CAPÍTULO 50 - YURI MARTEL


Yuri Martel

- Qual se nome? – perguntei ao belo rapaz que esperava na varanda.

Eu tinha acabado de sair do banho, com a toalha enrolada na cintura. Ele, ao me ver semi nu, tapou os olhos com a pasta.

- Advogado n. 17 senhor! – disse ele se escondendo.

Ele usava um terno barato, daqueles que o deixa com o corpo estupidamente quadrado. Era óbvio que o terno caberia 05 pessoas com o porte físico dele - Vim busca-lo para irmos a nossa reunião.

- Nunca vistes um homem nu, n.17? – perguntei tirando a pasta de frente dos seus olhos.

Era um rapaz loiro, olhos azuis, com mais ou menos 1,80. Era robusto, mesmo embaixo de toda aquela armadura que o terno formava.

- Não! Quer dizer, sim! Mas... é... que... você... é...

- Espero que você complete essa frase com Yuri Martel, ao invés de gay. Não é mesmo n. 17?

- Eu... jamais... falaria algo assim! Conheço o senhor de antes?

- Conhece da onde? – perguntei atônito, ao fundo o Cael entrava com a camionete.

- Eu o vi em várias festas já! – respondeu ele corando

- Que tipo de festas?

- Das que o senhor pediu para não mencionar! Senhor Cael, boa noite! – disse o rapaz apertando a mão do Cael.

O Cael apenas acenara com a cabeça.

- Boa noite Yuri! Calor aqui fora, né? – disse ele dando um "tapinha amigo" no meu ombro, daqueles que eu ensinei durante a viagem – Preciso falar contigo, poderia entrar, fazendo o favor?

- Claro! – respondi seco.

Já sabia até do que se tratava o sermão. Acendi a luz da varanda para o advogado ficar enquanto me esperava se trocar. Fechei a porta e fui até o fundo da sede aonde o Cael me esperava mordendo os lábios.

- Foda você, né? – disse ele quando eu o abracei e dei um beijo na sua boca

- Te amo!

- Detesto quando você faz isso. Sabe que eu estou puto com você e vens com seu "Eu te amo!".

- E por que meu amor está bravo? – perguntei enchendo o seu rosto de beijos.

Eu sabia que ele ficava furioso quando o e enchia de beijos durante alguma de nossas discussões. Mesmo furioso ele apenas ficava sério, sem mover os lábios, algumas vezes ele não aguentava e ria, mas logo já fechava a cara.

- Por causa disso! – disse ele puxando o nó da minha toalha, fazendo-a escorrer pela minhas pernas, me deixando nu – Já entendeu?

- Tá encanado a toa, porque jamais deixaria isso acontecer!

- E outra coisa, que história é essa de receber esses engomadinhos apenas de toalha? – perguntou ele cruzando os braços e encarando sério.

- Quantas mil vezes você recebeu pessoas na sua casa apenas de cueca?

- Pessoas da montanha e, não, pessoas que não conheço.

- Qual a diferença se, ao final, todos os verão semi nu? – perguntei abraçando novamente.

- Ah Yuri, não fale isso que tá feio. Sabe muito bem que todos aqui são minha família – disse ele me empurrando para longe.

- Mesmo quando tiveres bravo, não precisa me empurrar. Tô abraçando apenas pelo fato que eu não o vi o dia todo.

- Ah, então não há problemas em abraçar quando tiver bravo? Diga isso ao cara que esgoelou no dia que o Alan se feriu.

"Filha da puta. Me pegou de jeito!"

- Mas voltando ao papinho de "família" e ficar semi nu por aí: Então pode ficar receber qualquer um da montanha de cueca?

- Não vejo problema!

- Mesmo o Aldo e Juan? Aqueles no qual você fazia putaria nas festas de peão e batia punheta os vendo comer às putas?

Ele me encarou sério, passando a língua nos dentes. Depois suspirou fundo e me puxou para um beijo. Eu apenas repeti o gesto que ele fizera, deixando os lábios intactos.

