Capítulo 10
— Eu sabia! Você nunca me decepciona!
Diana arregalou os olhos para ver Fabrício na entrada da oficina.
— Desculpe?
— Não se faça de boba. Passeio na cachoeira? Mergulho a dois? — Ele avançou na direção dela, com um sorriso cheio de maldade. — Se o que queriam era privacidade, deviam ter se trancado em um quarto, não?
— Malditos Silva! — praguejou ela, lembrando-se da família que chegou na cachoeira depois do horário do almoço, flagrando ela e Fernando juntos. O escândalo poderia ter sido pior se ele, ao dar-se conta dos visitantes, não a tivesse envolvido, com sua enorme toalha, cobrindo-lhe a seminudez bem a tempo.
— Mas o que são essas coisas em comparação ao beijo trocado na frente do hotel de Brígida? Diana, minha garanhona!
Ela sentiu o rosto queimar.
— Não me chame assim! — ela ralhou, ao som dos risos de Fabrício e à vista de Miguel e Lorenzo. Emanuel tinha ido ao banheiro e Augusto seguia acamado.
— Fabrício, pare de apoquentá-la — Miguel interveio em tom protetor, parado ao lado de um Chevette bege com o para-choque dianteiro amassado. — Não fale com ela desta maneira. Diana não é como você, que vive trocando de mulher igual macaco pula de galho em galho.
— Eu sei, por isso estou apostando alto no casal do momento — revelou sem um pingo de vergonha, antes de guardar os pertences no armário do canto.
— Você o quê? — Diana gritou, a voz estridente, incapaz de esconder sua ira.
Fabrício deu de ombros com um descaso que a irritou ainda mais e replicou:
— É só juntar dois mais dois para saber no que isto vai dar.
— Eu não acredito! Apostou realmente que ele será meu quarto noivo?
— Não fui tão longe assim. Ao contrário de alguns iludidos, fui pelo lado realista da coisa. Apostei que estarão terrivelmente apaixonados em menos de duas semanas. Bem — ele fez o cálculo mentalmente —, agora você tem menos de uma semana e meia para não me decepcionar.
— Seu traidor de uma figa! Como pôde me apunhalar pelas costas desse jeito? — Diana queria enfiar a cabeça dele no capô do carro.
— Não fique brava comigo, doçura... Você sabe que eu tenho um fraco por jogos, principalmente quando envolvem apostas.
— Você é mesmo um canalha. Não vou mais discutir.
Dando-lhe as costas, ainda furiosa, agachou-se diante de uma pick-up e enfiou o braço por baixo da lataria. Uma mão apertou de leve seu ombro esquerdo.
— Diana...? — Era Fabrício.
Ela dispensou-lhe o silêncio.
— Tive uma ideia.
Mais silêncio da parte dela.
— Vai dar uma de Lorenzo para cima mim?
Um resmungo ininteligível reverberou pelo pátio. Eles não precisaram olhar para saber que foi o homenzarrão de cara amarrada.
— Vamos resolver este desentendimento da maneira que deve ser resolvido: com aquela boa e velha partida de basquete pós-expediente. Se eu ganhar, você me perdoa.
— E seu eu ganhar? — ela falou, por fim.
— Pode me pedir o que quiser.
Ela pensou na proposta com cautela. Não tinha nada a perder. As rusgas entre ela e Fabrício nunca duravam por tanto tempo, a ponto de, na manhã seguinte à briga, já estarem se falando normalmente. Os dois não eram de guardar rancor e talvez fosse isso o que fazia a estranha amizade dar certo.
Apreciou também saber que ele gostava dela o suficiente para querer ser desculpado. De quebra, desfrutaria de um momento de lazer, então resolveu aceitar entrar no jogo.
— É melhor você ir ensaiando a sua cara de perdedor. Não vou te dar sossego — ela disse, erguendo os olhos para ele, a raiva amenizando.
Captando o aceite, ele sorriu de forma travessa.
— Eu não esperaria outra coisa de você, Diana.
Várias horas depois, na quadra esportiva da praça, em frente à oficina, Diana e Fabrício formavam suas duplas, uma vez que dois dos mecânicos também mostraram-se interessados em fazer parte do jogo.
— Vou te dar a vantagem de escolher quem quiser — Fabrício declarou, confiante demais para o gosto dela.
