𝟮𝟳 : DEAD BY DAYLIGHT

☆ ☆ ☆

CAPÍTULO VINTE E SETE :
MORTO PELA LUZ DO DIA
come morning light, you
and I'll be safe and sound


"A moral da história é:

Cuidado com o homem que te
enfrenta desarmado. Se, aos teus olhos, tu
não fores o alvo, podes ter a certeza
de que és a arma."
── Os Seis de Atlas






OUTONO⠀─ ⠀ NOVEMBRO 28, 2003
⠀ ⠀18:00; Hartford, Connecticut
⠀⠀⠀⠀⠀

RILEY ESTAVA CORRENDO a muito tempo. O sol estava se pondo no horizonte, um tom bruxuleante de laranja e azul escuro banhavam o ambiente, começando a inibir sua visão em meio a floresta densa. Mesmo assim, ela não parou. Continuou correndo, pisando em gravetos e desviando de troncos no chão, pulando por cima deles, respirando de forma descompensada e arfando por ar enquanto suava.

O corpo de Riley tremia. Ela ainda sentia suas mãos tremulas, seu corpo quente se esforçando para bombear sangue no momento em que seus pulmões queimavam. Sabia que, caso parasse, seu corpo cederia. Desabaria por pura exaustão e cansaço e não poderia deixar isso acontecer. Não, ela precisava chegar até a casa. Precisava encontrar Sally e leva-la embora.

Os acontecimentos na cabana continuavam em sua mente, repetindo-se o tempo todo. O som do tiro ainda reverberava em seus ouvidos, um zumbido distante, uma lembrança esmagadora. Não conseguia se desfazer da imagem de Robbie morto, do sangue que respingou nas paredes e o no chão de madeira. O grito doloroso que saiu de sua garganta quando viu o que fez.

O peso de suas ações sobre seus ombros, filtrando-se em suas veias e em sua mente, foi a pior sensação que poderia ter sentido. A culpa que a corrói e dilacera aos poucos. Não sabia nem ao menos como teve forças para deixar aquele lugar, tudo aconteceu rápido demais.

── Você fez um bom trabalho. ── Ela se lembrava de ouvir Richard dizer, ainda sem conseguir desviar os olhos do homem morto na cadeira. ── Fez um ótimo trabalho, filha.

Ele abaixou a arma nas mãos dela devagar, até que o cano estivesse apontando para o chão. Riley ergue o olhar e encontrou com os olhos dele, suas orbes tremeluzindo.

── P-por que... por que me fez fazer isso? ── Riley o questionou com a voz trêmula.

── Foi necessário.

── Necessário?! ── Ela exclamou, sentindo uma nova emoção apoderando-se de seu interior, subindo aos poucos pelo seu corpo. ── Por que matar uma pessoa inocente é necessário?! Ele não fez nada demais!

── Porque nesse mundo Riley, precisamos fazer de tudo para proteger as pessoas que amamos. ── Richard a segurou pelo ombro, fazendo com que a jovem ficasse de frente para ele. ── Não importa o que seja, ou para que seja. Se quer manter quem você ama vivo e seguro, precisa aprender a fazer escolhas difíceis.

── Mesmo que isso signifique me tornar uma assassina? ── Ela indagou, lentamente.

── Você não é uma assassina, Riley. Perante os olhos de Deus, ele sabe que fez isso porque era necessário. Ele permitiu que isso acontecesse. Eu sei disso porque ele mesmo me contou. Deus quer que purifiquemos essa terra. ── Garantiu Linz, dando um sorriso singelo para ela. ── Ele compreende o seu coração e o seu ser.

Riley assentiu vagarosamente, deixando seus olhos vagarem por um tempo, antes de retornarem para Richard novamente. Seu coração batendo intensamente em seu peito, as palavras do homem ainda em sua mente.

Precisamos fazer de tudo para proteger as pessoas que amamos.

── Então, acho que Deus vai entender o que eu vou fazer. ── Ela comentou, olhando-o nos olhos.

O cenho de Richard franze e antes que ele possa sequer abrir os lábios para questioná-la sobre o que Riley quis dizer, a garota o acerta com o cabo de sua arma e depois o empurra para que caísse contra a mesa. Richard vai para o chão. Riley aproveita aquele momento para correr porta afora.

Ela não parou para olhar para trás desde então. Ignorando os chamados distantes e raivosos de Richard, ignorando a forma como seu corpo pedia por um pouco de descanso. Adams apenas faria isso quando encontrasse Sally e a tirasse daquela casa, de perto daquelas pessoas. Elas iriam para bem longe, sua irmã ficaria segura, ela faria o que fosse preciso para que isso acontecesse. Algo dentro dela gritava para fugir para bem longe de Richard Linz e tudo que o envolvia. Uma voz semelhante a de seu pai.

Quando avistou o velho casarão que eles se estabeleceram, foi pela entrada dos fundos. Haviam tábuas e cortinas velhas nas janelas. A única iluminação era provinda das velas que Bárbara e Esther acendiam quando a noite chegava e que deveriam ser apagadas antes das 21hrs da noite para que não chamassem a atenção de mais ninguém.

Riley abriu a porta de madeira gasta e entrou na cozinha. A adrenalina ainda correndo, seus olhos vagando por todos os lados. A arma ainda estava em seu ombro com sua alça escorregando a cada passo, até que teve que segurá-la para que não caísse no chão.

── Sally! ── Riley gritou. Ela entrou no corredor e foi até a sala, passando pelas escadas. Seus olhos passando por cada cômodo ── Sally!

Riley não a encontrou na sala ou no banheiro, todos os cômodos estavam vazios, sobrando apenas o andar de cima. Antes que ela pudesse subir, Esther apareceu, saindo da lavanderia onde eles usavam para estocar alguns mantimentos.

── Riley, o que está acontecendo? ── A mulher mais velha a questionou. Sua testa estava franzida, deixando seu rosto velho em uma careta de preocupação. ── Onde está Richard?

── Eu preciso encontrar a Sally. ── Ela responde, ignorando a pergunta de Esther.

── Sua irmã está no quarto com a Barbara.

Aquela era a única resposta que Riley precisava, subindo os lances de escada rapidamente. Esther não saiu de seu encalço.

── Riley, me diga o que está acontecendo. ── Ela a impediu de continuar, segundo-a pelo ombro e a fazendo virar. ── Você não me respondeu onde Richard está.

── Isso não importa agora, Esther. Eu só quero a minha irmã, apenas. ── Riley responde. ── Nós duas vamos embora daqui.

── O que? Você está louca?! ── Exclama a mais velha, apresentando tamanha indignação em seu tom de voz. Esther segue Riley escada acima, até que as duas estejam no corredor que leva a porta dos quartos. ── Não pode sair dessa forma, vai colocar a vida da sua irmã em perigo lá fora!

── A vida da Sally corre mais perigo aqui, com vocês. Não podemos ficar.

── Você não sabe o que diz! ── Esther a segura pela dobra do braço esquerdo, antes que Riley possa dar mais um passo em direção ao único quarto que apresenta frestas de luz. ── Não vou permitir que faça uma insanidade dessas! Se quer morrer, morra sozinha. Não leve uma criança inocente com você.

── Ela é minha irmã, é minha responsabilidade! Você não tem nada haver com isso, Esther! ── Retrucou Riley, sua voz estava exaltada. ── Deixa a gente em paz!

Riley tentou desfazer o aperto de Esther em seu braço, porém a mulher não cedeu. Ela levou a outra mão ao cabo da arma, tentando segurá-lo também e impedi-la de continuar.As duas haviam entrado em um impasse, onde a mais velha continuava tentando segurá-la e puxa-la para longe dos quartos, enquanto Riley fazia o possível para que Esther a soltasse.

── Me larga, Esther! ── Ela exclamou em meio a luta que passou a acontecer. Esther a forçou contra a parede, Riley a empurrou.

A sola do sapato de pano da mulher escorregou pela beirada, os olhos dela se arregalaram quando começou a se desequilibrar.

Esther arranhou os braços de Riley, tentando a todo custo segurar em algo para se firmar. Adams foi para trás, assustada pelo o que estava acontecendo e tentando fugir. Ela soltou a arma e empurrou Esther, caindo para trás assim como a mais velha caía na direção oposta, descendo as escadas rolando e deixando o rifle cair no chão com um som audível.

Os olhos de Riley estavam arregalados após tudo que aconteceu. Ela se apressou para ficar de pé, pegando a arma do chão e indo até o topo da escada para poder ver Esther. A cena a chocou. Fez com que Riley levasse a mão até a boca quando encontrou a Finley desacordada no final da escada. Ela a havia matado, assim como fez com Robbie.

Sem tempo para processar o que aconteceu, uma porta no final do corredor se abriu e Sally espreitou pelo batente, ignorando o chamado de Bárbara para não ir.

── Riley! ── Ela chamou pela irmã. A Adams mais velha voltou-se para a mais nova. ── O que aconteceu?

Olhar para Sally fez com que Riley lembrasse o porquê de estar ali. Caminhou até a menina de 11 anos com passos apressados.

── Sally, pega sua mochila. Nós vamos sair daqui agora. ── Riley disse, curvando-se um pouco para ficar da altura da menina. Sally abriu os lábios para perguntar algo, porém ela a impediu. ── Não faz perguntas, apenas faz o que eu estou te pedindo, por favor. Nós não temos muito tempo, precisamos ir embora.

── Riley, qual é o motivo disso? Por que vocês estão indo embora como se estivessem fugindo? ── Questionou Barbara, seguindo-a pelo quarto enquanto Riley ajudava Sally a recolher a mochila de forma apressada. ── Por que você estava discutindo com a Esther? Onde está o Richard?

── Barbara eu não posso te explicar nada agora. ── Riley olhou brevemente para a mulher grávida, ignorando a forma como sua mente se inundou com as lembranças dolorosas de minutos atrás. Ela empurrou Sally em direção a saída do quarto, apressando a menina. ── Eu sinto muito, mas...-

── Riley! ── Gritou Richard em algum lugar nos arredores da casa. Os olhos de Riley se arregalaram, seu corpo se arrepiou.

── Merda. ── Ela praguejou, sentindo o pânico aumentar em seu corpo.