- O que me diz "Cael"?

- Te amo, sabia? – disse ele caindo na risada.

- Ficou sem graça, né filha da puta?

- Te amo!

- E como faremos a respeito desse assunto que levantou?

- Simples, só nós dois podemos nos ver de cueca e toalha!

- Eu, de verdade, por mim, não ligo para isso!

- É exatamente esse o problema. Você é muito dado. Sabe quando você chega na casa de alguém e o cachorro já vai dando a barriga, mesmo que seja um estranho, coçar? É você Yuri!

- Olha o animal falando de outro animal!

- Credo! Olha a forma que você fala de mim.

- Sabe Cael, eu já entendi o que você quer "y você tambiem já entende lo que quiero dizer!" Não há necessidade de discutirmos mais, ok?

Mesmo eu tendo a certeza que ainda faltava muito para ele terminar o seu sermão, apenas concordou em silêncio e me abraçou. Naquela noite mal dera tempo de ficarmos juntos, pois fui para a reunião com os advogados e cheguei muito tarde. Entrei no quarto, pouco iluminado pelas luzes que vinham da sala com a casa sem forro. Terei meus sapatos, tirei meu blazer, jogando na mobília ao lado. Senti duas mãos quentes percorrendo meu abdômen, meu peito, beijando e mordendo a minha nuca. Vire-me de frente e lá estava meu homem, nu, sorrindo com a cara inchada de quem acabou de acordar.

- E acordou animadão, não foi? – perguntei pegando no pau duro dele – seu safado!

- Seu safado!

- Huuuuum! Gosto assim. – disse arrancando um beijão maravilhoso dele – meu safado!

Peguei no pau dele fazendo se afastar um pouco. Apenas sinalizei que estava tudo bem e que não faria nada que ele não quisesse.

- Estou apenas vendo seu piercing – disse olhando para aquele anelzinho metálico – Está doendo?

- Muito menos! – respondeu ele desabotoando minha camisa.

Depois a tirou com todo cuidado, jogando-a do lado. Ficou acariciando meu corpo por um longo tempo. Eu apenas o deixei brincar, sentindo sua respiração quente enquanto esfregava sua barba grossa na minha pele. Seus lábios firmes percorriam meu peito, meu mamilo, subindo ao meu pescoço. Com suas mãos grossas, tirou meu cinto, minha calça e minha cueca. Depois me jogou na cama onde ficamos coladinhos debaixo das cobertas.

- Você fica lindo de terno, sabia? – disse ele me dando um beijo – fica muito gostoso. Fica com um cuzão gigante.

- Isso é porque não é um Gucci, ai você iria pirar.

- Gucci?

- É uma marca italiana de terno, muito cara. A gente vai casar de Gucci.

- Gucci? Bem sua cara mesmo usar essas coisas chics.

- Não mais! Antigamente sim, mas hoje nem ligo. Caso contigo pelado, assim como estamos.

- Não de pinto duro? – disse ele nunca risada gostosa.

- Não, isso é lógico que não! Sabe, eu tenho uma curiosidade: como você tá fazendo pra "aliviar" toda essa tensão sua?

- Simples, bato uma!

- Ah, simples assim? E pergunta número 02: por que, desde de você bater uma sozinho, você não bate junto comigo? Não precisa fazer nada além de ficar abraçado a mim e me beijando. Ninguém precisa chupar ninguém, ninguém precisa penetrar ninguém, apenas ficarmos agarradinhos, nos beijando, nos sentindo.

Ele ria do meu desespero.

- Sério, eu estou ficando louco! Você não tem ideia como é foda sentir o seu cheiro, sentir sua pele, admirar seu corpo, tudo isso te amando e eu aqui, um pobre menino que não da conta mais de bater punheta.

- Posse te pedir mais uma coisa?

- Sim, mas não me venha com sermão, não hoje!

- Não, muito pelo contrário. Aguente apenas mais um pouco, vai valer a pena! – disse ele me dando um beijo e passando a mão no meu pinto.

