gatinha ➤ bucky barnes
A natureza era algo fascinante.
S/N sempre ficava intrigada perante o modo como florestas conseguiam ser lugares calmos e cheios de vida e assustadores e suspeitos ao mesmo tempo. O som dos passáros cantando suas melodias diversas nos altos galhos das imensas árvores — tão imensas que a luz mal chegava ali, apenas pequenas restias de iluminação por entre as folhas dançando juntamente com o vento suave. A sintonia dos grilos, que vez ou outra saltavam por entre a grama e as folhas secas do chão, se locomovendo ao mesmo tempo de suas canções repetitivas. E a escuridão da parte mais profunda da floresta; apesar de assustadora, algo nela chamava a atenção de S/N, ascendendo faíscas dentro do peito da mesma.
E o som da respiração ofegante. Esse sim era um som impossível de se ignorar.
S/N sentia o sangue pulsando nos seus ouvidos e a sensação do calor que emanava de suas orelhas e bochechas devido ao esforço. As mãos estavam suadas, assim como todo corpo, e as roupas grossas não ajudavam em nada com isso. Sentia os seus dedos dos pés amortecidos dentro das botas de combate e tentava ignorar a ansiedade e o pânico crescendo dentro do seu peito; a mulher estava, como havia estado tantas outras vezes, em modo alerta e combate.
O som de galhos sendo quebrados fez com que S/N voltasse para o mundo real. Como um gato, a mulher escondeu-se atrás de um tronco imenso ao mesmo tempo que identificava de que direção o barulho havia vindo. Oeste, ela concluiu, pressionando seu dedo indicador no gatilho de sua arma de modo suave, sem se precipitar.
Irkutsk, Rússia. Ano de 1999.
Um erro de cálculo minúsculo e agora S/N estava se esgueirando por entre os confins de uma floresta escura e densa. Ao mesmo tempo que precisava desviar das pinhas secas no chão a mulher mantinha seus ouvidos atentos aos passos do seu alvo, o som de folhas sendo arrastadas: a última bala o havia acertado, mas não o suficiente para detê-lo. Seus ouvidos —que foram modificados justamente para que ela conseguisse ouvir sons mínimos a distâncias consideráveis — captavam sons de tiros abafados a distância, além de gritos e barulhos de motores de carros e máquinas. O caos estava se instaurando. Ela precisava ser rápida, pois na região existiam bunkers e o seu alvo com certeza estava indo se proteger em um deles.
E a mulher sabia exatamente o que aconteceria se ela falhasse em uma missão.
Isso nunca havia acontecido antes, e era por isso que ela precisava correr, mesmo que a perfuração da bala no seu ombro estivesse ardendo mais do que qualquer coisa.
Você falhou, S/N. Você não conseguiu completar a missão.
A mulher respirou fundo, tentando controlar aqueles pensamentos acelerados assim como havia sido orientada por tantos anos.
Seu apelido era Gatinha. S/N fora a cobaia do experimento Pussycat desenvolvido na Rússia, que tinha como principal objetivo fazer com que um ser humano normal adquirisse as habilidades de um felino — como ouvir sons de alta frequência, correr e realizar saltos de modo impressionante e se esgueirar por lugares que muitos outros não conseguiam. Seus pés eram como almofadinhas das patas de um gato; era quase impossível ouvi-la chegando, e muitas vezes nem era vista saindo.
Ela havia sido um sucesso no experimento: de uma mulher sem família, largada nas ruas da Rússia a uma das melhores super soldadas de todo o país. A mulher era uma dádiva da organização.
O som de corvos levantando voô assustou S/N, o que demonstrava que ele estava mais perto do que antes.
Se concentra, porra. Não é hora para flashbacks.
E, de repente, o silêncio. O mundo inteiro ficou em silêncio naquele momento.
S/N prendeu a respiração e se viu travada pela tensão. O dedo no gatilho não se movia. Seus pulmões não mais filtravam o ar. A mulher jurou que até sentiu seu coração falhando uma ou duas batidas.