— Lorenzo jogará no meu time — decidiu-se rapidamente, ciente das habilidades do homem no basquete, as quais presenciara em partidas de outrora. — Você fica com Emanuel, já que são amigos inseparáveis... — justificou com inocência, sorrindo de canto.
— Estou de olho na sua tática, mas esse grandalhão aí não nos intimida, não é, parceiro? — dirigiu a pergunta ao amigo, enquanto mantinha a bola laranja debaixo do braço.
— Posso estar velho, mas não estou tão acabado assim.
— Eu não disse que estava — contornou Diana, suavemente, embora soubesse que Emanuel se cansava mais rápido correndo pela quadra quando comparado à resistência de Lorenzo.
— Chega de conversa! Vamos fazer um aquecimento! — Fabrício alegremente passou a bola para Diana, que a capturou no ar. Animado, bateu duas palmas e apoiou as mãos nos joelhos. — Vamos lá, doçura, mostre o que ainda sabe fazer.
Enquanto jogava algumas partidas para se aquecer, Diana sentiu-se transportada para os tempos da pré-adolescência, quando assistia, da arquibancada, seu pai driblando seus colegas de trabalho e fazendo cestas naquela mesma quadra. Não apenas ali como também no quintal de casa, onde ele montara uma cesta para ensinar basquete à filha desde cedo. Por causa dele, Diana tomou entusiasmo por esportes, participando sempre que podia dos jogos escolares, em posições de destaque.
O aquecimento terminou e Fabrício sinalizou para Miguel, que estava sentado na arquibancada, responsável por fazer o papel de árbitro. Em seu ritmo, ele andou até os jogadores, pegou a bola e esticou a mão com ela para cima.
Diana secou o suor do rosto na camiseta regata e se posicionou.
Então Miguel jogou a bola para cima e Diana e Fabrício saltaram no ar para disputar a posse da bola. Os dois tinham quase a mesma altura, mas Fabrício se precipitou ao pular antes. Foi por uma questão de milésimos de segundo que Diana conseguiu tocar a bola primeiro e a lançou, rápido, para Lorenzo.
Os momentos seguintes foram de pura concentração e fervor. Corriam com a bola pela quadra como se o futuro da humanidade estivesse em jogo. Brigaram, discutiram sobre pontuação, sobre faltas, e em seguida estavam gargalhando, para depois discordarem outra vez.
Miguel, como juiz, via-se em situações onde tinha que tomar decisões sensatas pelo bem da partida, algumas das quais não correspondiam às expectativas de todos os seus colegas, gerando atritos. Até mesmo Diana se irritava com ele às vezes, quando ele dava, qualquer coisa que considerasse vantagem, para o time adversário.
— Menina, você é muito competitiva! — Miguel ria.
— Não é sobre ser competitivo... é sobre ser justo! — ela rebateu enquanto corria para assumir sua posição na próxima partida.
Concentrados, não perceberam os adolescentes amontoando-se, gradativamente, na arquibancada, para assistir ao excitante jogo dos adultos. Quanto aos jovens, entretidos demais com as habilidades dos jogadores na quadra, entre vaias e gritaria, não notaram a aproximação de outro adulto, em roupas de corrida, que juntou-se à plateia juvenil.
Para azar de Diana, logo quando tentava desempatar o placar, ela notou o inconfundível espectador bem quando estava na borda da quadra, muito perto da plateia enlouquecida, avançando com a bola. Esta bateu na ponta de seu pé e suas pernas embaraçaram. Ela caiu, deslizando pelo chão liso de maneira nada graciosa.
A garotada na arquibancada soltou exclamações de espanto.
Então, fez-se silêncio.
Fabrício apressou-se até ela.
— A princesinha tropeçou no salto?
— Cale-se!
— Você e a sua mania de limpar o chão... — caçoou e estendeu-lhe a mão. — Vamos, saia daí! Não me faça passar vergonha, mulher!
Ela aceitou a ajuda e logo estava de pé.
— Machucou alguma coisa? — ele indagou ao vê-la girar o ombro.
— Estou ótima! — E olhou, irritada, para o espectador que lhe tirou a concentração.
Fabrício seguiu o olhar à sua maneira nada discreta.
— Olhe só quem nos deu a honra de sua ilustre presença...
