25. a doce constelação de Virgo que brilhava apenas para si
Eu não quero olhar para mais nada agora que te vi
Eu não quero pensar em mais nada agora que pensei em você
Eu tenho dormido há tanto tempo numa noite escura de vinte anos
E agora, vejo a luz do dia
(Daylight - Taylor Swift)
♡
Ele soube o que deveria fazer assim que chegou em casa, e seus amigos o rodearam com todo o amor que tinham no peito. O rapaz soube que deveria ser mais grato ao que tinha e menos amargurado com o que não tinha. Quando comeu a sopa deliciosa que Jin preparou, ele agradeceu. Quando Namjoon lhe fez um suco de laranja, pois sabia o quanto ele gostava, ele agradeceu. Quando Jungkook apareceu, com olhos brilhantes e um abraço apertado, ele agradeceu por tanto carinho. Quando Jimin trouxe um pote de sorvete de chocolate, porque sabia que era o seu favorito, ele agradeceu.
Taehyung começaria a agradecer mais e pedir menos.
Não precisava de tanto, não precisava mentir para se humilhar por uma atenção paterna que nunca teve. Ele não precisava de Oliver Kim quando tinha todos aqueles garotos ao seu redor, rindo alto e extremamente preocupados com seu bem estar. Não precisava das ligações monótonas do seu pai quando havia os melhores conselhos de Namjoon Kim e os abraços reconfortantes de Jin Reed, que sempre o acolhia mesmo com todas as suas falhas e defeitos.
Enquanto Jimin embaralhava as cartas do uno, tendo Jungkook reclamando sobre ele não estar fazendo aquilo direito, como se existisse um jeito certo de embaralhar cartas, Taehyung puxou o celular e mandou uma mensagem para Cassandra. Já tinha passado da hora de acabar com aquele teatro, talvez fosse esse o próximo passo para mudanças que Hoseok sugeria. Sinceridade. Essa palavra morava na boca do seu terapeuta, e mesmo que a princípio ele a odiasse, aprendeu a gostar e usá-la com certa frequência para expor seus sentimentos. Foi o que prometeu a Jin depois da briga que tiveram, que seria mais sincero.
Cassandra não pareceu muito afetada com a declaração dele sobre terminar com o acordo, apenas pediu que deixasse a mídia com ela. Taehyung soltou um risinho ao guardar o celular de volta no bolso. A última coisa que importava para ele naquele momento era o que os tablóides londrinos poderiam dizer, o que era irônico, pois até pouco tempo isso era tudo o que importava.
O que havia mudado?
— Tudo bem? — a pergunta veio de Jin, sentado ao seu lado e com os dedos entrelaçados nos de Namjoon. Ele tinha uma expressão suave, Taehyung sorriu. Era bom estar em casa, rodeado da sua família.
— Ótimo, Jin. — ele suspirou, encarando os restantes dos meninos na roda. Estavam sentados no chão, em uma roda perfeita. Tirando pelo casal mais meloso do grupo que ficavam grudados o tempo inteiro, esquecendo que a dinâmica do jogo era individual.
— No que tá pensando?
Taehyung voltou a encará-lo e ofereceu mais um dos seus sorrisos amáveis. Há muito tempo não se sentia tão leve, tão contente. A última vez que sorriu assim, com o peito transbordando de uma felicidade sem fim e sem lógica, foi em Paris, quando conheceu um homem de sorriso doce e olhos de gatinho.
— Em como eu amo todos vocês.
— Que isso? Achei que o único sentimental aqui era o Jun.
Ambos riram, e Taehyung não poderia pedir por mais do que aquele clima agradável que se instalou na sala. Exceto por uma única coisa...
— Falou com o Yoongi hoje? — a pergunta pareceu pegar Jin de surpresa, até mesmo Namjoon desviou os olhos dos outros garotos para encará-lo com curiosidade.
— Bem pouco, ele disse estar trabalhando numa nova música.
— Ah, que bom.
Jin lhe encarou de uma maneira estranha, mas nada disse sobre. O jogo continuou e mais risos preencheram o apartamento dos meninos. Jungkook e Jimin não perdiam uma oportunidade em discutir sobre tudo, enquanto os outros apenas riam, se divertindo com o caos. Enquanto ria das vinte quatro cartas que Namjoon teve que pegar, Taehyung entendeu a filosofia sobre lar não ser um lugar, mas sim alguém. Ali, naquele apartamento, rodeado daqueles garotos singulares, ele se sentiu em casa.
[...]
