitou sério por um momento e depois fitou o vale e a pequena cidade ao fundo.
- Acreditando ou não, a montanha é um ser vivo. Ela conecta a todos. Não falo de religião, meu amor. Falo de natureza.
le.com"O:��Z�X
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top