2 - "Eu vou chamar a polícia"

Três coisas passaram pela minha cabeça naquele momento:

1ª - Eu tomei algum ponche batizado na festa dos betas ontem, e não me lembro;

2ª - Eu estou sonhando! Não tiro aquele livro idiota da minha cabeça;

3ª Katrinne contratou um cara, surpreendentemente, inexplicavelmente, incrivelmente igual ao Dimitri que eu sempre imaginei, pra tirar um sarro com a minha cara;

Só ela havia lido meu livro e sabia como eu imaginava o meu protagonista. Mas como ela havia conseguido achar alguém tão parecido com ele? O pior de tudo isso era ele gritando Sondra feito um louco nos corredores. Isso não era bom. Phellix apareceria a qualquer momento.

"Sondra? O que fizeram com você?", bradou ele, a plenos pulmões.

Puxei ele de volta ao quarto:

"Para de gritar, seu maluco! Você vai ferrar comigo e com a sua 'chefinha', Katrinne! Seja o que ela pagou... eu... te pago o dobro!" , balbuciei.

Ao ver sua expressão de raiva, meu coração estremeceu. Seus olhos castanhos- claros, semi- cerrados, os lábios em um formato que só ele fazia. Eu via claramente quando escrevia as cenas em que ele brigava com os colegas soldados ou até mesmo quando discutia com a Sondra e depois a beijava. Era exatamente como nessas cenas, a diferença é que ele não ia me beijar...

"O que você fez com minha noiva? E por que esta vindo agora com esse papinho de dinheiro? Me diz, você é nazista? É amiga do Holden? O que você fez com a Sondra?"

Ele me segurou pelos ombros, com uma força um pouco além do que eu esperava. Me desvencilhei e peguei meu celular em cima da cama:

"Escute aqui seu maluco, ou você sai ou eu vou chamar a polícia! Vou prender você e a Katrinne!"

Ele olhou para meu celular com o rosto abismado e até mesmo enojado.

"Que aparelho é esse? É nazista, não? Achei que vencemos a guerra! Levaram a Sondra de volta para o campo de concentração?"

Como ele sabia de tantos detalhes? Como ele agia do mesmo jeito impulsivo do Dimitri?

"Eu vou enlouquecer... Eu tô louca! Enchi a cara e não me lembro!"

Alguém abriu a porta e eu me sobressaltei, já tentando adivinhar qual era a bruxaria do momento.

"Brenda, que barulheira é essa... Até chamaram o... Meu Deus, você trouxe um GoGo boy pro nosso quarto!"

Isso não podia estar acontecendo.

"Eu? Você trouxe esse louco! Ele tá fingindo que é o Dimitri!", gesticulava entre ela e ele, com as mãos tremendo mais do que um liquidificador.

"Que Dimitri? Dimitri Strauss? Do seu livro?", ela parecia confusa.

"Para de fingir que não sabe o que está acontecendo, Katrinne!"

"E eu não sei! Quem é esse? E que ideia é essa de achar que é o Dimitri?"

"Eu sou o Dimitri! E eu vou achar a Sondra, suas chucrutes, mascotes de Hitler"

Ele saiu correndo, desta vez para a janela. Ótimo, vai se matar.
"Brenda, o Phellix tá vindo ver o que está acontecendo...", Kat disse, quase cantarolando.

Sem saber o que fazer e num impulso de adrenalina, peguei o vaso rosa, pintado com detalhes de pontilhismo da Kat e acertei a cabeça do cara. Seu corpo alto caiu sobre o chão como folhas no outono. Folhas enormes no outono e Kat gritou.

"Brenda, sua louca! Vai matar o cara!"

"Eu... Não sabia o que fazer eu... Ele estava em pânico. Precisamos esconder ele antes que o Phellix veja!"

Kat se abaixou perto dele, para analisá-lo melhor e esboçou um sorriso malicioso.

