Capítulo Trinta e Dois
A primeira coisa que notei quando acordei, foi que havia uma mesa farta no centro da minha cela. Aquilo nunca havia acontecido antes. A comida sempre era servida em uma bandeja e tudo o que eu tinha era uma colher.
Alexy estava sentado à mesa e olhou para mim por apenas um segundo antes de desviar o olhar novamente para a torta que comia com elegância.
― Você está parecendo horrível ― declarou sem inflexão na voz. ― Prenda o cabelo e lave o rosto antes de se sentar comigo.
Me levantei e caminhei até a pia, odiando obedecê-lo, mas sabendo que ele dizia a verdade sobre a minha aparência. Após ter chorado até dormir, eu sabia que meus olhos estavam inchados mesmo sem ter nenhum espelho onde eu pudesse ver meu reflexo.
― Por que tem uma mesa aqui? ― Perguntei em voz baixa enquanto secava o rosto.
― Pensei que seria bom que comêssemos juntos e uma mesa é o mínimo que eu posso fazer com a minha posição ― respondeu tranquilamente antes de voltar a comer.
Ignorei o tom esnobe dele e comecei a juntar meu cabelo para fazer um rabo de cavalo no topo da cabeça. Quando fui prendê-lo ― com o prendedor que Alexy havia me trazido dias antes ― ele se sobressaltou.
― Que marca é essa no seu braço? ― Indagou se levantando, mas não se aproximando.
Terminei de prender meu cabelo e olhei para o meu braço tentando entender do que ele falava. A marca arroxeada no meu antebraço simbolizava o primeiro presente que me foi dado pela minha mãe biológica. Dei de ombros, pois sabia que ele jamais faria algo contra Sophia, mesmo com seu interesse mórbido por mim.
― Você não me trouxe de volta ontem, então Sophia o fez ― sussurrei de forma doce.
Ele franziu os lábios como se estivesse enjoado e seus pulsos se apertaram em punhos ao lado do corpo.
― Não a chame pelo nome, é desrespeitoso ― pediu. ― A chame de Rainha, pois é isso que ela é.
― E o meu bebê, Ale-General? O que ele será meu? ― Sentei-me a mesa fingindo uma calma que eu não possuía e comecei a me servir, pois todo aquele desgaste emocional me deixava constantemente faminta. ― Ontem, durante o meu ultrassom, disseram que hoje eu completaria seis meses. Como isso pode ser verdade?
Ele retomou seu lugar na minha frente e fechou os olhos com força.
― Não deveriam te deixar saber disso ― disse simplesmente se recompondo e voltando a comer.
― Elas nem ao menos pareciam notar que eu estava lá, o que não deveriam me deixar saber? ― questionei com um pingo de sarcasmo.
― Todo o Complexo onde estamos está instalado entre dimensões, para ser mais preciso, dentro de um vortex temporal ― ele respirou. ― O seu corpo não teve o menor problema em se adaptar a isso, mas quando a trouxermos para cá, não sabíamos que efeito isso teria na criança ― inspirei rápido com medo do que viria a seguir. ― E dos males o menor, a única diferença é que a gravidez está se desenvolvendo em um ritmo acelerado e o parto deve acontecer em poucos dias ― concluiu como se aquela enxurrada de informações não fosse nada demais.
Entorpecida pela notícia, esperei que todas aquelas novas informações afundassem.
― Quantos dias? ― Inquiri com um fio de voz.
Ele deu de ombros como se absolutamente não ligasse para aquele assunto.
― Quatro, no máximo ― respondeu.
Suspirei tentando conter as lágrimas em vão e Alexy se levantou.
― Eu vou te deixar um pouco sozinha para que possa processar essa informação, mas coma e tome um banho, pois preciso te levar para Sophia novamente e ela não gosta de atrasos.
Ele se retirou e eu corri até o vaso sanitário vomitando todo o conteúdo do meu estômago. Logo após, tomei banho, as lágrimas se misturando a água que me limpava. Me vesti dessa vez com uma blusa de mangas longas e saia comprida, sem força suficiente para odiá-las.
Eu achava que teria mais oito meses com o meu bebê antes que o tirassem de mim, mas até os longos meses de gestação me foram roubados. Desejei que a maldição de Sophia funcionasse e eu morresse antes de ver meu bebê ser arrancado de meus braços.
Comi novamente, sem vontade, apesar de estar faminta. Escovei meus dentes e me deitei na cama controlando a vontade de chorar enquanto esperava Alexy vir me buscar. Ele me guiou com a mão na parte baixa das minhas costas ― quis pensar que aquela era a forma dele de me confortar. Se a ideia era essa, não funcionou.