- Antes de você pegar nele, eu concordaria com tudo, mas agora que começou...

- Agora vamos dormir, não é? – cortou ele se encaixando nos meus braços.

A semana passou bem tranquila na montanha do Cael, tirando o fato do Alan ainda não retornar de Porto Alegre, coisa que já começa as nos preocupar. Eu sei que costurar uma artéria não é tão simples assim, mas ao ponto de ficar uma semana em recuperação? Não sei se foi por causa da perda de sangue ou se é por causa do HIV. Estávamos eu e o Cael sentados na varanda quando uma camionete chegou, de dentro, saiu um rapaz de terno barato, mas estupidamente bonito. Cabelinho raspado, topetinho, pote físico bacana.

- Tô achando que o advogado do seu pai é da nossa raça! – disse enquanto o Cael analisava o moço de cima a baixo.

- Por que diz isso?

- Sempre no mesmo estilo, galãzinho da malhação.

- Da onde? – perguntou ele fazendo uma careta.

- Malhação é um "novelinha" da Globo aonde contratam muitos gatinhos assim. Jovens, boa pinta.

- Gatinhos? Aonde esse moleque é gatinho?

Mas não dera tempo de responder, pois o moço já estava nos nossos pés.

- Boa noite Yuri e Cael! – disse ele cumprimentando-nos com um aperto de mão firme.

- Gostei de você! Não me chamou de senhor – disse deixando o rapaz sem graça – por favor, não fique vermelho porque eu detesto ser chamado de senhor. A não ser que você nos ache velho para isso.

O rapaz que deveria ter no máximo seus 22 ou 23 anos, coçava a nuca com o nervosismo.

- Estou brincando, pode respirar agora! – exclamei ao ve-lo completamente sem graça.

Deveria ser o seu primeiro dia de trabalho na vida. E o pior, comigo.

- Qual o seu nome? – perguntei.

"Caio Castro, Caio Castro, Caio Castro!" – APENAS PENSEI COMIGO, POIS, CASO O CAEL SONHASSE, EU FICARIA VIRGEM ATÉ MEUS 60 ANOS.

- Advogado n.º 18. Vim dar noticias do quadro do Alan. Ele está bem, mas houve complicações – disse o rapaz num português impecável.

- Que tipo de complicação? – perguntou eu e o Cael ao mesmo tempo.

- Infelizmente eu não fui informado!

- Você andou tudo isso apenas para dizer que ele está com "complicações"? – perguntei fazendo o "Caio Castro de terno" corar.

- Eu achei que vocês tivessem interesse em saber o estado clínico do Senhor Alan – respondeu ele ainda com muita vergonha.

- E tenho muito, por isso estou indignado com a falta de informação, no qual nos forçará ir até Porto Alegre...

- Apenas um telefonema seria suficiente, neste caso! Mas não vim aqui apenas dizer do estado clinico do Senhor Alan, mas sobre sua volta aos familiares.

- Ele não pode! – prontificou o Cael antes mesmo do advogado dar conta que o Cael se pronunciava de algo.

- Ele tem 30 anos, tem família e, pelo que sei, ele pode muito bem ...

- Uma vez aqui, não há volta. Ele sabe disso – disse o Cael ficando em pé.

- Sobre qual razão? Digo, judicialmente falando? – perguntou o Caio Castro já mostrando as garrinhas de fora –tipo, um contrato de trabalho?

- Ele tens apenas contrato de trabalho mesmo!

- Do resto?

- Do resto nada!

- Tens sim! Ele pertence aqui à montanha e ele sabe disso.

- "Pertence" em qual sentido? – perguntou o advogado cruzando os braços e colocando a mão na boca.

- Cael, já te disse que e para deixar os assuntos burocráticos comigo, por favor? – disse gentilmente ao meu amor.

- Vocês não entendem, ele tem para mim um juramento...

- Que são apenas palavras, senhor Cael!