O rapaz caminhava pelo parque com certa pressa, as roupas escuras e as flores rosadas das árvores eram um contraste interessante a quem visse de fora. Ele vestia um moletom preto, com o capuz escondendo o rosto, mas alguns fios longos do cabelo escapavam para fora da peça, agitados conforme ele andava. As mãos escondidas dentro dos bolsos estavam inquietas, o coração batia acelerado dentro do peito e a boca estava seca. A cabeça baixa, e os óculos escuros fazia-o parecer um suspeito de um crime em um filme de ação.
Yoongi estancou no lugar assim que avistou a estátua do Anjo das Águas. O que estava fazendo? Não deveria estar ali, sentia-se um criminoso. Ele não deu uma resposta a Taehyung sobre encontrá-lo, na verdade, ele riu ao soltar o celular na mesa. Achou absurdo a ideia, não aceitaria sair com aquele homem, não abriria brechas para ele tê-lo em mãos novamente.
No entanto, lá estava ele, encarando uma fonte antiga como se pedisse ajuda, respostas. Já não se lembrava o que havia movido-o até ali, não se recordava do motivo maior que o fez abandonar sua nova composição e correr até o Central Park. Impulsivo, louco, curioso. Não havia aprendido a lição, sobre o peixe morrer pela boca ou o gato por curiosidade. Pois estava ali, disposto a ouvir o que aqueles lábios teriam de tão importante para lhe dizer, e esgueirava-se entre os pedestres como um felino à procura de algo para saciar o sentimento que lhe assolava o peito.
Ansioso, Yoongi sentia-se com os nervos à flor da pele.
Continuou sua caminhada até a ponte mais famosa do parque, enquanto refletia nos motivos pelos quais Taehyung poderia ter escolhido aquele local para um encontro recheado de confissões. Talvez fossem os patos do lago, o sol se pondo por trás dos prédios, as flores das árvores cobrindo a ponte, ou apenas por... motivo nenhum. Pois ele era assim, incompreensível, surpreendente. Não havia palavras que pudessem descrevê-lo com exatidão, Taehyung Kim era inefável.
Yoongi chegou à ponte e pôde vê-lo se destacar mais que as flores na primavera. Suspirou.
Não... Havia sim uma palavra que o descrevia com precisão.
Taehyung era volúvel.
Inconstante, mutável, volátil.
Não se contentava em ser apenas uma coisa ou outra; ora agia como um demônio encarnado, falando coisas horríveis e fazendo atos profanos, ora parecia um anjo, com palavras doces, frases gentis e aquela aura em torno de si que o divergia de qualquer outro no mundo. Era difícil tentar compreendê-lo, pois demonstrava não se importar com nada nem ninguém em um momento, e em outro parecia desesperado por atenção como um garotinho.
"Me chame apenas de V"
Ele dissera na noite que se conheceram, e talvez esse foi mais um sinal que Yoongi ignorou. Se ele soubesse o que aquele V significava ainda naquela mesa, não teria entregado sua alma a alguém tão inconstante. Não teria se doado tanto em um sentimento unilateral se soubesse que havia a possibilidade daquele homem a sua frente ser de papel e que seu conto de fadas desmoronaria ao cotejar de uma nuvem. Se ele conseguisse ter tido o poder de prever tudo o que aconteceu durante esses dias, todo o sofrimento, todas as lágrimas, e todos os sonhos com um corpo sobre o seu, se ao menos ele soubesse de tudo antes, se pudesse ao menos ter uma pequena prova de que tipo de pessoa ele era... essa história toda seria muito diferente.
E então, ele não estaria no início da Bow Bridge, encarando aquele homem tão fabuloso e amaldiçoando o fato dele ser tão estupidamente bonito.
Talvez... talvez as coisas seriam mais fáceis se ele nunca tivesse se envolvido com Taehyung.
Naquela tarde, ele vestia o maldito sobretudo amarelo da cor dos girassois que mandou entregar no hospital. O mesmo que vestiu em um encontro em Paris, onde também recebeu uma flor de presente e agradeceu Yoongi com um sorriso mais brilhante que o sol. As mãos descansavam delicadamente sob o ferro da ponte, o cabelo castanho era acariciado pela brisa suave e a pele banhada pelos raios de sol tímido que transpassaram pelos galhos das árvores e refletiam-se no lago.
Yoongi suspirou, sendo incapaz de mover seu corpo dali. Seria tão mais fácil se nunca tivesse aceitado conhecer o quarto de hotel de Taehyung naquela noite, seria muito melhor que não tivesse que lidar com todas aquelas borboletas no estômago e o coração disparado. No entanto, mesmo que soubesse o quanto sua vida seria melhor sem ele, se pudesse voltar no tempo e ter a oportunidade de nunca tocar naquele homem, ele faria tudo novamente.
Porque bem... era Taehyung Kim.