Riley segurou o pulso de Sally e a puxou para fora dali, apressando-a e levando a menina em direção às escadas o mais rápido que podia. Quando a mais nova viu o corpo de Esther no final da escada, ela exclamou surpresa e chocada. A porta dos fundos abriu e fechou com força, passos pesados sobre a madeira a alertando da proximidade.

Antes que Richard chegasse até elas, Riley correu para fora da casa, escutando apenas enquanto Linz a chamava mais uma vez e Bárbara gritava em choque, ao avistar Esther. A porta da frente bateu, Adams não se deu o trabalho de olhar para trás para saber o quão longe o homem estava.

A escuridão se apossou ao redor da floresta, deixando todo o caminho pouco iluminado para se seguir, onde a luz da lua tornou-se o único guia. Mesmo assim, Riley não se importou em parar. Ela não tinha um plano bem formulado em mente, não havia pensado nos riscos de estar sozinha em um lugar escuro e rodeada de infectados, junto de sua irmã mais nova, porém sabia que agora era arriscado demais voltar. Talvez houvesse uma zona de quarentena em algum lugar próximo, com sorte as duas a encontrariam o quanto antes.

As duas chegaram até as cercas que mantinham os infectados longe da casa, Riley abriu a parte de baixo que estava solta a algum tempo com cuidado. Ela segurou a dor que sentiu graças ao arame colocado por Robbie para mantê-lo fechado, pequenos furos sendo feitos em seus dedos.

── Vai, passa por debaixo da cerca. ── Riley a instruiu, e Sally a obedeceu em seguida, arrastando-se pela terra para passar.

Um tiro de aviso, disparo na direção delas, a fez estremecer. Riley olhou para trás e viu que Richard estava próximo a entrada da casa, segurando uma espingarda. Ela costumava pertencer a Esther.

── Não me obrigue a te machucar, Riley. ── Ele exclamou a distância. Sangue escorria de sua testa, do ferimento que ela causou. ── Eu não quero fazer isso, só quero conversar com você. Vamos resolver isso como dois adultos, filha.

── Vai se foder!

Quando Sally estava do outro lado, Riley passou em seguida. Ela havia demorado mais que sua irmã, que era menor e mais magra, porém conseguiu. Puxou o rifle sobre seu ombro novamente e forçou Sally a ficar de pé para que pudessem voltar a correr.

Riley viu que Richard estava se aproximando dos portões, mirando a espingarda na direção delas mais uma vez. Ela correu pela floresta, escutando apenas o som dos disparos distantes e que faziam sua irmã choramingar de medo.

Em algum lugar ao redor, escutou um farfalhar. Seu coração errou uma batida, uma sensação ruim a deixando com medo.

── Riley, para onde estamos indo? ── Perguntou Sally. Suas bochechas estavam molhadas de suor e lágrimas.

── Eu prometo pra você que vou te explicar tudo quando chegarmos em um lugar seguro, Sal. ── Disse Riley, sem desacelerar. ── Mas agora não dá. Só confia em mim, por favor.

Sally assentiu brevemente, ainda apreensiva.

As duas continuaram pela floresta, tentando chegar até a estrada. Antes disso, porém, Riley escutou um farfalhar mais alto, o som de um rosnado de um infectado se aproximando em algum lugar. Ela forçou a parada das duas, procurando em que direção ele viria.

A sua frente surgiu um homem. Sua blusa azul estava rasgada e suja, assim como alguns lugares de sua calça jeans escura. O casaco que ele vestia estava caído de um lado quando rangeu os dentes para elas. Ele as avistou no mesmo instante que elas o viram surgindo no meio da floresta. Riley empurrou Sally para a esquerda.

── Corre, vai! Se esconde! ── Exclamou ela, engatilhando a arma em suas mãos enquanto o homem corria em sua direção. Sally a obedeceu.

As mãos de Riley estavam trêmulas quando mirou, mas não hesitou quando disparou um tiro certeiro na cabeça dele. O sangue espirrou, o infectado tombou para trás.

Ao seu lado esquerdo ela escutou mais um barulho e logo em seguida um outro infectado estava surgindo, dessa vez sendo uma mulher de cabelos castanhos. Riley a matou da mesma forma que fez com o primeiro, sem pensar duas vezes ao atirar, fazendo o possível para manter suas mãos firmes.

Girou ao redor, procurando por mais deles, os sons na floresta confundindo sua mente já perturbada pelos eventos daquela noite. Riley estava frenética. Suava frio e sentia seu corpo arrepiar enquanto procurava pelo pior. Girou mais uma vez ao redor, buscando pela direção de onde veio mais um farfalhar. Primeiro os passos passaram voando acima de sua cabeça, em seguida ela escutou passos vindo de trás.

Estava escuro, porém ela viu o contorno de uma silhueta. Distante, porém não parava de se aproximar. Seus ouvidos estavam zumbindo, escutava os sons que aquele infectado fazia, porém não o compreendia. Riley mirou e atirou como se estivesse no modo automático. Antes da bala sair do rifle, escutou seu nome saindo da boca daquela pessoa. Claro e alto, porém era tarde demais.

A bala atravessou o corpo de Bárbara no peito. Riley conseguiu identificá-la quando ela estava a uma distância considerável onde seus olhos conseguiam focar e a luz da lua iluminava melhor a área. Ela ficou petrificada, todos seus movimentos parados. Bárbara Linz a encarava, permanecendo alguns segundos ainda de pé antes de cair.

Riley pode ver o lampejo do choque permanecendo no rosto dela, a forma como a mulher levou a mão ao peito. Seu corpo caiu inerte no chão, movimentando a grama e o cascalho amontoado ao redor da floresta por anos. Sangue vermelho e viscoso jorrou, os olhos dela permaneceram abertos mesmo após a morte.

── Não! ── Gritou Richard, a todos os pulmões. Seu grito era doloroso, dilacerador ao se prostrar no chão ao lado da esposa morta após correr até ela, deixando a arma que carregava de lado. ── Barbs, não! Não, não... Amor, não...

Ele a embalou nos braços, chorando sobre o corpo dela, balançando-a como se fosse uma criança necessitada de conforto. Riley sentiu seu coração se rasgar pela cena, sentiu a culpa retornando. Abaixou o rifle e levou uma mão até os lábios trêmulos, sentindo as lágrimas de puro choque e horror escorrendo pelo seu rosto já manchado, sujo e molhado de suor. Fios de seu cabelo grudam em seu rosto, o vento que passa não faz nada para afastá-los.

Richard segura o rosto da esposa, o embala em sua mão maior. Ele implora, pede aos céus para que a traga de volta, mas seus lamentos são infundados. Eles não o levam a nada. Bárbara continua morta em seus braços, levando junto a vida que carregava em seu ventre.

── E-Eu... Eu sinto muito... ── Riley murmura com a voz embargada, dando dois passos à frente, sentindo suas pernas fracas. ── E-Eu sinto muito, eu n-não queria... Eu não queria matá-la, eu juro. Me desculpa.... Me desculpa.

Linz para seus movimentos e levanta o olhar para Riley, encarando-a. A tristeza que havia em seu olhar se esvai, o ódio e a raiva toma conta de suas feições.

── Você... Isso é tudo culpa sua. ── Ele diz, seus dentes cerrados.

Richard ergueu-se abruptamente e correu até ela. Riley tenta atirar nele com a arma para se defender, porém o rifle ficou travado. Sem tempo para conseguir consertá-lo, Linz arranca a arma das mãos de Riley e a joga longe.

Em seguida, suas mãos fortes vão diretamente para o pescoço dela. Adams cai de costas no chão com Richard colocando todo seu peso em cima dela enquanto a enforca. Suas mãos cobrem todo o pescoço da jovem, sufocando-a com força. Seu olhar está transtornado, frenético ao ponto de parecer irreconhecível.

Riley tenta lutar contra ele, tenta arranhá-lo até onde pode alcançar, porém não tem forças para tirá-lo de cima do seu corpo. Todas suas tentativas de lutar contra o homem são em vão, todas levam a nada. Ela pode sentir a forma como seus pulmões lutam para receber ar e a forma como passa a não conseguir respirar. O desespero faz seu ouvido zumbir como se sua cabeça estivesse cheia de algodão.

── Tudo o que eu fiz foi tentar te ajudar e essa é a forma que você me retribui?! ── Disse Richard, ainda tentando matá-la. A mão de Riley cai para o lado, tentando alcançar a arma ou qualquer coisa ao seu redor que pudesse usar para se defender. ── Sua garota estúpida, olha o que você fez! Você estragou tudo! TUDO.

Riley alcança uma pedra e a usa para acertar a cabeça de Richard. A pancada o desequilibra, faz com que o homem caia para o lado e a solte em seguida. Quando ele tomba, Adams vira de lado e arfa por ar.

De bruços, Riley rasteja no chão enquanto sua visão começa a desembaçar e os sons ao redor passam de ruídos para algo mais compreensível. Seus movimentos ainda estão lentos, porém ela se esforça para tentar fugir. Riley mal consegue ficar de pé antes que Richard esteja envolvendo um braço em torno de seu pescoço.

── Para onde pensa que você vai, ein? Você não vai fugir de mim, Riley. Não vai! ── Ele exclamou. ── Tentei ser bondoso e de nada isso me serviu.

── Me solta! ── ela gritou, voltando a lutar contra ele. Riley acertou o cotovelo no estômago de Richard, ele devolveu apertando o braço em volta do pescoço dela com mais força.

── Larga a minha irmã! ── Sally gritou. ── Solta ela agora!

O olhar dos dois seguiu para a mesma direção, encontrando Sally vários passos à frente deles. Lágrimas escorriam pelas bochechas rosadas dela, enquanto a menina segurava uma pistola em suas mãos. Riley se lembrou de colocar a arma dentro da mochila dela quando estavam no quarto minutos atrás. Richard deixou aquela arma com Bárbara e, enquanto a mulher não estava olhando, Adams a escondeu dentro da mochila.

Sally foi a única que havia visto, porém não fez perguntas. Agora a menina usava a arma para tentar proteger a irmã, segurando a mesma com as duas mãos. O objeto era maior que as mãos pequenas dela, parecia algo que não se encaixava.

── Se não você vai fazer o que, pequena Sally? ── Indagou Richard, rindo fracamente enquanto ainda tentava fazer com que Riley ficasse quieta em seus braços. ── Vai atirar em mim? Tem coragem de fazer isso, de ser cruel como a sua irmã?!

