𝟮𝟱 : LITTLE DARK AGE

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CAPÍTULO VINTE E CINCO :
PEQUENA IDADE DAS TREVAS
all alone open-eyed, burn the
page my little dark age


"O passado nunca está onde
você pensa que o deixou."
── Katherine Anne Porter






INVERNO⠀─ ⠀DEZEMBRO 12, 14:00
⠀⠀⠀Horse Creek, Wyoming
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RILEY ESTAVA COMEÇANDO a sentir os efeitos da abstinência novamente. Vinha em ondas, de maneira desordenada. Durante os dias que esteve em viagem com Joel até o Colorado, ela se conteve. Bebeu bastante água, tomou alguns remédios que Maria havia lhe entregado, conseguiu superar o pior. Depois do que aconteceu na Universidade até sua chegada em Horse Creek, os antibióticos inibiram a maior parte dos efeitos, mas agora ela estava sentindo algo torcendo em seu estômago novamente.

O gatilho foi ver Gaspard tomando dois goles de Tennessee Whiskey de seu próprio cantil, enquanto os 4 caminhavam pela floresta até a mina que Dyani havia falado. Ele chegou a oferecer a ela, deixando próximo o suficiente para Riley sentir o cheiro e quase ceder a tentação da bebida que tanto sentia falta.

Ela achava que, depois de tanto tempo, o álcool já não teria o mesmo efeito sobre seu corpo, porém estava enganada. Ainda era uma alcoólatra em recuperação, que quebrou seu período sóbria em Jackson e que agora tinha que começar do zero, mas sem estar desacordada ── o que para Riley estava sendo um verdadeiro inferno.

Antes de seguirem o caminho para seu objetivo, a líder do grupo lhe devolveu sua mochila e suas armas. Riley não tinha muita munição para pistola ou para o rifle e sua aljava estava totalmente fazia, fazendo com que fosse inútil utilizar o arco. Ela ainda tinha algumas faças de arremesso e sua própria faca que deixava dentro da bota que poderiam ter uma utilidade futuramente.

Chegou a cogitar a possibilidade de roubar um dos cavalos e fugir, sem se importar com seu trato, mas Adams não achava justo com aquelas pessoas. Querendo ou não eles a ajudaram, poderia estar morta a essa altura se Dyani não tivesse insistido para que ela fosse salva. Um senso de responsabilidade também existia dentro dela, lembrando-a que era muitas coisas, menos desonesta.

── A mina não é tão longe, ── explica Kai. ── porém ela percorre um longo caminho por debaixo da Terra.

── Tem muitos caminhos. ── Dyani completa.

── E como vocês vão saber qual é o que precisam pegar? ── Riley os questiona. A líder estala os dedos para Gaspard.

── Temos um mapa. ── Anuncia ele, retirando o objeto de dentro do casaco. É um papel de tamanho médio, amarelado e rasgado nas bordas. Eles tem o caminho traçado com uma caneta vermelha, indicando a saída certa e um X marca o final dela na cidade de Cheyenne. ── Você pode usar ele pra se localizar lá dentro, mas não perca. Precisamos desse mapa.

── O que está marcado com a caneta azul é onde supostamente estão as dinamites. ── Explica a mulher de cabelos escuros, enquanto Riley segura o mapa que o francês lhe entregou e o analisa. ── Caso precise delas para algo lá dentro. Talvez fechar uma saída, matar uma horda... Elas podem te ajudar.

── Apenas deixe um pouco para a gente. ── Adiciona Gaspard, sorrindo ladino.

Riley estudou o mapa com cuidado. Seus olhos passaram pelos dois caminhos dentro da mina, os trilhos desenhados nas páginas. Riley não queria imaginar como eles conseguiriam chegar tão longe, não estava nos seus planos ajuda-los além disso. Mais uma vez estava arriscando sua segurança por algo que poderia não dar certo.

Mascarou seu nervosismo o melhor que pode, mas sentia o olhar de Dyani sobre si enquanto guardava o mapa em seu bolso. Continuou acompanhando o pequeno grupo pela mata.

── Então, vocês estão juntos a muito tempo? ── Questiona a Adams, decidindo quebrar o curto tempo de silêncio que se formou.

── Desde que o surto começou. ── Kai respondeu. ── Eu, Kai e Ani nos conhecemos desde criança. Gaspard chegou na cidade na época do surto.

── E o que trouxe um francês para esse lado do Wyoming?

── Sai de férias com um amigo, na época. Íamos escalar alguns montanhas, estávamos fazendo um mochilão juntos. ── Gaspard explicou. ── Ficamos em outra cidade na época, mas ela não aguentou quando o Cordycerps chegou. Devastou tudo em questão de minutos. Meu amigo morreu e eu... Bem, parti em busca de algum lugar seguro e os encontrei.

── Desde então ele está com a gente, tirando todo mundo do sério. ── Comentou Kai.

── Vamos, garoto. Pode dizer. Sei que não vive sem mim. ── Gaspard colocou o braço em torno dos ombros de Kai, que bufou e tentou empurra-lo.

── Sai de cima, Gaspard. ── Resmungou o mais novo.

Gaspard falou uma frase em francês que Riley não compreendeu, agora prendendo Kai em uma chave de braço. Os dois começaram uma pequena luta entre si, deixando Dyani e a Adams para trás, aborto em suas ações infantis.

── Esses dois são sempre assim. ── Murmurou Dyani, após revirar os olhos. ── Brigam o tempo todo, mas não vivem um sem o outro.

Riley, dê braços cruzados, riu fracamente.

── Ah, eu sei bem como é isso. ── Ela comentou, um sorriso crescendo no canto de seus lábios, enquanto ela olha para o chão ao andar.

── Sua família. Acha que estão mesmo procurando por você? ── Dyani a questiona.

── Possivelmente. Talvez para você pareça loucura, mas... Depois que você os conhece, entende bem. ── Disse Riley. ── Mesmo que eu pedisse, mesmo que eu implorasse... Ele... Eles nunca me deixariam para trás.

Riley leva as mãos aos bolsos da parca que veste, sentindo um leve aperto na garganta ao se lembrar de sua família. Quando pensa nos últimos acontecimentos, no que a levou até aquele presente momento, sente um pouco de arrependimento por ter os abandonado.

Ela não deveria ter se colocado em perigo, mas não se arrependia de ter agido daquela maneira, não se arrependia de ter dado uma chance para eles escaparem em segurança. Apenas esperava que todos estivessem bem.

── Eu entendo. ── Responde Dyani, olhando para ela. ── Sei como é. Atualmente, ninguém tem muito pelo o que lutar. Ter as pessoas que amamos a nossa volta é um luxo. As vezes, é necessário ser um pouco egoísta para mante-las em segurança.

── Você deve ter sido então. Para manter seus amigos em segurança. ── Riley comenta.

── Mas não consegui ser pelo meu pai. ── Disse Dyani, soltando um pequeno suspiro. ── Não falamos tanto sobre como nosso egoísmo trás consequências, nem todas são boas. Erros assim... Não podem ser reparados com um pedido de desculpas. Algumas vezes, tudo se resolve com mais sangue derramado.

── Não é um mundo justo. ── Disse a Adams. As palavras da mulher reverberando em sua mente.

── Nunca foi.

Riley gostaria de perguntar a ela o que aconteceu, como eles perderam Cheyenne e como o pai dela morreu, mas deixou esses questionamentos para outro momento. Eles haviam chegado a entrada da mina, onde dois outros homens estavam parados.

Dyani apressou o passo, seu olhar se estreitando para algo. Riley percebeu que algo a perturbou, mas não a questionou o que aconteceu. Apenas seguiu os passos apressados da líder.

── Quem retirou as tábuas? ── Indagou Dyani. Seu tom era autoritário, firme.

Os dois homens se entreolharam, nervosos.

── Foi o Mika. ── Respondeu um deles. Cabelos negros e lisos até os ombros, ele estava com um chapéu de tom pardo na cabeça e vestindo uma jaqueta preta fechada, junto de luvas da mesma cor. ── Tentamos impedi-lo, mas... Ele disse que "ia resolver isso com as próprias mãos".

── Bom, então acho que vocês não vão precisar de mim, não é? ── Debocha Riley, notando o olhar preocupado que Gaspard, Kai e Ani trocam entre si.

── Ele vai morrer lá dentro. ── Comenta Kai.

── Bastard! ── Arqueja Gaspard.

── A gente precisa ir atrás dele. ── Adiciona o mais novo, enquanto Gaspard solta mais palavrões em francês.

── Quanto tempo faz que ele foi, Jack? ── Questionou Dyani.

── Alguns minutos. ── Responde o mesmo homem de antes. ── Talvez uns 5 minutos no máximo. Quando chegamos aqui, ele já tinha arrancado as madeiras.

── Falamos para ele parar, mas ele não quis. ── adicionou o outro rapaz. Ele parecia ser um pouco mais velho, com barba por fazer e mantendo seu cabelo liso preso. ── Mika estava armado também. Estava com a espingarda da Penny.

── O que ele tem na cabeça?! ── Indagou Kai, exasperado.

── Não quer que a gente depende de alguém de fora de novo. ── Comentou Dyani. ── O medo dele é que a situação se repita, ele nunca concordou com a gente recebe-la no acampamento ── A mulher aponta para Riley. ── e discutimos sobre a possibilidade dela nos ajudar com a mina antes. Mika não queria isso.

── Agora ele vai morrer para deixar de ser um idiota. ── Pragueja Gaspard. ── É loucura entrar lá embaixo sozinho.

── Vocês iam me deixar fazer isso sozinha. ── Riley responde.

── Sinceramente, achavamos que você iria desistir antes disso. ── Confessou Kai, olhando na direção dela. Riley arqueou uma sobrancelha para ele. ── Mas, se você não desistisse, um de nós iria com você. ── Ele dá de ombros. ── Mesmo não querendo entrar lá.

Riley solta um bufo, colocando as mãos na cintura, enquanto Kai se volta para o restante do grupo novamente.

── A gente precisa ir atrás dele. ── O rapaz comenta.

── Fique a vontade, parceiro. ── Gaspard fala, seu sotaque proeminente no final da frase. Ele dá alguns tapinhas no ombro de Kai, que solta uma respiração pelas narinas. ── Não estou arriscando meu pescoço entrando nessa mina cheia de zumbis por causa desse bastardo.

── Não são zumbis, são infectados.

── É a mesma coisa! ── Exclama o francês.

Os dois estão inicialmente mais um discussão, quando Riley revira os olhos.

── Foda-se. ── Ela pragueja baixinho e passa por eles. A discussão entre Gaspard e Kai cessa assim que ela caminha no meio deles e vai até a entrada da mina.

── O que vai fazer? ── Pergunta Dyani.

── Não é óbvio? Eu vou entrar lá, mandar o amigo de vocês de volta e limpar o lugar. ── Ela responde.

── Sozinha?

── Esse não era o plano desde o começo? ── Adams indagou, parada em frente a entrada da mina. ── Eu não posso perder mais tempo aqui, já disse. Vou resolver isso, pegar o cavalo e ir embora.

Riley encarou o interior da caverna, sentindo um vento frio percorrer o lugar.

── Eu vou com você. ── Anunciou Dyani. Riley virou-se para ela.

── Não. Seu pessoal precisa de você aqui, para ser a líder deles. ── Responde a Adams. ── E eu já vou ter que lidar com o amigo de vocês lá embaixo, não posso ficar sendo babá de dois.

── Ninguém disse que você ia ser babá. Eu sei me virar.

── Tenho certeza disso, querida. Mas prefiro não arriscar. ── Riley retruca, fingindo um sorriso amigável. ── Fiquem aqui. Eu vou cumprir a minha parte do acordo. Vou fazer o possível para trazer o tal do Mika inteiro, mas não posso garantir que vou conseguir se ele não colaborar.