"Nossa! Ele é bem gatinho ein... onde achou?", ela disse, passando as mãos nos cabelos do estranho.

"Agora não é hora pra seus papos de menininha, Kat! Me ajuda a colocar ele no closet!"

Ele era extremamente alto. Tinha pelo menos 1,85 de altura. Até nisso se parecia com o Dimitri. Foi difícil colocá-lo no closet, mas, por sorte, Kat tinha muitas roupas, ou seja, o closet era enorme. Tiramos algumas roupas e colocamos ele deitado.

Dois minutos depois, Phellix apareceu. Ele era um inspetor - o mais chato de todos - que cuidava da frágil "integridade" dos veteranos do campus de forma desnecessária, já que somos adultos e nunca existiu regra alguma contra trazer qualquer pessoa - ou namorado - para os dormitórios. Mas Phellix tinha a jurisdição para punições de conduta universitária e não precisava se explicar de forma alguma. O implacável Phellix Upplenight era a alto, negro, bem gato, mas um chato de carteirinha. Não sei como a Katrinne conseguiu enganá-lo tantas vezes.

"Meninas? Que barulheira toda é essa? As meninas disseram que ouviram vozes de homem aqui... vocês sabem que podem estar encrencadas, não?"

Me fiz de desentendida e leve:

"Homem? Que homem? Que isso, Phellix. Você sabe que não sou disso. E a Kat? Você sabe que eu a controlo."

Kat cerrou os dentes em uma fraca tentativa de sorrir. Ela era uma péssima atriz.

"Tá... E por que tem tanta roupa jogada na cama?"

Kat revirou os olhos e cruzou os braços, em sua clássica pose autoritária.

"Ah, por favor, Phellix. Virou detetive agora? Uma mulher não pode nem limpar o closet em paz?"

Ele inclinou a cabeça, desconfiado.

"E por que tá fechado?"

De repente, de atriz horrível, ela passou para ganhadora do Oscar:

"Phellix, o closet é meu e quem decide se ele fica fechado ou aberto! Não sei de voz de homem nenhuma e se realmente tem um homem por aqui além de você, no nosso quarto não está!"

Me deu uma vontade enorme de abraçar a Kat. Phellix deu uma risada sem graça e disse:

"Estou de olho em vocês, menininhas.", e saiu.

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Esperamos todas saírem dos dormitórios e irem curtir seus finais de semana e ficamos no nosso para tentar descobrir quem era aquele cara. Deitamos ele na cama de Kat. Ainda estava apagado.

"Tem certeza de que não foi você que fez uma pegadinha comigo?"

"Brendy, olha nos meus olhos... Eu posso brincar com você as vezes, mas jamais faria uma coisa dessas. Eu tenho um super respeito pela sua obra! Você sabe que eu amo ela. Outra pessoa fez essa brincadeira de maldade pura!"

Ela falava a verdade. Eu conhecia Kat e ela era uma pessoa transparente. Eu sabia quando ela estava sincera. Esfreguei os dedos em minhas têmporas e suspirei profundamente:

"Ele é exatamente como eu sempre imaginei o Dimitri. Ninguém leu o livro além de você."

"E o professor?"

"Ele não foi ontem. Me deu um cano. Quase perdi meus manuscritos quando aquela ventania... e... aquele... aquele livro sinistro!"

"Que livro sinistro?"

Lembrei na hora daquele livro. Não poderia ser aquilo. Essas coisas não acontecem. Não mesmo!

"Acho melhor a gente acordar ele. Precisamos saber o que ele sabe e quem ele realmente é. Não vou mentir, essa história tá estranha.", cocei a cabeça.

"Será que ele morreu?"

"Vira essa boca pra lá, Katrinne. Vai no banheiro e pega um pouco de água nesse copo!"