Mesmo sabendo que não havia perigo algum ao seu redor, S/N se viu tomada pelas mesmas sensações tão familiares de anos em missões: o medo de morrer. Mas acima do medo de morrer, ela havia sido treinada para a perfeição. Nada de falhar. Isso não estava no plano.
Mas acima de uma combatente de guerra, ela era um ser humano. Ela sempre teve medo de morrer.
Mais alguns segundos de silêncio, tempo necessário para que a mulher respirasse profundamente para se recompor da tensão.
— Achei você, gatinha.
O estouro de tinta vermelha passou de raspão ao lado da têmpora de S/N, explodindo na árvore seguinte, manchando suas cascas grosseiras com a cor escura e pegajosa. Uma sequência de disparos prosseguiu, mas não com a intenção de acertá-la. A mulher encolheu-se mais junto ao tronco enquanto as bolinhas vermelhas passavam zunindo ao lado de seus ouvidos, somente esperando que o show avermelhado acabasse. Apesar disso, S/N sorriu, voltando para sua normalidade. Alongou as escápulas para trás e girou o pescoço, se livrando daquela tensão nostálgica que insistia em ir e vir. Ela sabia o que estava por vir.
— Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. — a voz atrás da mulher ironizou, e o triunfo da vitória já era notável no seu tom. — O que a gatinha vai escolher?
Mais som de folhas secas sendo amassadas por passos pesados e desleixados. Ele jura mesmo que ganhou?
— Olha... — S/N começou, verificando sutilmente quantas bolinhas ainda restavam na sua arma. — Se o bicho for você...
— O bicho sou eu.
— Então eu vou ficar. — a mulher completou, enquanto os passos continuavam se aproximando cada vez mais, lentos. — E você também vai ficar bem paradinho aí.
Com o olho na mira, S/N virou-se para trás a tempo de ver Bucky Barnes pisando em um solo falso feito pela própria mulher. A perna do homem foi engolida pelo buraco suficientemente fundo para que ele perdesse o equilíbrio e caísse de joelhos, resmungando durante todo o processo. A arma de Bucky caiu no chão e, mesmo se ele tentasse recuperá-la, S/N já estava com a cabeça do homem na sua mira.
— Suas últimas palavras? — S/N sorriu, dando um passo para frente.
Bucky ergueu ambas as mãos para o alto em rendição, sorrindo de modo ladino. Mesmo com o capacete e a viseira de proteção, S/N conseguia distinguir os cabelos suados grudados na testa do homem, enquanto o mesmo molhava os lábios com a língua de modo provocante.
— Sabia que você fica muito gostosa desse jeito?
Quinze disparos em sequência, contados um a um por S/N. As bolinhas de tinta vermelha encharcaram a viseira de Bucky, feita de um material suficientemente resistente para aguentar esses disparos de bolinhas de paintball, enquanto o mesmo somente aceitava o seu destino de modo sorridente.
Parabéns, agente S/N S/S. Sua missão foi concluída com êxito.
— Esses foram por ter deixado a toalha molhada em cima da cama.
Mais uma sequência de disparos. Mais uma explosão vermelha.
— E esses são por ter deixado o braço de metal no meio da sala. — a mulher prosseguiu, abaixando a arma. — E existem muitos outros motivos, porém isso já foi o suficiente.
Bucky riu de modo divertido, abaixando os braços logo em seguida. Ele retirou a viseira e o capacete, os jogou no chão e limpou os respingos de tinta vermelha do rosto de modo desajeitado, passando a mão pelos cabelos curtos, porém de comprimento suficiente para que ficassem descabelados e grudados em sua testa. S/N abaixou sua arma e revirou os olhos, mas sem conseguir deixar de admirar as feições marcadas do homem brilhantes por causa do suor e levemente manchadas de tinta vermelha, deixando-o atraente de um modo que somente S/N conseguia ver. Por fim, ela aproximou-se de Bucky, enquanto o mesmo começava a desvencilhar sua perna da armadilha na qual havia sido pego.