── Faça ele perder 1 ou 2 dedos, tenho certeza que não farão falta. ── Disse Gaspard, sorrindo e debochando da situação. Kai acertou com o cotovelo na costela dele. ── Ai!

Ela retirou a lanterna da mochila, preparando-se parar entrar no local. Ainda sentia os olhares aflitos e questionadores do grupo sobre si. Riley entendia que eles ainda não estavam acreditando que ela estava disposta a lidar com vários infectados sozinha ── uma parte dela também não acreditava que estava disposta a ser tão burra.

Inspirando profundamente, ela encarou o interior do lugar, observando o quão escuro estava. Levou a mão a pistola no coldre em sua cintura, apertando-a para ter certeza de que estava firme ali e em prontidão quando fosse necessário.

Dando alguns passos para dentro, ela parou e olhou para Gaspard atrás dela. Estendeu a mão livre na direção dele.

── O que? ── Ele questionou, confuso.

── O cantil. ── Disse ela. Realização tomou conta das feições do homem e ele retirou o cantil com a bebida de dentro do seu casaco.

── Precisa de uma dose de coragem líquida. ── Gaspard comentou, sorrindo ladino ao entregar para ela o objeto já destampado. ── Aprecio isso.

Riley bebeu o Tennessee Whiskey com prazer, implorando para que aquela não fosse sua última bebida, pois o gosto não era tão agradável para o paladar dela. Sua garganta queimou um pouco, porém seu corpo esquentou. Os tremores passaram e ela sentiu que estava um pouco melhor, sem toda a irritabilidade em seu corpo.

Um gole não era o suficiente para deixá-la bêbada, muito menos para consertar os dias que passou sem a bebida, mas deveria servir pelo menos para lhe dar um pouco de coragem. Até o fim daquela missão, esperava estar de volta ao seu período longe de qualquer bebida alcoólica ── saberia que Sally ficaria desapontada se soubesse que ela estava bebendo novamente.

Depois de tentar devolver o cantil para o homem e ele insistir para que ela ficasse, Riley guardou o objeto meio cheio na mochila e desceu pelo caminho rochoso, adentrando a mina e seguindo pelos trilhos. Recordando-se do mapa, ela sabia que deveria descer continuamente até chegar na intercessão de dois caminhos. Um levaria para a esquerda e outro para a direita e Riley não conseguia enxergar nada adiante. Ela respirou fundo, apertando a mão sobre a lanterna.

Riley segue até chegar na intercessão e decide ir para o caminho esquedor primeiro, onde chegaria até o lugar onde estavam guardadas as dinamites. Ela também olha para o chão em busca de pegadas, tentando encontrar qualquer vestígio de Mika. Riley não encontra nada que possa ajuda-la a localiza-lo, o que a deixa um tanto frustrada.

A mina era um local grande, cada vez que descia, estava cada vez mais no fundo dela até chegar em um lugar aberto, onde há muitas passagens. Ela precisa parar por um momento para se localizar no mapa, pois agora tem muitas opções de caminhos para tomar. A sua volta há apenas terra e pedra formadas pela caverna arenosa. O lugar é abafado, sua respiração ecoa pelas paredes, mas ainda pode sentir o vento correndo pelo lugar, soando como uma música familiar.

Riley não escuta o som característico dos infectados aonde está, ela se recosta na parede e aproveita para segurar a lanterna entre o ombro e o rosto, a pressionando para mante-la firme, enquanto abre o mapa com a mão e se localiza. Passa o dedo sobre a folha, seguindo as linhas desenhadas até o local onde imagina que esteja agora. Ela olha para os dois lados e percebe o caminho a frente que precisa tomar para continuar até onde deseja chegar.

O caminho que toma tem degraus feitos de pedras, feitos com o próprio sedimentos da mina. Riley anda com cuidado, temendo a possibilidade de escorregar ou pisar em falso. Adams continua até chegar ao fim do caminho mais uma vez, encontrando mais trilhos para os carrinhos de mineração e uma porta verde de ferro que levava para uma sala de controle feita de madeira.

Riley nunca havia entrado em uma mina antes, aquela era a primeira vez que estava em uma de verdade. Lembrava-se apenas de ve-las em filmes quando era mais nova. A experiência de estar dentro de uma era totalmente diferente de ver uma mina pela TV. Chegava ser assustador a forma como vento sussurrava por todos os cantos, como o lugar parecia não ter fim cada vez que se caminhava mais para dentro, mais havia para descobrir.

Também não havia qualquer iluminação, a única forma que tinha para se guiar era através de sua lanterna. As lâmpadas postas na época em que a mina ainda funcionava já não tinham mais energia ou estavam quebradas. O sinal inexistente de infectados também deixava Riley preocupada. Ela não os escutava, estava tudo completamente silencioso.

Riley sobe as escadas de madeira até a porta verde e tenta abrir. Para a sua felicidade, o lugar está destrancado, a fechadura havia sido arrombada, entra e encontra o interior de uma sala de energia. Um lugar com alguns mecanismos como um painel de controle bem antigo, um armário para arquivos e uma mesa de metal no canto da sala. O que a espanta é o cadáver sentado no chão, nem no canto da sala.

Há uma arma no colo dele e um papel pardo caído ao lado. Havia apenas restado os esqueletos do homem e seu uniforme puido, deixando evidente que ele era um dos trabalhadores da mina. Adams se agacha e pega a arma primeiro, chegando a munição e guardando algumas balas consigo para a pistola. Depois ela pega a carta e a lê.

"Eu fracassei. Fracassei com todos eles.

Eles ficaram presos e eu fui o único que consegui fugir. Deixei eles lá... Com aqueles monstros. Estão presos e eu posso ouvir os gritos e o desespero de cada um deles.

Eram meus amigos. Eu deveria voltar e salva-los mas não consigo. Não sei o que fazer. Estou com medo de sair daqui, de encarar o lado de fora e também estou ferido. Sei que mais desses monstros estão por aí, não sei da onde eles surgiram ou como isso aconteceu, mas... Está acabando com tudo.

Não posso conviver com isso. Não posso conviver sabendo que deixei essas pessoas morrerem. Fui que detonei aquela dinamite, eu causei o desabamento.

Eu mereço morrer aqui."

Riley olha brevemente para o cadáver decomposto pelo tempo, ela nota os respingos de sangue na parede e a forma como a mão dele está caída sobre a coxa. Riley não precisa de muito para entender o que aconteceu.

── Você conseguiu sobreviver ao desabamento, mas não teve coragem de sair. ── Ela comenta no silêncio da sala. ── No final, você perdeu de qualquer forma. ── Dobrando a folha, Riley a guarda na mochila. ── Essa é uma forma muito triste de morrer.

Ela vasculha a sala, procurando suprimentos que possam ser úteis, encontra uma garrafa e alguns panos que podem ser utilizados para um coquetel molotov, mas ainda faltava o álcool. Para a sorte dela, ainda tinha o cantil com whiskey que pertencia a Gaspard.

Ela também achou um recipiente com gasolina que deveria ser usado para abastecer o gerador de energia. Não havia muito dentro do galão, mas serviu para que Riley pudesse criar o coquetel e guarda-lopara mais tarde, caso fosse realmente necessário.

Antes que pudesse sair novamente, Riley escuta uma explosão que a assusta. Seus olhos se arregalaram, um pequeno tremor passou por todo o lugar e ela levou a mão até o armário ao seu lado. Adams olhou para todos os lados, procurando qualquer sinal que pudesse ter alertado infectados próximos. Quando tudo retorna ao silêncio, ela deixa a sala apressadamente pela mesma porta que entrou.

Riley retoma seu percurso, descendo pelo caminho escuro em busca do ponto onde deveria encontrar as dinamites. Ela acha trilhos de ferro pelo caminho que ilumina e, antes que possa chegar ao final dele, esbarra com o motivo da perturbação.

Onde deveria haver as pedras que barravam a passagem, agora havia uma entrada liberada. Alguém havia acabado de estourar uma dinamite na frente das rochas e conseguido abrir uma passagem novamente. Teria que passar agachada por cima daquelas que restaram, mas ainda era uma boa passagem e Riley sabia que havia sido feita por Mika. Ela se perguntava onde ele havia conseguido as dinamites.

Riley se agacha e passa pela abertura, subindo pelas rochas e descendo do outro lado. Ela só consegue enxergar onde sua lanterna alcança e não é muito longe. Tudo está completamente escuro, silêncio toma conta do lugar novamente, onde o som da sua própria respiração é tudo que ela escuta conforme caminha vagarosamente.

Quando finalmente encontra algo, Riley chega até um tipo de plataforma de madeira que percorre os cantos da mina e tem uma escada para descer. Ela encontra Mika sobre ela e o homem vira a luz na direção de Riley bruscamente. Os dois se encaram.

── O que você está fazendo aqui?! ── Exclama o homem em uma indagação com os dentes cerrados. Ele não fala alto, sua voz não passa de murmúrio baixo.

── Estou aqui pra salvar você, idiota. ── Adams responde, espelhando o tom de voz dele. ── Não deveria ter descido aqui, precisa voltar.

── E deixar com você a responsabilidade de ajudar a gente? Nem pensar. ── Mika solta uma risada de escárnio. ── Não vou dever nada a alguém como você, muito menos minha sobrevivência. Vai embora, não precisamos de você.

Mika tenta dar as costas para Riley e ignora-la, descendo as escadas. Ela o segue, não planejando desistir tão facilmente agora que já está ali.

── Sua líder pensa o contrário. ── Riley comenta. Ele se volta para ela mais uma vez.

── Dyani não sabe o que está fazendo. ── Respondeu Mika. ── Parece que não aprendeu nada depois do que aconteceu, mas eu sim. Eu sei que não se deve confiar em pessoas de fora.

── Eu não sou uma dos Jericos, não sou como eles. ── Riley afirma. ── Não tem a necessidade de me tratar como se eu fosse.

── E do que isso importa? Pode não ser uma deles, mas ainda não sabemos quem você é, o que está disposta a fazer. ── Argumentou ele. ── Não precisamos de uma salvadora, muito menos que seja alguém que não temos certeza de nada sobre. Eu não confio em você.

── Olha, eu pouco me importo com o que você pensa ou deixa de pensar de mim. Estou aqui para cumprir com o que prometi para a sua líder e pronto. Estou indo embora depois disso. ── Fala a Adams. ── Você não vai me atrapalhar a fazer isso. Então, ou me acompanha como alguém normal e sem me incomodar, ou vai embora daqui a força. Você escolhe.

Os dois ficam em uma discussão silenciosa, encarando um ao outro no escuro e sentindo a tensão que se estabeleceu. Mika está irritado, solta uma respiração profunda pelo nariz e chega a abrir a boca quando eles escutam o som de um estalador.

Os olhos dos dois se arregalaram na hora e eles movem a lanterna para a direção de onde veio. O infectado entra se contorcendo pelo caminho abaixo deles, onde os dois precisam descer para continuar. Riley leva o dedo indicador aos lábios, pedindo para que Mika fique em silêncio e, enquanto olha para ele, pode perceber o quanto homem aparenta estar nervoso agora.

Há alguns alicerces feitos de madeira, usados para segura a plataforma acima deles, que praticamente serve como uma pequena sacada improvisada o qual acabaram de descer. Eles dão poucos passos para trás, ficando abaixo dela e esperando, analisando cada movimento do infectado para saber para onde ele vai e garantindo que fiquem fora do caminho do mesmo. Atrás deles há apenas uma abertura, uma passagem bem estreita e sem saída.