Com a propensão de Fabrício para metê-la em situações constrangedoras, Diana arrependeu-se amargamente de ter entregado o motivo de sua desconcentração.
Para seu alívio, ele voltou-se para ela e disse:
— Vamos terminar logo este jogo. — Para reforçar, bateu com as duas mãos na bola que segurava. — Emanuel disse que se não estiver em casa na próxima meia hora, a esposa o matará. Conhecendo aquela mulher brava, eu não duvido.
Desestabilizada com a presença surpresa, Diana lutava para recuperar a concentração e a dignidade. A última coisa que esperava era sentir-se estranha no meio da homenzarada. Passara tanto tempo escutando as críticas da madrasta e de parte da sociedade a respeito de seus modos, que negligenciara seu sexo como forma de proteger-se do sofrimento causado.
"Você não vai deixar de ser mulher só porque esqueceu que é", Fernando dissera.
Sua mente travava uma batalha interna, pois, em oposição ao que crescera acreditando, Fernando a fizera sentir-se muito feminina em seus braços... e agora que estava ali, em sua presença, com ele olhando-a tão intensamente, ela soube que podia esquecer qualquer coisa, menos que era mulher.
Limpando a testa com as costas da mão, tentou focar no jogo que tinha de ganhar.
— Certo! Eis a partida que vai decidir este empate! Preparados?
Os jogadores assentiram para o juiz.
— Ei, Diana — Fabrício chamou.
— Fale.
— Quer que eu te deixe ganhar?
— Por que está me perguntando essa besteira?
— Quero ajudá-la a impressionar seu amorzinho. Ele não tira os olhos de você. Não quer ganhar pontos com ele?
Foi o que bastou para ela virar toda a atenção para Fabrício e o objetivo de tirar-lhe o sorriso estúpido do rosto.
— Hoje você está demais, hein? Espere só...
O placar final terminou a favor do oponente, mas, estranhamente, Diana não se sentia derrotada. Ela sorria enquanto observava Fabrício e Emanuel comemorando a vitória aos berros, satisfeita em não ter levado para esta última partida os efeitos que Fernando causava nela enquanto mulher.
Dera o seu melhor e isto bastava. Por ora. No momento certo, iria atrás da revanche.
— Foi uma partida emocionante — Miguel falou, aproximando-se e cumprimentando-a com a mão.
— Muito — ela concordou, ao levar em conta o rebuliço em seu interior nos últimos minutos.
— Valeu pelo jogo, pessoal. Estava precisando disso — Emanuel agradeceu enquanto se preparava para ir embora. — E para quem achou que eu estava velho e acabado... — olhou especificamente para Diana —, só lamento.
— Mas...!
— Ela ainda tem muito o que aprender. — Fabrício passou o braço em volta dos ombros de Diana. — Regra número um: jamais subestime as habilidades de um ancião.
— Ancião, uma ova.
Fabrício soltou uma sonora gargalhada. Emanuel acenou com a mão e foi embora acompanhado de Miguel.
Coberta de suor, Diana não via a hora de refrescar-se. Sentia as pernas encharcadas e grudando no tecido da calça esportiva. Ela secava o rosto com a tolha, enquanto ouvia comentários entusiasmados sobre o recente jogo e os passos da garotada que esvaziava a quadra.
— E você, forasteiro? Será que sabe jogar basquete ou suas competências se resumem a apenas vestir terno e gravata?
Diana quis bater em Fabrício com a tolha.
— O que está fazendo? — perguntou-lhe baixinho.
— Atraindo a presa — ele cochichou de volta.
— Você sabe que eu sei fazer muito mais do que isso. — Foi a resposta firme e sólida.
— Essa eu vou pagar para ver.
— Fabrício...
Ele não lhe deu ouvidos. Ao invés disso, dirigiu-se a Lorenzo:
— E aí? Aguenta mais uma?
Lorenzo apenas deu de ombros, como se aquilo não fosse nada para ele.
— Eu e Diana contra você e Lorenzo. É pegar ou largar.
Calmamente Fernando andou até parar diante do trio. Ele encarou o braço ainda ao redor dos ombros de Diana e, mais do que depressa, ela viu o perigo brilhar nos olhos pretos.
O forasteiro sorriu.
— O que estamos esperando?
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