Depressão (s.f.)
|é o vazio que consome seus dias um por um. é o lençol de uma tonelada que te impede de levantar. é minha alma excruciando. é o que devora meu presente. é a guerra espiritual. é isolamento involuntário. é não sentir nada ao ponto de querer sentir qualquer coisa. é muita sílaba pra uma bula de remédio só. é definhar em pensamentos mortos.
Não é frescura.
(João Doederlein)
~ Naomi ~
Eu estou debaixo de um Ypê amarelo, é primavera, então ele floresceu lindamente. Há algumas pessoas passando pela praça, não sei se é porque elas estão com pressa, mas não dão nem uma olhadinha para apreciar a visão do Ypê, também não posso julga-las, já que em um dia normal eu estaria igual a elas.
Eis a questão, o que eu faço em dia normal? Bom, meu dia começa às 3:00 da manhã, eu acordo, me preparo, faço o café da manhã, cuido dos me animaizinhos de estimação e saio para ir trabalhar. No caminho, passo por essa praça, correndo como se minha vida dependesse do quão rápido eu corria ( e meio que depende), chego ao trabalho e faço o que tenho que fazer (trabalho com administração, então já deve imaginar o tanto de coisa), saio do trabalho às 17hrs e corro para o meu outro emprego em um pet shop, ao sair de lá às 22hrs, quando não faço hora extra, vou pra casa e me preparo para o dia seguinte que é a mesma história.
Eu diria que é uma rotina aceitável, se eu não tivesse desenvolvido todo o tipo de problemas mentais com ela.
Hoje faz mais ou menos três ou cinco semanas que não sigo essa rotina, a questão é que eu não tenho conseguido mais levantar da cama, meu corpo está cansado, exausto, eu até tento, mas quando eu vou ver já são umas 19hrs ou umas 22hrs e então eu só volto a me deitar, é como se meu corpo estivesse falando que não aguenta mais.
Hoje depois de muito esforço mental e físico, consegui me levantar às 14hrs, fui até o mercado e fiz compra, levei meus gatos e meu cachorro para um hotel, pois não estou na condição de cuidar deles, liguei para o meu emprego e informei que estava muito doente, que doença? Bom, eu não sei.
Agora estou, numa ponte perto de casa, ela dividi a praça do metrô e tem alguns ypês que a prefeitura colocou, ela é um tanto alta, dá pra ver os carros passando lá baixo.
Pela forma como as pessoas passam por mim, se eu me jogasse ninguém nem notaria e se notasse, não pararia pra ajudar.
Já fiz a mesma pergunta umas mil vezes "o que caralhos estou fazendo?", é a mesma que faço quando corto o meu braço ou mordo o meu antebraço. Algo, não sei dizer bem o que, me diz: "você está procurando sentir algo, além de tristeza, culpa e frustração", acho que é meu subconsciente justificando minhas ações, só pode ser.
Lá embaixo os carros parecem está a mil, estou procurando um motivo pra não ir olhar para eles de perto, viro minha cabeça para o lado e vejo uma menina. Diferente de mim ela não está do lado certo da ponte, acho que ela vai pular porque ela tá chorando muito.
Eu deveria fazer algo?
Penso.
Bem se eu fosse ela, não ia querer que me atrapalhassem.
Penso novamente.
Mas...
Dou alguns passos na direção dela e paro próxima.
Agora próxima dela, consigo ver melhor seu rosto, ela parece ter uns 17 anos, ela está chorando e segurando firme a barra da ponte, talvez tomando coragem para fazer o ato.
- Sabe... - começo e vejo que ela se assusta com a minha presença, então desviou o olhar dela e olho para o horizonte, o sol estava se pondo - Se planeja pular, porque não faz isso depois que sol se por, é um desrespeito fazer isso enquanto ele nos banha com essa linda luz laranja.
Ela me encara, talvez me achando uma ridícula intrometida, que fica falando baboseiras sobre o sol sem saber de nada da dor dela.
- Você acha que eu me importo? - sua voz sai trêmula por causa do choro. Eu olho pra ela e sorrio, ou pelo menos tento.
- Então vá em frente, pule e esmague seus miolos em frente a esse lindo pôr do Sol, enquanto os carros passam por cima do seu corpo esmagado lá em baixo, eu vou terminar de ver o esse lindo espetáculo - falo e olho para o horizonte novamente, esperando que minhas palavras faça um efeito contrário e ela comece a me xingar e se despendure da ponte e volte para o meu lado, por que de qualquer maneira, assim como eu, ela não quer se jogar de verdade e sim cessar essa dor estridente que fica no nosso peito.
