Capítulo Um

Avery Strong

O dia estava ensolarado, sem nenhuma nuvem no céu. Dias assim eram bons para trabalhar. Quando chovia ficava tudo cheio de lama e demorávamos o dobro do tempo para conseguirmos voltar para casa.

Assim que entrei na vila voltando do mercado notei que havia algo ligeiramente errado. Portas e janelas se encontravam fechados e não havia uma alma viva nas ruas. Aquilo era tão incomum naquele lugar que eu inconscientemente apertei as compras pesadas contra o meu peito apenas para me lembrar que eu deveria ter cuidado com os pães doces que Thomas havia me oferecido. Eu sabia que aquela era a forma dele de me cortejar e eu não deveria encorajar os sentimentos dele em relação a mim, mas só de imaginar que aqueles pães fariam o mês dos meus irmãos, aceitei.

Thomas era padeiro, havia herdado a padaria do pai que trabalhou na zona dos Highters a vida inteira, era onze anos mais velho que eu e a não ser que algum tipo de milagre mudasse a minha vida eu acabaria sendo convencida pela minha mãe a casar com ele pela vida que ele poderia me prover.

Ao chegar a minha rua finalmente entendi o que havia de tão errado na atmosfera do lugar. As portas e janelas da minha casa estavam escancaradas e havia um carro parado em nossa calçada. Não havia um só carro na vila, então aquilo só podia significar uma coisa: havia um Highter em minha casa.

Entrei em um ímpeto. Preocupada com as possibilidades e desesperada para saber de fato o que estava acontecendo.

Três homens estavam no meio da nossa minúscula cabana. Eles se agigantavam na nossa cozinha e meus pais pareciam maravilhados com a presença deles, meus irmãos longe de vista.

― Avery ― exclamou minha mãe. ― Você chegou em boa hora!

― O que está acontecendo? ― perguntei desviando deles para guardar as compras, mas minha mãe me interceptou cavando os dedos como garras em meus ombros.

― Esses são os senhores Swisten, Ackerman e Beurengard ― apresentou meu pai da sua cadeira de rodas na entrada da cozinha. ― Eles vieram aqui em nome da Verhallow.

― O que?! ― questionei assustada.

― É verdade, senhorita Strong, viemos por sua causa ― disse Ackerman.

― Isso é algum tipo de brincadeira? ― inflamei.

― Pelo contrário, te buscamos por ser especial ― garantiu.

Bufei sem conseguir me controlar, pois aquela era a coisa mais ridícula que eu já havia ouvido e isso significava muito depois de anos trabalhando para Highters.

Minha mãe enterrou os dedos nos meus ombros com mais força e eu reconstruí minha expressão estoica.

― A senhorita sabe como funciona o Parlamento da Verhallow? ― perguntou calmamente.

― Não permaneci na escola por tempo o suficiente para aprender a respeito ― alfinetei.

Ackerman pareceu constrangido demais para prosseguir e Swisten tomou seu lugar:

― Quando o mundo antigo acabou, a Verhallow foi criada com o intuito de tornar o novo mundo mais justo, então foram escolhidos doze jovens de dezoito anos para lutar pelos seis assentos do Parlamento, um para cada continente ― ele olhou para a minha mãe que ainda me segurava antes de seus olhos voltarem para mim. ― Você será paga para passar o próximo ano de competição conosco, aprenderá e se aperfeiçoará e se não passar, poderá voltar para casa tranquila, sem danos.

― E se eu passar? ― inquiri de queixo levantado, desafiando.

Beurengard olhou em volta parecendo a beira do riso e foi preciso que Ackerman o cotovelasse nas costelas para que ele recuperasse a compostura.

― Se você passar, terá vinte cinco anos no poder ao lado dos seus colegas, ajudando a criar um mundo cada vez melhor para todos nós. É um cargo duro, sem glamour, mas de extrema importância. Sem falar que você receberá um salário vitalício que será o suficiente para prover o necessário para a sua família. Isso é o que viemos propor a você, Avery.

Ele era bom. De alguma forma ele sabia que minha família ― meus irmãos, em especial ― eram a forma mais fácil de conseguir algo de mim.

Não precisei responder. A voz fina de minha mãe iniciou um coro de sim's ensurdecedores, mas os olhos de Swisten estavam em mim.

