Capítulo 5

Após a partilha entre os responsáveis pela expedição marítima ser concluída, Jungkook tomou sua parte e rumou para casa, guiando Jimin através de um atalho pela floresta. Ambos seguiram boa parte do caminho em silêncio, com o mais velho na frente e o noviço um pouco mais atrás. 

As controvérsias que ouviu desde antes da viagem, deixaram Jimin bastante pensativo. Primeiro, o guerreiro Taehyung insinuou que ele pertence a Jungkook, depois, teve a desconcertante conversa sobre escravos no salão do rei. Definitivamente precisava esclarecer as coisas com ele.

— Jungkook — Jimin parou de andar e esperou o outro olhar para trás, para continuar: — Creio que precisamos pontuar algumas questões que ficaram bem confusas, para que possamos nos entender.

— É mesmo? — ele observou o noviço dos pés a cabeça, depois se aproximou devagar enquanto o outro recuava, até bater com as costas contra uma árvore. 

— Huhum… — Jimin pigarreou. Jungkook estava tão próximo que podia sentir a respiração dele. Ele tomou um suspiro de coragem para prosseguir: — Estou aqui para te ensinar latim, nada mais. Não pertenço a você e nem serei escravo de ninguém. Posso ir e vir quando eu quiser. Este foi o nosso acordo, certo? Depois disso, você me levará para onde eu queira ir. 

— Hmm… — Jungkook suspirou, pensativo. — E em que parte você está confuso?

— Não tenho certeza se você compartilha da mesma intenção. Pelo que estão falando por aí…

— E o que estão dizendo?

— Você sabe. Que pertenço a você, que posso ser vendido...

— Você me pertence? 

— De forma alguma.

— Posso vendê-lo?

— Não.

— Eu também não tenho essa intenção. Agora estamos entendidos?

— Hmm… — Jimin hesitou, baixando o olhar até o machado do guerreiro preso no cinto, depois ergueu os olhos para os dele novamente: — Não quero dizer que você não é uma pessoa confiável, mas… Você matou todos os meus irmãos.

— Eu não matei ninguém.

— Mas foi o responsável. Você os liderou.

— Eu não dei a ordem, Jimin. Disse para rendê-los, apenas. Seus irmãos foram burros e tocaram o sino, correram e se espalharam. 

— Eles ficaram assustados. O que você faria se aparecesse um bando de homens armados até os dentes na sua casa?

— Eu mataria todos eles.

— A… 

— Eles irritaram os meus homens e tudo aquilo aconteceu sem nenhuma necessidade.

— E é matando que vocês aliviam a irritação?

— Às vezes. — Jungkook observou o corpo dele outra vez. — Sexo também ajuda.

Jimin engasgou-se com a própria saliva e tossiu algumas vezes. O rosto corado e a forma como ele ficou constrangido com o rumo da conversa, deixaram o guerreiro curioso com o fato.

— Você sabe do que estou falando? — Jungkook perguntou.

É óbvio que o noviço sabia do que ele estava falando. Embora nunca tenha experimentado, Jimin ouviu muitas vezes os monges ensinando sobre os pecados da carne, a luxúria. Em três anos faria seus votos de castidade, se não fosse pelo ataque sofrido no mosteiro.

— Sei. — Respondeu sem olhá-lo.

— É o que faz quando está irritado? Já que não gosta de matar…

— Eu leio um livro! — Jimin voltou a olhar para o guerreiro. —  Eu limpo, eu rezo… Existem muitas coisas para se fazer além de… disso que você falou.

— Por que está agitado?

— Não estou... Será que podemos continuar nosso caminho?

— Então já estamos entendidos?

— Sim, estamos. — Respondeu de imediato.

Encarou os olhos do noviço, até que este desviou o olhar para outro canto. Isso posto, Jungkook virou-se para a trilha que conhecia muito bem, e que os levou diretamente para uma casa perto de um rio.

Uma mulher estava atrás da residência com um machado cortando lenha, enquanto um pequeno menino empilhava a madeira na parede ao lado. Assim que viu Jungkook, a criança abriu um grande sorriso e correu para encontrá-lo, sendo recebido com um forte abraço.