Dei um copinho da Minnie que eu uso a noite para beber água. Ela me obedeceu e o trouxe cheio. Joguei a água com tudo no rosto do garoto. Ele acordou desesperado, encharcado, com um olhar bem confuso e já berrando. Sim... Ele estava berrando Sondra.

"O que vocês fizeram com ela?"

Katrinne explodiu, puxando os cabelos, como sempre fazia quando surtava.

"Ai já chega! Só fica aí falando Sondra, Sondra... não sabe outra palavra não? Credo, Brenda! Deveria ter dado um nome menos irritante pra essa sonsa. Sonsa combina com Sondra."

Ele ficou feito estatua. De boca aberta. Não contive a risada. Mas ainda estava muito preocupada com aquela situação.

"Certo, vamos jogar o joguinho dele."

Cheguei mais perto do estranho e me afoguei no castanho dos seus olhos. Demorou para retomar a concentração.

"Olha, assim como você não estamos entendendo nada! Me diz primeiro onde você estava e como veio parar no nosso quarto?"

Ele respirou fundo. Tentou se controlar, mas percebia suas mãos tremendo. Ele as esfregou, exatamente como Dimitri fazia quando tentava sair de suas crises de pânico.

"Eu não sei! Eu tinha encontrado minha noiva no centro médico depois do resgate. Senti um alívio depois que a vi. Sentei-me do seu lado. Depois tudo escureceu e... e acordei aqui."

Ponderei acerca das coisas que ele havia acabado de dizer. A parte que ele se encontra com Sondra no centro médico era a última parte do livro. Quando ele se sentou ao lado dela e ele a responde falando "Felizes à medida do possível", o livro acaba.

Kat pensou o mesmo.

"É o final do seu livro, Brendy? É a única parte que eu não li."

Andei para lá e para cá, com o dedo indicador sobre o queixo, pensando e pensando.

"Vamos ver se você é ele mesmo. Qual o seu nome completo?"

"Dimitri Lukas Henzki Strauss."

"Data de nascimento?"

"Quem são vocês?", ele franziu o cenho.

"Você é o penetra! Você responde.", sibilei.

Ele bufou e prosseguiu:

"19 de outubro de 1925"

"Onde você nasceu?"

"Em Moscou, mas fui morar em um pequeno vilarejo na Inglaterra."

Kat interveio:

"Ok, esse louco só está falando coisa que tem no livro. Ele deve ter dado algum jeito de ler e agora está tirando um sarro da nossa cara. Brendy, lembra daquela parte do livro, antes do Dimitri ir para o campo de treinamento, que ele ouviu o pai dele falando algo que fez ele chorar e ir embora sem se despedir de ninguém?"

"Como vocês sabem disso?", os olhos dele quase saltaram das órbitas.

"Pergunta pra ele. Isso nem eu sei. Foi o maior furo da sua história porque você não explica o que é. "

"O que você chama de furo, eu chamo de estratégia de escrita. Pra instigar a curiosidade dos leitores."

"Para de se gabar e pergunta, Brenda!", ela grita.

Respirei fundo. Ele continuava com o rosto assustado e ainda mais bonito. Droga, onde estava a concentração?

"Dimitri..." me recusava a chamá-lo assim, mas não via outra opção. "... O que o seu pai falou?"

"Eu não posso falar", ele disse com a voz extremamente falha e com o sotaque russo mais evidente que o britânico.

"Você precisa.", olhei em seus olhos. "Por favor!"

De repente, seus olhos tiveram um brilho diferente. Ele abaixou a cabeça e começou a falar quase na mesma hora que eu pedi para que ele falasse.

"Ele... Tinha conhecido um capitão muito próximo de Hitler. Ele queria montar... um campo de concentração em nossa fazenda. Meu pai era nazista!"

Quase desmaiei quando ele falou isso. Kat notou em minha expressão.

"Brendy?"

"Kat. Eu não sei o que houve. Mas... Ele é o Dimitri. Com toda a certeza ele é!"

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