- Você nunca vão entender, pois ambos não são daqui. Mas uma vez jurado, não há volta. Mas faça o que achar melhor. Vou repetir mais uma vez: não há volta depois que você faz o juramento!

- Isso é uma ameaça?

- Cael Martel, por favor, já disse que é para deixar comigo! – pedi novamente apontando a porta.

Ele nos fitou sério, com aquela cara de quem mataria os dois, mas apenas concordou e entrou.

- Cael? - chamou o advogado fazendo-o parar na porta – seu pai e o advogado pediram para lembrar que eles não o esqueceram.

"Os Lannisters mandam lembranças!" – Tywin Lanninster, Game of Thrones.

- É que o senhor precisa?

- Que vocês façam a baixa na carteira e depois uma declaração a punho, dizendo que ele não pertence a nada.

- Mas acabou de dizer ao Cael que não precisa de nada, depois diz que precisa. Que contradição tosca é essa?

- Não sei. Que juramento "tosco" é esse? – perguntou ele olhando no fundo dos meus olhos.

- Apenas "palavras", não são?

Ele apenas apertou a minha mão e depois foi embora patinando a camionete a areia. Entrei na sede e lá estava o Cael, apenas de cueca, com rabo de cavalo bem preso. Bebia sua pinga numa cara fechada. Sei que esses assuntos da montanha o chateavam. Sei que ele se considera o rei daqui e, sei mais ainda, o quão difícil você passar uma vida inteira sendo algo e depois alguém de tirar tudo o que conquistou. O abracei forte, coloquei minha mão dentro da sua cueca, fazendo carinho no bumbum dele, ficando em silêncio, balançando devagarinho de um lado par o outro. Depois ganhei vários beijos, vários cheiros, várias mordiscadas, me deixando "daquele" jeito.

- Vamos dar um passeio? – perguntou ele com os olhinhos semi serrados, com um sorriso gostoso.

- Pela montanha?

- Não, isso não! Lá na cidade, topa?

- Cael, eu jamais recusaria algo que você nunca fizera. Lógico que vou!

- Mas antes, eu tenho uma surpresa para você! – disse ele abrindo ainda mais o sorrisão de garoto.

Tomamos banho, nos trocamos e na saída ele pediu para que eu fechasse os olhos antes de entrar na camionete. Saímos de mãos dadas, já que não via aonde eu pisava. Ele me virou de costas.

- Abre os olhos – pediu ele.

Eu estava de frente para sede, toda apagada.

- O que eu deveria ver?

- Agora vire para mim.

Eu fui virando devagar até a cidade de Poti ao fundo, iluminada pelos 04 canhões de luz, espalhados em 04 cantos da cidade e ao fundo, os canhões de luz da arena e, mais, todas ela acesa. Eu tinha testado várias vezes às luzes, mas nunca as visto daqui de cima.

- Nossa, ficou lindo visto daqui! Muito lindo – disse puxando ele e o colocando entre os meus braços para vermos juntinhos.

- Apaguei todas às luzes justamente para poder ver melhor.

Os canhões de luz eram tão fortes que iluminavam, de forma fantasmagóricas, as nuvens repolhudas de chuva. Daqui de cima lembrava até o memorial do 11 de Setembro.

- Você tinha razão meu amor, ficou impossível de não achar o cu do mundo.

Paramos a camionete ao lado da Igreja Matriz e ficamos papeando e caminhando em volta dela até bater aquela fome e pararmos num lanche.

- Não é um Mc Donald's ou Burger King, mas dá pro gasto.

- Isso é uma bomba calórica em forma de lanche. Deus não pensou na barriga quando criou tudo isso. E não ligo que não seja Burger king!

Como de praxe eu logo pedi dois de uma vez para não ter perigo de ficar faminto. Depois passamos na sorveteria aonde "filei" um Sunday. E, para finalizar o passeio, entramos na arena e ficamos contemplando-a toda iluminada. Eu havia ido em milhões de festas, mas nunca as feito. E, sem me gabar, eu arrasei!

- Estás desanimado. O que houve?

