Tessa era uma bastarda. Sabia disso como sabia que era filha de Jisso Sinclair e irmã mais velha de Kezia e Sierra, mas nunca teve tanta certeza disso como quando sua mãe morreu e as visitas já escassas de seu pai se tornaram nulas. Ele ainda mandava dinheiro de vez em quando, mas não era nem de longe o suficiente para sustentar as três irmãs e assim, Tessa começou a costurar para fora até que os dedos se tornassem grandes bolhas calosas e suas juntas doessem tanto que suas mãos começassem a se curvar em garras como se ela tivesse oitenta e dois e não vinte e dois anos.

A oportunidade de salvar o que restava de sua família surgiu quando ela recebeu uma carta cujo remetente e o selo a ligavam à Mansão Sangrenta e a abriu com pressa, usando uma de suas agulhas como abridor. Ela mal podia acreditar no conteúdo ali descrito, estava sendo convocada para costurar e pessoalmente cuidar de um dos Iniciandos a Parlamentar, aquela era a oportunidade de uma vida e ela não podia acreditar que tinha caído em seu colo. Ela estava exultante pela proposta e confiança, mesmo que provavelmente esse súbito convite tivesse sido fruto da amizade de sua mãe com um dos funcionários da Mansão, mas toda essa alegria se esvaiu quando o pai apareceu na porta da casa delas com uma carranca:

― Olá, Tessa ― ele havia dito. ― Precisamos conversar.

O coração da oriental havia acelerado, sua garganta ficando áspera e suas mãos começaram a suar. O que aquele homem pretendia tirar dela agora?

Ela o havia levado para a minúscula sala de estar, sem saber direito como lidar com a presença dele depois de tanto tempo e rezando para que as irmãs não o vissem e tivessem que lidar com sua perda mais uma vez.

― A que devo a sua visita, papai? ― ela hesitou ao chamá-lo pelo título, ele não o merecia, mas ela ainda tinha educação.

― Eu soube de sua convocação. Tenho um... conhecido na Mansão que me avisou sobre você e uma outra coisa que me trouxe aqui.

Tessa engoliu em seco, não se sentindo nem de longe preparada para o que quer que fosse que ele dissesse a seguir. Seu pai também não parecia muito disposto a continuar, mas prosseguiu mesmo assim:

― Uma de suas irmãs estará lá também. Como competidora.

O coração de Tessa pareceu despencar até o chão aos seus pés:

― Kezia? Mas ela acabou de completar dezoito anos...

― Não Kezia. Minha outra filha ― ele fez um sinal de círculo com o dedo indicador, como um eufemismo para seu adultério ― o nome dela é Sylvie.

Claro. A amargura encheu o estômago da jovem como se ela fosse ficar fisicamente doente. Claro que seria sua filha legítima que seria uma Inicianda a Parlamentar.

― Eu não vou desistir dessa oportunidade, papei. Eu e as meninas precisamos disso ― ela tentou apaziguar, mesmo que sua real vontade fosse de gritar.

O rosto de seu pai se suavizou, mas Tessa nunca esqueceria a lição que aprendeu sobre ele naquele dia.

― Não estou te pedindo isso, Tess. Apenas... Não se apresente, não se aproxime dela dessa maneira.

Ou seja, não revele minha farsa e infidelidade. Não exponha a segunda família que eu tentei tão duramente varrer para debaixo do tapete.

― É claro, papai ― ela aquiesceu, os olhos colados no colo.

Seu pai podia amá-la, ela entendeu, mas nunca a escolheria. Ela seria sempre a outra, a que deveria ser esquecida, boa o bastante para cuidar da filha legítima, mas não o suficiente para ser apresentada para ela.

― Sabia que você entenderia, querida ― ele deu um beijo em sua testa e saiu, deixando um envelope de dinheiro em sua mesa, fazendo com que Tessa se sentisse suja, como se sua companhia precisasse ser paga.

Olhando para a porta após ela ser fechada naquela tarde, toda a alegria sobre a convocação esvaindo conforme uma decisão se formava no âmago do seu ser. Ela encontraria sua irmã Sylvie e faria com que a garota soubesse sobre esse... ramo de sua família, nem que para isso fosse preciso ceder seu último suspiro.

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Só para deixar mais claro a relação da Tessa com os Aberne e porque ela agia tão estranho durante o livro e principalmente perto da Sylvie, ela diz pra si mesma que vai revelar a verdade, mas toda vez que ela tinha a oportunidade ela se acovardava. Esse conto me deixou com muita raiva ao escrever e espero que vocês sintam a mesma raiva ao lê-lo.