― Vou ficar aqui fora ― disse quando paramos em frente a porta branca mais uma vez. ― Quando acabar, vou te levar de volta para o seu quarto.
Dei de ombros mesmo que soubesse que aquela era a forma dele de dizer que não deixaria ela me machucar de novo. Nenhuma dor física que Sophia me infligisse agora seria comparada a tempestade se formando dentro de mim.
Por falar na bruxa, ela estava ainda mais animada que no dia anterior, se é que isso era possível.
Já que hoje eu usava uma saia, só precisei desabotoar os botões e minha barriga ― agora do tamanho de uma bola de praia ― saltou livre. Eu quase chorei ao perceber que só a veria grande daquele jeito por mais alguns dias.
― Bem, ― falou a médica já espalhando aquele gel gelado sobre a minha pele ― vamos ver se conseguimos saber o sexo hoje? ― Perguntou e Sophia se aproximou animada. ― Quer ouvir os batimentos cardíacos do bebê?
Achei, por alguns segundos, que ela estava falando comigo, antes de perceber que ela falava com a outra que retorceu os lábios em desgosto.
― Não gosto de barulho ― declarou rapidamente.
A médica franziu as sobrancelhas e pela primeira vez olhou para mim ― e não para a minha enorme barriga. Suspirando tocou-me com o estetoscópio e pareceu satisfeita com o que ouviu.
― As batidas são fortes e rápidas como deveriam ser ― falou a loira sorrindo.
― Vamos logo com isso, eu quero ver meu filho ― repreendeu Sophia ou como Alexy me mandou chamá-la, Rainha.
A médica se apressou e poucos minutos após isso, tínhamos a imagem do meu bebê na tela. Ao mesmo tempo, ela fez um som de engasgo e eu quis perguntar se havia algo de errado, mas Sophia foi mais rápida.
― Há algo de errado, Juliet? ― Indagou rudemente. A mulher me olhou com os olhos aflitos como se pedisse alguma coisa, mas não pude entender o que ela queria. ― Vamos! Responda, Juliet! ― Berrou.
― É uma menina ― disse a médica de forma estrangulada. ― O bebê é uma menina.
Nesse instante tudo ao meu redor ficou estático. O reconhecimento do fato de que eu tinha uma pequena menina dentro de mim, que agora não era mais apenas uma criatura e sim um ser humano, foi de realização completa e saber que Nicholas ficaria mais do que feliz em termos uma menina me deixou em êxtase. Esses pensamentos fluíram pela minha mente em um rápido flash antes de o inferno se instalar naquela sala.
Sophia deu um berro animalesco e se jogou em cima de mim com as unhas perfeitas expostas.
― Eu vou te matar, eu vou te matar ― urrava ensandecida. Batia, puxava, socava e chutava tudo o que conseguia alcançar. Encolhi-me até a beirada da cama enquanto tentava proteger o meu bebê, sem muita sorte. O cheiro de sálvia me sufocando. ― Você não serve para nada! ― Aumentou a voz na última palavra. ― Você estragou tudo! EU ODEIO VOCÊ! ODEIO VOCÊ! VOCÊ DESTRUIU MINHA VIDA! EU VOU TE MATAR! ― Ela rugia tão alto que parecia estar falando dentro da minha cabeça. Ouvi outros gritos e eles poderiam muito bem ter vindo de mim.
A partir daí tudo aconteceu muito rápido.
Alexy entrou no quarto como um furacão e a arrancou de cima de mim. Me encolhi ainda mais, sentindo algo úmido nas bochechas que ardeu quando tentei secá-las com a ponta dos dedos, vendo arranhões e marcas roxas por meus braços.
Alexy continha Sophia ― que ainda enlouquecida, investia contra ele de forma bruta ― do outro lado do quarto. Juliet entrou na minha frente tampando a minha visão dos dois. Limpou o gel que ainda estava presente sobre a minha barriga redonda e me ajudou a abotoar a saia e a me levantar da maca. Me levou de volta a cela e limpou as escoriações por todo o meu corpo com um líquido que ardia muito e colocou um curativo sobre os piores.
Checou os batimentos do bebê novamente antes de me trazer comida, chinelos de pano, um vestido, uma calça de tecido mole e duas blusas, todos para grávidas. Também trouxe uma toalha seca, dois sabonetes e levou todas as roupas que eu havia usado e tinha deixado dobradas no canto do quarto.
Fez tudo isso sem dizer uma palavra, como se fosse proibida de se dirigir a mim e quando ela foi embora, percebi pela primeira vez desde que havia chegado que a ideia de ficar sozinha me fez sentir realmente sozinha.
A esperança era realmente uma coisa forte e poderosa, percebi, sem ela só restava o medo e o medo era a coisa mais enfraquecedora do universo.
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