13 - I Hear A Symphony


"Eu costumava ouvir uma simples canção
Isso foi até você chegar
Você pegou a minha melodia partida
E agora eu ouço uma sinfonia"

— I Hear A Symphony, Cody Fry

Na Grécia ficamos duas semanas, pois havia muito para se ver por ali. Andamos por Atenas, onde vimos as ruínas gregas, vimos museus e obviamente eu tentava registrar através de meus desenhos e pinturas, tudo aquilo que me marcava, inclusive vários deles eram de Gyu e Ellie. Eu sou tão grato aos dois por tudo que vivemos, que com certeza fizeram dessas memórias mais preciosas. E assim passou-se mais um mês e pelas contas, me faltavam agora três.

As dores haviam piorado, consequentemente me deixando mais baqueado. Várias vezes me sentia indisposto, além do dia que cheguei a vomitar sangue.... mas tentava não demonstrar fraqueza, pois queria aguentar o máximo que pudesse. Óbvio que isso não passou despercebido pelos olhos de Gyu, que se mantinha preocupado e prestativo a cada vez que passei mal. Seu olhar de tristeza para mim me machucava. Não queria que ele sofresse, mas era inevitável devido às circunstâncias. Então, tentava me consolar de que pelo menos, estávamos aproveitando tudo um do outro, assim como Ellie sempre se mantinha otimista e eliminando o clima mórbido que se formava cada vez que eu passava mal.

Embarcamos em um avião com destino à Espanha, mais precisamente em Madri. Ellie já havia elaborado uma lista dos lugares que gostaria de visitar. Decidimos começar pelo parque temático da Warner, já que a Disney estava além do oceano. Assim que chegamos, fomos calorosamente recebidos pelos personagens dos Looney Tunes e nos lançamos às diversas atrações do parque. Ao final, Gyu e Ellie convenceram-me a acompanhá-los na montanha-russa temática do Batman.

O resultado? Bom uma terrível indisposição. Fiquei extremamente tonto, chegando até mesmo a perder a consciência. Recebi os primeiros socorros da equipe do parque e, ao despertar, me deparei novamente com aquela aparição, que desde o encontro com Ellie, tornara-se cada vez mais difusa, quase uma sombra, porém ainda presente.

Após me recuperar, nos dirigimo ao local de acampamento, onde éramos os únicos presentes. O local era pitoresco, adornado com um amplo deque de madeira e espreguiçadeiras. Escolhemos um lugar próximo ao deque e rapidamente nos acomodamos.

Enquanto Ellie trançava os cabelos de Gyu, eu me deitava, usando a perna do garoto como travesseiro, contemplando o céu estrelado. A beleza do céu naquela noite era indescritível, e tenho certeza de que, se não fosse minha enfermidade, jamais teria desacelerado meus dias o suficiente para apreciar a noite em todo seu esplendor. Muitas memórias preciosas jamais teriam surgido se não fosse por isso, e de certa forma, sentia-me grato, pois ali, no chão, ao lado das duas pessoas mais importantes do mundo, me sentia realizado.

— Obrigada, meninos.  — Ellie quebrou o silêncio, e nossos olhares se voltaram para ela. — Não comentei nada antes para evitar comoções, mas hoje é meu aniversário.

— Por que não disse nada, garota? Ninguém comprou um presente para você. — Gyu indignou-se, e ela riu.

— Mas vocês já são meus presentes. Graças a vocês, estou vivendo uma aventura. É como se tivesse renascido, pois me sinto tão viva, e não poderia haver presente melhor para mim.

— Não, Ellie... É você quem me faz sentir vivo. Vocês dois fizeram meu coração bater novamente. — Olhei para ela e segurei a mão de Gyu, que me lançou um sorriso terno. — Sou grato aos dois. Afinal, Gyu tem provado sua lealdade e paciência comigo ao longo desse tempo, e seria loucura da minha cabeça dizer que ele não me faz feliz também. — Disse, trocando olhares sinceros com Gyu.

— É porque você o ama. Ama muito mais do que você próprio imagina. — Ellie respondeu, apoiando-se no ombro de Gyu.

— Ellie! — Gyu reclamou, descontente com o rumo da conversa.

— Eu sei... é possível eu dizer que amo os dois? — Afinal, ambos ocupavam lugares de importância em minha vida, e me sentia injusto em afirmar que amava apenas um deles.