── Sally, atira nele. ── Riley fez o possível para conseguir falar com ela, segurando o braço de Richard com as duas mãos e o arranhando com suas unhas. ── Faz isso!

Sally chorou mais, ainda segurando a arma apontada para os dois, sem conseguir mirar direito. Ela choramingou o nome de Riley.

── Sua irmã matou várias pessoas boas essa noite, Sally. Ela causou isso. ── Linz disse em meio aos lamentos da menina. ── Eu posso te proteger, ela não. Atire nela e eu vou resolver tudo, criança.

── Não escute ele, Sally. Ele não sabe o que diz! ── Riley exclama, Richard a soca no estômago com o punho fechado.

── Parem com isso, por favor! ── Chorou a mais nova.

── Sally, me escuta! ── Gritou Riley. ── Atira!

Os dois não permaneciam parados, lutando um contra o outro naquele impasse que havia se formado. Sally não sabia para onde direcionar a arma, tentando seguir seu alvo que sempre saia do lugar. Quando a mais nova atirou finalmente, desejava que o tiro acertasse Richard, porém os dois se moveram e o disparo havia sido baixo.

A bala atravessou o ombro esquerdo de Riley, passando pelo corpo dela e acertando o do homem. Ela se alojou no peito dele, longe do coração, mas serviu para afastá-los um do outro. Adams cai para frente, levando a mão até o local onde a bala perfurou, sentindo uma dor excruciante e que nunca havia sentido antes.

Seu ombro queimava, seus olhos ardiam pela dor. Ela nunca havia sido ferida daquela forma antes, odiou cada segundo daquela sensação. Ergueu seu olhar na direção de Sally, ignorando Richard e notando a arma escorregando da mão da irmã enquanto a mais nova chorava muito.

Mesmo com a dor nublando seus sentidos, Riley colocou-se de pé e cambaleou até ela, pensando apenas em tirar sua irmã dali, pensando apenas no bem estar dela. Sally repetia um coro de desculpas, tremendo de pânico, medo e culpa.

── 'Tá tudo bem, tá tudo bem. ── Ela repetiu, buscando tranquilizá-la. Riley compreendia a culpa que Sally sentia. ── Não foi culpa sua, não precisa se desculpar.

Riley levou as mãos ao rosto de Sally e limpou as lágrimas e o ranho, retirando fios de cabelo grudados no rosto dela.

── Shh. Não chora, meu amor. Já passou, ok? ── A Adams mais velha a puxou para perto com o braço que estava bom e escondeu o rosto da irmã em seu peito, abraçando-a enquanto os soluços de Sally ficavam mais fortes. ── Está tudo bem agora, não precisa mais ter medo. Vamos sair daqui, vamos para outro lugar. Ele não vai mais me machucar.

── E-eu machuquei você...

── Não se preocupe com isso, eu vou ficar bem. ── Riley a afastou devagar, fazendo com que Sally a encarasse. ── Eu sei que você está com medo agora e isso é muito para uma criança como você processar, eu sinto muito por você ter que passar por isso, mas não podemos ficar aqui. Não temos mais tempo a perder.

As palavras de Riley saíram apressadas, enquanto ela ainda estava tentando ignorar toda a dor que sentia. Seus ossos também clamavam por descanso, porém sabia que não deveria. Não podia parar agora. Aquele era o momento que tinham para escapar.

Olhando por cima do ombro, Adams nota Richard começando a se mexer. Ela também escuta os infectados se aproximando por algum lugar.

── Precisamos correr, Sal.

Riley pega a pistola do chão e se levanta, grunhindo de dor quando o faz. Ela segura o braço esquerdo com a mão direita, fazendo o possível para mantê-lo estável quando as duas correm para longe dali, deixando Richard a beira da morte para trás, sem se preocupar em olhar ou tentar salvá-lo dos infectados.

── Tem um barco na praia por ali. ── Sally comenta com Riley, apontando para a esquerda, a direção que havia sido mandada antes.

── Certo. ── Riley assentiu.

Elas apenas continuam seguindo, desviando das árvores para chegar até a areia escura da praia. O local é encontrado com facilidade e há apenas um barco pequeno esquecido ali. Sua tinta azul e amarela está descascada, a madeira antiga se projetando. O barco ainda está inteiro e os dois remos ainda estão mantidos.

A mais velha ajuda a mais nova a entrar, deixando a arma em um dos bancos de madeira do barco velho. Riley empurra o barco totalmente para água e entra antes que ele se afaste muito. O esforço a faz grunhir de dor. Mesmo que tente desfarçar para não assustar sua irmã, o som sai de forma involuntária.

Ela senta-se ao lado de Sally, segurando um remo enquanto a menina utiliza o outro para que possam sair dali mais depressa. A todo momento seu olhar permanece na costa, buscando encontrar algo no meio da floresta, qualquer sinal de perigo, vasculhando a praia com seus olhos. Tudo o que Riley avista são mais pássaros fugindo para longe, nada mais.

Aquele momento a faz recordar de meses atrás, quando Richard a salvou no meio do caos que New Haven havia se tornado. Lembrava-se de observar sua cidade natal se tornando cada vez mais distante da mesma forma que naquele momento. Era como ter um deja vu.

Quando teve certeza que estavam longe o suficiente, Riley guardou a arma dentro da mochila de Sally, notando a forma como a mais nova estremeceu apenas ao observar o objeto, pegando repúdio do mesmo. Riley pescou uma blusa de dentro da mochila e rasgou em um grande pedaço, envolvendo-o em torno de seu ombro ferido e depois o amarrando com força para estancar o sangramento.

Sally apenas observou com um olhar triste e com mais lágrimas se formando em seus olhos, sentindo-se sobrecarregada novamente. Riley também sentia o peso daquela noite se alojando em seus ossos, deixando-a cansada. Quando terminou de fazer o seu melhor com o ferimento, ela respirou fundo e olhou para a irmã. Adams se esforçou para deixar o canto dos seus lábios subirem um pouco, o mais perto de um sorriso de conforto que conseguiu dar para Sally.

── Nós estamos seguras agora. O pior já passou. ── Riley tentou tranquilizá-la. Ela não tinha certeza se o pior havia realmente passado, mas sabia que Richard não seria mais um problema para elas.

── Para onde nós vamos, Riley? ── Perguntou Sally, um pouco calma.

── Vamos tentar encontrar alguma ajuda. ── Disse ela colocando uma mecha de cabelo de Sally atrás da orelha. ── Descobri que existem zonas de quarentena. Um lugar mais seguro para se morar. Devemos ficar bem lá.

── E onde fica isso?

── Eu... ainda não sei. ── Respondeu Riley. ── Mas deve haver alguma por perto. Se encontrarmos algum rádio, talvez consigamos descobrir para onde ir.

── Eu 'to com medo. ── Disse Sally com lágrimas não derramadas em seus olhos.

── Eu sei, eu também sinto um pouco de medo. Mas eu sei que, enquanto estivermos juntas, nós vamos conseguir. ── Ela sorriu tristemente para a irmã. ── A gente aguentou até aqui, Sal. Conseguimos fazer mais. Eu sei que sim.

Sally abraçou a cintura da irmã, descansando a cabeça no peito dela. Riley acariciou o cabelo dela, confortando-a.

── Prometo que vou continuar te protegendo, não importa do que seja, não importa o que esteja por vir, estarei aqui pra você. Só temos uma a outra agora ── Disse Riley, olhando para um ponto distante enquanto o barco continuava vagando para longe na água. ── Você é tudo o que eu tenho, não vou deixar que nada de ruim aconteça com você, tá bom?

Riley se esforçou para olhar para Sally, a mais nova a encarou de volta, assentindo.

── Não vou quebrar essa promessa. Você é minha maior responsabilidade, sempre vai ser. ── Adams a abraçou novamente com o braço direito e descansou a mão no topo da cabeça da irmã mais nova, deixando que o silêncio o som da água as envolvesse. ── Vamos superar tudo isso juntas, Sally. Você vai ver.

Riley não esqueceria de sua promessa, não se esqueceria do que seu pai disse antes de morrer. Continuaria cumprindo com ela, não importava quanto tempo passasse. Sua mão direita subiu, buscando um pouco de conforto no colar que carregava consigo em torno de seu pescoço desde a morte de John. Porém Riley não o encontrou lá. Em algum momento daquela noite caótica, Riley o perdeu e nem ao menos sentiu quando isso aconteceu. Ela engoliu sua frustração e deixou sua mão retornar a acariciar os cabelos finos de Sally.

Tudo o que fez naquela noite foi pensando no melhor para Sally. Imaginou que, em algum momento no futuro, poderia ser ela no lugar de Robbie apenas porque não concordou com Richard em algo. Imaginou que ele poderia forçá-la a matar a própria irmã apenas para afirmar a lealdade, da mesma forma que havia feito naquele dia. Nada a garantia que Linz não repetiria seus atos novamente. A insanidade nos olhos dele foi seu alerta para fugir.

Riley apenas se arrependia de como tudo havia terminado, não queria que Esther, Barbara e até mesmo Richard tivesse o fim que teve, desejava apenas ir embora com sua irmã para um lugar onde poderia ser seguro para ela. A situação saiu do controle rapidamente e, no primeiro sinal de perigo, percebeu que não podia mais hesitar.

Richard poderia ser um homem louco, mas não estava errado quando disse que ela precisava fazer de tudo ao seu alcance para proteger a pessoa que amava. Notou que ele era um homem perigoso e não confiável. Um dia foi um homem bom que se importou com ela, mas agora não era mais ── ou talvez nunca tivesse sido, agora a máscara dele apenas havia caído para revelar a pessoa que Richard realmente era.

Durante todo o percurso, Riley tentou convencer a si mesma que fez o certo, que ele não lhe deu escolha e que era um homem ruim por natureza. Disse a si mesma que logo esqueceria aquela noite e tudo o que fez. Ela se agarrou a isso como um mantra, como uma âncora.

Mas em meio a dor das marcas de dedos deixadas em torno de sua garganta, da dor causada pelo ferimento que ainda latejava em seu ombro e de todas as outras pequenas contusões que ficariam marcadas em seu corpo, Riley sabia que nunca esqueceria naquela noite.