— O papai voltou! 

— Cuidou direitinho da casa? 

— Sim! Do jeito que você mandou.

— Muito bem. 

Jimin parou ao lado de Jungkook e sorriu para o menino. Ajay sorriu de volta mas, curioso, perguntou ao pai:

— Quem é ele? 

— Este é o Jimin. — Colocou a criança no chão, e disse em tom de mistério: — Ele é um cristão.

— Oh… — Ajay encarou Jimin ainda mais cheio de curiosidade. Ele observou a túnica que o noviço utilizava e perguntou: — Por que você usa vestido?

— Não é um vestido — Jimin riu, explicando logo em seguida: — É um hábito, os monges usam como forma de mostrar publicamente sua consagração religiosa e renúncia ao mundo.

— Hmm… — O menino demonstrou menos interesse, virando-se para o pai: — Ele será nosso escravo?

Jimin pigarreou, Jungkook segurou-se para não rir e logo em seguida respondeu:

— Não. Ele tá aqui pra me ensinar um outro idioma.

— Oh… 

— Não vai me apresentar, querido? — A mulher que antes cortava lenha, se aproximou com o machado apoiado no ombro.

Jungkook olhou para ela com o cenho franzido. Usualmente, esse não era o tratamento que ele recebia daquela mulher. 

— Essa é a Betty, mãe do Ajay. 

— Olá. — Jimin sorriu para ela, mas a mulher permaneceu séria.

— Onde ele vai dormir? — Ela voltou-se para Jungkook. — Porque na nossa casa eu não permito.

O noviço buscou em volta uma alternativa que deixasse Betty satisfeita, pois não queria ser aquele que desfez a harmonia entre aquela família. Embora entre Jungkook e ela nunca tenha existido tal conceito.

— Posso dormir ali. — Jimin apontou para uma choupana, mas os que discutiam não prestaram atenção.

A pequena construção era feita de madeira e ramos, cuja função era armazenar as ferramentas utilizadas para pesca, criação de animais, plantação e caça.

— Aqui você não manda em nada. — Jungkook respondeu a mulher.

Betty suspirou com visível irritação. Jimin então achou mais prudente manter-se calado, já que em sua primeira tentativa ninguém se mostrou interessado na sua opinião. 

A mulher examinou o noviço de cima a baixo e, em seguida, voltou-se para o marido:

— Podemos conversar lá dentro? — Indicou a casa onde moravam. — Em particular…

O pedido foi aceito e ambos se dirigiram em direção a casa, enquanto Jimin e Ajay ficaram do lado de fora, com o mais novo enchendo o noviço de perguntas. 

Jungkook tinha em mente que a conversa seria breve, por isso, não se deu ao trabalho de sentar. Assim que virou de frente para Betty, a mesma revelou que não tinha intenção de trocar palavras com ele quando o segurou nos braços para deixá-lo próximo. 

As mãos subiram até os ombros e ela o encarava com ar de provocação. Jungkook permaneceu impassível, apenas analisando a falsidade alheia na tentativa de conseguir o que queria.

— Não quero que ele assista o que pretendo fazer aqui com você, todas as noites…

— Você fala como se de fato fosse acontecer alguma coisa. 

— Isso é o que você não sabe… — Sorriu maliciosamente.

— Não vai conseguir me manipular oferecendo sexo. — Ele a cortou, deixando-a saber que estava ciente de sua intenção. — Jimin é meu convidado e será acolhido em nossa casa.

— Convidado? — Betty riu, afastando-se dele. — Agora é assim que chama as pessoas do reino que você invade e traz como escravo? 

— Nós temos um acordo. Ele não será nosso escravo.

— Que tipo de acordo? — Betty cruzou os braços e esperou, mas não obteve resposta. — Eu também moro aqui e tenho o direito de saber, Jungkook!

— Ele vai me ensinar alguns idiomas.

— Pra quê?! Isso é completamente inútil. Mande-o embora ou o venda no mercado.