- Eu posso ver mudanças nas nossas vidas e acho isso muito bacana, vejo que Poti só anda piorando para nós. Eu posso ver que há ódio crescendo cada vez mais. Eu vejo que as coisas lá mudaram.

- só por causa de um final de semana com problemas?

- Nada, desde que você chegou lá eu venho perdendo coisas – disse ele olhando.

- É uma indireta?

- Jamais, eu te amo!

- Desculpe se você não gostar do que vou falar, mas percebeu que você sempre foi amargo, sempre quis ganhar tudo na base da porrada, principalmente comigo?

- Eu não consegui lidar com o fato que a minha cabeça não parrava de pensar em ti um minuto se quer.

- Que lindo!

- E eu não entendia que era paixão, até porque eu nunca tinha me apaixonado. Eu nunca tinha entendido a necessidade um do outro. Eu acabava ficando irritado com essa vontade de estar ao seu lado. Essa necessidade que a cada dia me deixava louco. E depois tudo fez sentido.

- Eu sabia que você me amava!

- Como? Nunca deixei isso transparecer! – retrucou ele me dando um soco na perrna.

- Porque é impossível alguém não me amar! Eu sou bonito, sexy, bem humorado...

- Modesto – interrompeu ele.

- Fala que é mentira!

- Pior que não! pior que faltou algumas coisas, como: tem bom coração, nunca faz mal a ninguém (mesmo sendo assim, todo marrento), é carinhoso, é atencioso, quer sempre mostras o lado bom da vida (de fato esse é o seu melhor dom), faz o meu lanche na chapa que conheço.

- Te amo Cael, mesmo você não tendo nenhuma dessas qualidades!

- Mas eu farei o melhor a partir de agora.

- Eu estava apenas brincando seu bobo. Você tendo reconhecido essas coisas, já mostra que você tem isso dentro de ti e, sem falar que, depois que nos assumimos, você é outra pessoa. Muito melhor do que eu conheci.

- Eu sei! – repetiu ele dando uma risada gostosa.

- Monstrinho!

- Amo ser seu monstrinho! E ai, o que está achando do passeio?

- Achei muito bacana! Você nunca tinha me chamado para sair antes.

- Depois que saímos daqui e, você a cada dia me mostrava algo novo, aprendi a gostar de passeios.

- Que noticia boa Cael!

- Estava pensando aos finais de semana a gente rodar cidades da região, sempre ouvi dizer que são lugares lindos, pequenos, mas muito lindos!

- Viajar, aos finais de semana?

- E nosso trabalho?

- Ah, agora eu tenho uma pessoa que necessita mais de atenção que a montanha. Quero dizer, não ficarei enfiado mais lá como antigamente. Eu vivi tão pouco em tanto tempo, que não quero mais me matar como antes.

- Mas agora demos andamento ao Rodeio. Não poderemos apenas parar!

- Não é que vou parar, apenas não ficarei 24 lá. E, se continuar assim como está, eu não podendo mais reclamar de nada, não tenho mais interesse em ficar lá!

- E o que faria, já que não terá mais nada disso?

- Quando a jornalista disse que a fronteira do Uruguai era muito próxima daqui, naquela sua reportagem tosca, ela sabia do que está falando.

- Como?

- Eu tenho um pequeno sítio lá, com pouco gado. Nem se compara com aqui, mas é lá que eu fui construindo aos poucos. A única diferença é que faz muito mais frio e eles falam castelhano, mas nada que não adaptaremos!

- Adaptaremos? Pensa em me levar pra mais longe do que já estou?

- Na verdade, você é quem disse que não há mais volta! Você não pode voltar para Sampa e eu para montanha. Aquele sitio era minha aposentadoria. Lugar é lindo, pequeno, mas lindo.

- Talvez possamos ir lá...

Fui interrompido por um barulho que e há muitos dias eu não ouvia, o som assustador da sirene da represa quando enchia às represas.

- Mas não foram feitas novas represas para conter a água?

- Só pode haver um problema então, o sistema de alarmes está danificado.