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INVERNO⠀─ ⠀ NOVEMBRO 12, 18:35
⠀ ⠀Cheyenne / Jerico, Wyoming
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A porta da mansão se abre com um ranger lento, deixando com que a luz noturna adentre os cômodos pouco iluminados. O hall de entrada apresenta uma escada de madeira onde a tinta branca descasca em várias partes, onde o tom amadeirado escuro fica à vista para qualquer olhar curioso perceber.

Riley deixa que a porta fique completamente aberta antes de entrar com passos calmos. Os meus passos que deu para passar por cima dos dois Jericos mortos na porta, causados pela arma que ela carregava em suas mãos e utilizava para investigar cada cômodo da casa. O andar de baixo parecia completamente vazio e silencioso. Sem energia, assim como em Hertford anos atrás, algumas poucas velas foram acesas na sala.

Escutou passos no andar de cima que fizeram seu olhar se erguer, escutando o som com cuidado enquanto estudava para onde a pessoa se direcionava. Riley a seguiu com o cano da arma apontado para cima, deixando o cômodo que havia entrado por último para assim seguir até as escadas. Ela subiu cinco degraus antes de alguém surgir.

Dois disparos foram feitos e a mulher derrubou o Jericó antes que ele tivesse a oportunidade de atirar primeiro. O corpo do homem caiu contra a interseção na escada após seu sangue manchar a parede. A arma que ele segurava, uma pistola pequena, escorregou de seus dedos na queda e deslizou sobre a madeira.

Riley passou por cima dele, seguindo para cima, ainda escutando uma movimentação próxima e mantendo sua arma erguida para caso algo surgisse.

Assim que seus pés firmaram-se sobre o piso do segundo andar, Riley sentia o oposto do que sentiu 20 anos atrás. O medo não era mais um fato para despertar seu pânico, agora sentia uma necessidade de continuar, de procurar e encontrar seu alvo, de acabar com tudo de uma vez por todas.

Ela vasculhou os dois primeiros cômodos, abrindo as portas e procurando por Matthias dentro dos quartos. No terceiro, onde houveram alguns murmúrios, ela foi duas vezes mais cuidadosa ao abrir a porta. Quando pode encarar todo o cômodo, encontram os motivos que a levaram a chegar até ali, uma mulher avançou para cima dela com uma faca.

A jovem gritou, achando que de alguma forma conseguiria ajudá-la, porém Riley a impediu. Ela a derrubou, assim que desviou do ataque que quase acertou em seu braço, desferindo um golpe com a arma que deixou a mesma caída no chão.

As outras mulheres estavam todas no canto do quarto, amontoadas próximas umas das outras, segurando crianças em seus braços. Elas exclamaram em pânico crescente, assustadas pela forma que Riley havia tratado a outra. Quando pode finalmente observar por mais tempo todas elas, contou 7 mulheres, 8 com aquela que ainda estava no chão, choramingando.

Todas faziam parte dos Jericos e variam em idade, não saberia dizer quem poderia ser a mais nova ou a mais velha apenas olhando para elas. As feições cansadas e marcadas pelo tempo serviram para confundi-la. Algumas ainda tinham bebês de colo e outras mantinham o mais próximo que podiam as crianças de 5 à 7 anos que tinham, outro fator que pegou Riley desprevenida.

Quando encarava o rosto pálido e magro dos mais jovens, seus cabelos ralos e olhos assustados, poderia dizer que aquelas crianças não estavam bem. Todas pareciam doentes e ela não duvidava que os bebês também. Riley teve que forçar a si mesma para se concentrar, obrigou-se a deixar aquilo de lado, disse a si mesma que aquilo nada lhe devia a respeito, porém algo ainda se torceu em seu peito.

── Se não quiserem um buraco de bala no peito, me digam onde o Matthias está. ── Lentamente, Riley ordenou a elas. Um silêncio se seguiu enquanto passava o olhar sobre cada uma das mulheres. ── Não estou aqui para machucar nenhuma de vocês, nem seus filhos, então não me obriguem a isso. Apenas respondam o que eu quero saber.

As mulheres se entreolham, apresentando um olhar que permanece assustado.

── Por que você quer saber? Quer matá-lo? ── Questiona uma que é um pouco mais alta que as outras. Seus cabelos são castanhos escuros e estão trançados em uma única trança, deixando alguns fios soltos. Ela segura um menino de em torno 5 anos em seus braços, ele deixa a cabeça próximo ao pescoço dela, mastigando os próprios dedos. ── Está aqui apenas para isso, não está? Assim como os outros selvagens que destroem nossa cidade.

── Primeiro, essa cidade não é de vocês. Eles apenas estão tomando de volta o que lhes pertence. ── Disse Riley. ── Segundo, o que vou fazer com o Matthias não diz respeito a você, a menos que deseje acabar como ele. Então, me diga de uma vez, onde ele está?

Mais uma vez, elas olham uma para as outras. Riley nota que a quase certeza de que não vão dizer a ela o que quer saber, e isso a irrita. Não deseja machucar nenhuma daquelas mulheres, a vida por si só já parecia ter feito o bastante com elas. Matthias parecia ter feito mais do que isso.

Entretanto, uma delas dá um passo à frente. Cabelos ruivos soltos, pele clara e olhos azuis opacos. As outras ainda tentam impedi-la, resmungando para que voltasse ao seu lugar, porém ela não o faz.

── Eu digo se prometer pra mim que a morte dele será muito dolorosa. ── Disse a mulher, segurando um bebê envolto em trapos em seus braços. Os olhos dela brilharam com lágrimas não derramadas, lagrimas de ódio, dor e fúria. ── Faço-o sofrer tanto quanto ele nos fez todos esses anos!

── Lisa, não diga blasfêmia! ── Uma outra tentou repreendê-la.

── Blasfêmia? Blasfêmia?! ── Ela indagou, voltando-se para o grupo. ── Blasfêmia foi o que ele fez conosco durante todos esses anos! Só servimos para colocar crianças no mundo para ele, gerar filhos doentes e que morrem antes dos 8 anos. Crianças que ele despreza e ignora e depois coloca a culpa em cada uma de nós pelo o que chama de fracasso!

As outras se encolheram, desviando o olhar culpado, parecendo amuadas pela grande verdade exposta.

── Eu cansei disso. ── Disse Lisa. ── Cansei de ser um objeto para ele, cansei de estar cega. Eu não me importo se vou morrer depois disso, ── ela se volta para para Riley mais uma vez. ── contanto que ele morra antes.

── Ele vai.

É tudo que Riley consegue dizer a elas depois de escutar a dor que Lisa consegue pôr para fora. Cada palavra aprofundou o nojo e a repudia que ela nutriu por Richard durante todos aqueles anos.

Quando viu aquelas mulheres, imaginou que fossem esposas dele, que ele não deixou de buscar o que perdeu anos atrás: um filho, um herdeiro. Uma busca infundada que nunca prosperou. Aquelas crianças eram a prova disso. Nascidas doentes e fracas, sem qualquer possibilidade de um auxílio médico em um mundo acabado como aquele.

Riley se perguntou quantas outras faleceram antes daquelas? Quantas outras aquelas mulheres colocaram no mundo apenas para verem os próprios filhos falecendo em seus braços?

── Bom. ── Assentiu Lisa, olhando diretamente para ela. ── Ele está no porão. Há uma passagem de baixo da escada, leva para o "santuário" dele.

Riley assentiu em compreensão e deu meia-volta para sair do quarto, porém ela hesitou e olhou para trás antes de se afastar.

── Fiquem aqui, não saiam por nada. Se quiserem viver, é claro. ── Disse a Adams, friamente. ── Não me responsabilizo pela segurança de vocês fora dessa propriedade, nem pela das suas crianças.

Riley fecha a porta e sai, não dando a elas a chance de questioná-la. Ela inspirou profundamente, ainda buscando superar o que havia acabado de acontecer. Aquela sensação ruim revirou em seu estômago mais uma vez e ela forçou-a para fora do caminho.

Desceu as escadas de maneira apressada, chegando até a porta abaixo da escada. Riley levou a mão até a maçaneta, tentando abri-la, mas a mesma estava trancada. Sua segunda alternativa foi quebrar a maçaneta com o cabo da arma, até que a porta abrisse e revela-se o interior escuro das escadas do porão.

Apenas ao fim das escadas estava levemente iluminado por um tom dourado provindo de velas e lamparinas acesas, uma luz que dançava no escuro.

Seus passos foram cuidados, fazendo o possível para que cada ranger fosse mínimo para que não alertasse Matthias. Também não enxergava muito bem e precisou continuar minuciosa ao descer.

Quando desceu o último degrau, Riley voltou-se para a direita e o encontrou soltando murmúrios baixos enquanto rezava para um altar improvisado. Várias velas em torno de uma imagem de um santo, um desenho que deveria referenciar Deus. Havia várias velas ao redor da mesa, enquanto Matthias estava ajoelhado perante ele.

O som do gatilho da arma sendo destravado fez com que aquele espaço caísse em um silêncio perpétuo quando Matthias cessou seu clamor. Ele endireitou a postura lentamente, olhando primeiro para a imagem de seu Deus, antes de olhar na direção dela.

── Minha filha. ── Ele a saudou como se esperasse por isso, como se a aguarda-se.

── Pare de me chamar assim. ── Riley retrucou entre dentes, dizendo aquelas palavras lentamente. ── Eu não estou aqui para ser sua amiga, para te tratar como família. Você já não significa nada para mim a muito tempo.

── Tudo pode ter mudado para você, mas, para mim, nada mudou. ── Matthias coloca-se de pé devagar enquanto fala, apoiando no banco a frente da mesa. Riley segue os movimentos dele com a arma apontada. ── Eu ainda te vejo como a garotinha que salvei anos atrás.

Ele se sentou, direcionado para ela, soltando um suspiro cansado pelo esforço.

── Não foi isso que me disse naquela noite, quando tentou me matar.

── Foi... um erro. Um erro bobo. ── Ele desdenhou da situação. ── Eu fiquei à beira da morte naquele lugar, tive um encontro com nosso Salvador, ele me fez perceber que nada daquilo importava. Ele me disse para te perdoar e te receber em meus braços quando voltasse para casa.

── Como você sobreviveu, Richard? Os infectados teriam te matado naquela noite, mas isso não aconteceu. E não me diga que foi Deus, porque senão estouro seus miolos aqui e agora.

