Capítulo Treze
Avery Strong
Liderei a volta do Rei Cryllis e seus soldados para o castelo fantasma.
― Ninguém toca em Raghaten ― pedi. ― Deixem que ele acorde.
― Como quiser, minha Senhora ― respondeu o rei da Floresta se fazendo confortável na sala decrepita.
Esperamos por horas, naquela cena bizarra de Rei, ex-Rainha e soldados da Floresta, até que Raghaten descesse as escadas desesperado e gritando:
― Guardas! Guardas! Levaram a minha... O que significa isso? ― disse parando quando nos viu.
― Resolvemos o seu problema com os súditos ― respondeu o Rei Cryllis se levantando. ― E agora iremos acertar as contas com você.
Raghaten gritou e esperneou, jurando vingança por todo caminho, antes de finalmente ser levado embora, direto para a Floresta Branca.
Ah, a paz do silencio!
Mas a vitória não se manteve silenciosa. Sylvie ficou realmente chateada por não termos lhe contado o plano e levou toda tarde e noite para que ela finalmente entendesse e perdoasse a mim e a Cameron.
Mais uma coisa aconteceu naquela noite, antes de irmos embora. Tesla chegou ao nosso quarto, torcendo as mãos com nervosismo.
― Gostaria de conversar com vocês por um minuto ― pediu esperando que a deixássemos entrar.
A permitimos entrar e a fizemos sentar. Ela deu um olhar delicado para Jamile antes de começar a falar em uma torrente:
― Eu quero ir com vocês.
Troquei um olhar com Sylvie, sinceramente surpresa por aquelas palavras.
― Mas por quê? ― retrucou Jamile. ― E Alastair? Ele é seu irmão gêmeo, não é? Vai deixá-lo sozinho?
― Alastair já é bem grandinho e sabe se cuidar ― respondeu a ruiva. ― Não quero ficar aqui vivendo uma vida medieval, me casar com um ferreiro e ter doze filhos.
― Meu pai é ferreiro ― pontuei um tanto ofendida.
Ela me olhou exasperada.
― Mas não é isso que eu quero para mim ― ela suspirou. ― Nem sequer gosto de homens.
― Não há nenhuma lei que te obrigue a casar com um homem e dar filhos a ele ― comentou Sylvie.
Tesla fez um som de frustração:
― Mas é isso que se espera de mim, entende? Não quero isso e por isso lhes peço para me levar. Fui uma aia uma vida toda, não me importo em mudar de empregador.
― Bem, ― começou Jamile ― se é isso que você realmente quer, imagino que eles podem fazer bom uso da sua ajuda.
― Obrigada ― respondeu Tesla se levantando emocionada. ― Vocês não vão se arrepender.
E foi assim que nos encontrávamos parados na mesma clareira que fomos deixados, assistindo Tesla e Alastair trocando um estranho abraço. Seus braços estavam entrelaçados, mas fora isso apenas suas testas se tocavam, os olhos estavam fechados, mas o resto de seus rostos estavam neutros.
― Esse é um antigo rito de antes de uma batalha ― disse o Rei Cryllis parando subitamente ao meu lado. ― Normalmente é usado apenas por irmãos de armas, mas não acho que alguém vá reprová-los.
― Rei Cryllis ― exclamei me virando em sua direção e lhe oferecendo uma reverencia ― a que devo a honra dessa adorável visita?
― Gostaria de tratar um assunto com a senhorita antes que voltassem para sua competição.
Tentei engolir a surpresa e manter meu tom de voz completamente neutro:
― Que tipo de assunto poderia ser tão importante para que Vossa Majestade viesse até aqui? E sem a Rainha Sonali, se devo notar ― provoquei sem poder me conter.
Ele sorriu, provando ser um homem de espirito leve apesar das responsabilidades de ser um monarca.
― Sonali está em nosso castelo, tinha que falar com o ferreiro sobre a forja de uma coroa nova, disse que não usaria nenhuma coroa velha vinda da Floresta Vermelha e vim porque não poderia deixar que parisse antes de te oferecer um presente de agradecimento?