Um homem inefável, volúvel, espetacular, reluzente. Ele poderia não ser bom, mas talvez Jimin tivesse razão sobre a bondade humana ser algo relativo e parcial. Somos todos humanos, e Yoongi estava disposto a ouvir o que Taehyung tinha a dizer. Se revelaria suas fraquezas ou apenas tentaria justificar seus atos. Sentia-se curioso. O rapaz deu mais dois passos em sua direção, mas algo lhe parou novamente.
Algo mágico.
Taehyung desviou os olhos da imensidão à sua frente e fitou-o por trás da franja enrolada. Naquele momento, o mundo inteiro parou e era como se estivessem se vendo pela primeira vez depois de anos. Pessoas passavam pela ponte, barcos pelo lago, pássaros cantavam e um vento açoitava o cabelo de ambos. Mas para Yoongi, só existia aquele rapaz de sobretudo amarelo na sua frente. Ele desencostou-se da ponte, parecendo reconhecer o músico mesmo em sua fajula tentativa de se esconder, analisou-o por um tempo longo demais e então...
Ele sorriu.
Taehyung sorriu genuinamente. Não como o homem traiçoeiro que encontrou em um bar, seu sorriso não era malandro ou malicioso. Ele sorria com leveza, como se estivesse encontrado um amigo de longa data. Parecia bem, feliz. Yoongi sentiu-se amolecer pelos olhos de meia lua. Ele era tão bonito que chegava ser injusto.
O músico se aproximou a passos leves, temia que a gravidade lhe puxasse cada vez mais para baixo e ele se afundasse em si mesmo. Taehyung o encarava com certo carinho quando ele parou ao seu lado, não parecia o mesmo. Havia algo de diferente nele, Yoongi apenas não conseguia identificar o que.
— Você veio. — o rapaz sussurrou, claramente empolgado. — Obrigado por isso.
Yoongi encarou-o, percebendo que aqueles olhos cortantes estavam fincados em si como dois punhais afiados. No entanto, em uma doçura sem igual. Era estranho, teve que desviar o olhar para conseguir formular alguma frase.
— Você disse que tinha coisas a dizer. — Yoongi depositou a mão no metal frio da ponte e suspirou. O que estava fazendo ali? — Não faça eu me arrepender disso.
— Yoongi... — ele sussurrou seu nome com tanta ternura, que o músico teve que fechar os olhos e se agarrar a ponte para não correr o risco de cair. — A primeira coisa que deve saber é que nunca houve traição, porque nunca existiu um relacionamento.
Yoongi abriu os olhos, encarando-o no mesmo instante. Então era mesmo verdade?
— Que?
Taehyung suspirou, depositando as mãos dentro dos bolsos do sobretudo.
— Cassandra e eu tínhamos um acordo, era tudo apenas aparência para enganar nossos pais.
— Isso é... — Yoongi evitou pensar no tempo verbal daquela frase e tentou ao máximo organizar seus pensamentos, fechando seu coração idiota com cadeados. — Isso deveria me confortar? Você... mentiu. Não só para mim, ou para sua família... Você... Taehyung...
— Eu menti até para mim mesmo, Yoongi. — ele suspirou, e o músico encarou-o, analisando suas expressões corporais. Taehyung parecia desconfortável, até envergonhado. — E não, não é para te confortar. Eu sei dos meus erros e estou tentando fazer o certo agora. Terminei esse meu teatro com a Cassandra, e... comecei a fazer terapia. Eu... estou me esforçando, Yoongi.
Yoongi suspirou, agradecendo pelos óculos esconderem seu olhar nublado. Eram muitas informações de uma única vez, não sabia o que sentir, o que fazer, falar. O que Taehyung esperava dele? Um abraço? Felicitações?
— Fico contente por você. — disse com certa dificuldade, observando o mundo embaçado graças as lágrimas nos seus olhos. Não permitiria que elas caíssem, não choraria por Taehyung mais. — Mas não entendo o que espera de mim com isso tudo. Por que me chamou aqui para falar todas essas coisas?
— Porque... estou sendo sincero com você dessa vez.
— Sua sinceridade me confunde, você parecia bem sincero ao tentar me afastar.
— Yoongi... eu estava assustado.
O músico desviou os olhos do lago e encarou o rapaz por breves segundos. Perto, ele havia se aproximado demais. Sua cabeça soou um alarme de perigo quando o aroma floral lhe abraçou, mas ele disfarçou com um riso frouxo.
— Assustado? E por quê?
— Porque eu me apaixonei por você. — confessou, tão baixinho, que Yoongi pensou estar imaginando coisas. Mas ele continuou, perto demais, com os olhos brilhando demais, e a boca irresistível demais. — Eu nunca me senti assim antes, meu coração nunca bateu tão forte por alguém como ele bate por você, eu nunca desejei tanto alguém com toda a minha alma e coração como eu te desejo. Eu... me desculpe, eu não sabia como lidar com meus próprios sentimentos. E talvez ainda não saiba, mas sei o que sinto e eu...