Richard permaneceu um curto tempo em silêncio, parecendo analisá-la. A visão parcialmente boa trazia a ele uma dificuldade ou talvez estivesse escolhendo as palavras certas para usar contra ela.

── Esther me salvou. ── Ele respondeu, pegando Riley de surpresa.

── Ela morreu. Eu a derrubei da escada.

── Não, ela não morreu. Desmaiou, na verdade. ── Disse ele, tranquilamente. ── Quando acordou, me encontrou na floresta ferido e... me ajudou com os infectados. Ela foi o anjo enviado pelo Senhor para me salvar, minha guia nesse caminho de perdição.

Riley revirou os olhos, sentindo a irritação em seu interior. Nunca passou pela mente dela que Esther pudesse ter ficado viva, Riley tinha dado certeza a si mesma de que a mulher havia morrido.

Após a surpresa ter passado, compreendeu que aquilo fazia sentido. Esther Finley era o epíteto de uma fanática religiosa e ela vivia para alimentar o ego de Richard, os dois formaram a pior combinação que ela poderia imaginar.

── Por que toda vez que você abre a boca é para falar a maior besteira que um ser humano pode dizer? ── Ela perguntou. ── Você é louco, completamente maluco. Deus não fala com você. Se ele existe, com certeza te odeia.

── Eu acho que é você quem não sabe o que diz, garota. ── Ele respondeu, sem sequer se alterar. ── Ainda não tem seus olhos e coração abertos para ele, não entende o seu propósito.

── E qual seria esse meu propósito? ── Adams indagou de forma desdenhosa.

── Dar continuidade ao que eu comecei. Ser o pastor que essas ovelhas precisam, ensinar aos perdidos que a purificação na terra é necessária, que os infectados vieram para o bem. ── Matthias respondeu. ── Corpos são passageiros, palavras são eternas.

── Não, palavras não são. Posso muito bem fazer todo esse seu "legado" morrer junto com você. ── Ele riu. O olhar zangado no rosto de Riley se aprofundou.

── É o que você acha? Acha que, se me matar, tudo o que passei 20 anos construindo vai se esvair? Acha que isso é tudo que há de Jericos? ── Indagou ele. ── Não, Riley. Você está enganada, querida. Eu vi e conheci muitas pessoas, não fui o único que viu a luz. Eu quero que seja você a continuar o que comecei, mas não significa que, caso não escolha esse caminho, tudo irá ruir. Outros depois de mim virão. Deus guiará os seus. Dará a eles voz nesse mundo perdido. Serão como... os serafins, declarando a salvação.

Matthias começou a rir, uma risada cheia de insanidade. Ela logo se tornou uma tosse forte, fazendo com que levasse a mão até a boca. Quando a abaixou, havia sangue manchando toda a sua palma.

── Meu tempo está... acabando. ── Ele comentou, olhando para o vermelho que sujou seus dedos. ── Mas ainda posso estar aqui para te ensinar o que falta...

── É por isso que quer que alguém assuma seu lugar. ── Riley o observa com atenção. ── Por que não o Dwayne? Ele é seu braço direito. A pessoa que você mais confia.

── Dwayne é um descrente. Ele acha que eu não sei, mas não sou tolo. Sou velho, não tolo. ── Matthias abaixou a mão suja e olhou para longe. ── Eu sei que ele cobiça o que eu tenho apenas para ser um tirano.

── E não é isso que você é?

── Eu sou um salvador, um enviado por Deus. ── Ele respondeu, olhando na direção dela com certo esforço. Ele mal a enxerga, Riley nota isso. ── Faço o que é necessário em nome dele.

── Isso inclui matar, estuprar e roubar? Inclui fazer aquelas mulheres sofrerem por 20 anos colocando seus filhos no mundo e os verem morrer todo santo dia? ── Ela indagou, dando passos à frente e apontando para cima. ── Essa é a palavra divina que você prega? A palavra onde prevalece o ódio, a selvageria, onde a humanidade se esvaiu dessas pessoas a muito tempo. Isso não é ser salvador, Richard. Isso é ser um monstro. É corromper vidas, condená-las ao que há de pior nessa terra em um mundo todos já estão fragilizados! Não há Deus nisso, não há nada de divino, apenas há a casca de um homem podre que se esconde atrás de falsas profecias e falsas promessas para ser o que ele realmente é!

── Você não é ninguém para me julgar, garota! ── Ele exclamou de volta. ── Não está isenta dos pecados que cometeu, Riley. Sei que também é uma assassina.

── Eu nunca disse que não era, nunca disse que sou uma santa. Estou bem longe disso. ── Riley responde, apresentando uma calma que não estava presente minutos atrás. ── Mas, quando me perguntam quem eu realmente sou, respondo a verdade.

Os dois ficaram em silêncio naquele porão, onde as pequenas chamas das velas refletiam sobre a lateral de seus rostos. Riley poderia jurar ter visto um lampejo de algo no rosto dele, uma raiva contida talvez.

Ela observou enquanto a mão dele ia ao pescoço, indo para baixo da gola da túnica para pegar algo que Riley nota logo depois ser a corrente de um colar.

── Eu sei que na sua mente eu sou o vilão. E está tudo bem, todos nós somos os vilões da história de alguém. ── Disse Richard, apertando o pingente do colar em seu punho fechado. ── Durante meu tempo na guerra, eu aprendi muito sobre isso. Tenho certeza que seu pai também. Não existe o bom e o mal quando se está lutando para sobreviver, muito menos quando se deseja restruturar um mundo, refazer a ordem. Algumas pessoas simplesmente não entendem que tudo que fazemos é apenas... necessário.

Quando ele abriu a mão, o reflexo da luz sobre o pingente de prata a fez perceber qual colar era aquele. O mesmo que havia perdido 20 anos atrás, aquele que pertencia a ela.

── Onde achou isso? ── Adams o questionou.

── Na floresta, na manhã seguinte, quando fui enterrar o corpo da Bárbara. Guardei comigo desde aquela noite. ── Respondeu o homem, ainda sem direcionar seu olhar para ela.

── Isso é meu. Eu quero de volta. ── Ela fala lentamente.

── Sabe, olhar para esse colar sempre me fez pensar como o John conseguiu uma família tão boa. Como ele foi capaz de ter algo que nem ao menos merecia? ── Indaga Richard. ── Algo que ele menosprezou por tanto tempo. Mesmo assim, ele teve isso. Aquele desgraçado...

Riley avançou e levou a mão até o colar, arrancando o mesmo do pescoço dele com brutalidade. O objeto ficou fechado dentro da sua palma enquanto ela encarava Richard com intensidade.

── Pra mim, isso só prova que você nunca conheceu o meu pai. ── Disse ela, bem próximo ao rosto dele. Richard não respondeu.

── Um homem que abandona a própria família, não deveria ser respeitado. Muito menos lembrado.

── Isso não diz respeito a você decidir.

Afastando-se em seguida, ela guardou o colar dentro do bolso da calça jeans. Riley segurou a arma com as duas mãos novamente.

── Eu estive lá por você, Riley. Em todos os seus momentos ruins, fui eu quem estava ao seu lado. Eu fiz o papel dele, eu te ajudei, salvei você. ── Disse o homem, apresentando tanta convicção. ── Fiz mais por você do que ele em anos e é assim que vai me agradecer? Com tamanha ingratidão?

Ela ficou em silêncio, escutando o que ele tinha a dizer. A resposta não chegou a sua mente, não havia mais nada que gostaria de dizer a Richard. Ela era grata pelo o que ele fez no passado, mas nada disso importava agora. O que aquele homem queria, o que o padre Matthias desejava, era conseguir manipula-la. Queria a garantia dela de que assumiria o posto dele, queria que ela desistisse do que veio ali para fazer, queria que ela cedesse.

Richard parecia ter entendido o silêncio dela como conflito, pois abriu um misero sorriso inclinado sobre a mesa atrás dele.

── Sinto tanta hesitação em você, garota. Eu sei que bem no fundo, você sabe que estou certo sobre tudo. Você é como eu, Riley. Sempre foi, mas nega isso com tanto fervor. ── Encarando-a, continuou. ── Eu te pergunto, realmente quer me matar? Depois de tudo que passamos, acha mesmo que conseguiria?

── Você acha que eu não quero? ── Ela indagou, quebrando seu próprio silêncio com tamanha seriedade em sua voz. ── Pensa que não sou capaz?

Richard abriu os lábios para responder, mas os disparos interviram. Ela atirou contra as pernas dele quatro vezes, dois tiros em cada, fazendo o homem gritar de dor.

── Eu prometi pra alguém que ia te fazer sofrer antes de morrer. Não gosto de quebrar minhas promessas, mas já desperdicei muito tempo com você. ── Ela continuou, observando-o cuspir sangue pela boca. ── Então, se pensou por qualquer momento que eu tenho o mínimo de consideração por você, está enganado. Qualquer consideração se foi a muito tempo. Só achei que precisávamos ter essa última conversa para que eu pudesse deixar bem claro pra você isso, uma última vez. Não vou assumir o seu lugar, eu nunca vou ser como você. E mesmo que dure toda a eternidade, vou fazer questão de destruir tudo o que você construiu.

── Você é uma tola! ── Ele exclamou. ── Vai para o inferno por conta de suas escolhas, por não aceitar quem realmente é, por agir contra um profeta de Deus!

Riley abriu um sorriso.

── Bom, nos encontramos lá então.

Mais 6 disparos foram feitos, atingindo o peito, estômago e por fim a cabeça dele, até que o corpo de Richard não permanecesse mais no banco e despencasse no chão como um saco de batatas pesado e inerte. O sangue que se acumulou ao redor passou a se amontoar aos pés dela, enquanto Riley permanecia parada no mesmo lugar mesmo após a morte do homem.

Seu olhar se perdeu em algum ponto naquele santuário improvisado, onde o cheiro do sangue e das velas queimando se misturou naquele porão úmido. Riley não sabia o que esperava sentir depois do que fez, mas com certeza não recebeu o alívio. Desejava que aquele fosse realmente o fim de tudo.

Após respirar profundamente uma vez, ela deu um passo para trás, depois se voltou para as escadas. Antes mesmo de chegar no primeiro degrau, uma lata foi jogada para dentro do porão. Adams percebeu tarde demais o que era.