— Achei que você já tivesse percebido que só aceito dividir seu amor com Ellie. — Brincou Gyu, fazendo-nos rir.

— Beargyu, toque violão para nós. — Ellie pediu, ao terminar as trancinhas.

Quando estivemos na Grécia, Beomgyu contou a Ellie que sabia tocar violão. Então, ela saiu sozinha e voltou com um um belo violão preto, todo lustrado, o dando de presente a Gyu. Desde aquele dia, toda noite, ele tocava alguma coisa para nós.

— Algum pedido especial minha cara Ellie? — Gyu perguntou, depois que pegou o violão e o posicionou nos braços.

— Comece com La Seine por favor!

La Seine era uma música que Ellie adorava e toda vez que ela a cantava, eu e Gyu ficávamos derretidos com aquela voz doce e angelical que possuía. Até aprendemos para poder acompanhá-la, quer dizer, eu aprendi, porque Beomgyu só se enrolava em seu francês barato.

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Quando chegou ao segundo refrão, Gyu, sem pedir permissão, mudou para o pré-refrão de 'Whatever It Takes', de Imagine Dragons. Ellie o olhou furiosa, e ele mostrou a língua para ela. Tocava a música com muita energia, mais rápida do que o normal, e quando chegou ao refrão, nós três cantamos em alto e bom som.

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— É isso, vocês terão que abandonar seus grupos para formarmos uma banda. — Disse a garota, cheia de confiança.

— Depende, você vai me pagar melhor do que a Hybe? — Beomgyu perguntou, dedilhando qualquer coisa no violão.

— Primeiro, você precisa verificar se ainda tem emprego. — Eu disse, e ele fez uma careta.

— Gyu, por favor, toque 'Love Song'! — Ellie pediu.

— Mude a música, amor. Todos os dias essa mesma música não. — Ele respondeu, implicante.

— Anda logo!

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Ele riu e começou a dedilhar a melodia. Gyu apresentou essa música do T.X.T para Ellie, e ela ficou viciada. Dizia que a música representava exatamente o caos em nossas vidas e o amor que tínhamos um pelos outros. Sempre que chegava na parte da Seori, Ellie a cantava, entregando-se tanto a essa parte que era notório que representava algo especial para ela.

Quando já estava tarde, fomos todos dormir, mas fui acordado por uma dor insuportável na cabeça. Olhei ao redor em busca da minha garrafa de água e percebi que Ellie não estava na barraca. Saí de lá e a encontrei sentada, observando a fogueira que estava apenas com brasas. Para minha surpresa, ela chorava de soluçar. Preocupado, fui até ela e a abracei, sem dizer nada, e ela retribuiu.

— O que aconteceu, anjo? — Perguntei, carinhosamente, enquanto mexia em seus cabelos.

Ela hesitou em responder, mas eu selei seus lábios várias vezes e enxuguei suas lágrimas. Então ela olhou nos meus olhos e disse:

— Eu queria ter mais tempo com você. Desejo poder ter um futuro ao seu lado...

— Eu...

— Não precisa dizer nada, não é culpa sua. — Ela alisou minha bochecha e sorriu fraco. — Sabe por que gosto tanto de 'Love Song'? A letra... Ela nos representa... Este mundo é uma droga, mas mesmo vivendo no inferno, eu te encontrei, e eu sei que meus sentimentos são reais. Mas você não me ama.

Mais uma lágrima escorreu de seus olhos e eu a limpei com os dedos, depois a beijei rapidamente antes de responder.

— Eu não costumo ser sentimental, mas você faz meu coração palpitar mais forte. Se isso é amor, então eu te amo.

Ela sorriu e mais lágrimas escorreram, até então, eu não sabia o que estava fazendo de errado.

— Gostaria de acreditar nisso, mas sei que seu amor pertence a ele. — Ela apontou para a barraca. Já ia protestar, quando ela me interrompeu. — Está tudo bem. Amar alguém é entender que nem sempre a sua imensidão de sentimentos será igual a da outra pessoa. Você fica tão feliz quando ele está com a gente que automaticamente eu também fico, como posso odiá-lo? Desejo sua felicidade acima de tudo...Como ficará ele quando você...

— Eu não tenho certeza... Espero sinceramente que ele não sofra muito. — Não gostava de pensar no que seria de todos em minha falta. — Além disso, mesmo que cada um siga seu caminho, vocês não precisam perder a amizade quando eu não estiver mais aqui.