— Anos se passam e você continua pensando nos mínimos detalhes, como se estivesse em uma missão. — o homem comentou, levantando-se enquanto batia a terra e as folhas secas das suas calças.
— Força do hábito. É quase impossível não lembrar, ainda mais num lugar como esse. — S/N respondeu, largando sua arma.
— Entendo super bem. — Bucky disse, começando a desabotoar o uniforme de proteção manchado de tinta pegajosa. — Falei que não precisávamos fazer isso que você não se sentisse a vontade. Sei que as memórias e a despersonalização ainda estão presentes em você e sei o quanto isso é horrível e...
— Está tudo bem, amor. Fazem mais de sete anos. — S/N o interrompeu, sorrindo levemente, demonstrando que validava a preocupação de Bucky por sobre ela. — Algumas imagens e alguns momentos continuam frescos na minha memória, mas quem precisa controlar isso sou eu. — ela aproximou-se do homem, ficando cara a cara com ele. — São quase oito anos de terapia com todos os tipos de técnicas. Eu preciso aproveitar a vida sem que tudo o que eu faça se torne um estopim para os surtos.
Bucky demorou seu olhar no rosto de S/N, admirando cada partezinha da mulher da sua vida. O orgulho que ele sentia dela era imenso; de assassina impiedosa ela conseguiu ressignificar seus traumas do passado sanguinário ao qual foi submetido a força anos atrás, assim como Bucky havia sido. Era óbvio que o motivo para que ambos estivessem tão unidos até hoje fora o passado em comum que compartilhavam. A sede de mudança e de melhora fez com que o casal apenas reforçasse seus laços amorosos com o decorrer do tempo juntos e, mesmo com todas as brigas, surtos e discussões, o amor conseguiu vencer todos os obstáculos.
E isso os fez ser o que são hoje e o que serão para sempre: um casal apaixonado.
— Tudo bem. Acredito em você. — Bucky respondeu por fim, abrindo um sorriso. Ele terminou de retirar seu uniforme sujo, jogando-o no chão. S/N demorou-se no peito suado do homem, envolto por uma regata branca que deixava a mostra seu braço de metal que havia ganhado um novo design recentemente.
— Tudo bem. — S/N deu ênfase, rindo de leve. A mulher abriu seu próprio uniforme apenas para provocar, mostrando seu busto nu com apenas seus seios envoltos em um top de academia extremamente justo. E é óbvio que Bucky plantou seu olhar neles.
— Como ele disfarça. — S/N ironizou. Ademais, no fundo, era exatamente essa reação que ela queria.
— E precisa disfarçar? — o homem respondeu, levemente indignado, arrancando um riso da mulher.
Bucky abriu seus braços e envolveu S/N em um abraço apertado, erguendo-a no ar, fazendo-a rir.
— A mulher mais linda do mundo. — ele distribuiu beijos desajeitados por todo o pescoço de S/N, enquanto a mesma somente gargalhava mais ainda.
Por fim, o homem colou seus lábios nos da mulher em um beijo cheio de sentimentos verdadeiros e luxúria. S/N retribuiu ao beijo quente, passando suas mãos pela nuca do homem, fazendo-o morder de leve o lábio inferior da mulher em resposta. Quando o ar faltou, ambos separaram os lábios com certa relutância.
— Eu te amo. Muito. — Bucky sorriu, depositando um beijo amoroso no nariz de S/N.
— Eu também te amo. — a mulher respondeu, sorrindo docemente. — Muito.
Mais um beijo apaixonado e demorado.
Esse sim era o tão falado amor verdadeiro. Duas pessoas que possuem passados tão terríveis conseguiram ressignificar seus traumas e medos para viverem uma vida digna de "pessoas normais". E era isso que os tornava extremamente fortes. A vida apenas havia começado.
Ⓐ
Não sei se ainda existe alguém por aí KKKKKKS
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top