Um flash de luz branca ofuscante fez com que sua visão ficasse comprometida. Ela cambaleou para trás, sem conseguir enxergar nada quando abria seus olhos. Suas costas foram de encontro à parede e, quando escutou passos, ergueu a arma para tentar atirar cegamente. A pessoa responsável não havia sido atingida, conseguindo chegar até ela para segurar sua mão com a arma e utilizar o cabo para acerta-la no rosto. A coronhada fere sua testa, Riley o sente escorrendo do ferimento quando é derrubada no chão, a arma é jogada longe. Escutou apenas uma risada acima de seu corpo, uma risada familiar que a encheu de ódio.

── Vejo que você fez bem o seu trabalho, Adams. ── Dwayne comentou, forçando-a contra o chão ao colocar seu antebraço sobre a garganta dela. Riley tentou lutar contra ele, porém ele fez questão de colocar um joelho em cima dela também. Com sua visão ainda turva, ela mal conseguia distingui-lo. ── Do jeitinho que eu queria.

── Vai se foder, seu filho da puta! ── Ela exclamou, raivosa.

── Eu não queria ter que matar você agora, Adams. Mas você estragou os meus planos. ── Enquanto fala, Dallas pega um pano e amarra ele fortemente nas mão dela, prendendo os dois pulsos juntos para que a mulher não possa se soltar. ── Eu ia deixar que os outros decidissem o que fazer com você. Talvez, eles escolhessem te jogar para os nossos bichinhos de estimação, talvez se divertissem com você um pouquinho mais. Estava ansioso por isso.

Dwayne coloca um segundo pano em volta da boca dela, prendendo-o entre os lábios para que Riley não possa falar ou gritar. Quando está satisfeito, ele a coloca de pé e a arrasta até um canto da sala onde pode prendê-la em uma pilastra de madeira e também amarrar suas pernas. Ao tentar chutá-lo, ela apenas o faz rir.

── Mas agora vou ter que fazer tudo diferente. ── Continuou. Dallas ergueu-se em toda sua altura encarando-a. Riley não desviou o olhar.

Dwayne caminhou até um canto, passando pelo corpo de Richard e cuspindo no mesmo. Ele pegou um galão de gasolina guardado em uma caixa, escondido em uma parte escura daquele lugar que também parecia servir de depósito. Retirou a tampa e fez uma única linha com o líquido em direção ao corpo dela, despejando um pouco sobre a mulher, divertindo-se enquanto fazia.

Ele também aproveitou para despejar o resto sobre o cadáver de seu antigo líder, balançando o conteúdo do galão até que não sobrasse mais nada.

── Eu poderia te matar com as próprias mãos, mas acho que vai ser mais divertido te deixar queimar aqui, não acha? ── Ele indaga retirando uma caixa de fósforo do bolso. ── Já vi um homem queimar até a morte uma vez, é bem doloroso. Ele não parou de gritar um minuto sequer. Espero poder escutar os seus gritos lá fora.

Perversamente, Dwayne sorriu. Riley apertou a mordaça sobre sua boca com força, sem conseguir produzir nenhum som por tamanha raiva que sentia.

Sua visão estava mais clara quando ela o observou ir até as escadas, ao começo da linha de gasolina. Dallas acendeu o fósforo, o fogo queimando na ponta, e o deixou cair sobre a área úmida sem pensar duas vezes. Ele olhou na direção dela, deixando que Adams notasse por completo seu rosto e o rastro de sangue que havia se formado depois que ela perfurou o olho dele.

A última coisa que Dwayne fez foi sorrir. Em seguida, voltou-se para as escadas e subiu por onde havia entrado, fechando a porta com força quando partiu.

Riley lutou contra as amarras assim que ele se foi, entrando em pânico enquanto via o fogo seguindo seu caminho pela gasolina, prestes a dispersar caso chegasse muito perto da madeira que constituía a mesa ou aos alicerces improvisados.

O fogo chegou primeiro ao corpo de Richard, que estava no caminho. Enquanto as chamas o consumiam, Adams tentava a todo custo fazer com que o nó que Dwayne fez afrouxar pelo menos um pouco para um pouco para que uma de suas mãos conseguisse sair. Seus pulsos doíam pelo esforço e mais tarde hematomas se formariam, mas nada daquilo importava enquanto ela não conseguisse se soltar.

Quando viu o fogo chegando próximo, Riley tentou afastar as pernas, dobrando-as contra o peito o máximo que conseguiu em sua situação precária. Ela olha ao redor em busca de algo para ajudar, qualquer coisa próxima para que pudesse soltar-se, avistando canos passando pela parede à sua direita e indo para o andar de cima.

Seus movimentos param quando ela escuta a porta sendo aberta novamente, passos pesados e apressados acompanham uma silhueta que adentra naquele cômodo com uma arma em punho. Ele a nota primeiro. Riley demora para conseguir identificá-lo em meio à penumbra do porão e o caos do fogo, porém quando acontece, ela sente um grande alívio.

Joel tem o rosto espantado ao se mover pelo lugar para puxar um grande pano estendido sobre os caixotes próximos da entrada, usando-o para conter o fogo quando o cobre e pisa em cima. Riley esforça-se para chamar a atenção dele com a mordaça em sua boca. Joel percebe e volta-se para ela, vendo enquanto Riley faz sinal para os canos de água passando pelo porão.

No que ele se aproxima, Miller atira contra o mesmo com a arma, quebrando com o cabo até que a água espirre para fora poucos segundos antes do fogo chegar ao seu destino. O líquido também recai sobre o corpo da Adams, trazendo um refrigério durante o tempo que seu coração ainda está acelerado e a chama em sua bota se apaga. O fogo se extinguiu por completo.

── Puta merda. ── Joel disse, deixando a tensão sair de seus ombros. Volta-se para Riley mais uma vez. ── Você está bem?

Ela assentiu, olhando-o. Naquele momento Riley percebeu o quanto sentiu a falta dele, notando tamanho o alívio por ver Joel ali, vivo e bem. Ele e as meninas haviam conhecido, isso era o que realmente importava.

Havia muito que ela gostaria de dizer para ele, porém seus planos foram impedidos quando escutaram uma explosão que fez a casa tremer. Joel se assustou, erguendo a arma quando escutou todos os gritos tão perto, ruídos de infectados como se estivessem muito próximos. O dedo dele chegou a escorregar no gatilho e disparar um tiro em um algum ponto atrás dela.

Quando o tremor passou e havia apenas o familiar som abafado do caos que vinha do lado de fora, Joel abaixou seu olhar para ela novamente, ficando mais sério.

── Nosso tempo é curto, Riley.

── Se atirar em mim, eu te mato! ── Ela se esforçou para dizer com a mordaça bloqueando sua fala. Suas palavras saíram abafadas.

── Não entendi merda nenhuma do que você disse. ── Comentou Joel, abaixando-se e retirando uma faca do bolso. ── Mas, conhecendo você, tenho certeza que foi uma ofensa.

Joel cortou a corda em volta do pulso dela primeiro, deixando-a livre para afrouxar o pano em seus lábios e abaixo-lo, liberando-a para falar de forma clara.

── Disse que ia te matar se atirasse em mim.

── Foi só um deslize.

── Eu sei, eu vi. ── Ela comentou, recebendo a ajuda dele para retirar os restantes das amarras.

── A coisa tá séria do lado de fora, quase não consegui chegar nessa casa. ── Joel comentou, oferecendo uma mão para que Riley ficasse de pé. ── Parece que estamos em Kansas City novamente.

── Só que com muito mais neve e muitos Jericos em volta. ── Ela completou, pegando sua arma do chão.

── E eles não estão fugindo. ── Joel entregou para ela um lenço.

── Obrigada. Os Jericos? ── Ela questionou, usando o pano para limpar o ferimento na testa. Joel assentiu, tentando não deixar a transparecer a preocupação que sente.

── Em Kansas City, todo mundo se preocupou em salvar suas próprias vidas quando tudo saiu do controle. Os Jericos não estão fazendo isso. ── Explicou Joel. ── Eles não se importam de estarem sendo atacados por infectados, só se importam em matar os outros. Isso é insanidade.

── Estamos no meio dos loucos do fim do mundo, amor. Não fica surpreso. ── Riley passa por ele contando a munição que ainda tem na arma. Joel a segura pelo braço, impedindo que vá para as escadas e parando o movimento da mulher.

── Espera. ── Ele diz. Riley se volta para a direção dele, franzindo o cenho. Miller permanece em silêncio por um curto período de tempo, apenas analisando o rosto dela. Riley estranha as ações dele. ── É bom te ver de novo.

Ao escutar aquelas palavras, ela relaxa instintivamente. Um pequeno sorriso desejando crescer em seus lábios, puxando nos cantos e seus olhos brilhando com o reflexo da luz das velas daquele santuário escuro.

── É bom te ver também, cowboy. ── Ela responde. A mão de Joel escorrega do braço dela enquanto Riley se aproxima, passando a envolver seus dedos nos de Riley. A testa dela encosta na dele e os dois fecham os olhos, respirando profundamente. ── Senti sua falta.

── Não tanto quanto eu senti a sua.

Riley ri, genuinamente. Ela se afasta para poder olhá-lo nos olhos.

── Isso é discutível, na verdade. ── Responde a mulher. ── Mas podemos deixar pra brigar sobre isso depois. Precisam da gente lá fora.

── Precisam da gente? ── Indagou Joel, franzindo o cenho. Ele soltou a mão dela. ── Eu já fiz o que precisava fazer, que era encontrar você. Temos que ir embora agora, Riley. Não tentar lutar uma luta que não é nossa.

── Joel, isso ainda não acabou. Eu prometi que ia ajudar, é isso que estou fazendo. Não vou quebrar minha promessa. Essas pessoas precisam de mim.

── Você também me prometeu que iríamos lidar com os Jericos juntos e não foi isso que você fez na universidade. ── Retrucou ele.

── Por favor, não comece com isso agora. Esse não é o momento, não é a hora nem o lugar pra isso. ── Riley respondeu. ── Se quer ficar zangado comigo, fica. Só me deixa terminar o que comecei aqui de uma vez por todas. Depois... seguimos em frente de vez.

Joel ponderou em silêncio, olhando para algum ponto no santuário, enquanto balançava a cabeça de um lado ao outro. Ele odiava aquela ideia, Riley notou isso, mas também percebeu que Joel estava cedendo.

── Faça o que tiver que fazer e vamos embora. ── Disse Joel, sério. Seus olhos castanhos avelã olhando diretamente para os olhos dela.