Jungkook finalizou a conversa com impaciência após o questionamento insistente:

— Ele ficará aqui, independentemente da sua vontade.

Após o breve diálogo, ela deixou a casa ruminando a raiva de não ter sua vontade atendida. Não era ciúme, mas a necessidade de impor que aquele território era dela. 

Durante o tempo em que esteve conversando com o pequeno garoto, Jimin notou que, efetivamente, aquela criança era filha do guerreiro Jungkook. 

O que mais chamou a atenção do noviço foi uma uma pequena arma encaixada em um espaço no cinto. Era um objeto muito perigoso, principalmente para uma criança tão pequena.

— Você pode se machucar com essa faca. 

— Não se preocupe, eu só caço animais pequenos. Por enquanto…

Jimin demorou algum tempo para absorver a informação. O mais novo retirou a faca do encaixe e manuseou enquanto explicava algo que o noviço sequer estava prestando atenção. Sua mente parou na parte dos animais pequenos. Talvez tenha entendido errado…

— Já terminou de fazer suas perguntas? — Jungkook se aproximou sorridente, pegando a criança no colo.

Dificilmente alguém que presenciou a violenta invasão sofrida pelo monastério, conectaria aquele homem ao que liderou o ataque. O sorriso largo que apresentava enquanto distraía-se com o filho fez com que Jimin, por um breve momento, duvidasse de que se tratava da mesma pessoa.

— Eu tava mostrando a ele como faço pros filhotes não fugirem quando me aproximo. 

— Tenho certeza que ele ficará feliz em ouvir suas histórias, em um outro momento. — Jungkook o colocou no chão. — Veja se sua mãe precisa de ajuda.

— Sim, senhor.

O menino passou por Jimin e seguiu o caminho indicado por seu pai. Os olhos do noviço o acompanharam por um instante, e quando voltou sua atenção para Jungkook, este já o estava analisando.

— Está tudo bem? — Jimin perguntou sobre o momento anterior. 

Jungkook assentiu e logo depois acenou com a cabeça gesticulando para ele entrar na casa. Jimin foi na frente e o outro o seguiu de perto. 

Assim que entrou teve a certeza do que já tinha visto do lado de fora. Na casa não haviam janelas, a iluminação era fornecida por velas feitas de sebo, que eram fixadas nos chifres de alguns animais. Não havia sofisticação e a maioria dos móveis eram rústicos.

A curiosidade inata do noviço o levou a explorar o interior da residência com certa timidez, sempre acompanhado pelo olhar atento de Jungkook.

Apesar de pequena, a casa era aconchegante, com peles, tecidos macios e algumas peças trançadas dando um aspecto acolhedor. Três escudos estavam em uma das paredes que separavam os cômodos, assim como referências visuais aos deuses nórdicos. Era perceptível que tudo foi feito com materiais da própria floresta. 

— Pode descansar naquela cama — A voz de Jungkook chamou a atenção dele para si. — Temos uma horta depois da choupana onde você pretendia dormir. Já que você não come carne, pode preparar sua própria refeição.

— Eu agradeço. 

— Antes que eu esqueça — Jungkook se aproximou com um semblante sério —, não saia por aí sem o meu conhecimento.

— Pensei que tínhamos um acordo. — Jimin apoiou a mão no quadril.

— E temos. Estou falando isso para sua própria segurança. Não somos os únicos que residem nesta região.

— Ah, certo… entendo… — Havia um traço de receio na voz do noviço, em relação a estar livre de qualquer perigo.

— Não precisa se preocupar, manterei você a salvo. Apenas siga minhas instruções.

Tendo passado a maior parte de sua vida em um mosteiro, Jimin não precisava disso, então não era uma situação agradável precisar da proteção de outra pessoa, tampouco sentiu-se agradecido. Ele nunca pediu por isso. Encontrava-se nessa situação por causa de Jungkook, então, no mínimo, era dever do guerreiro manter sua palavra.

Mas Jimin reconheceu que aquele homem era diferente do que imaginava a princípio. A casa, por exemplo, foi uma grande surpresa descobrir que Jungkook não vivia em uma caverna.