O Estalador para próximo a parede pedra a esquerda da caverna, contorcendo-se em frente a ela e arquejando em sons agudos. Riley retira a faca do seu coldre e anda vagarosamente até ele, temendo a possibilidade de acabar sendo notada enquanto o faz. Ela quase não respira, desejando ser o mais lenta e imperceptível o possível. Quando o Estalador chia altamente mais uma vez, ela para no mesmo instante. Espera que ele vire na direção dela, porém ele não o faz.

O infectado apenas fareja o ar, grunge algumas vezes e continua da mesma maneira que estava antes. Adams avança e dessa vez tem a chance de chegar até ele sem qualquer problema. Envolve o pescoço do Estalador com o braço e, enquanto ele se desespera, ela crava a faca no crânio dele e o mata. Tornando-se mole em seus braços, Riley o deixa desabar aos seus pés, formando uma poça de sangue viscoso a sua frente.

Para o seu desagrado, um segundo Estalador entra e solta um agudo altíssimo na direção dela. Sua mão vai até a arma que carrega e Riley quase a tira do coldre na perna quando uma flecha dispara e acerta o infectado na cabeça, atravessando o crânio em formato de cogumelo. Ao desabar do morto, os olhos de Adams seguem até Mika e ela o encontra segurando um arco em suas mãos.

O olhar dos dois se encontram e ela vê como o rosto dele se fecha novamente, ficando obscuro e sério, desgostoso em olhar para ela.

── De nada. ── Ele murmura em um tom de irritação. Ríspido e desdenhoso, Mika não se importa em esperar Riley. Abaixa o arco e segue a frente pelo caminho.

Adams bufa, soprando alguns fios de cabelo rebelde para fora de seu rosto.

── Espera ai, bonitão. Tem algo ali atrás. ── Riley aponta para a passagem estreita atrás deles. Mika olha com desinteresse. ── Não podemos deixar nada passar.

── Se quiser ir, fica a vontade. ── Ele dá de ombros. ── Não pense que estamos trabalhando juntos.

Riley revira os olhos.

── Se as dinamites estiverem ali atrás, não pensa que vou ir atrás de você. Vou te deixar sozinho, andando que nem um idiota dentro desse lugar. ── Ela respondeu. ── E vou orar para um infectado te devorar.

Ela dá um sorriso mínimo para ele e dá as costas. Mika não responde, ficando apenas pensativo em relação ao que fazer. Riley se espreme pela passagem, passando por pouco por ela. Lá dentro não há nada que chame sua atenção, além de dois cadáveres.

Os dois são apenas ossos agora, mas um ainda está inteiro. São dois homens, um ao lado do outro. Um deles está deitado e o outro sentado. Os uniformes entregam que também eram trabalhadores da mina. Escrito com sangue nas paredes, um dos dois escreveu: "Eu estava com tanta fome, não tive escolha."

Também havia várias marcas contando os dias e Riley logo entendeu que aqueles dois não se transformaram, mas ficaram presos ali. Aquele que estava sentado, matou o próprio amigo e o canibalizou para sobreviver. No final, ele também morreu de qualquer forma. Talvez tenha enlouquecido, talvez tenha achado um jeito de tirar a própria vida. Riley não ficou muito tempo ali para descobrir.

── Encontrou alguma coisa? ── Mika pergunta assim que ela sai novamente. Ele está parado, esperando por ela em frente ao caminho que eles precisam descer.

Riley engole o seco, tentando tirar a névoa do que viu da sua mente. A cena a deixou enjoada.

── Nada. Apenas mais gente morta. ── Ela respondeu. ── Dois desafortunados que sobreviveram ao cordycerps, não conseguiram sair dali de dentro e acabaram morrendo. Um deles comeu os órgãos do próprio amigo para sobreviver.

── Porra. ── Praguejou Mika. ── Que forma horrível de morrer.

── Parece que todo mundo que entrou nesse lugar teve uma puta má sorte. ── Riley comentou.

Tenta acompanhar o homem mau humorado a sua frente, que caminha a passo largos. Ela não havia notado a aljava que ele carregava presa a mochila. Mika também carregava consigo um pequeno machado.

── Meu avô costumava contar uma história para gente sobre pessoas que se transformavam em monstro depois de cometerem canibalismo durante o inverno. ── Mika compartilha com Riley aquele informação. ── Já ouviu falar dos wendigos?

── Não, nunca. ── Ela negou.

── Pois bem, eles são criaturas que não enxergam muito bem, mas que tem uma ótima audição.

── Isso soa como os Estaladores para mim. ── Riley comenta.

── São parecidos. ── Concorda Mika. ── A diferença é que os wendigos são altos e muito magros. Olhos grandes e sem vida, boca cheias de presas que consegue arrancar a cabeça da pessoa do corpo muito facilmente. ── Ele explica. Riley quase sente um calafrio em sua espinha. ── Meu avô dizia que eles se escondiam nas florestas. Segundo ele, não podiam sair a luz do dia. Mas já ouvi histórias dizendo que eles apenas não queriam, preferiam a noite.

── Você tinha quantos anos quando seu avô contava essa história?

── Uns 8 anos, talvez menos.

── Uau. Ótima história para contar para uma criança. ── Riley ironiza. ── Seu avô deveria adorar você.

── Servia pra manter a gente longe da floresta. ── Ele dá de ombros.

── A gente? Ele contava essa história para mais crianças. Porra, que maravilha. ── Ela ri fracamente.

── Dyani, Kai, eu e meu irmão... Ouvimos as histórias dele o tempo todo. Nem todos eram sobre monstros. ── Retrucou Mika. ── Ugh, nem sei porque estou te contando isso.

Riley dá um sorriso de lado, achando a situação engraçada, porém evita implicar com Mika por conta disso.

── Fique tranquilo. Vamos encontrar coisa pior do que wendigos por aqui. ── Ela responde.

── Nossa, não sabe como você me tranquiliza ao dizer isso. ── Ele debocha. ── Você não tem filhos, né? Seria uma péssima mãe.

── Isso é questão de ponto de vista. ── Adams retrucou. Eles continuam mais um tempo em silêncio, seguindo pelo túnel. ── Como conseguiu desobstruir a passagem? ── O questionamento vem enquanto eles descem o caminho rochoso, observando cada canto em busca de mais inimigos.

── Com dinamite. ── Mika responde.

── E onde você conseguiu dinamite?

O homem solta um suspiro cansado. Riley tem quase certeza que ele revirou os olhos agora.

── Encontrei em um cadáver lá atrás, ele ainda tinha duas com ele. ── Explicou.

── E você não se preocupou nem um pouco com a possibilidade de perturbar os infectados que estão presos aqui? ── Ela perguntou. ── Não passou na sua mente em nenhum momento que poderia atrair vários deles pra você?

── A mina é enorme. Eles podem estar por qualquer lugar aqui dentro agora. ── Disse Mika.

── Você leu a carta? Eles ficaram presos bem aqui. Todos os infectados estão exatamente em algum lugar nesse caminho.

── Eu sei, mas era ou fazer isso ou não fazer nada. ── Afirma o homem. ── Não tinha muitas outras opções além disso. O restante das dinamites que precisamos estão por algum lugar aqui embaixo. O que você faria no meu lugar, ein? ── Ele questiona por cima do ombro, porém Riley não responde. Apenas desvia o olhar. ── É, pensei que a resposta seria essa mesmo.

Mais madeiras servem como alicerce pelo caminho, rodeando as paredes e o teto, servindo para manter firme. Riley e Mika também encontram algumas máquinas paradas, algumas áreas de mineração. Eles vasculham pelos carrinhos de ferro nas áreas de expansão em busca de algo, procurando pelas dinamites e onde podem estar guardadas. O mapa não é preciso, a sinalização dele diz que é algum lugar por aquele túnel, mas eles não sabem dizer onde.

O trabalho se mostra cada vez mais difícil conforme eles não encontram nada. Riley sente que está andando em círculos, que talvez não haja mais dinamite e que os mineradores gastaram tudo para lidar com os infectados. Ela quer sugerir a Mika que eles voltem, porém acha que não vai ser fácil convencer o homem.

── O mapa mostra uma segunda área de expansão mais a frente. ── Riley diz, observando o mapa em suas mãos. ── Vamos até lá e, se não tiver mais nada, vamos voltar. Acho que já tive o suficiente desse lugar.

Mika parece em conflito, porém aceita.

Eles continuam até o final daquele túnel para acabar encontrando mais rochas bloqueando o caminho. Não podem mais continuar.

── Não tem como passar. ── Comenta ele. ── O que vamos fazer?

── Precisamos procurar outro caminho. ── Ela olha em volta e guarda o mapa em seu bolso. Atrás deles há uma passagem no lado direito bloqueada por madeiras e com uma placa escrita "Perigo! Não entre" ── Não é convidativo, mas... Pode nos levar até lá. ── Adams aponta na direção.

Mika suspira.

── A gente não tem escolha. ── Ele responde. Prende a lanterna na alça da mochila e acompanha Riley até lá.

── Me ajuda a quebrar essas madeiras.

Juntos, os dois chutam as tábuas de madeira até que se quebrem. Elas se despedaçam fácil, deixando claro que não são totalmente firmes ou seguras. A possibilidade de desabamento é algo que os preocupa.

── Não parece ser muito estável. ── Mika comenta, analisando o caminho enquanto eles se abaixam para passar. É um buraco que não deveria ter sido aberto, eles não passam em sua altura total.

── Talvez tenha um motivo para eles não terem terminado essa estação. ── Riley diz, seguindo na frente enquanto Mika está atrás dela. ── Parece que uma banana de dinamite é o suficiente pra derrubar todo esse lugar.

── Não sabe como é ótimo ouvir isso. ── Debocha o homem. ── Isso realmente me conforta.

── Bom saber disso. ── Riley ironiza.

Os dois saem do outro lado, encontrando mais trilhos e dois lados para seguir e um carrinho no meio dele. Ela vai até ele e procura pelas dinamites. Está quase completamente vazio, se não fosse pelo pequeno dispositivo dentro dele. Riley pega, um tanto curiosa. O objeto é feito com arames, uma garrafa e fita. Olhando mais meticulosamente, ela percebe que é um tipo de bomba de distração.

── O que é isso? ── Mika pergunta.

── Uma bomba caseira improvisada. ── Ela responde. ── É feita pra distrair. Você joga, espera alguns minutos e ela explode fumaça. Faz tempo que eu não vejo uma dessas.

── Já fez algo assim?

── Uma vez, eu acho. Quando eu trabalhava com uma pessoal nas zonas de quarentena, deixavamos a cidade com algumas armas improvisadas quando não tínhamos nenhuma. ── Disse ela. ── Isso servia pra dar tempo da gente correr e se esconder.

Riley guarda a bomba na mochila e retoma o passo com Mika; os dois decidiram seguir em frente, mas logo chegam na zona de expansão que procuravam. O caminho principal bloqueado a frente e mais utensílios de mineração ao redor.

Geradores de energia desligados, as ferramentas dos mineradores, uma mesa no canto, com um  rádio em cima e um grande baú fechado. Riley vai diretamente ao baú de aço e encontra o mesmo aberto, seu cadeado não está a vista.

Quando o abre, Riley encontra mais alguns objetos descartados e uma bolsa de viagem preta, suja e gasta. Ela a retira com uma mão, deixa o baú fechar e apoia o que pegou sobre a superfície. Quando abre o zíper, ela solta uma risada.

── Encontrei. ── Ela cantarolou. Mika está ao lado dela em questão de minutos, olhos arregalados enquanto observa as bananas de dinamites dentro da bolsa.

── É só isso que tem?

── Infelizmente, sim. ── Assentiu a Adams. ── Deve servir, certo?

── Isso é o Gaspard quem vai dizer. ── Mika respondeu. Ele estava com o velho rádio nas mãos. ── Mas acho que vai ser o suficiente.