— Com certeza. — Ela sorriu.

Então, de forma delicada, voltei a beijá-la várias vezes, conseguindo arrancar diversos sorrisos dela.

— Agradeço por me permitir saborear desse basquete. — Ela disse, acariciando meu rosto.

— Agradeço por estar ao meu lado.

Ellie continuou me olhando e fez uma pergunta que me deixou um pouco assustado, me fazendo olhar para ela atônito:

— Você já desejou ter filhos?

— Na verdade, nunca parei para refletir sobre isso. Acho que nunca me envolvi com alguém ao ponto de desejar tal coisa. — Respondi com sinceridade, considerando meu estilo de vida. Quem seria o louco a assumir essa responsabilidade comigo?

— Eu tive apenas dois namorados nesta vida, e nenhum deles merece comentários. E, com essas decepções, toda minha vontade de ser mãe desapareceu. No entanto, tive um sonho antes de chegar aqui, sonhei que tínhamos um filho, e mesmo sendo apenas um sonho, foi maravilhoso.

— É por isso que você está chorando? — Olhei para ela, cujo rosto agora contemplava as estrelas, como se estivesse revivendo aquele sonho.

— Eu fico pensando na vida que poderíamos ter e nunca teremos.

— Ellie... Eu não quero te fazer sofrer... Desde o início, você sabia sobre a doença. — Aquelas palavras doíam, pois eu desejava um futuro em que pudesse sobreviver e não tivesse que deixar ninguém.

— Mas eu não me arrependo de estar aqui. Não me arrependo nem por um segundo de ter deixado Paris e estar ao lado de vocês. Se eu estivesse lá, levando a minha vida vazia, estaria apenas existindo. Para mim, é um privilégio poder fazer parte dos seus últimos dias na Terra.

O câncer é uma doença ordinária, pois em alguns casos como o que eu me encontrava, não havia o que fazer. Eu sei que foi a doença que me levou até aquele momento mas... Por que tinha que ser tão trágico?

— Vamos animar as coisas por aqui. Levanta, vou te ensinar uma coreografia de kpop. — Disse, me obrigando a tirar os pensamentos depressivos da cabeça e me levantei, puxando-a pela mão para me acompanhar.

Comecei a ensiná-la a coreografia de "Hype Boy" e passamos um bom tempo dançando.

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Ela achou divertido aprender uma coreografia de k-pop e pediu por mais. Então, decidi ensinar uma do SKZ e escolhi "Case 143". No final, conseguimos esquecer aquela conversa triste enquanto eu a ensinava as partes principais das coreografias. De uma pulávamos para outra, e outra. Fiquei surpreso com a facilidade que ela tinha em acompanhar as coreografias, mesmo nunca tendo as visto antes.

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Decidimos fazer uma pausa e eu fui em busca de água. Enquanto isso, ela me observava com firmeza e proferiu com convicção:

— Agora que você me apresentou coreografias de kpop, irei te ensinar um Pas de deux.
*off se lê Pa-tê-dê

— Pá do que?

— Você sabe, aquela parte em que a bailarina dança com o patner... O parceiro da bailarina?

— Ah, saquei. — Refleti sobre a tradução de Pas de deux, "passo para dois".

— Vou te ensinar uma coreografia e dançaremos juntos. Se possível, gravar, para ter uma lembrança para o resto da vida. — Seus olhos brilharam com entusiasmo diante da ideia.

— Você sabe que é impossível para mim dizer não a você.

Ela riu e entrou na barraca. Quando retornou, estava envolta em um vestido branco, que eu sabia ser relacionado ao balé, mas parecia quase como uma camisola devido à sua transparência. Em suas mãos, segurava um par de sapatilhas de ponta e dois pares de meias, que eram meus, pois eu as havia colocado na mochila mais cedo.

— Já fazia parte do seu plano, não é? Me convencer a dançar ballet. — Comentei, enquanto observava as pontas que ela segurava.

Ela piscou, fingindo inocência, e me conduziu até o deck, onde me entregou as meias me recomendando que eu começasse a me aquecer. Executava os alongamentos aos quais estava habituado; afinal, durante toda a minha vida, fui um dos membros mais flexíveis do SKZ. Portanto, talvez o ballet não fosse tão desafiador para mim. Assim que ela terminou de ajustar suas sapatilhas, ergueu-se sobre as pontas dos pés. Enquanto se esticava, fiquei atônito com sua flexibilidade, como se não possuísse articulações no corpo. Percebendo minha expressão de espanto, Ellie comentou:

— Não se preocupe, a bailarina sempre deve ser mais flexível que o patner. Bem, hoje vou te ensinar o pas de deux de Romeu e Julieta, na versão Royal.