── Esse é o plano.

Desviando o olhar, Riley deu as costas e seguiu para as escadas. Ela subiu na frente e Joel a acompanhou até chegar no topo, onde Adams abriu a porta devagar para checar o lado de fora antes que pudessem sair. Quando teve certeza que estava seguro, Riley saiu primeiro.

── Como descobriu que eu estava aqui? ── Ela perguntou.

── Uma mulher de cabelos escuros disse que viu você entrando nessa casa. ── Joel respondeu. Riley chutou que deveria ser Dyani. ── Depois eu senti o cheiro de queimado e fui para a porta na escada, checar o que estava acontecendo.

── Se você tivesse demorado mais um pouco, eu tinha virado churrasquinho igual o Matthias. ── Disse Riley, enquanto os dois se encaminharam para a porta. Ela ficou do lado direito do batente e Joel no oposto.

── Aquele cadáver lá embaixo era ele? ── Miller perguntou, Riley assentiu. ── Você o matou ou...?

── É, foi eu. ── Ela assentiu mais uma vez. ── Mas o fogo foi o Dwayne quem colocou. Foi ele quem me prendeu no porão e me deixou para morrer. Agora ele está do lado fora, achando que conseguiu me matar.

Em compreensão, Joel assentiu. Os dois empunharam suas armas, escutando os gritos e os disparos do lado de fora. Riley sentiu uma certa apreensão crescendo, uma sensação que fez suas mãos começarem a suar.

── Ei, ainda comigo? ── Ele a chamou quando notou que o olhar dela começou a vagar. Riley balançou a cabeça de forma afirmativa. ── Bom, porque não vai ser fácil.

── Eu sei que não vai. ── Adams respondeu. ── Mas saber disso não faz a preocupação ir embora.

── Nós vamos conseguir. Fizemos isso antes podemos fazer de novo. ── Joel garantiu. ── Apenas não se esquece... ── Ele a olha nos olhos mais uma vez, posicionando sua arma, concentrado. ── Hoje será nós dois contra o mundo, faça os tiros valerem a pena.

Em retorno, Riley assentiu uma única e última vez. A mão de cada um foi até a maçaneta devagar. Eles seguraram e giraram ao mesmo tempo, abrindo as duas portas da casa para que pudessem encarar o lado de fora mais uma vez.

A cacofonia daquele pandemônio se tornou realmente real quando eles encaram o mundo real novamente. Há o desespero crescente causado pelas pessoas que corriam dos poucos infectados que os Jericos mantinham acorrentados na cidade e dos inimigos humanos. Como Joel havia dito, os Jericos não se importam quando os corredores ou estaladores os atacam. Eles cedem e gritam orações aos céus, como se aquilo fosse uma bênção. Quando conseguem escapar das garras dos infectados, avançam contra o pessoal de Cheyenne com tudo o que tem.

Joel e Riley estão atirando assim que seus pés pisam nas escadas que levam à entrada da casa, afastando todo o tipo de inimigo que aparece o melhor que podem. É difícil distinguir as pessoas no meio daquele caos, saber quem é aliado e quem não é. Riley também não sabe dizer que lado está ganhando quando tudo se resume ao desespero pela vida.

Ela percebe que Dyani e os outros seguiram com seu plano. O tribunal e outras partes da rua estavam em chamas, bloqueando a passagem para os lugares à frente da igreja. Eles usaram os artifícios que tinham ao redor para juntar a maioria deles em uma única direção, sem que dispersassem, porém alguém havia aberto a Cúpula com os infectados.

A neve que caiu pela cidade estava manchado de vermelho em cada caminho que eles pegavam. Haviam corpos para todos os lados, tanto de infectados quanto de pessoas. A quantidade de corredores estavam diminuindo, porém a de aliados também, fazendo com que Riley pensasse no que poderiam fazer para mudar aquele jogo.

Riley se vira para enfrentar um agressor com um machado, ela desvia de um golpe que passa raspando por seu braço e atira três vezes contra ele. Antes que um segundo chegue, Joel está disparando contra ele, impedindo que o mesmo a machuque. Há apenas uma troca de olhares silenciosa, um aceno com a cabeça, a forma que Adams encontra para agradecer enquanto ainda está sem fôlego.

Eles encontram Dyani, Gaspard, Mika e Kai no centro da luta. A passagem para a saída da cidade está bloqueada, fazendo um desvio com fogo em direção ao único meio de fugir. Os Jericos que se sentem encurralados, correm para dentro da igreja, deixando alguns remanescentes do lado de fora junto com os infectados. Eles trancam a porta assim que conseguem recolher o máximo dos seus.

A mulher de cabelos escuros avista Joel e Riley se aproximando, atirando com uma espingarda contra dois corredores. A maioria dos inimigos agora eram infectados.

── Vejo que você a encontrou com vida. ── Dyani comenta. Enquanto eles estavam ali, Mika e Gaspard colocaram uma barricada em frente a saída da igreja. Outros haviam bloqueado a dos fundos.

── Por pouco, mais encontrou. ── Riley responde por Joel, estourando a cabeça de um infectado com um único tiro. ── Como estamos indo?

── Os infectados estão acabando por enquanto, eles estão... lentos. Mas não estamos conseguindo dar conta por muito tempo, precisamos fazer alguma coisa contra eles ── Responde a mulher, dando uma análise rápida da situação atual. ── Os Jericos entraram na igreja, como você queria. Vai mesmo atear fogo no lugar?

── Não devíamos fazer isso. ── Kai comentou, intrometendo-se na conversa delas assim que se aproximou com Mika, os dois entrando na luta. ── Tem mulheres e crianças lá dentro, pessoas inocentes.

── E o que você sugere que a gente faça? Salva-los? ── Indagou Mika, cortando um infectado com um facão. ── O bastardo que matou a Lucia está lá dentro com eles, ele merece morrer.

── Podemos tentar firmar um acordo.

── Não há acordos com Jericos. ── Responde Riley, carregando a munição do rifle que encontrou, tendo trocado de arma quando a anterior não tinha mais munição, enquanto Joel a cobre.

── A morte não pode ser a única solução. ── Kai insistiu.

── Em um mundo de assassinos, talvez seja. ── Joel disse, mais próximo do grupo quando os infectados passavam a deixa-los encurralados.

── Se fosse o contrário, eles não pensariam duas vezes antes de te matar, Kai! ── Retrucou Mika, raivoso. ── Não fiz tudo isso atoa. Eles devem morrer!

Riley notou que eles permaneceriam naquele impasse. Dyani também não sabia qual caminho seguir e, por mais que ela fosse uma líder forte e decidida, naquela situação estava dividida. A mente deles poderia não estar feita, mas a dela estava. Joel continuou a cobrindo enquanto a mesma trabalhava em seu plano, apenas observando vagamente enquanto Riley agia rápido demais.

Saqueou dois cadáveres de Jericós enquanto os outros lutavam, retirando deles dois molotovs que por pouco não haviam sido acessos. Ela os acendeu com o isqueiro que um deles carregava e os jogou cada um por uma janela da igreja. A barricada em frente a porta impedia que qualquer um pudesse sair, então quando o fogo começou a se alastrar, eles batiam contra as portas em desespero desejando poder fugir.

Os gritos começaram, vozes diferentes se misturando. Riley permaneceu em frente ao edifício, observando tudo que acontecia. Seu peito subia e descia rapidamente, uma sensação de dormência em suas mãos confundia seus sentimentos.

── O que você fez?! ── Gritou Kai, vendo a cena enquanto matava um infectado.

── O que vocês deveriam ter feito. ── Riley respondeu, mantendo seus olhos concentrados no fogo que se alastrava, escutando os clamores desesperados que vinham do lado de dentro. ── Misericórdia é ruína.

Riley afasta-se, dando alguns passos para trás, enquanto o fogo consome as laterais da igreja, subindo cada vez mais alto. Os gritos não cessam.

Um misto de emoções passa pelo grupo. Kai e Gaspard parecem insatisfeitos com o que aconteceu, Mika é o oposto dos dois. Dyani permanece em silêncio, concentrada em matar os infectados que não param de surgir com seu facão, porém ainda há algo em seu rosto que Riley poderia dizer que ela não concorda com o que aconteceu.

── As dinamites acabaram? ── Ela pergunta a Gaspard.

── Temos duas ainda dentro da mochila. ── Ele responde. Riley tira a mochila do ombro dele e coloca no seu próprio.

── O que vai fazer? ── Dyani a questiona, finalmente dizendo algo.

── Leve o que sobrou do seu pessoal para fora da cidade. ── Adams os instrui. ── Vou lidar com os infectados enquanto vocês fogem. Vão ter alguns minutos antes que a situação fique feia.

── O que diabos você está planejando?

── Sei que você queria sua cidade de volta, mas pra mim isso nunca foi uma opção. Acabar com os Jericós sempre significou acabar com o que restou de Cheyenne também. ── Disse Riley, olhando para a mulher. ── Eu sinto muito, Dyani. Mas nunca houve uma forma de vocês terem esse lugar novamente.

Ela se afastou, indo em direção ao aposto da saída. Antes de se encaminhar para onde precisava chegar, Joel a parou.

── O que pensa que está fazendo? ── Ele a questionou.

── Vou acabar com os infectados para que vocês possam fugir.

── Não, nada disso.

── Joel, me escuta. Vai ser rápido. Eu vou ficar bem, encontro vocês do lado de fora em alguns minutos.

── Eu vou com você. ── Joel percebe que não adianta insistir pelo contrário, Riley não vai ceder.

── Você vai com os outros, ajuda-los a encontrar uma saída, ou um lugar seguro para se esconder. ── Uma explosão próxima faz com que os dois se encolham. ── Não temos muito tempo. Só tira eles daqui.

Joel suspira, odiando ter que ceder, mas ele o faz. Ele deixa Riley ir, olhando para ela uma última vez, antes de retornar sua atenção para seus inimigos. Corredores surgem e são afastados por Dyani e os outros. Ela grita para que seus outros companheiros comecem a dispersar.

Riley não olha para trás, ela foca em chegar até o grande reservatório de água da cidade. Ela é alta, em torno de 24 metros de altura, tem a forma de um tubo e é pintada de branco. Na lateral, há uma escada que leva até o topo. Riley espera que seja o suficiente conter os infectados que restaram.