Riley fecha a bolsa e a joga por cima do ombro, porém guarda duas bananas de dinamite em sua mochila, pronta para dizer para Mika que eles já podem ir embora, quando o rádio que o homem mexia começa a chiar. O objeto assusta os dois, ganhando vida imediatamente e fazendo a estática soar. Não há uma pessoa falando, apenas aquele som estridente e desconfortável.

── Desliga isso, porra! ── Ela exclama, levando as mãos aos ouvidos para tentar abafar o som que a perturbar.

── Eu 'to tentando! ── Mika grita de volta, soando desesperado.

Frustrado, Mika joga o objeto no chão e começa a pisar nele, tentando a todo custo faze-lo parar de tocar. Riley escuta barulhos a volta deles, olha para todos os lados com suas orbes azuis arregaladas.

Um calafrio percorre sua espinha mais uma vez e ela sabe que aquilo não foi um bom sinal. Riley puxa o homem pela manga da jaqueta.

── Vamos sair daqui. Anda. ── Ela o arrasta até metade do caminho.

Quando eles chegam até o carrinho de mineração parado no meio dos trilhos, escutam o primeiro som de um estalador, seguido por outro e mais outro. Torna-se uma sinfonia fecorrente.

O som vem da direção oposta aquela de onde eles vieram e os dois percebem que começa a se aproximar. Riley empurra Mika para a passagem por onde eles passaram agachados antes e o segue para a fora dali, escutando o instante em que um Corredor passa rapidamente atrás deles, indo para onde eles estavam antes.

── Você tinha que brincar com a porra do rádio, não é? ── Riley o confronta assim que eles saem, soando muito irritada.

── Eu explodi duas dinamites e eles não apareceram antes. ── Retrucou Mika, falando em um tom de murmúrio. ── Por que logo agora isso acontece?!

── Porque o rádio era um som único, quando você detonou as dinamites, causou um som disperso porque todo o lugar tremeu. ── Ela respondeu, andando na frente. ── Eles não sabiam para onde seguir. O rádio foi um farol no meio do mar aberto pra eles. ── Riley olha para ele por cima do ombro. ── 20 anos de fim do mundo, porra. Como você não sabe disso?

── Eu nunca sai de Cheyenne. ── Ele responde, andando apressadamente ao lado de Riley. ── Não fiquei me aventurando por aí como você.

── Você não sabe o básico e queria entrar aqui sozinho. ── Adams debocha. ── Depois sou eu que tenho tendências suicidas.

Mika não tem tempo de responder quando Corredores surgem a direita deles, pelo caminho que eles não utilizaram pois não os levaria para onde queriam. Há pelo menos 6 atrás deles e os dois passam a correr, fazendo o caminho reverso.

── Atira neles! ── Mika grita, enquanto eles ainda estão correndo.

── Só vai chamar mais atenção! ── Riley responde, ofegante. ── Apenas... Continua correndo.

── Eles vão alcançar a gente, porra!

Riley tenta apertar o passo. Eles não podem ver nada do que há atrás deles, mas ainda escutam. Os Corredores estão perto, estão cada vez mais ao alcance deles. Riley pensa no molotov que fez e um plano se forma em sua mente.

Seus pulmões estão queimando agora, ela acha que nunca correu tanto em sua vida. Mika empurra um dos carrinhos nos trilhos ao alcanca-lo e consegue fazer com que o mesmo atropele alguns dos infectados. Se não tivesse saído do caminho a tempo, Riley sabia que também seria derrubada.

Um último Corredor chega até eles e ela crava uma faca no crânio dele, espirrando sangue em suas roupas e rosto pela força que impôs.

── Tem mais deles vindo. ── Mika comenta, assim que ela mata o que sobrou. Ele também está ofegante. ── Vamos. Não falta muito pra gente sair daqui.

Ela assente e o segue.

Os dois correm, passando pela primeira zona de expansão e enfim o lugar do qual saíram antes. O som dos Estaladores está alto, juntos dos grunhidos dos outros infectados. Eles vem de direções aleatórias, por caminhos que eles não se aprofundaram antes.

Mika chega até a escada de ferro primeiro e a sobe. Riley olha para trás várias vezes, ansiosa e agitada, sentindo a adrenalina correndo por suas veias, enquanto espera que o homem suba. Quando ele está lá em cima, ela está logo atrás dele.

Ao chegar no meio da escada, um Corredor entrou no local e foi diretamente até ela. A mão dele segura a perna dela e a impede de continuar. Riley xinga e tenta chutá-lo, faz de tudo para que ele a solte, porém o infectado não larga e a escada começa a tremer, perdendo os parafusos que a seguram na madeira.

Riley o chuta mais uma vez, acertando o Corredor no rosto e conseguindo fazer com que ele solte sua perna. Quando isso ocorre, ela retoma a subida. A escada se sacode e Riley vê que Mika começou a chutá-la.

── O que você tá fazendo, porra?! ── Ela o questiona em um exclamação furiosa.

── Me livrando de você, antes que se torne um problema. ── Ela responde. ── Passa as dinamites!

── Não!

Ela tenta subir, porém ele a impede. Mika pisa nos dedos dela e Riley pragueja de dor.

── Eu disse: passa as dinamites! ── Mika aponta a arma para ela. Embaixo, Riley vê mais um infectado chegando, os dois lutando para tentar alcanca-la.

── Você não precisa fazer isso!

── Eu não me importo. Não vou cometer os mesmo erros novamente! ── Respondeu ele. ── Me dá as dinamites!

── Nem pensar. ── Ela diz com os dentes cerrados.

O primeiro tiro que ele dá vem com um aviso. Passa raspando pelo ombro de Riley e acerta o infectado abaixo, fazendo com que ele caia no chão, contorcendo-se.

── Não vou pedir mais uma vez, porra. Me dá a bolsa... Agora! ── Ele exclama.

── Eu vou morrer de qualquer forma. ── Ela diz ofegante. ── Se for pra isso acontecer, espero que você se foda também. ── Riley solta a bolsa e deixa que caía no chão.

Mika fica furioso e, quando ele está prestes a atirar nela, Riley pula para o lado direito e o tiro acerta o infectado que está logo abaixo.

Ela acerta o chão em um baque alto, sente todo o seu corpo doer por conta dá queda, sua lanterna falha, porém Riley não tem tempo para sentir a dor. Tudo o que escuta é o som dos infectados que chegaram, eles entram aos montes e ela só tem tempo de se levantar e passar pela passagem estreita abaixo do alicerce de madeira.

Nem mesmo Mika conseguiu descer para alcançar a bolsa com as dinamites. Ela escuta ele dando alguns tiros, mas logo cessam e isso sinaliza que ele foi embora.

Adams ainda está ofegante, sentindo a forma como seu coração bate de maneira descompensada agora que ficou tão perto da morte... Mais uma vez. Eles ainda estão do outro lado, arquejando, grunhindo, acertando uns aos outros. Não é uma horda tão grande quando aquela que eles encontraram em Kansas City, mas ainda sim é uma horda.

Há tanto Corredores quanto Estaladores. Aqueles que notaram a presença dela, tentam passar pela passagem, mas não conseguem. Para a sorte dela, Riley tem um tempo para pensar no que fazer. Ela prende a lanterna na mochila de maneira precária e se concentra em se agachar em um canto e vasculha-la em busca das coisas que pode usar.

Riley encontra o molotov, a bomba caseira e as duas dinamites que salvou para si mesma quando Mika não estava prestando atenção. Não era muito, mas deveria servir para que ela pudesse sair dali. Enquanto ela se preparava, os infectados se dispersaram novamente, porém continuaram na saída da passagem.

Primeiro ela jogou a bomba que, ao começar a fazer barulho, chamou a atenção de todos eles. Quando eles se amontoaram, Riley passou pela passagem e arremessou o molotov assim que o acendeu com o esqueiro que tinha guardado. No instante seguinte, foi como se o inferno estivesse aberto. O fogo ardente tomou conta do lugar, o calor das chamas passando a consumir os infectados que se entraram em desespero e corriam de um lado ao outro.

No escuro, Riley acendeu uma banana de dinamite e lançou sobre eles, fazendo questão de matar mais e derrubar aqueles que ainda estavam de pé, mesmo pegando fogo. A única iluminação vinha deles e ela usou isso para de guiar. Lançou a segunda dinamite e mais uma explosão soou pela caverna.

Os Estaladores estavam mortos, porém ainda faltavam alguns Corredores. Riley puxou sua arma e atirou em dois na cabeça. Um segundo avançou até ela pela direita, chegando bem perto, antes que ela o acertasse. O tiro certeiro atravessou a testa do Corredor, mais sangue espirrou pelo rosto de Riley e, cada vez mais deles surgiam, mais ela matava.

Eles não estavam mais vindo aos montes, porém os cadáveres começaram a se amontoar aos seus pés. Um de cada vez caía, enchendo o lugar com o cheiro de sangue e a podridão dos mortos. Quando sua arma ficou sem munição, Riley usou o machado de mineração que estava no canto, acertando cabeças atrás de cabeças.

Ela não sabia quanto tempo perdeu nisso. Sua mente deixou para trás o fato de que deveria ir embora, apenas focava em matar cada um dos infectados que apareciam em seu caminho. Era como se ela estivesse agindo no automático, deixando que seu corpo a levasse para isso, seguindo apenas seus instintos.

Não importava se suas articulações doíam, se estava cansada ou exausta, adrenalina a mantinha de pé, assim como a raiva que sentia. Apenas descansaria quando todos estivessem mortos. Cada um deles. Naquele momento, Riley apenas via vermelho.

INVERNO⠀─ ⠀DEZEMBRO 12, 16:00
⠀⠀⠀Horse Creek, Wyoming
⠀⠀⠀⠀
Eles estavam quase indo embora quando ela apareceu. Mika, Kai e Gaspard foram os primeiros a virar as costas, porém Dyani ainda estava receosa. Ela queria ficar por mais um tempo. Seus olhos apenas se desgrudaram da entrada da mina por um momento, a mulher dando as costas com relutância.

Inesperadamente, uma movimentação chama a atenção e logo todos estão olhando para trás. Não há como conter os olhares espantosos. Se pudesse definir a cena, seria como encarar um fantasma ou um ceifador adornado pelas marcas a morte.

O cheiro metálico do sangue em seu corpo não a deixa nauseada. Riley já se acostumou com ele. Sente aquela viscosidade grudando em sua pele, o líquido começando a secar e a grudar em suas bochechas, testa e outras áreas aleatórias de seu rosto e pescoço exposto. Há manchas em suas roupas também, algumas sobre sua botas, mas tudo isso apenas a entorpece. Não há qualquer reação de seu rosto enquanto deixa a mina e caminha pela grama lentamente.

Os olhares de todos estão sobre ela. Kai, Mika e Gaspard não conseguem conter a surpresa por ela ainda estar viva. Dyani é mais discreta. A líder do grupo mantêm um olhar firme e impassível, não parece afetada pela forma como Riley deixa aquele lugar parecendo que acabou de passar pelo inferno na terra.

Os olhos de Riley se cruzam com os de Mika por um momento. Ele se inquieta, sentindo a intensidade das orbes claras dela sobre si. Se olhar pudesse matar, Mika sabia que estaria morto naquele exato momento pela forma como ela o encarou com tamanho desprezo. Sem conseguir observa-se por muito tempo, o homem desvia o olhar, sentindo-se como um cervo sobre os faróis.

── Oh-oh, não vamos precisar fazer um funeral para você. ── Ri Gaspard, soando radiante. ── Nem mesmo uma lápide escrito indigente. Mademoiselle, você é realmente uma mulher e tanto.

── Você conseguiu? ── Kai indagou após torcer o rosto para a fala de Gaspard, assim que Riley parou em frente a eles. ── Eliminou todos eles?

Ela assentiu.

