Capítulo Vinte e Quatro
Avery Strong
Em nossa volta para Bloodhouse eu me sentia muito mais calma, como se a paz de Lily tivesse se apossado de mim. Então, na quinta-feira, eu fui encontrar Pierre como se estivesse flutuando:
― Por que tão feliz, Avery? A missão foi tão bem assim? ― Perguntou quando eu me sentei na poltrona, cantarolando.
― Melhor que bem, querido Pierre, sinto que finalmente estou compreendendo meu lugar aqui.
Ele sorriu, o cabelo preto arrepiado combinando com os olhos delineados.
― Fico feliz que você esteja enfim enxergando o que eu sempre vi ― seu sorriso se tornou quase paternal apesar de sua idade, antes de ele começar a ralhar, como era de seu feitio: ― Agora se levante daí, estamos aqui para que você possa aprender, não para papearmos.
― O que teremos hoje? ― questionei não perdendo meu bom humor.
― Sua dicção, obviamente.
― Por Crown, Pierre, quer me matar?
― Pelo contrário, quero te ajudar e achei que isso já tivesse ficado claro. Não sei como sua professora de estudos de TV ainda não te matou ― ele foi até a mesa e trouxe consigo uma pilha de fichas. ― Aqui tem uma série de trava-línguas que, em oposição ao nome, vão te ajudar a soltar a língua.
― Eu vou ter que ler?!
― Avery, eu sei que sua leitura melhorou muito nesses últimos meses, mas você não pode fugir de ler na presença de outras pessoas para sempre.
Ele tinha razão sobre a minha melhora, o livro de poesias da mãe de Cameron, que eu parecia incapaz de parar de ler, era responsável também pela melhora do meu vocabulário. Minha dicção agora havia se tornado meu maior problema.
― Tudo bem ― concordei pegando suas fichas. ― O rato rasgou a roupa do rei de Roma ― consegui depois de algumas tentativas.
― Agora o resto ― incentivou.
― A rainha raivosa rasgou o resto ― exprimi com maior facilidade.
― Muito bem, não é tão difícil, é? ― questionou de maneira um pouco debochada. ― Agora o próximo.
E assim, continuamos.
Na sexta-feira, nossa aula de TV era uma prática, nossa gravação do tema passado na aula anterior. Eu costumava odiar tanto essa aula e agora me perguntava o porquê. A pressão de não apenas ter que escrever meu próprio texto, mas também ter que falar de frente para uma câmera, sabendo que mais tarde o vídeo seria apresentado para todos, no entanto, hoje eu me sentia não incomodada e não me incomodava ver meu vídeo ― que eu e Cameron escrevemos e gravamos após nosso retorno ― ser exposto.
E dessa forma, quando meu coração não disparou como me era normal, eu suspirei percebendo que estava me acostumando com aquela vida.
A temática daquela semana era a morte de um Parlamentar e sob o brilho da tela, eu pronunciei:
― Querida Nação, é com muito pesar que trago a notícia de que meu caro colega Parlamentar, Yuri Krum, veio a falecer de complicações causadas por uma doença renal. Sua morte foi tranquila e pedimos que cada um, de sua forma, envie mensagens positivas para a família Krum. Dessa forma, encerro esse anúncio dando os pêsames a toda Verhallow pela nossa perda em comum. Nosso coração pode ter perdido uma parte, mas continuará batendo como um. A Verhallow somos todos nós e juntos sobreviveremos a essa perda.
Meu rosto se apagou e Sylvie aplaudiu, alvoroçada. Cameron bateu em minhas costas, expressando seu agrado.
― Foi perfeito, Avery ― afirmou e eu concordava.
No sábado, Cameron me tirou para dançar durante o baile. Ele tinha bebido um pouco de champagne, orgulhoso pelo nosso bom trabalho na Seita e estava um pouco alegre.
― Por Crown, Cameron, você vai me deixar tonta ― implorei me agarrando em seus ombros conforme ele me levava as piruetas pelo salão e eu vi Samuel conversando com a calada Lia.
― Não seja boba, Ave ― pediu me esmagando em seu abraço.