Andamos até próximo ao rio que cortava a cidade. Estava bem abaixo do normal, mas poucos minutos depois, a agua começou agitar o estreito rio e ele começou encher, encher, encher até quase ficar no limite. Algumas pessoas também vieram até a margem para ver a correnteza. Era crianças que brincavam de colocar seus gravetos na pequena correnteza, uns jogavam pedras, outros pulavam de alegria, já o Cael estava sério. Fomos para montanha aonde certificaram que tudo estavam normal e, que amanhecendo, a primeira coisa que fariam era procurar um engenheiro e um técnico para inspecionar tudo. Quer dizer, seria a primeira coisa.

Acordamos com batidas fortes na porta e depois o som da maçaneta sendo forçada a abrir. Agora entendia a teimosia do Cael quando eu queria ficar deitado com ele, peladinhos na sala e ele insistia sempre ficar no quarto, porque sempre deixava a porta aberta.

- Acorde Cael – chamou o Tomé insistindo nas batidas na porta.

Ele pulou da cama e colocou a calça em 01 segundo, me puxando para fora do seu quarto enquanto colocava. Ele fez sinal de silêncio enquanto eu ia para o meu quarto. Pulei na cama fria e enrolei no cobertor.

- Estamos tentando falar com você desde ontem à noite, mas não os achamos. Um dos advogados veio avisar para você que tens que comparecer a polícia de Porto Alegre, ás 13 horas de hoje, para prestar depoimento.

- Yuri? – chamou o Cael num tom firme.

Coloquei a minha calça, me enrolei no cobertor, sai do meu quarto e me encontrei com o restante na sala.

- Precisamos ir a Porto Alegre hoje!

- Mas, só queria saber, por que eles que vieram lhe chamar a depor e não o Cael?

- Na verdade, disseram que a Policia entrou em contato com o Cael durante o dia todo, mas como vocês não estavam aqui, entraram em contato com o advogado responsável.

- Então deixa quieto. O advogado não tem nada com a sua vida. É problema da policia vir até você.

- Sabe Yuri, eu quero acabar logo com isso!

- Eu também, mas vamos fazer de forma correta. O cara não é seu procurador e nem seu advogado para falar em seu nome.

- Eu posso fazer o que eu quiser? – perguntou ele balançando a cabeça negativamente.

- Você combinou de nunca mais fazer nada sem conversar comigo. Está na cara que estão aprontando com você. Querem o pegar desprevenido.

- Tomé, poderia fazer um favor de ir até a represa, contatar os engenheiros e os técnicos. A represa é a prioridade nossa hoje. Obrigado pelo recado, agora deixe a sós com o Yuri.

Esperamos o capataz ir embora enquanto deixei o Cael na varanda. Graças a sua falta de paciência, mais uma vez ele estava fazendo tudo por conta própria e isso me irritava muito.

- Yuri, me espera um pouco. Preciso falar com você – vinha ele com aquela voz de Cael arrependido.

- Sempre isso Cael! No fundo ainda não consegue lidar com o fato de sermos um só pra tomar decisões familiares.

- Não é isso! Quero que acabe logo, quero que parem de me encher aqui na montanha.

- E isso significa falar amém para qualquer idiota que está lhe fazendo mal. Toda vez que abriu a boca para falar com um advogado você se ferrou.

Como de costume, ele vinha me abraçar para evitar que eu ficasse bravo com ele.

- Por favor, Yuri, dessa vez, confie em mim.

- Eles estão armando contra você! Não entende que é impossível você ser intimado pelos advogados?

- Eu preciso ver o Alan. E outra você estará comigo. Se na hora você disser "não" eu não vou, pode ser?

- Amor, eu não vou ficar pra sempre presente ao seu lado. Não faça isso!

Arrumamos as malas mais que de pressa naquele dia. Precisaríamos correr se quiséssemos chegar às 13 horas. Descemos a montanha derrapando a camionete a cada virada. E, para mais uma surpresa, na porteira estava o Tomé e mais um engravatado.