── Não graças ao Mika, claro. ── Os olhares se voltam para o homem, que não consegue encarar nenhum dos amigos. Ele se encolhe. ── Mas eu dei um jeito. O segundo caminho da mina está fechado agora, as explosões fizeram algumas pedras bloquearem o caminho. Vocês só tem uma passagem e é a que precisam.

Riley jogou a bolsa com dinamites aos pés de Dyani. A mulher abaixa a cabeça e encara o objeto, semicerrando os olhos.

── A pessoa que disse para vocês que tinha várias dinamites lá dentro, com certeza mentiu. ── Continua a Adams. ── Isso era tudo o que tinha dentro de um dos baús de mineração.

Gaspard se abaixa e abre o zíper da bolsa de viagem suja de ferrugem e poeira. Ele pega uma das bananas de dinamite na mão e a inspeciona.

── Não é da melhor qualidade, mas deve servir. ── Comenta o francês. ── Só precisamos cortar a energia deles. Deve ser o bastante.

── Deve? ── Indagou Kai. ── Você é o nosso especialista em explosões. Precisa ter certeza.

── É uma bolsa cheia. Vai bastar. ── Dyani intervém antes que eles começem a discutir. Gaspard guarda a dinamite e fecha a bolsa, colocando a sobre o ombro ao se levantar. Dyani volta-se para Riley. ── Obrigada.

── Guarde os agradecimentos. Pode cumprir sua parte do acordo agora? ── Questionou.

Dyani assente em um movimento afirmativo com sua cabeça, depois olha para Kai.

── Vai pegar um dos cavalos. ── Ordena ela de braços cruzados. Kai assente e vira-se para sair. ── Gaspard, vai com ele. Guarde essas dinamites em um lugar seguro.

── Sim, senhora. ── Responde o francês. Antes de partir, ele se vira para Riley e estende a mão para ela. Um pouco desconfiada, ela leva a mão até a dele e Gaspard sorri ladino. ── Mademoiselle, foi um prazer te-la conosco. ── Ele beija as costas da mão dela. ── Até algum dia.

Ele solta a mão dela e pisca, antes de ir embora. Riley revira os olhos.

── Ele é assim com toda mulher? ── Riley pergunta para Dyani, assim que ele se afasta.

── Mulher, homem... Tudo que se mexe. ── Responde a líder, debochando. ── Gaspard não tem limites. Nem mesmo o fim do mundo foi capaz de para-lo.

Riley solta uma risada fraca, cruzando os braços. Não estava surpresa, ela realmente achava que poderia estar acontecendo algo entre Gaspard e Kai, mas não achava que seria possível com o "espírito livre" do francês.

── Eu vou... Indo. ── Mika comenta, chamando a atenção das duas. ── Precisa de mim para alguma coisa?

── Não. Pode ir. Mas avise a eles que fomos até o rio mais próximo. ── Responde Dyani. Em seguida, ela volta-se para Riley. ── Vou te levar para lavar o rosto. Não vai querer reencontrar sua família desse jeito.

Quando Dyani começa a se afastar, Mika segue na direção oposta. Riley sabe que deve seguir a líder do grupo, porém vai até o homem e segura o braço dele antes que ele vá muito longe. Mika para no exato momento em que ela o segura e vira-se para a Adams rígido.

Dyani não está próximo a eles, porém observa a cena no momento em que percebe que Riley não está perto dela.

── Dá próxima vez que tentar matar alguém, certifique-se que essa pessoa está realmente morta. ── Disse a mulher com os dentes cerrados. Riley fala em um tom que apenas Mika pode ouvir. ── Aprenda a acabar seu trabalho, antes que acabem com você. Outros não vão ser misericordiosos como eu estou sendo.

Ela o solta bruscamente, deixando que ele vá embora sem nem ao menos olhar para trás.

Riley não fica para o ver sumir de sua vista, caminha na direção de Dyani como se nada tivesse acontecido e, por mais curiosa que esteja, a mulher não faz nenhuma pergunta a ela quando se aproxima.

── Vamos? ── Questiona. A de cabelos escuros assentiu e começou a ditar o caminho.

O rio não era longe. Elas caminharam pela neve até onde estava o córrego e, mesmo durante aquela temporada invernal, ele não estava congelado. A água gelada não era convidativo, porém Riley aceitou que deveria limpar pelo menos um pouco do sangue seco em seu rosto.

Ela retirou as luvas e se agachou na margem do rio. A água congelante fez seus dedos tremerem e ela foi o mais rápido de pode para leva-la ao rosto e esfregar toda a sujeira. Seu reflexo na água parecia deplorável, porém ela sentia um pouco melhor quando retirou todas as camadas de sangue e sujeira. Também aproveitou para fazer um curativo no ferimento causado pelo tiro de raspão em seu braço.

Quando terminou, retirou uma toalha de dentro da sua mochila e secou o rosto e as mãos. Em seguida, retirou o walkie talkie para tentar utiliza-lo agora que finalmente tinha liberdade para isso.

── Não vai funcionar aqui. ── Comenta Dyani, atraindo o olhar de Riley para si. Ela estava sentada num tronco de árvore próximo.

── E onde funcionaria?

── Na montanha. ── Ela responde. ── Nosso sinal é fraco desse lado de Horse Creek. Temos que estar mais perto da torre para um melhor alcance e isso só acontece na Iron Mountain.

── Os Jericos realmente tiraram tudo de vocês. Até o contato com o restante do mundo. ── Riley comenta, guardando a toalha e o rádio de volta na mochila e ficando de pé. ── Forma horrível de morrer.

── Por isso não podemos deixar as coisas da forma que estão. ── Afirma a líder. Riley joga sua mochila por cima do ombro. ── Não planejamos morrer assim, muito menos aqui.

── Planejam morrer enfrentando um monte de lunáticos em seu próprio lar. ── Adams disse, colocando as luvas em suas mãos novamente. ── Nada melhor do que manchar sua própria terra com o sangue dos seus.

── Estamos dispostos a morrer por isso, mas não significa que iremos. ── Retruca Dyani, colocando-se de pé. ── Os Jericos não são tudo que as pessoas propagam. Eles ainda são humanos e humanos tem fraquezas. Não devem ser temidos.

Riley dá de ombros.

── Só estou dizendo que, as vezes, a melhor coisa que podemos fazer é seguir em frente. ── Adams diz, olhando para ela. ── Não pelo nosso bem, mas pelo bem das pessoas que amamos. Aqueles que contam com a gente. Você é a líder, eles contam com você.

── Não sou a única que quer isso. ── Retruca a mulher. ── Não é algo que parte só de mim. O que aconteceu meses atrás afetou a todos. Não é o tipo de situação onde você apenas segue em frente. Tenho certeza que você entende.

Riley ficou tensa e desviou o olhar, enquanto ajeitava as luvas em suas mãos. Sabia que o conselho que deu a Dyani era um pouco hipócrita, ela mesma não havia conseguido seguir em frente de verdade. Continuava voltando a velhas lutas.

Talvez alguns aspectos de sua vida ela tenha superado. Não pensava mais em seu pai com tanta frequência, nem em sua mãe. Mas ainda manteve o que aconteceu com Ben e Margot em sua mente, seu ódio pelos Jericos floresceu. Ela entendia como Dyani se sentia.

Perder tudo. Essa era uma sensação dolorosa demais. O que a manteve de pé foi Sally, continuar lutando pela sua irmã, a única família que lhe restará, e a segurança dela sempre foi o que mais importou para Riley. A mulher ao seu lado estava no mesmo barco, querendo proteger sua família e lutar por ela.

Após alguns minutos, Kai voltou com os dois cavalos deixando-os com Riley e Dyani. Ele também se despediu da Adams ── sendo menos galanteador que Gaspard e mais tímido ── e depois deixou que as mulheres fossem embora.

── Me segue. Vou te levar até o topo da Iron Mountain. ── Dyani disse, assim que estava montada em Eagle. ── Depois disso nos despedimos e você pode ir encontrar sua família.

── Tudo bem. ── Riley assentiu.

Ela galopou o cavalo que pertenceu aos Jericos que a arrastaram até ali, seguindo Dyani pela trilha até a montanha.

── Você vai ter uma bela vista de Cheyenne daqui. ── Comentou a mulher de cabelos negros. Riley a seguia pelo caminho de pedras estreitas.

── Isso não vai ser perigoso? Eles podem acabar nos notando. ── Indagou a Adams, franzindo o cenho. Ela se concentrou em segurar firme nas rédeas.

── O topo da montanha é alto demais. As rochas vão encobrir a gente. ── Respondeu Dyani. ── Não se preocupe.

── Se você diz. ── Murmurou.

Elas continuam dando voltas até o topo. Riley percebe que Dyani tem mais destreza para caminhar por aquelas terras. A líder daquela pequena comunidade indígena nem ao menos tremia ao guiar Eagle pelo caminho sinuoso, enquanto Riley encontrou algumas dificuldades.

Sua preocupação em acabar puxando seu cavalo muito para a beirada a estava deixando tensa, ficava pior quando ela percebia a longa queda que teriam da montanha.

Assim que chegaram ao topo, Adams se sentiu aliviada, mas também deslumbrada com a vista. A Iron Mountain tinha uma visão panorâmica das longas terras do Wyoming. Ela podia ver a floresta, o rio, várias outras montanhas cheias de neve e a cidade de Cheyenne.

A vista da cidade a surpreendeu. Assim como Jackson, Cheyenne também tinha altos muros de madeira agora, porém com pontas finas, formando estacas. A cidade, que era enorme, foi reduzida pela cerca, assim como ocorria nas zonas de quarentena. Ao redor, várias ruas estavam sem movimento, com carros e motos parados. O lugar também foi tomado pela vegetação, que agora estava coberto pela fina camada de neve trazida pelo inverno.

── Vocês fizeram sua própria zona de quarentena dentro da cidade. ── Riley murmurou, notando a peculiaridade do lugar quando elas pararam atrás das rochas para observar a área.

── A FEDRA não conseguiu chegar até aqui. Ficamos a mercê do destino, tivemos que nos unir para fazer tudo funcionar. ── Disse Dyani. ── Meu pai começou a liderar a cidade depois que o prefeito Johnson morreu infectado. Ele achou que seria uma ideia melhor reduzir a cidade do que tentar cerca-la toda. Levaria muito mais tempo e esforço desnecessário.

── E os infectados? ── Indagou a Adams, olhando para a mulher ao seu lado. ── Não foram um problema?

── Com certeza foram. ── Dyani assentiu. ── Mas o cordycerps demorou a chegar desse lado, então tivemos uma certa vantagem. Quando aconteceu, veio de fora. Uma pessoa infectada foi o suficiente para fazer tudo desandar. Os mineradores ficaram presos nas minas, as catástrofes começaram nas cidades... ── Ela explicou. ── Tivemos sorte que o inverno não tardou a chegar. Conseguimos usar o clima ao nosso favor e os infectados ficaram menos frequentes, mais lentos.

── Quem diria que muito frio e muito calor seriam os maiores inimigos do cordycerps. ── Riley comenta. ── Fogo e gelo salvam vidas mesmo.

── Mesmo assim, ainda perdemos muitas pessoas. Não foi fácil, mas... Conseguimos progredir. ── A mulher continua. ── Passamos por muitos altos e baixos nos últimos 20 anos, pensamos que estávamos preparados para tudo depois das coisas pelas quais lidamos.

O olhar de Dyani se torna distante, Riley nota a forma como ela parece afetada pelo o que conta, a mulher estava finalmente expondo o que aconteceu em Cheyenne, como os Jericos conseguiram tomar a cidade para si.