— Já podemos começar? — Jimin perguntou. Quanto mais cedo iniciar as aulas, mais brevemente ele irá embora.

— Não está cansado da viagem? 

— Posso fazer isso. — Garantiu. — Apenas traga as escrituras que você, hm… 

— Tomei. — Jungkook sorriu, divertindo-se com o decoro do noviço. — Dê nome às coisas como elas são. Roubei de você. 

— E eu gostaria que devolvesse, por favor.

— Ainda preciso ler.

— Por que está tão interessado? — Assistiu o outro se afastar para buscar as escrituras.

— Gosto de aprender sobre coisas novas. — Jungkook sentou confortavelmente e folheou as páginas, esperando o noviço ocupar o espaço à sua frente. — É interessante suas crenças…

Em outra ocasião, Jimin ficaria feliz em ensinar latim a um pagão, para que ele pudesse ler e compreender as escrituras. Mas aquele não era o caso. Jungkook achava que ele era um tolo inocente, mas Jimin interpretou seus verdadeiros motivos. 

— Fale a verdade — finalmente se sentou próximo a Jungkook. — Não está interessado em nada disso. O que você realmente quer é encontrar informações de onde eu vim. Quer saber se há mais lugares para invadir e objetos para roubar.

O queixo de Jungkook caiu e suas sobrancelhas se ergueram. As páginas que antes consultava com entusiasmo, esperando encontrar alguma utilidade, agora estavam entre suas mãos, largadas sobre o colo.

Jimin permaneceu sentado na mesma posição, de forma reta e com a cabeça erguida, concentrando-se nas reações de Jungkook. Talvez não devesse ter revelado aquilo. Vai que o guerreiro ficasse decepcionado, o considerasse inútil e usasse o machado que levava sempre consigo, para cortar sua cabeça ao meio.

Mas a expressão chocada se transformou em um sorriso divertido. Jungkook tirou as escrituras do colo e as deixou em cima de uma prateleira, depois relaxou mais o corpo, rindo soprado.

— Você é bem mais esperto do que pensei. Está certo. Eu quero mais, e sei que há muito para explorar.

— Não vai encontrar o que espera nessas páginas, nesse caso, é melhor que eu vá embora já que me tornei inútil para os seus propósitos.

— Eu ainda quero que me ensine sua língua. Só porque as informações que eu quero não estão nesses livros, não significa que a minha teoria esteja errada. 

Jungkook ficou quieto por um momento, observando as reações dele. Jimin desviou o olhar quando lembrou-se da vez que foi com os monges ao palácio, a pedido do rei. 

Tudo o que levaram do mosteiro não chegava perto da quantidade que existia na morada do rei. Se Jungkook confirmasse a informação, certamente voltaria para as terras do Sul e mais pessoas inocentes iriam morrer.

— É isso mesmo, não é? Há muito mais… — Os olhos de Jungkook estavam brilhando. — Conte-me.

Apesar de obter algumas informações, Jimin não pretendia revelar se aquilo significasse que haveriam outros ataques como aquele, mas também não estava à vontade com a ideia de mentir, por isso, ele apenas negou, balançando a cabeça.

— Não? — Jungkook inclinou o corpo para frente, ficando mais próximo do noviço. Jimin negou outra vez, um pouco mais devagar e sem tirar os olhos dos dele. — Não vai me contar?

— Não posso fazer isso… — Explicou. Não queria que o guerreiro pensasse que o estava desafiando. 

— Não pode, ou não quer?

— As duas coisas. — Jimin ergueu a cabeça um pouco mais, e quando percebeu o que havia dito, desviou o olhar. — Não estou aqui pra isso.

— Que pena… — Jungkook regressou para a posição anterior. O noviço voltou a respirar normalmente, e o encarou, quando o guerreiro prosseguiu: — Vamos ao que interessa.

Ao contrário do que Jimin imaginou, ele não estava desistindo de obter mais informações através dele. Jungkook apenas entendeu que aquele não era o momento. A paciência era uma das maiores virtudes para se obter sucesso.

Continua…

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