Depois de alguns segundos ouço a garota ri (um riso nada feliz, na verdade eu até diria que ele foi sarcástico para não dizer que era vazio) e voltar para o lado certo da ponte, uma vez do lado certo ela me encara e abre a boca pra falar e logo fecha, mas então abre de novo e fala:
- É hipócrita da sua parte dizer isso quando a mesma há alguns minutos atrás estava cogitando a mesma ideia que eu.
Então ela me viu
Sorriu pra ela sarcasticamente.
- Você me fez perder a vontade. - falo e olho em seus olhos, tristes, apagados, talvez iguais aos meus - Estava mais digna de pena do que eu, então resolvi te ajudar.
A garota a minha frente fecha a cara e sai andando.
- De nada! - falo me virando e dando um tchauzinho debochado.
Sei que ela não ficou ofendida, pois antes de sai andando pude notar um sorriso, um pouco iluminado em seu rosto. Acho que salvamos uma a outra de cometer uma besteira essa tarde.
Olho em volto e tudo está como antes, cheio de pessoas, mas ao mesmo tempo, sem ninguém.
Começo a caminhar, indo em direção a minha casa, sinto meu coração ficar angustiado em saber que assim que eu passar pela porta, toda a dor e cansaço mental que tenho escondido por um longo tempo, durante o dia, vai se esvaeser e então irei voltar para minha melhor amiga, a cama.
E como eu disse, ao chegar em casa, é como se eu tirasse a máscara, o meu ombro pesa e meu corpo dói pelo mínimo de esforço que fiz, arranco algumas roupas e jogo pelo caminho e vou direto para minha cama, que pretendo ficar até me sentir renovada.
~ 3 dias depois ~
Acordo sentindo como se eu estivesse me fundindo com a cama, tento me levantar, mas sinto o meu corpo pesado, procuro meu celular pela cama e o ligo, a claridade faz meus olhos doerem ao terem contato com a luz, mas ainda continuo o olhando. São 17:45, tem 30 ligações perdidas da minha chefe e algumas mensagens dela falando que assim que eu pudesse era pra eu retornar. Desbloqueio o celular e vejo que meus pais também mandou mensagem, eles estão perguntando como estou e quando vou visitá-los, desço mais um pouco o chat e vejo que alguns amigos do trabalho perguntou se estou bem e outros perguntam o que aconteceu. Desligo o celular e jogo na cama e encobri a cabeça, voltando então a "dormir".
~ 2 dias depois ~
Me levanto da cama depois de muito esforço, vou até o banheiro e tento tomar um banho, mas estou cansada demais, então apenas me sento no chão e deixo a água cair pelo meu corpo.
E então um pensamento me vem na cabeça:
Eu preciso resolver isso.
~ 4 dias depois ~
Definitivamente preciso fazer algo sobre isso.
É o que eu estou pensando, porém não consigo pensar em nenhuma solução. Geralmente em filmes, as pessoas tem alguém para ajuda-la, mas eu não tenho ninguém, é só eu e eu.
Em filmes, a pessoa geralmente é taxada de estar com depressão e é mandada pra uma clínica psiquiátrica, mas no meu caso eu me taxaria de estar com sídrome de burnout, então acho que não preciso ir pra uma clínica né?
Olho em volta do meu quarto e vejo um poster que colei quando me mudei pra cá, é um poster da Torre Eiffel, eu sempre quis ir pra Paris, mas nunca consegui chegar perto de realizar esse sonho. Quando eu não estava estudando, eu estava trabalhando e quando era minha férias, eu estava cansada demais para pensar em fazer qualquer coisa a não ser dormir.
Vejo que ao lado do poster tem umas fotos de bandas que gosto, algumas coisas sobre moda e dança (coisas que nunca tive chance de estudar ou trabalhar, mas sempre amei), tem também uma estante, lá tem meus livros favoritos, mas nem sei mais se ainda são.
Parei de ler e de me interessar por mim mesma há muito tempo, larguei tudo para estudar. Sonhos, hobbies, família, amigos, nada disso ficou na minha vida depois que me mudei para a Capital.
Sempre achei que estava fazendo isso por algo maior, mas olhando agora, vejo que não ganhei nada, além de solidão, cansaço e frustrações.
Passo a mão pelo meu rosto e logo em seguida no cabelo.
E se eu fizesse uma viagem?
O pensamento passa pela minha cabeça, mais como um pensamento intrusivo do que algo concreto.
Balanço a cabeça, tentando me livrar da ideia doida que passou pela minha cabeça.
Mas e se...
- Definitivamente não vou fazer uma viagem nesse estado.
Dito isso me levanto e ligo para meu que mora na França.
- Aquela proposta que você vez ano passado ainda tá de pé?
Ouço ele responder que sim no outro lado da chama e sorrio satisfeita.
- Chego aí em uma semana! - falo e desligou o telefone.
É isso! Vou pra Paris.
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