Quando a música acabou, ele tirou Sylvie ― também excessivamente alegre ― para dançar e eu peguei um copo de champagne e conversei um pouco com Yussef, que me parabenizou pelo trabalho bem feito.
― Posse levar a dama para um baile? ― questionou Samuel, galante como sempre, que tinha se aproximado sem que eu sequer notasse.
Acenei para Yussef, que me olhou com curiosidade por cima de sua taça e eu me afastei, segurando a mão de Samuel até a pista.
― Você está deslumbrante esta noite, se me permite dizer, Avery.
Foi a primeira vez que ele disse meu nome sem o "senhorita" ou alguma variação primeiro e não pude deixar de titubear, tentando esconder isso com um sorriso afetado.
― Eu sei.
― Senti sua falta no baile passado, esse salão perde a graça sem sua maior joia.
― Deixa eu adivinhar, você veio me dizer o quanto estou indo bem?
― Sem dúvidas ― retrucou. ― Você ainda é minha maior aposta. ― Ele pausou então, tendo um ataque de tosse que ele sanou com um lenço azul escuro que prontamente guardou de volta ao bolso. ― Peço perdão, peguei uma gripo que não pareço ser capaz de curar.
― Lhe desejo sinceras melhoras ― pronunciei quando a música terminou.
― Você está fazendo tudo certo, Avery. Logo estará no topo do mundo.
Voltei para o lado de Yussef após mais uma taça de champagne e o tirei para dançar.
Mais tarde, quando os Parlamentares já haviam ido embora e a maioria da Bloodhouse já estava dormindo, eu, Sylvie e Cameron, saímos para o jardim de trás, o mesmo que costumávamos passar nosso tempo cabulando as aulas de Encorajamento, o mesmo que eu havia vomitado em nossa noite de apresentação, tantos meses atrás.
Nós estávamos completamente alegres, um pouco bêbados de champagne, rindo de tudo como se fosse de todo hilariante.
― E se fizéssemos uma caça ao tesouro? ― gritou Sylvie com a voz esganiçada.
― Mas não temos um tesouro, Syl ― respondeu Cameron berrando também.
― Podemos enterrar algo nosso e depois girar, girar e girar ― exclamou ela demonstrando o ato ― até esquecermos onde o colocamos.
E contra o meu melhor juízo, concordei:
― Vou buscar algo brilhante em meu quarto, então ― disse Cameron antes de me puxar pelo braço, quase me derrubando e eu gritei:
― Cameron! Cameron, me leve em suas costas! ― pedi correndo atrás dele.
Mas ele fugiu e já estaca quase na porta quando eu ouvi Sylvie sussurrar:
― Avery.
A princípio pensei que a baixeza de sua voz de devia a sua incapacidade de controlá-la novamente, mas olhando para trás, me tornei imediatamente sóbria ao ver uma flor vermelha brotar do corpete de seu vestido.
Me projetei para frente quando ela caiu e a agarrei berrando, minhas mãos empapadas de sangue e meu vestido sujo de lama. Cameron logo estava ao meu lado, arrancando-a de meus braços, os berros de horror dele me partindo a alma, mas não havia nada a ser feito, pois Sylvie, minha tão cara Sylvie, espirituosa e avessa a relacionamentos, estava morta.
+++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++
Não sei o que dizer. Escrevi esse capítulo por volta de outubro do ano passado, enquanto assistia uma palestra e tive que sair da sala para chorar. Chorei novamente ao digita-lo. Isso é uma mostra do quanto esse capítulo me abalou, apesar de necessário para o próximo plot da história.
A Sylvie foi uma personagem criada para essa versão da história e eu já sabia, na primeira cena que ela apareceu, que esse seria seu final. Ela jamais poderia se tornar uma Parlamentar, como disse algumas vezes, porque ela não chegaria viva ao final da corrida. Nada disso me preparou para o peso dessa cena, porque assim como espero que tenha acontecido com vocês, a Sylvie criou uma marca muito profunda em mim.
Apesar disso, espero que tenham gostado do capítulo e se preparem pois esse plot inicia a jornada final da história. Espero vê-los semana que vem <3
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top