── Alguns meses atrás, uma caravana bateu em nossos portões. Estavam com roupas surradas, tinham pessoas feridas, mulheres grávidas... Disseram que a ZQ onde moravam foi atacada e que perderam tudo. ── Contou ela. ── Meu pai sempre foi um bom líder, ele era justo e honesto. Pesava a mão quando necessário, mas sempre estava disposto a estende-la para quem precisava. Sempre tive orgulho do homem que ele foi e queria ser como ele.

Riley entendia aquele sentimento. Durante uma época, ela também se espelhou no própria pai. Ela o teve como um herói até que as coisas mudaram, até que tudo começou a sair dos trilhos e eles não eram mais os mesmos. Aquela sensação ainda a perturbava.

── Acho que todos fomos um pouco ingénuos na época, mas eu me culpo mais. Eu insisti para os meu pai ajudá-los por mais tempo do que apenas alguns dias, opinei no conselho a favor deles, fiz de tudo para ajuda-los porque realmente achei que eram boas pessoas e aquele Padre Matthias ── Dyani diz o nome dele com escárnio. ── havia se mostrado alguém bom no primeiro momento. Ele falava manso, parecia apenas um homem desesperado para proteger os seus. Ele me convenceu a ajuda-lo e depois começou a fazer a cabeça de algumas outras pessoas na cidade. Isso durante os dois primeiros dias que eles ficaram em Cheyenne. No terceiro dia, durante a madrugada, eles atacaram.

── É isso que ele faz, esse é o modus operante dele. Se fingir de amigo, falar o que as pessoas querem escutar... Ele pega suas fragilidades e usa contra você. ── Riley comenta.

── E nossa cidade estava um pouco frágil na época. Muitos estavam se cansando do ciclo em que estávamos vivendo. Sem suporte, sempre tivemos que caçar para sobreviver e nem sempre conseguíamos muito. Precisávamos nos virar com o que tínhamos e nem todo mundo gostava. ── Disse Dyani. ── Matthias dizia que tinha as respostas para tudo, falava que daria um propósito para aquelas vidas infelizes. Alguns que perderam sua fé a muito tempo, as colocaram nele como se aquele padre falso pudesse ser algum tipo de Santo, um Messias do fim dos tempos.

A fala de Dyani carregava rancor, raiva. Riley também compreendia aquele sentimento.

── Depois de que mais deles entraram na cidade durante a calada da noite e começaram a tomar o lugar, eles nos prenderam na delegacia. ── Ela continua. ── Nos ofereceu a chance de escolher segui-lo ou a morte, dizendo que esses eram os únicos dois caminhos que tínhamos para escolher. Muitos escolheram o caminho mais fácil, mas meu pai não foi um deles. ── O olhar de Dyani caiu. ── O braço direito de Matthias cortou o pescoço do meu pai na minha frente. Eu... Nunca me esqueço dessa cena, da forma que ele me olhou pela última vez. Me senti tão...

── Impotente. ── Riley concluiu. Dyani a encarou e assentiu com a cabeça.

── Sim. Impotente. Não poder salva-lo me doeu tanto, me dilacera até hoje. ── Carregando lágrimas não derramadas em seus olhos, Dyani profere aquelas palavras com dor. ── Mas eu nunca vou esquecer que meu pai nunca se deixou corromper, nunca foi contra seus ideias. Ele se manteve firme até o final e isso é o que me motiva a continuar.

Assentindo de maneira compreensiva, Riley demora a encontrar as palavras para continuar. Era impressionante ver as semelhanças e diferenças que elas tinham. Ver a força de Dyani fazia com que Adams passasse a admira-la mais.

Ela não imaginava como deveria ter sido para a mulher passar por aquilo. Sabia que suas frustrações com os Jericos a afetaram, mas nunca foi algo tão direto assim. Dyani carregava não só o peso da morte do pai nas costas, mas também o de várias pessoas que conheceu durante toda a sua vida.

── E como vocês conseguiram sair de lá? ── Riley a questiona, inclinando um pouco a cabeça para o lado no processo, quase como um animal curioso.

── Matthias decidiu nos dar mais um tempo para pensar. Gaspard, Kai, Mika e eu ficamos presos com mais algumas pessoas durante a noite e conseguimos formular um plano para sair. Conhecíamos a cidade melhor do que eles, usamos isso ao nosso favor. ── Disse ela. ── Retiramos o máximo de pessoas que conseguimos, mas perdemos outras na fuga. Além das mortes, outras foram capturadas. Incluindo a esposa do Mika, Lucia.

Aquela informação nova pegou Riley de surpresa, o choque dela não passa despercebido por Dyani, mesmo que sua expressão não seja tão clara quanto aparenta.

── Sei que você não deve gostar do Mika-

── Impossível gostar dele depois do que ele fez comigo hoje. ── Riley a interrompe. Suas palavras carregam raiva e rancor.

── Eu te entendo. Ele é realmente uma pessoa difícil de se aturar, mas... Precisa entender que ele também se culpa demais. Em Cheyenne, ele também votou para que déssemos uma chance para aqueles forasteiros. Mika estava disposto a ajudar, principalmente porque Lúcia também queria ajuda-los. ── Explica Dyani, olhando para longe. ── Quando fugimos, Lucia acabou ficando para trás. Mika quase enlouqueceu, ele estava disposto a tudo para voltar para ela. Então nos reagrupamos e tentamos fazer negociações com eles. Prometemos nunca mais voltar ali, eles só tinham que devolve-la. Apenas isso. Não estávamos pedindo muito.

── Não importa o que seja, essas pessoas não são misericordiosas. ── Ela comenta. ── Misericórdia e benevolência não estão nas bíblias deles.

── Aprendemos isso da pior maneira. ── Afirma a líder. ── Um deles subiu na torre de vigia e disse que a deixaria ir, isso quando estávamos longe. Ele usou um megafone para que pudéssemos escuta-lo. Depois, ele abriu o portão e a mandou correr. Soltaram vários infectados atrás dela. Atiramos em alguns, tentamos despistá-los, Lucia tinha a chance de chegar no Mika quando... Atiraram nela. ── Dyani olhou intensamente na direção de Riley ao continuar a falar. ── A centímetros dos braços dele, uma única bala de sniper estourou a cabeça dela. Sabe o que eles fizeram depois? Eles debocharam. Riram e disseram que a estupraram por várias e várias noites, que apenas a usaram e que agora poderiam se livrar dela.

As mãos de Riley apertam as rédeas do cavalo com força. Ela não conhecia Lucia, não fazia ideia de como ela poderia ser, mas pode imaginar o desespero dela, a angústia. Nenhuma mulher merecia passar por algo do tipo. Uma parte dela também se sentia mal por Mika, isso a fazia entender o porquê dele ser tão fechado e desconfiado.

Ela o julgava antes, mas agora percebia que o homem não era tão diferente dela ou de Joel. Os dois também passaram a ser mais distantes depois do que lidaram, eles também não sabiam como confiar facilmente, como dar o braço a torcer quando necessário. Estavam sempre com a guarda levantada por conta do que viram, por conta do que perderam.

Era difícil permanecer os mesmos em um mundo como esse, onde não se dá apenas para temer os infectados, onde o cordycerps se torna o menor dos problemas ── os humanos conseguiram ser piores. Eles eram os verdadeiros monstros que se libertaram conforme o mundo colapsou, conforme o desespero dilacerou todo senso de empatia e humanidade que eles poderiam ter.

── Sinto muito. Você e o seu pessoal não mereciam passar por isso. ── Palavras sinceras são ditas por Riley naquele momento, onde as duas se encaram em silêncio. ── Também perdi pessoas por conta dos Jericos. Pessoas muito importantes para mim, então eu entendo como você, como o Mika, como todos se sentiram. Não há... Palavras que definam esses sentimentos.

── Eu ainda tenho esperança de que iremos conseguir superar isso. ── Disse Dyani. ── E sou grata a você pela ajuda.

── Não fiz muito.

── Foi o suficiente. ── Afirma a mulher. ── Temos uma chance graças a sua coragem.

── Minha irmã chamaria isso de "tendências suiciadas". Tenho muitos desses momentos de inconsequência. ── Soltando um riso fraco, Riley a responde. ── Acho que já se tornaram parte de mim.

Um pequeno sorriso de lado cresce nos lábios de Dyani, a mulher achando graça da fala de Riley. As duas voltam a observar a cidade abaixo, um vento frio passa por elas durante aquele momento.

Enquanto aquele momento continua, Riley fica séria. Ela analisa a cidade melhor agora e, conforme isso acontece, alguns pensamentos vem em sua mente fazendo com que deixe um pouco de lado o fato de que precisa contatar sua família.

── Qual são os seus planos? ── Pergunta, voltando-se para a líder de Cheyenne. A mulher a encara de volta. ── Digo, para atacar os Jericos. Como planejam fazer isso?

── Acabar com a energia deles é o primeiro passo, ── Disse a mulher. ── depois disso vamos atacar e tentar tomar a cidade durante a noite, como eles fizeram conosco.

── Esse plano é... Péssimo. Sabe disso não é? ── Riley indagou. ── Vocês vão ser massacrados. Só destruir a torre e outros pontos estratégicos não vai ser o suficiente. Também precisam de uma distração e conseguir junta-los todos em um único lugar. Sabe pelo menos onde é o local onde a maioria deles se reúnem?

── A igreja ou no Tribunal. Usavamos o tribunal para reuniões do Conselho da cidade. Eles utilizam pouco em consideração a Igreja, mas sempre tem gente lá.

── Ótimo. Precisam dar um jeito de reunir todos na igreja e atear fogo em todos. ── A sugestão de Riley faz Dyani encara-la com a testa franzida. ── O que? Não faça essa cara surpresa. Já disse que não gosto dessas pessoas e não tenho pena de nenhum deles.

── Bem insensível da sua parte, mas... Não julgo.

── Obrigado. ── Riley cruza os braços. ── Tente atear fogo em lugares aleatórios da cidade também, de forma que vocês consigam fazer o fogo guia-los para as igrejas como o único lugar seguro.

── E a parte da distração?

── Algo que chame a atenção deles, ou alguém. Se vocês conseguirem entrar lá sem forçar antes, da mesma forma como eles se fragilizaram para conseguir abrigo, talvez consigam obter mais êxito ao destruírem a torre de energia. ── Disse Riley. ── Vão conseguir recuperar a torre depois?

── Quando conseguirmos Cheyenne de volta, podemos dar um jeito. Vai ser um longo tempo de concerto, mas já fizemos isso antes.

── Não vai ser a mesma coisa, sabe disso, não é? ── Dyani assentiu para ela. Adams suspira. ── Certo. Essas são minhas dicas para vocês.

── Agradeço por isso. Passarei suas sugestões para o meu pessoal quando voltar. ── Respondeu a líder indígena. ── Agora você deveria entrar em contato com a sua família. Eles devem estar preocupados.

── Sim, você está certa. ── Assentiu Riley.

── Vou te dar privacidade. Ficarei ali atrás caso precise de mim. Descemos assim que terminar e eu te guio para onde precisar ir. ── Dyani disse.

── Tudo bem.

Riley a observa voltar para o caminho de pedra coberto por uma camada fina de neve, parando próximo a algumas rochas e deixando que a Adams tenha seu momento privado para tentar contatar sua família. Riley tira o walkie talkie da mochila e desce do cavalo, caminhando até próximos as rochas do penhasco.

Ela observa por um momento a cidade abaixo, a pequena movimentação que pode ver. Há poucas pessoas do lado de fora naquele momento, mas todas apresentam características de Jericos. Respirando fundo, deixa que seu dedo aperte o botão de chamada do rádio e tenta pela primeira vez fazer uma chamada para o rádio de Sally.

── Alguém na escuta? ── Ao perguntar, Riley espera por uma resposta pacientemente, escutando apenas estática e chiados que vem do outro lado da linha. Ela pressiona o botão mais uma vez. ── Alô? Tem alguém me escutando? Se tiver, é a Riley.