"Puta que pariu! O que seria agora?!"

- Mais uma vez? – disse o Cael cabisbaixo. –eu não quero mais isso para mim. Não aguento mais esses advogados vindo aqui todos os dias.

- Sabe, nem eu estou aguentando mais.

Paramos a camionete ao lado do engravatado. Era uma rapaz baixo, de cabelos devidamente emplastados de gel, penteados para trás, usava óculos escuros que dificultava saber se era bonitinho ou não e o mesmo terno barato.

- O que está acontecendo agora? – perguntou o Cael ficando vermelho.

- O... advogado quer falar com o senhor Yuri – disse o Tomé olhando para os pés.

O rapaz d deu a volta pela camionete e abriu um sorriso largo a me ver.

- Bom dia Sr. Yuri – disse ele e estendendo a mão para me cumprimentar.

- Qual o seu nome?

- Meu nome é advogado n.º 21 – respondeu ele ainda com aquele sorriso estampado.

- Temos pressa advogado n.º 21, se puder adiantar o que precisa?

- Preciso é do senhor! Venho através do Senhor Caio solicitar sua presença às 20 horas de hoje na montanha dele para discutirmos finanças.

- O Senhor Caio não pode esperar até amanhã?

- Por qual motivo senhor Yuri Martel?

- Pelo motivo que estou acompanhando o Cael Martel até Porto Alegre para depor – respondi batendo na perna do Cael, indicando para ele continuar.

- E o que o Senhor Cael tem haver com você? – indagou o engravatado cruzando os braços.

- Tudo! Trabalhamos juntos – respondi fazendo o advogado soltar uma gargalhada.

- Senhor Yuri, esteja pronto meia hora antes que passarei aqui para apanhá-lo, ok? Ah, não esqueça o terno e gravata. Sabe que o Senhor Caio é bem "alinhado". Sem mais – disse o filha da puta entrando no carro dele.

O Cael me olhava com uma cara triste, daquelas que não aguentava mais aquela situação constrangedora.

- Yuri... você é o único Martel dessa montanha...

- De jeito algum Cael! – interrompi ao perceber do que se tratava.

- Precisamos de um Martel constantemente aqui...

- Eu disse não! Não vou deixar que você vá para o "abatedouro" sozinho.

- Você é mais valioso aqui do que eu em Porto Alegre. Eu estou te pedindo.

O Tomé que estava ao nosso lado, percebeu nossa discussão e foi dar uma volta ao lado para nos deixar a sós.

- Yuri, eu preciso de você aqui, preciso que seja eu.

- Eu não sei nada daqui?

- Como não sabe nada? Você sabe tudo o que tenho aqui e faça o seu melhor.

- Não sei ser o melhor, sem você!

- Sabe sim, sou melhor no que sou graças a você!

Mais uma vez aquele barulho que me tirava o ar dos pulmões soou pela montanha. esperamos longos dez minutos passarem quando ele pegou na minha mão.

- As sirene está tocando Yuri... você tem trabalho há fazer – disse ele me puxando para um abraço.

- É muito injusto que está fazendo comigo. Eu nunca fiquei um dia longe de ti desde que sai daqui.

- Se vamos passar os restos dos dias juntos, não será o ultimo!

Dei um abraço mega apertado e verificamos se o Tomé nos olhava quando demos um beijo. Meu coração doeu muito por vê-lo partir sozinho.

- Yuri? – chamou o Tomé dentro da sua pick-up – Trabalho a fazer.

Fomos falar com o mestre da represa que precisaríamos solicitar um engenheiro e um técnico.

- Mas, de imediato, precisaria abrir mais umas 03 mini represas para escoar bem aqui em cima. Deve haver algo impedindo a tubulação de correr essa água. O que tem ser feito, deverá ser feito rápido.