― Com todo o respeito, senhorita Strong, mas creio que só Avery pode dar a resposta para essa pergunta.

― Sim ― falei em um folego só com medo que minha voz falhasse. ― Eu aceito.

― Vá arrumar suas coisas, então ― demandou Ackerman. ― Partimos assim que estiver pronta.

Me virei ainda tonta e rumei para o minúsculo quarto dos fundos. Lá dentro, meus três irmãos mais novos estavam encolhidos no canto.

― Você vai nos abandonar, Avery? ― perguntou Lily, a mais velha, já com voz de choro.

Suspirei me abaixando de frente para eles.

― Vocês não deveriam estar ouvindo conversa de adultos ― ralhei suavemente.

― As paredes são muito finas, você sabe que conseguimos ouvir tudo ― sussurrou Elias, o caçula, segurando a mão de Brigite, sua gêmea.

― Eu nunca vou abandonar vocês ― garanti. ― Vou passar alguns meses fora para que vocês não precisem largar a escola como eu e Tamara precisamos. Você adora estudar, não é, Lily?

Eu segurei uma mecha do cabelo loiro dela entre os dedos. Ela tinha a mesma idade que eu tinha quando comecei e eu estava evitando ao máximo que começasse a trabalhar conosco. Eu gostava que ela ajudasse Carmilin na biblioteca, mesmo que fossem raras as vezes que ela conseguia alguns trocados, era melhor que ela ficasse lá cercada de livros e aprendendo constantemente do que largando tudo para lavar o chão de Highters.

Ela era tão diferente do resto de nós. Eu tinha cinco anos quando ela nasceu e lembro das brigas incessantes que se seguiram. Tamara tentava me distrair criando brincadeiras insanas naquele cubículo que chamávamos de casa e então dois anos depois vieram os gêmeos e a guerra estava acabada.

Levou muito tempo para que eu entendesse que aquela turbulência foi causada pelo fato de ela ser uma cópia exata da nossa mãe, cabelo loiro incluso, ao invés de ter a pele escura como meu pai e o resto de nós. Lily não pertencia ali e eu sempre fiz de tudo para que ela jamais percebesse isso.

― Eu não quero uma vida melhor, eu quero que você fique conosco! ― exclamou começando a chorar.

― Não aja assim, Lily. Você tem treze anos, já é uma mulher, é sua vez de cuidar dos mais novos.

Dei um beijo em sua bochecha e a deixei encolhida no canto. Ela se arrependeria disso depois. Assim como me arrependi de não ter me despedido de Tamara, mesmo que ela tenha se tornado uma bruxa conforme crescíamos.

Brigite e Elias me olharam com atenção. Ela estava com o nariz pequenino escorrendo e ele estava com os olhos escuros marejados.

― Querem me ajudar a arrumar minhas tralhas?

Na mesma hora, Brigite saltou para o armário em busca de uma bolsa. Elias me abraçou com seus bracinhos tão finos quanto gravetos. Isso mudaria. Eu ia garantir que nenhum deles fossem tão magros assim.

Brigite voltou com uma sacola trançada e começamos a guardar minhas poucas roupas. Meu único par de sapatos estava nos meus pés. Eu não tinha sequer uma escova de cabelos própria. Peguei minhas agulhas de tricô e alguns novelos de lã para que eu pudesse trazer algo de volta comigo quando eu retornasse.

Quando terminamos abracei os gêmeos e me demorei na porta esperando que Lily mudasse de ideia. Ela não mudou, então, sai.

― Pronta para ir senhorita Avery? ― perguntou Ackerman.

Acenei e minha mãe me abraçou.

― Não me envergonhe ― sussurrou em meu ouvido. Meu pai, ainda austero na cadeira apenas acenou para mim.

Saímos. Entramos no carro de bancos macios. Beurengard no volante, Ackerman ao seu lado e Swisten ao meu, minha bolsa no meu colo.

Suspirei tentando me acalmar. Eu precisava ser agradável, precisava ser boa o suficiente para passar.

― Então, lá vamos nós ― falou Swisten.

A viagem seria longa.


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Nem acredito que você chegou a segunda fase desse videogame :o
Brincadeiras a parte, espero que goste de wosae tanto quanto gostou de Wwc. Coloquem os cintos porque aqui vamos nós!

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