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*coreografia que Ellie quer ensinar ao Hyunjin, sintam-se a vontade para assistir para enriquecer a imaginação sobre a fanfic*

— Hoje? Haverá mais de uma? — Lancei um olhar preocupado, pois sabia que ballet não é nada fácil de aprender.

— Claro, bobinho! Eu quero dançar com você o pas de deux do primeiro ato de Manon. É uma peça perfeita e, para mim, a mais bela que existe.

— Nunca ouvi falar dessa coreografia. Alguém morre, como acontece na maioria dos ballet de repertório?

— Ei! Nem todos os são tristes! Ok que em Manon, ela é uma golpista que sonhava em se dar bem com o amante dela e acaba morrendo no final, mas... Nem todos! La fille mal gardée tem um final feliz, Coppélia também e O Quebra-Nozes também tem.

— Não tá mais aqui quem falou. — Estendi os braços em sinal de rendimento e ela sorriu.

A bailarina assumiu sua posição e ficou pensativa sobre como começar. Normalmente, o ballet é ensinado a crianças, então ensinar a um adulto e a alguém acostumado com danças de k-pop são coisas bastante diferentes.

— A primeira coisa que você precisa saber sobre ballet é que tudo é muito expressivo, extremamente dramático. Você precisa transmitir emoções através da dança, e isso é um grande desafio.

Ellie começou a me ensinar os primeiros passos e, em vinte segundos de uma coreografia que durava cinco minutos, percebi que realmente precisaria de muito mais força no corpo do que de articulações flexíveis. Eu tinha que levantá-la o tempo todo e isso me fazia perder o fôlego. Não porque ela era pesada, mas porque eu não estava acostumado a fazer isso. Ellie era muito paciente ao me explicar e, mais uma vez, eu ficava maravilhado ao vê-la dançar. Os movimentos eram difíceis, mas ela os tornava tão fáceis.

Obviamente, eu não conseguia fazer nada muito correto, mas ao final da dança, terminava com um beijo, e isso eu sabia fazer muito bem. Então a beijei e ela se sentou em meu colo, enquanto sua mão acariciava meu cabelo. Beijá-la fazia meu coração acelerar, como uma montanha-russa, uma mistura de sentimentos que se uniam toda vez que nossos lábios se encontravam. Quando terminamos o beijo, ela perguntou, com um sorriso no rosto:

— Se nossa história de amor se tornasse um ballet clássico, qual seria o nome?

La tragédie. — Respondi imediatamente.

— Eu chamaria de Viva La Vida. O final pode ser triste, mas... O que importa é o quanto celebramos a vida.

Sempre tão poética, fiz com que nossos lábios se tocassem novamente, enquanto a abraçava mais apertado. Ela estava certa. Não deveria ver essa história como uma tragédia inevitável, mas sim como uma celebração dos bons momentos que compartilhamos. Talvez eu devesse escrever sobre isso...

— Ei, vocês dois! Estão fazendo sexo ao ar livre agora? — Gyu nos interrompeu de propósito, e percebemos que o sol estava quase nascendo.

— Junte-se a nós, Beargyu! — Ellie respondeu, já se levantando.

— Sai fora, não curto ménage. — Ele disse, fazendo-a gargalhar.

— Não, idiota. Venha dançar com a gente. — Eu o chamei.

Gyu espreguiçou-se e se aproximou de nós. Ellie colocou "Hymn For The Weekend" para tocar, e era incrível como tudo o que ela fazia se tornava melódico, sempre escolhendo uma música com um significado por trás.

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Oh, anjo enviado lá de cima
Você sabe que você ilumina o meu mundo
Quando eu estava triste, quando eu estava machucado
Você veio me levantar
Eu estava vazio.