Yoongi não deixou que ele terminasse e se afastou dele, fugindo como o diabo foge da cruz. As lágrimas teimosas escorreram pelo seu rosto, e ele não queria que Taehyung as visse. Por isso se afastou, porque Yoongi não era tão corajoso assim. Ele tinha medo de se machucar novamente, daquilo tudo ser uma grande baboseira para tentar levá-lo para cama novamente. Yoongi sentiu muito medo pelo seu coração, por isso fugiu.
No entanto, Taehyung como um perfeito espírito perseguidor, correu até ele. Chamando pelo seu nome, em uma súplica tão genuína e desesperada que chegava ser tocante. Mas ele não parou, continuou andando, com lágrimas no rosto e o coração na manga. Estava tão óbvio o quanto ele também sentia tudo aquilo que Taehyung descreveu, que duvidava que ele não soubesse. Dedos longos agarraram delicadamente seu pulso, forçando-o a parar. Uma brisa mais forte açoitou, agitando o cabelo de Taehyung e derrubando o capuz da cabeça de Yoongi.
— Eu tô apaixonado por você, Yoongi. — a voz grave soou pelo silêncio do parque. Yoongi ergueu a cabeça, não havia ninguém ali naquela parte. Somente a natureza sendo testemunha de confissões intensas demais. Ele encarou o rapaz que agarrava seu pulso, pouco se importando com o rosto molhado ou o olhar raivoso que era escondido pelas lentes escuras do óculos.
— Por que você é assim? — ele praticamente ralhou, em uma voz fanha. Taehyung tinha olhos brilhantes com a constelação de Virgo, Yoongi já quis mapear cada estrela dela.
O rapaz se aproximou, ainda segurando seu pulso com uma propriedade assustadora. Quem ele pensava que era para tocá-lo daquela forma? Era como se soubesse de todo o poder que exercia, como se ter Yoongi na palma das mãos fosse prazeroso. Taehyung se aproximou tanto que Yoongi podia sentir seu hálito quente se chocando com o seu, sua respiração acelerada, seu perfume de flores, seus olhos, sua pele.
Yoongi iria morrer, podia sentir isso.
— Se não me quer, se não aceita todas as minhas confissões, diga. — Taehyung sussurrou, como se fosse um segredo íntimo. — Me mande ir embora, diga que me quer longe. Respeitarei sua decisão.
Taehyung era um maldito, um infeliz. Yoongi sentia vontade de socá-lo novamente. Como tinha a coragem de falar para Yoongi ser sensato com a boca a centímetros da sua? Como podia esperar que o músico o mandasse ir embora enquanto ele segurava seu pulso com tanta delicadeza daquela forma?
Não... Talvez ele soubesse que Yoongi jamais faria aquilo naquelas condições. Era apenas um joguinho? Taehyung estava brincando consigo novamente?
— É tudo um jogo para você?
— Ah, Yoongi... — a mão que estava em seu pulso subiu lentamente pelo seu braço, encontrando um caminho perigoso até os fios da sua nuca. Yoongi arrepiou-se, deveria afastá-lo, mas parecia tão certo. E havia aquele brilho no olhar, a doce constelação de Virgo que brilhava apenas para si, em uma doçura e sinceridade que jamais viu. — Sem joguinhos dessa vez, confie em mim.
— Você me deu razões o suficiente para desconfiar.
Se lhe perguntassem, Yoongi jamais saberia responder de onde havia tirado voz.
— Mesmo assim você continua aqui.
Touché.
— Tem razão, eu sou um maluco.
E então, Yoongi o beijou.
Os lábios de Taehyung tinham gosto de chocolate, de saudade, de lar, de amor. Era como saborear um doce morango maduro, suculento, saboroso. Uma mão acariciava sua nuca, enquanto outra puxava sua cintura cada vez mais para perto. Yoongi sentia-se um drogado em abstinência, precisava de mais. Tocou o corpo de Taehyung, se embrenhou no cabelo de Taehyung, mordeu a boca de Taehyung, sugou a língua de Taehyung.
Sim, com certeza ele iria morrer.
Quando os pulmões pediram por oxigênio, as bocas se separaram em um estalo quase erótico demais para um beijo num lugar público. Taehyung tomou a liberdade de retirar os óculos escuros do rosto de Yoongi, e ofereceu um sorriso doce ao encarar os olhos alheios. O músico se sentiu nu sem as lentes protegendo seus olhos vermelhos, mas também não fez questão de encarar outro lugar além daquele rosto.
— Eu gosto muito dos seus olhos, gatinho. — Taehyung exclamou com suavidade.
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