Avisamos ao tio Caio e ao Mestre Cervejeiro sobre dinamitar mais 03 lugares. E foi o que fizemos durante toda tarde. Dinamitar coisas deveria ser o evento que mais chamava atenção dos moradores de Poti, pois sempre eles lotavam os lugares para ver o "expetáculo". Após uma tarde inteira de trabalho para colocar os explosivos no seu determinado lugar, fiquei de responsável pelo meu setor, pois ainda não tinha experiências com explosivos. Ou seja, meu único trabalho era dizer "Ok" para que o Mestre cervejeiro ligasse as chaves. Voltamos meia hora após retirarem todo o sistema que utilizaram para o sucesso em abrir 03 represas. Chegamos à montanha já no final da tarde. A estrada que ligava a porteira a montanha estava toda enfeitada com rosas.

- Pra que essas rosas Tomé? – perguntei ao ver várias mulheres amarrando-as nas cercas – nunca vi isso aqui.

- Porque é dia de Nossa Senhora – respondeu o capataz seco.

- Mas o povo daqui não é devoto ao Santo Padre?

- O povo que mora em Poti, mas não o povo da montanha.

- Entendi!

Cheguei à sede já bem tardinha. Nada de ver a camionete do Cael o que fez meu coração apertar ainda mais! Apenas a Nina estava na varanda, colocando rosas nos pilares da minha casa.

- Boa tarde Nina!

- Boa tarde Yuri! Viu como ficou bonito os enfeites? -perguntou ela sorrindo.

- Não sabia que o Cael era devoto de algo.

- Ele é o dono daqui! Ele sempre enfeita a montanha e faz um jantar aos mais próximos na sua casa.

- Como ele fará um jantar se ele não está aqui ainda?

- Mas aonde aquele homem foi? Ele sabe que todos os anos eu faço cordeiro, leitoa, frango e tudo mais... como ele foi esquecer?!

- Ele foi obrigado Nina, assim como eu fui obrigado a ir à montanha do tio Caio – disse fazendo-a exclamar algo que não entendi.

Eu fiquei meia hora explicando a ela tudo o que acontecera. Ela, no entanto, me mostrou o que fez dentro da sede. Lembrava até um buffet com dezenas de vasos de rosas espelhado por todos os cômodos da casa, além de uma bela mesa posta. Dentre outros enfeites feitos com plantas que não sabia distinguir. O cheiro maravilhoso de ceia de Natal tomou conta dos meus pulmões, enchendo minha boca d'água.

- Mas assim que eu chagar, eu desço pessoalmente até a casa de vocês e os chamo para vir jantar.

- Está bem então, já que o Cael não está, vamos esperar.

Fui tomar banho quente, daqueles que derrete o corpo.

"Como conseguirei ir a alguma reunião com meu amor sem dar noticias o dia todo?"

Eu mal conseguia respirar, falar, quiçá pensar enquanto não obtive noticias do Cael.

"Mas que idiota que fui, nem ao menos dei o celular a ela para me ligar. Que idiota!"

Fui até o meu armário aonde procurei um terno bacana para reunião de hoje. Passei bastante perfume e fui lá fora esperar o advogado vir me buscar. Ao fundo, o sol se punha num vermelho vivo. Eu mal sentara quando a camionete apontou na porteira, dela desceu outro engravatado. Achei que fosse o mesmo, mas era outro rapaz alinhado. Era um cara baixo, com a barba por fazer, estupidamente alinhada num desenho que poucos barbeiros saberiam fazer. Seu cabelo formava um topete com gel, todo espetado, nas laterais um degrade entre o numero 0 a 1, alinhando-se perfeitamente com a barba. Como todos os outros advogados anteriores, esse aqui usavam óculos escuros. Bom sorriria em troca se não fosse "compromissado". Sem falar que eu preciso parar de pensar besteira sobre os advogados.

- Meu tio anda investindo em vocês advogados. Ele vos pagam belos cortes de barba, cabelo, óculos escuros, mas ainda insiste em ternos baratos. Qual o seu nome? – perguntei quando rapaz chegou ao meu pé.

- Meu nome Cael Martel e esse não é um terno barato. É um GUCCI!

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top