A música me proporcionava momentos de reflexão. Eu acolhi a morte, porém sofria, não por minha própria dor, mas pela angústia que deixaria nas pessoas. Essa constatação me afligia. Acreditava que, ao vir para a Europa, estaria poupando todos do sofrimento, mas Gyu decidiu me seguir. Ele sempre me afirmou que eu o ensinei a apreciar a vida; antes de nos conhecermos e nos tornarmos amigos, ele carregava consigo uma série de questões que o machucavam, e eu trouxe cores vibrantes para sua existência. Às vezes, tudo o que precisamos é de alguém que esteja em sintonia conosco. Pois essas pessoas são capazes de nos aceitar como somos, sem julgamentos, sem preconceitos, apenas o querem presente pelo que você é.

A melodia continuava a preencher o ambiente:

A vida é uma bebida e o amor é uma droga
Oh, agora acho que devo estar milhas acima
Quando eu era como um rio seco
Você veio para chover uma inundação

Isso me levou a refletir sobre Ellie e sua constante afirmação de que estava apenas vivendo. Sua escolha tornou-se compreensível, já que nenhum sucesso profissional parecia tão importante quanto uma existência repleta de momentos felizes.

Você disse: Beba de mim, beba de mim
Quando eu estava tão sedento
Derramou uma sinfonia
Agora, eu não consigo me cansar
Colocou suas asas em mim, asas em mim
Quando eu estava tão pesado
Despejou uma sinfonia
Quando estava pra baixo, baixo, baixo, baixo

Eu acredito que, apesar da tristeza que permeia essa história, nós três a transformamos em algo feliz. Sentia-me vazio, Gyu estava abatido pelo iminente falecimento de seu amigo, e Ellie se encontrava em um estado vegetativo, apenas existindo na vida que haviam planejado para ela. Nossas asas despertaram e nos preparamos para alçar voo pelos céus.

À medida que a música atingia o refrão, cantamos alto e desafinados, nossos corpos giravam e balançavam em perfeita harmonia com a melodia:

Eu, oh, eu, oh, eu
Você me faz sentir bêbado e alto
Tão alto, tão alto
Oh, eu, oh, eu, oh, eu
Agora estou me sentindo bêbado e alto
Tão alto, tão alto

Ali percebi que antes de adoecer, antes de passar por tudo isso, a minha vida era uma simples canção. Sem mais nem menos, se transformou em uma verdadeira sinfonia, com os mais belos arranjos feitos pelos mais impecáveis instrumentos.

Fomos para Portugal de trem, com o desejo de Ellie de visitar a imponente Catedral de Lisboa. Afinal, ela era católica e em todos os países que conhecemos, sempre reservávamos um tempo para explorar uma igreja. Acompanhávamos Ellie, já que ela não frequentava as missas. Entrava, sentava-se por alguns minutos e depois saía, e em Portugal não foi diferente. E os passeios não eram tão chatos, pois por mais que eu não goste muito de religiões, a estética da igreja católica é magnífica, as construções e sua decoração sempre me chamavam a atenção. Não foi diferente ali em Portugal. Enquanto a garota fazia o de sempre, eu e Gyu ficamos afastados, analisando a arte da igreja e esperando.

Andávamos pelas pilastras em estilo gótico, algo bem tradicional das igrejas europeias, e paramos frente a imagem de um santo qualquer, mas observava os detalhes cuidadosos que foram feitos, a igreja inteira é uma obra de arte.

— Às vezes, questiono se também deveria acreditar nisso... Em Deus, milagres e tudo mais. — Comentei, pensando que não apenas Ellie, mas também as outras pessoas estavam ali ajoelhadas, clamando suas aflições a uma estátua de gesso que, obviamente, não poderia ouvir.

No entanto, talvez se seus corações desejassem intensamente, alguma força além de nós pudesse escutá-los.

— Acredito que exista uma força maior do que nós por aí. Este universo é vasto demais para estarmos sozinhos. — Beomgyu me respondeu.

— Então você acredita em alienígenas? — Perguntei, e ele começou a rir.

— Nunca te perguntei isso, mas por que é tão difícil para você aceitar a existência de Deus?

Não precisava nem pensar muito para responder.

— Por que é tão difícil para as pessoas aceitarem que nem todo mundo acredita em Deus? O único cara legal na Bíblia é Jesus, que andava com ladrões, prostitutas e leprosos... Tudo o que a sociedade odiava. — Respondi e Gyu riu um tanto alto, o que atraiu olhares para nós. Quando as pessoas pararam de nos olhar, continuei. — Ah, sei lá... Acho que sou muito cético mesmo. Para onde os céticos vão depois que morrem?