Riley espera por mais um momento, escutando os mesmos sons de antes. Ela solta um suspiro profundo e frustrado, prestes a apertar o botão do aparelho e tentar mais uma vez. Porém acaba sendo interrompida.

── Riley?! ── Vem uma exclamação estridente pelo rádio. ── É você mesmo?!

── Sally? É você quem está falando? ── Questiona, reconhecendo pouco a voz da irmã. A estática não ajuda na compreensão, mas Riley consegue a escutar com clareza.

── Sim, sou eu. ── Sally expira uma risada, ela parece passando por um misto de emoções. ── Merda, eu... Eu não consigo acreditar. Riley, meu Deus, eu estava tão preocupada! Não sabe quantas vezes eu tentei te ligar.

Riley sorri.

── Também senti sua falta, Sal. Muita. ── Sincera, Riley fala.

── É um alívio poder falar com você novamente. ── Responde a Adams mais nova. ── Estava começando a pensar que o pior tivesse acontecido...

── Não estive nas melhores condições antes, mas... Eu estou bem agora. Encontrei boas pessoas pelo caminho. ── Riley olha momentaneamente para Dyani atrás de si, voltando-se para a frente novamente logo em seguida. ── Não pude entrar em contato com vocês por conta de alguns problemas, mas já os resolvi. E vocês? Como estão?

── Estamos bem. Aconteceram muitas coisas mas conto tudo para você depois. ── Não passou despercebido por Riley a forma como a voz de Sally parecia receosa. ── Estamos no Wyoming. Viemos procurar por você.

── Como descobriram que eu estou aqui?

── É uma longa história, mas pode se dizer que o Joel foi atrás de pistas sobre o seu paradeiro e encontrou algumas com os Jericos próximos a Salt Lake.

── Deve ter sido uma longa caminhada. ── Ela ri fracamente.

── A pior, mas precisávamos encontrar você. Então... Valeu a pena. ── Disse a mais nova. ── Você está bem mesmo? Eles fizeram algo com você? Merda, você precisa dizer para a gente onde está.

── Eu me feri na Universidade, passei boa parte do tempo desacordada até chegar no Wyoming, mas tive a ajuda de um grupo de sobreviventes de uma cidade próxima. ── Riley explicou. ── Garanto pra você que estou bem agora. Eles lidaram com os idiotas que me sequestraram.

── Você foi muito sortuda.

── É, acho que meu anjo da guarda finalmente lembrou que eu existo e decidiu intervir. ── Disse Riley. ── Ou ele apenas tem uma morte mais desagradável pra mim no futuro.

── Cale a boca, você não vai morrer. Vai ficar velha e chata e imortal, cuidando de uma fazenda de ovelhas com o Joel. ── Sally retrucou. ── O hobby de vocês dois vai ser discutir o tempo todo e falar mal dos outros.

Riley ri com a fala de Sally. Céus, ela sentia tanta falta dela.

── Ok. Eu posso imaginar isso acontecendo. ── Ela respondeu, adornado um pequeno sorriso em seus lábios. ── Joel e Ellie estão perto de você?

── Sim, eles estão escutando a gente agora. Também estão muito felizes em saber que você está bem. ── Disse Sally. Depois de um curto período de silêncio, ela continua. ── Todo mundo está muito aliviado. Você nem imagina o quanto.

── Na verdade, eu já esperava que você fosse estar viva e bem. ── Ellie adiciona. ── Não é uma surpresa pra mim. Você é fodona.

── Oi, pirralha. ── Riley sorri ao falar. ── Bom ouvir sua voz, mas não sinto falta de você tagarelando no meu ouvido.

── Então você deve sentir falta do Will Livingston. ── Brinca a garota, a voz de Ellie não é tão viva quanto antes, mas Riley nota que ela está se esforçando.

── Ugh, definitivamente não. Por favor, mantenha o Will Livingston enterrado em sua mochila. ── Disse ela. ── Ou se não, a primeira coisa que eu vou fazer quando te encontrar, é usar esse livro de merda como fogueira.

── Você não faria isso, você gosta dele. Pode assumir. ── Retruca Ellie. ── Mas eu vou ser legal e não vou ler nenhuma piada agora. Eu sei que você está ansiosa para falar com o Joel, você gosta mais dele.

A maneira sugestiva que Ellie fala faz Riley revirar os olhos, mas o sorriso que ela dá seria capaz de entregar como Adams se sente em relação a isso, se eles estivessem na frente dela agora.

Riley espera poucos segundos até que a linha fique ativa novamente. A luz no rádio walkie talkie sinalizando que ela estava recebendo um chamado, que logo se fez ativo e a voz familiar que ela tanto queria escutar surgiu.

── Riley... ── Ela morde o lábio interior assim que o escuta. ── Oi. ── Joel soa incerto e ela também não sabe o que dizer. Agora que eles tem a chance de conversar, Riley não esperava que fosse assim.

── Oi, Joel. ── Respondeu a mulher. ── Sentindo minha falta, cowboy? Ou já se encheu?

── Pode escolher entre a verdade ou a mentira. ── Ele disse. Riley pode ouvir os passos dele no fundo, imagina que Joel estava se afastando para ter um pouco de privacidade. ── Porque eu posso muito bem dizer que foi ótimo tirar algumas férias de você, mas... Não faria isso novamente.

── Espera, essa é a verdade ou a mentira? ── Riley retrucou, rindo.

── Sinto sua falta. ── Ele responde. ── O tempo todo. Senti falta de ouvir sua voz, Adams.

── Não vai dizer que se apegou a mim, cowboy. Logo você? ── Ela brinca, um sorriso em seus lábios ao falar.

── Quando você anda meio mundo com uma pessoa, é difícil não criar apego.

Riley sente suas bochechas esquentarem. Timidamente, ela morde o lábio inferior, tentando conter o sorriso que força a crescer em seus lábios. Acha que o melhor a fazer é ceder, deixar as provocações de lado e dizer o que sente.

Ela sentiu falta dele mais do que poderia dizer em palavras.

── Também sinto saudades. Queria muito poder te ver agora. Poder ver todos vocês. ── Disse a Adams. ── Mas ouvir a sua voz... Saber que vocês estão bem... Isso já é ótimo.

── Nós vamos nos encontrar... Em breve.

Ela respira fundo antes de continuar. Riley sente que sua visão começar a embaçar.

── Me desculpa pelo o que aconteceu na Universidade. Eu sei que fiz uma promessa pra você, mas eu não podia deixar que nada de ruim acontecesse com vocês. ── A voz de Riley embarga algumas vezes. ── Só queria que tivessem uma chance de sair de lá bem, mesmo que fosse sem mim.

── Deveríamos fazer isso juntos, Riley. Eu... Entendo que você quis nos proteger, mas esse também é meu trabalho. ── Disse Joel. ── Droga, eu... Nós deveríamos ser uma dupla. Você não tem que se arriscar sozinha.

── Joel, eu sei que nós deveríamos fazer isso juntos, mas algumas coisas... Eu preciso lidar sozinha. ── Os olhos de Riley focam na cidade logo abaixo, observando enquanto um Jerico corre pelo campo até os portões da cidade. ── E não é porque eu não quero ajuda, é porque são meus fardos, meus demônios. Se eu não lidar com eles sozinha, não vou poder seguir em frente nunca.

Riley sabia que não estava falando exatamente sobre o que aconteceu no Colorado. Seus olhos não deixaram a cidade enquanto falava, sua mente repassando pensamentos conflitantes.

── Vamos conversar melhor quando nos encontrarmos, ok? ── Riley quase poderia escutar o suspiro cansado que ele deve ter soltado antes, mas que foi cortado pelo rádio. Ter aquela conversa pessoalmente seria mais dificil do que pelo rádio. ── Me diga onde você está agora.

── Entre Horse Creek e Iron Mountain. ── Ela responde. ── Atualmente estou na Iron Mountain com a líder do grupo que me acolheu, Dyani. Mas o acampamento deles fica entre esses dois pontos. É uma velha cidade turística. Eles deixaram a cidade que moravam para um... grupo de Jericos. Não é mais habitável.

Riley aguarda alguns segundos pela respostas deles, sentindo aquela pequena mentira a corroer. Joel não precisava saber o que ela iria fazer.

── Certo, conseguimos encontrar no mapa. ── Joel responde. ── Não estamos longe. Você pode se encontrar com a gente próximo ao Vale.

── Não, acho melhor vocês virem para cá.

── O que?

Ela engole o seco.

── Eu preciso... Terminar algo. Prometi ajudar a Dyani e o pessoal dela. Eles vão me dar um cavalo depois que eu fizer um último favor para eles. ── Ela mente. Fechando os olhos fortemente por um momento, Riley os abre em seguida. ── Deve ter um caminho que vocês podem tomar para chegar até aqui. Vou pedir para a Dyani mandar alguém para encontrar com vocês e leva-los até a cidade.

── Isso não me parece uma boa ideia. São 2 horas de caminhada até ai, podemos ir embora. ── Joel comenta, desconfiado. ── Não podemos demorar mais, Riley. Precisamos seguir em frente.

── Eu sei, eu sei. Prometo pra você que não vou demorar. ── Disse ela. ── Essas pessoas foram ótimas comigo. Não posso deixa-las na mão agora. ── Riley olha para Dyani por cima do ombro. ── Eles precisam de mim. Vão todos morrer se eu não ajudar.

Joel demora alguns instantes para responder. Riley consegue imagina-lo tenso, pensando seriamente em um resposta e no que seria mais plausível de se fazer.

── Tudo bem... ── Ele suspira profundamente. ── Vamos fazer isso. Encontramos você e partimos pela manhã. Nada mais. Depois disso, estamos de volta a estrada. Estamos entendidos?

── Claro, cowboy. ── Riley evita revirar os olhos com a fala autoritária de Joel. ── Nos vemos em breve.

── Riley, eu... ── Notória é a forma como a voz de Joel carrega um tanto de insegurança. Ela o escuta respirando do outro lado da linha, esperando em total antecipação pelo o que ele tem a dizer. ── Espero que você tome cuidado. Não faça nada sem pensar.

A voz dele cai para um quase murmúrio. Riley quase se sente decepcionada pelo o que não escuto.

── Espero o mesmo de vocês. ── Adams sorri minimamente. ── Até, Joel.

Ela se despede de todos eles, sentindo um aperto em seu peito. Quando a chamada pelo rádio se encerra, Riley olha para o aparelho em suas mãos por um tempo. Expira e solta o ar lentamente, sentindo a ponta dos dedos formigando com aquela sensação excruciante que a perturba.

Riley tenta não se deixar abater, não estava disposta a voltar atrás agora. Olhar para a cidade Jericó abaixo a dava a coragem que precisava, a força que necessitava em por um fim naquilo tudo. Ou pelo menos na parte que dizia respeito a ela. Estava na hora de parar de fugir do seu passado e encara-lo de frente.

Ela dá as costas para a cidade e caminha até Dyani com certa determinação. A líder disfarça sua curiosidade e seu tédio por ter esperado tanto.

── Eu vou ajudar vocês com a invasão. ── Ela fala, pegando a mulher a de surpresa. A testa de Dyani franze.

── Você não precisa. Já pagou sua dívida conosco.

── Não estou fazendo isso por vocês, estou fazendo por mim. ── Riley responde, devolvendo o rádio para sua mochila. ── E talvez por que sei que vocês vão morrer se eu não ajudar.

── Pensa que não somos capazes.

── Penso que vocês precisam de uma isca. ── Retruca a mulher, encarando-a Riley para ao lado de seu cavalo. ── Vocês precisam de algo que eles querem, alguém que eles querem. Vão entrar mais facilmente na cidade assim, enquanto isso-

── Os outros podem entrar pela mina sem chamar a atenção. ── Completa Dyani. ── Nós pensamos nisso. Era o meu plano no início... Quando você apareceu.