― Um presente? ― repeti atordoada.
― Sim, senhorita Avery Strong, por toda a sua ajuda a Floresta, eu gostaria de transformá-la em uma Lady.
Dessa vez não pude esconder meu choque:
― Uma Lady? Vossa Senhoria, eu não fiz nada que me tornasse merecedora dessa posição.
Foi a vez dele de parecer estupefato:
― Como não? ― retorquiu. ― Senhorita Avery, sem a sua ajuda teria sido impossível unificar as Florestas de forma pacífica!
Lhe dei um olhar compassivo nem um pouco inclinada a aceitar:
― Agradeço o gesto, mas não preciso de um título ― a nave se aproximava e respirei fundo. ― Eu sinto uma tempestade vindo, no fundo dos meus ossos, como nada que veio antes, em vez do título, adoraria de sua parte uma promessa de auxílio quando o que está para acontecer, acontecer.
― Tem a minha promessa, Lady Avery ― pronunciou se curvando em uma mesura e beijando minha mão com seu olhar galanteador. ― Boa viagem.
Já na nave, após Sylvie dormir e Cameron tomar minha mão suavemente, ele falou:
― O que o Rei Cryllis queria com você?
Olhei para ele por sobre as pálpebras:
― Ele queria fazer de mim uma Lady ― respondi com um tom risonho.
A boca dele ficou escancarada com o choque:
― Uma Lady? ― ele engoliu em seco.
Eu deixei um risinho escapar:
― Você pode acreditar? Eu? Uma Lady? Ridículo!
― Você negou? ― ele questionou, incrédulo.
― É claro que neguei, o que eu faria com um título?
― Um título pode não ter valor em nossa cultura, mas tem bastante significado na deles. Um título como esse poderia lhe render diversos favores ― explicou com os olhos claros arregalados.
― Ah, mas eu tenho favores, em troca do título eu pedi uma promessa.
Ele escondeu uma risada com a mão que não segurava a minha:
― Você é realmente uma garota extraordinária, Avery ― ele tentou ficar sério. ― Qual foi o pedido que você teve a coragem de fazer para um rei logo após negar uma rara honraria?
Dei-lhe um olhar reprovador:
― Fiz ele prometer que atenderia nosso chamado caso precisássemos algum dia.
Ele pareceu preocupado pela primeira vez:
― Você acha que vamos precisar?
Dei de ombros com uma falsa calma:
― Espero que não, mas ultimamente ando sentindo uma urgência no fundo do meu estomago e não sou de negar meus instintos.
No momento em que as palavras saíram da minha boca a nave deu um chacoalho.
― Ah! ― exclamei horrorizada. ― O que é isso?!
Ele olhou para o teto e para uma das janelas sem cobertura do outro lado do corredor:
― Eu acho que é uma tempestade ― sussurrou.
― O que? ― indaguei tentando conter o pânico que subia rapidamente.
― Respire fundo, querida, não deixe que o medo te domine.
― Vamos cair ― murmurei apertando a mão dele.
Ele colocou um dedo sobre meus lábios me calando.
― Não vamos. Não fale isso, nem sequer pense nisso ― falou baixinho. ― Concentre-se na minha mão envolvida na sua, na sensação dos seus dedos nos meus e respire.
Fiz como ele mandou, mantendo meus olhos colados aos dele.
― Só um segundo ― ele fez movimentos estranhos para conseguir pegar a bolsa de Sylvie sem soltar a minha mão e verdadeiros malabarismos para encontrar dentro dela o que procurava. ― Aqui, ― ele me entregou uma pílula de uma caixinha ― vai te relaxar e te permitir dormir.
Eu, que odiava qualquer tipo de remédio, hesitei:
― Mas Sylvie...
― Não vai ficar chateada ― me garantiu ― se alguma coisa, vai dicar feliz por eu não ter te permitido sofrer desnecessariamente.
Eu estava vendida. Peguei a pílula de suas mãos e rapidamente a engoli.
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