Ela retira as dinamites restantes da bolsa e as posiciona no cão próximo ao fim da caixa de água. Retira o isqueiro do bolso e luta para acendê-lo, até que uma chama permaneça acessa e Riley a utilize para acender as duas pontas. Destruir aquele reservatório significa destruir o último recurso que a cidade de Cheyenne era capaz de prover. A possibilidade de conseguirem se reestruturar era baixa, porém Riley prometeu que colocaria um fim em tudo. Os Jericós que sobraram também seriam mortos se não fugissem.

Ela se afastou o máximo que pode da explosão. Estava distante o suficiente apenas para vê-la acontecer, observando o momento exato em que as dinamites fizeram seu trabalho. O estrondo ocorreu, o reservatório tombou em direção a rua, água irrompendo de dentro. Qualquer um que estava no caminho foi levado pelo impacto, em sua maioria, infectados. Riley não avistou Joel, nem os outros. A queda da caixa bloqueou sua visão do outro lado, mas atingiu seu objetivo.

Estaladores e Corredores foram levados pela água, ou mortos pelos escombros. O reservatório também caiu em casas onde os Jericós se escondiam. Eles acabaram mortos, soterrados.

Riley relaxou, vendo que havia dado certo. Seu único pensamento agora era conseguir achar uma passagem para poder deixar aquele lugar de uma vez por todas. Ela caminhou para a frente, olhando ao seu redor, buscando encontrar um caminho por dentro de uma casa que pudesse levá-la até o outro lado. Até que seu plano foi frustrado.

Aconteceu rápido demais. Riley não consegue dar muitos passos na direção do caminho que fez, decidindo voltar até o grupo, pois um braço envolve seu pescoço e a puxa para trás. Ela se debate, tentando soltar-se, porém o homem a aperta com mais força.

── Você é a porra de uma pedra no meu sapato! ── Veio a voz de Dwayne atrás dela, usando seu antebraço para contê-la. ── Por que você não morre?!

── Eu te pergunto a mesma coisa, seu filho da puta. ── Riley acerta a cabeça contra o rosto dele, fazendo-o cambalear. Depois o acerta com o cotovelo para que Dwayne a solte de uma vez.

Quando eles se afastam, ela pode finalmente encará-lo. Riley massageia a garganta, ele leva a mão ao rosto ferido. Agora sangue mancha o nariz de Dwayne, junto do que sobrou do sangue que deixou seu olho perfurado. A face suja e deformada a encara com ódio. Riley sabe que, dessa vez, não há chance dos dois saírem dali com vida.

Dallas retira uma faca de suas costas, uma arma que antes estava escondida. Ela não tem nada para se defender, suas mãos estão vazias. Não é justo, porém Adams sabe que esse é o jeito dele. Dwayne sempre quer ter a vantagem.

── Vou cortar sua garganta primeiro. ── Ele murmura, baixo e rouco. ── Depois, vou encontrar a sua irmãzinha e cortar a dela também.

Riley avança com raiva, desviando da primeira tentativa dele de cortá-la. Ela o acerta no rosto com um soco, depois segura a mão com a faca antes que possa ser feita a segunda tentativa. Ela o empurra para trás, o chuta na barriga. Dwayne cambaleia, mas não cai.

Ele retorna mais uma vez, cortando o ar na frente dela quando Adams vai para trás, desviando. Riley se desequilibra por um momento e é o suficiente para que Dwayne faça um corte em seu estômago. É superficial, mas ainda dói. Sente o sangue escorrendo do pequeno filete em sua pele, mas tudo que pode fazer ranger os dentes e continuar. Ela escutou a risada dele.

Dwayne continuava tentando deixá-la encurralada, forçando-a na direção onde as chamas estavam, os dois permanecendo naquele impasse. Ambos movimentos estavam lentos, porém eles não cederiam. Ele sabia que, caso cedesse, ela faria questão de matá-lo. O mesmo aconteceria ao contrário.

Quando conseguiu segurar o pulso dele mais uma vez, Riley o torceu com as duas mãos até que Dwayne soltasse a faca. Ele grunhiu, o objeto caindo no chão enlameado. Dallas usou a outra mão para apertar o pescoço dela, subindo até apertar o cabelo dela entre os dedos e puxar a cabeça da mulher para trás. Riley o solta por extinto, sentindo a dor em seu couro cabeludo ficar forte, porém não se compara aquela que sente no rosto quando Dwayne desfere um soco em sua bochecha.

Ela cai de bruços no chão, seu cabelo cobrindo seu rosto. Ele a segura pelo ombro, a vira com brutalidade e a faz enfrentá-lo quando pressiona contra o chão. As costas de Riley doem por conta do impacto, porém não tem tempo para processá-lo. As duas mãos de Dwayne estão em volta de sua garganta, o corpo pesado dele em cima dela. Tudo começa a se tornar um borrão em sua visão. Flashes de uma lembrança antiga se misturando. Quando ela pisca, jura que pode ver o rosto de Richard.

── Maldita. ── Ele fala enquanto as mãos dela tentam arranhá-lo. ── Você teve a sua chance de esquecer isso, mas não podia, não é?! Você tinha que aparecer para estragar tudo.

Os pontos pretos começaram a dançar na visão dela, seus pulmões doendo por ar. Nada que fazia parecia adiantar quando Dwayne estava com tanta fúria, decidido a matá-la a qualquer custo.

── Queria tanto vingança pela sua irmã, agora vai morrer por conta disso. ── Continuou Dwayne. ── Vai morrer e eu vou poder me divertir com ela uma última vez. ── Ele riu, doentio e perverso. Não havia qualquer traço de remorso naquele homem e Riley se odiou por não conseguir matá-lo.

De repente, dois tiros soam. Ela mal os escuta, mas percebe que atingiram o homem acima dela. A risada dele se torna uma tosse de sangue, escorrendo da boca pelo queixo. Dallas afrouxou seu aperto em torno do pescoço dela, trazendo o alívio que Adams precisava. Ela arfa por ar, sentindo a dor se esvaindo.

Dwayne tropeça para o lado, usando o restante de suas forças para tentar ficar de pé, mas acaba caindo de costas na lama. Riley avista a pessoa que a salvou assim que o corpo de Dallas para de bloquear sua vista.

── Sally ── A voz áspera de Riley expira o nome da irmã com surpresa. Sally segura uma pistola com as duas mãos.

Ela olha brevemente para a irmã mais velha, mas seu foco retorna para Dwayne, caminhando até ele. O homem ainda respira. Seu peito desce e sobe lentamente, ainda lutando em seus últimos momentos de vida.

── Pequena Sally... V-Você cresceu... ── Ele diz, engasgando com o próprio sangue escorrendo pelos lados de sua boca. Um fantasma de um sorriso nos lábios dele. ── F-Ficou durona.

Sally está acima dele, olhando para o homem com um leve tremor, várias emoções passando pelo rosto dela. Riley coloca-se de pé aos tropeços, firmando-se.

── Espero que você queime no fogo do inferno, desgraçado. ── Diz a mais nova, encarando-o e apontando a arma. A luz do fogo próximo reflete em seus olhos que brilham com lágrimas não derramadas.

── N-não devia ter guardado... ressentimento... ── Murmurou ele.

── Foda-se.

Sally descarrega o pente da arma sobre ele, perfurando com vários buracos de bala. Ela não para mesmo depois que Dwayne está morto, ou depois que a pistola está descarregada. A arma está vazia, mas o dedo dela permanece no gatilho com força.

As lágrimas caem. Sally cerra os dentes, sentindo raiva e dor passando pelo seu corpo, sem conseguir conter o que sente. Riley precisa levar a mão até as delas, envolvendo seus pulsos a arma, intervindo e ficando na frente da mais nova.

── Ei, acabou. Já chega. ── Ela fala suavemente, tentando retirar a irmã da espiral em que havia entrado. ── Acabou, Sal. Ele está morto. Está tudo bem. Estamos sãs e salvas agora. Ele nunca mais vai machucar nínguem

Sally treme, cedendo e soltando a pistola, deixando que Riley a leve. A mais velha a puxa para um abraço, deixando ela soluçar e chorar sob seu ombro. Sally aperta o casaco de Riley com força, enquanto as mãos dela acariciavam suas costas.

O alívio que deveria surgir ainda não veio, não quando a ferida havia sido aberta mais uma vez. Apenas encarar Dwayne em sua morte foi o suficiente para trazer aqueles acontecimentos na mente de Sally novamente, fazendo-a soltar gritos de dor que eram abafados contra a roupa de sua irmã mais velha. Riley deixou que ela soltasse tudo que esteve preso nesses últimos anos. Tudo o que a Sally de 16 anos suportou. Aquilo que quase matou sua luz.

Enquanto conforta a irmã, Riley nota a porta da casa próxima sendo arrombada e Joel surgindo. Ele parece desesperado por um momento. Antes procurando por ela, relaxa instintivamente quando a avista. Apenas com o olhar, Riley percebe que ele quer saber se está tudo bem. Ela acena uma vez com a cabeça, o suficiente para Joel concordar em troca e permanecer onde está.

Seu foco retorna a Sally, deixando que ela solte toda a dor que precisa deixar sair. Tudo o que for necessário para limpar sua alma. Agora elas tinham tempo para isso, tempo para realmente deixa curar. As duas apenas saíram dali quando Sally conseguiu se recompor o suficiente para sair do lugar. Seguiram Joel por um caminho seguro para fora da cidade, onde todos os outros estavam, onde poderiam ver o que restou de Cheyenne com clareza. Eles passaram por tantos corpos no caminho, tantas pessoas mortas. Não haveria glória pela manhã, apenas a reminiscência perante aquilo que havia sobrado para salvar.

AUTHOR'S NOTE. 𓏲࣪ ☄︎˖ ࣪

I. Depois de 1 semana escrevendo esse capítulo, finalmente ele está entre nós. Nem acredito que consegui finaliza-lo, foi realmente uma luta. E, sinceramente, não ficou nada como eu esperava. Tinha planos melhores pra esse cap, mas nada estava saindo como eu queria.

II. Mesmo assim, espero que vocês tenham gostado de ler. Fiz o meu melhor para conseguir concluir e poder dar continuidade a essa história, que agora está oficialmente chegando ao fim. Só mais três capítulos. Espero que vocês estejam prontos para o que está por vir.

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