— Não faço ideia, mas já que tocou no assunto... — Gyu começou a falar e eu já revirei os olhos, ele iria falar da doença. — Hyun, pelos nossos cálculos, você tem mais uns dois meses de vida, correto?

— Dois meses e meio, para ser mais preciso. — Respondi, seco.

— Estou achando tudo isso muito estranho. Alguém com um tumor tão grave como o seu nem deveria mais estar andando, pois estaria sentindo muita dor. No entanto, você está aqui, firme e forte, com algumas dores aqui e ali, mas ainda firme. Talvez o tumor esteja diminuindo... Você deveria procurar um médico. — Gyu sugeriu, esperançoso.

Eu não pude deixar de rir de forma irônica.

— Gyu, não quero passar por exames só para ouvir do médico que estou morrendo. Já sei disso. Não vou criar esperanças onde não existem.

— Como você sabe que não existem se não tentar? É apenas um exame, custa tanto assim fazer isso por mim? Por nós? — Ele disse, segurando minha mão e suplicando com o olhar. Nunca tinha o visto me olhar desse jeito e aquilo me deixou nervoso.

— Não vou passar por isso de novo, desculpe. — Foi tudo o que eu disse e voltei meu olhar para a imagem do santo, a fim de encerrar o papo.

— Você está sendo um idiota! — Sua voz saiu alto demais e dessa vez, até Ellie nos olhou.

— Pelo quê? Por aceitar que vou morrer?

— Eu ouvi sua conversa com a Ellie aquele dia na Espanha... Eu estava acordado. Ellie vai sofrer, eu vou sofrer... Cara, eu te amo, te amo há muito tempo. — Fiquei assustado diante a sua declaração repentina. — Nunca te exigi corresponder a droga desses sentimentos porque sei que você não sente o mesmo por mim, mas... Você sente por ela e deveria querer viver por ela. — O amargor vindo de suas palavras me fizeram querer ir até ele mas o mais novo deu um passo para trás.

— E quem foi que te afirmou que eu não tenho sentimentos por você? A gente sempre se entendeu dessa maneira... A gente sempre aprontou de tudo e mais um pouco e acreditei que você estava tranquilo com isso. Não pode chegar agora e dizer que sempre me amou, como se eu fosse um vilão!

— Ah claro, porque se eu tivesse manifestado meus sentimentos, você teria me afastado da sua vida, assim como fez com todos aqueles que se apaixonaram por você.

Será que isso teria acontecido? Eu apreciava a companhia de Beomgyu, valorizava nossos momentos juntos, nossas conversas, nossa amizade e até mesmo nosso sexo. Cada detalhe dele me agradava, e eu me questionava se realmente o teria afastado da minha vida.

— Mas você está apaixonado pela Ellie. — Ele interrompeu meus pensamentos. — E por mais que eu sinta ciúmes, eu não estou bravo, vocês são meus amigos... Eu só queria que você lutassem um pouco mais pela sua vida, seja pelos sentimentos que você diz ter por mim, seja por essa paixão que tem pela Ellie, seja pelos fãs que sempre nos abordam na rua, seja pela sua família ou pelo Stray Kids...

Ele voltou a pegar em minha mão, seus olhos suplicantes me fitaram e um de seus dedos alisou meu rosto. Desviei o olhar para o chão, incapaz de continuar olhando para seus olhos, me sentindo um lixo por saber que todo esse tempo, ele me amou e eu fui incapaz de enxergar isso. Ellie estava certa, estive tão acomodado aos nosso rolos que nunca vi a situação como um todo. Como permaneci calado, Beomgyu continuou:

— Você se entregou tão facilmente que nem mesmo cogitou buscar tratamentos alternativos. Mesmo que as chances fossem pequenas, poderiam aumentar suas possibilidades. Você não considerou nada, apenas aceitou, e isso é lamentável. Hyunjin, você é um safado, prepotente e egocêntrico, talvez valha menos que uma moeda de um euro, mas... Não merece morrer. Vamos procurar um médico e ver como está sua situação... Por favor...

— Gyu... — Eu não conseguia formular uma resposta. A expressão em meu rosto já entregava minha decisão.

— Faça o que quiser, então, idiota! — Beomgyu ficou verdadeiramente irritado e se afastou, dirigindo-se à saída da Catedral.

O clima ficou tenso por aqui

Não esqueça a estrelinha

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