── Por que mudou de ideia?

── Você não era a pessoa que eu esperava que fosse. ── Disse a líder. ── Seria mais fácil se você fosse uma pessoa ruim, alguém desprezível e descartável. Mas você não é.

Os lábios de Riley se erguem em um sorriso ladino, ela cruza os braços na frente do peito e diz com tamanha tranquilidade:

── Vai descobrir que sou pior do que você imagina.

INVERNO⠀─ ⠀DEZEMBRO 12, 17:00
⠀⠀⠀Cheyenne / Jericó, Wyoming
⠀⠀⠀⠀
Os galopes dos cavalos puderam ser ouvidos à distância, a movimentação atrás nas árvores chamando a atenção dos homens em seus postos na torre de vigia. Eles ficaram mais agitados quando viram os dois cavalos surgindo pelos campos, galopando rapidamente até os portões.

Eles já estavam de armas em mãos quando os dois chegaram, prontos para lidar com as ameaças. Dois rifles ficaram apontados para as pessoas no cavalo. Um dos Jericos, um homem de estatura mediana e cheio de cicatrizes pelo rosto, mas que usava um moletom manchado de preto e com o símbolo de Jericó no peito, reconheceu as pessoas que ali estavam.

Ao todo haviam três, dois ele reconheceu como antigos moradores da cidade que eles habitavam. Uma mulher de longos cabelos escuros e um chapéu reto de cor marrom, que tinha uma pena preta presa do lado, junto de duas penas brancas menores. O outro rapaz era mais novo, traços indígenas como os dela e vestindo uma jaqueta marrom.

O homem estranhou o fato deles estarem ali, principalmente acompanhados de uma mulher amordaçada. Ela estava presa na garupa do cavalo da outra mulher. Mãos presas, firmemente amarradas e um pano em volta de sua boca. Ele agiu por impulso.

── O que vocês querem aqui, profanos? ── Indagou o homem no muro, apontando o rifle na direção deles. ── Vieram atrás de mais morte, por acaso? Já não foi o suficiente o que fizemos com vocês antes? Querem que pegamos o que sobrou?

── Não estamos aqui para brigar. ── Respondeu a mulher de cabelos escuros. ── Estamos aqui para negociar. Temos algo que o líder de vocês pode querer. ── Ela inclina a cabeça na direção da mulher.

── E quem seria essa? ── Perguntou um outro.

── Vocês iram nos dizer. Encontramos dois de vocês arrastando essa mulher pela neve. ── Disse ela. ── Ela pode ser importante.

Os dois homens se entreolharam.

── Tudo o que queremos é uma conversa com o líder de vocês, o padre Matthias. ── Continuou a mulher, notando a dúvida presente neles. ── Avise a ele que estamos aqui para isso, sem conflitos. Conversaremos apenas com ele sobre isso.

── Sabe que podemos apenas matar vocês e pega-la, certo? ── Disse o primeiro. ── Não vão precisar importunar o padre com suas ladainhas.

── E ai nós a matamos e vocês perdem a oportunidade de encontrar a garota. ── Retrucou ela. ── Tenho certeza que Matthias vai ficar muito bravo se isso acontecer. ── Provocou. ── E vocês serão os culpados por isso.

Mais uma vez eles se entreolham, apertando as mãos sobre as armas que seguram. A incerteza paira sobre eles por um tempo, a mulher no cavalo ergue uma sobrancelha, esperando pela resposta. Demora apenas mais alguns segundos até que eles finalmente tenham uma resposta.

O primeiro olha para o segundo, narinas levemente dilatadas quando respira. Ele toma a frente como um líder faria.

── Avisa o Comandante. ── Ordena com um tom de voz baixo. ── Fala pra ele o que tá acontecendo, vamos deixar que ele decida.

── Certo. ── Assentiu o rapaz. Ele retira um rádio da cintura e se afasta para passar uma chamada para o Comandante em questão.

── Diga a ele que a mulher que está comigo se chama Riley Adams. ── Exclamou a mulher, antes que o primeiro se afasta-se. ── Isso deve bastar para deixa-lo interessado no que tenho a dizer. ── Ela sorri minimamente.

Enquanto os minutos passam, a mulher no cavalo olha brevemente por cima do ombro. Uma troca de olhares inofensiva, quase imperceptível. Não perturbava o homem que permaneceu com a arma apontada para eles.

A mulher presa não aparentava qualquer sinal de tentar uma fuga. Ela estava parada onde havia sido deixada, imóvel a não ser por sua respiração e pelo olhar dela que se movimentou até ele. Um olhar gélido de seus olhos claros que fez o corpo do Jericó tremer levemente. Não havia espanto nas feições dela, qualquer indício de medo.

Talvez ele pudesse encontrar repúdio se conseguisse analisá-la com maior cuidado. Se ele fosse mais observador teria notado.

── O Comandante mandou deixar eles entrarem. ── Disse o outro ao retornar para o lado do amigo e falar de forma que apenas ele escutasse. ── Enviou alguns homens para guia-los até o Capitólio.

Ele assentiu e cada um se dirigiu a um lado dos portões, abrindo-o por cima através de correntes. Aos poucos, as grandes portas duplas de madeira revestidas com entalhes de ferro se abriu vagarosamente, revelando o interior antiquado da cidade e quatro homens que se aproximavam a cavalo.

Todos eles estavam com armas em mãos e revestidos com armaduras improvisadas, feitas com sucata. Eles também utilizavam capacetes, mas que pareciam ser aqueles que pertenciam aos guardas da FEDRA. Pintado em vermelho sobre a tinta preta do objeto, estava o símbolo de Jericó.

── Eu os saúdo irmãos, que padre Matthias os guie. ── Saudou um deles, aquele que liderava a pequena patrulha.

── Eu os saúdo, irmãos. ── Respondeu o primeiro sobre a torre de vigia. ── Esses são os profanos que requerem um encontro com o padre Matthias. ── Ele apontou na direção dos três do lado de fora.

O líder da patrulha solta uma pequena risada de escárnio.

── Bom saber que ainda está viva, Dania. ── Disse ele.

── Meu nome é Dyani. ── Ela respondeu. Os olhos da mulher se estreitam para ele e quase passa despercebido a forma como ela aperta as rédeas em suas mãos mais fortemente. ── Pensei que fossemos ser recebidos pelo seu Comandante, não por alguém tão abaixo.

── Se continuar com essas provocações, não vai conseguir o que quer, herege. ── Ele respondeu. ── Não vai sair daqui com vida, nossa misericórdia não dura tanto.

── Ah, como a misericórdia que você teve com Lúcia?

── Ainda não superou? ── O homem sorri. ── Deveria. Ou deseja acabar que nem ela? Posso garantir que isso aconteça.

Dyani não responde, mas seus nós dos dedos ficam brancos com tamanha força que ela mantêm em seu aperto.

── Apenas nos leve até seus superiores. ── Disse o rapaz ao lado dela. ── Não estamos aqui para discutir com você.

Ele solta um tisk, debochado.

── Como quiserem. ── Respondeu, dando as costas. ── Sigam-me.

Os quatro soldados guiam a direção, enquanto Dyani e seu companheiro os acompanham. Atrás deles o portão se fecha de maneira audível, deixando claro que agora não há mais volta.

A cidade é pior ainda por dentro do que por fora. Eles tem tochas presas em lugares aleatórios, as casas estão manchadas com tinta, sangue e mais madeiras afiadas formando pequenos pontos estratégicos. Cheyenne parece mais uma cidade da idade Média, retrógrada e pertencente à idade das trevas.

Eles passam por várias estruturas, até mesmo pela cúpula e por uma outra torre de vigia posta bem no meio da cidade. Passam por várias ruas, onde vários moradores saem de suas casas para observa-los. Eles comentam entre si, riem, rosnam e apontam na direção dos intrusos. Fica claro que não são bem-vindos naquele lugar.

O que eles chamam de Capitólio é na verdade o Tribunal da cidade. O local serve para reuniões, mas também parece ser onde reside os superiores na maior parte do tempo. Todos desmontam de seus cavalos e os deixam presos próximo a entrada.

── Vamos logo, hereges. Quero acabar com isso o quanto antes. ── O tenente os empurra para frente bruscamente. Rindo anasalado enquanto os obriga a subir a escada até as portas de madeira.

Dois dos homens dele as abrem e revelam o interior do lugar que também foi redecorado com a temática dos Jericos. Dyani está ao lado de Kai, que segura o braço de Riley e a leva com eles pelo caminho, enquanto os soldados os escoltam para dentro do Tribunal.

Eles chegam até a sala central, toda feita de madeira escura, tochas nas paredes, porém limpa dos bancos nos centros. Há apenas aqueles próximos as paredes, deixam o salão limpo. Próximo a tribuna apenas há três cadeiras altas, onde a do meio é maior que as outras duas.

── Fiquem de joelhos. ── Ordenou o tenente. ── Se vão ficar na presença do padre, devem se curvar. ── Quando nenhum dos três se movem, os guardas o forçam a isso. ── Andem logo!

Eles os seguram pelo ombro, empurram a parte de trás dos joelhos deles com os pés e os forçam a se curvar. O joelho deles encontram o chão de linoleo, cabeças curvadas enquanto uma porta próxima a tribuna se abre.

── Isso não é necessário, rapazes. ── Disse uma voz masculina áspera, porém provocativa. Ela era familiar para os três, mas principalmente para uma pessoa em específica. ── Sei que sou como um ser divino, mas nosso senhor irá se atrasar um pouco. ── Ele bate as mãos juntas. ── Será apenas eu por enquanto.

── Senhor. ── Saudou o tenente. ── Aqui estão eles.

── Eu os vejo, Dário. Não sou cego. ── Responde o homem, aproximando-se com passos lentos. ── Podem ficar de pé vocês dois. Não precisam de tamanha formalidade comigo.

Dyani e Kai se levantam, um pouco desconfiados com tanta tranquilidade vinda do homem. Com um mover de mãos, ele pede que os soldados se afastem um pouco e eles o fazem, dão alguns passos para trás e apenas observam.

Os passos do homem param a frente da única pessoa de joelhos. Riley mantêm a cabeça baixa e vê apenas as botas dele a sua frente. Ela respira profundamente várias vezes, quase bufando, sentindo a adrenalina correndo em suas ovelhas, a irritação fazendo suas mãos formigarem e se apertarem nas amarras que mantêm seus pulsos juntos.

── Menos você. ── Ele continua lentamente. ── Você eu quero exatamente onde está... Aos meus pés. ── Ele ri. ── Ah, isso vai ser tão bom.

A mão dele vai até o topo da cabeça de Riley quando ele se abaixa ao nível dela, e o mesmo puxa os fios bruscamente, fazendo com que a mulher o encare quando levanta a cabeça dela.

Os olhares dos dois se encontram, a cicatriz no lado esquerdo do rosto dele, a marca deixada pelo fogo, a marca que ela fez, e começa desde o pescoço e sobe para o restante da face dele, entrega quem o homem é. Porém Riley não precisava vê-lo para reconhecê-lo. Ela já sabia quem ele era quando começou a falar.

── Oi, Riley. Quanto tempo. ── Dwayne sorri amplamente. Um sorriso malicioso e macabro. ── Sentiu saudades? Eu senti. ── Disse cada palavra lentamente. ── Sabia que precisávamos nos encontrar de novo. Aquela sensação de assunto inacabado nunca foi embora, aconteceu o mesmo com você? Estava ansioso pelo nosso reencontro.

Riley não podia responde-lo com a mordaça em sua boca, tudo o que podia fazer era ranger os dentes sobre ela. Raiva dominando duas terminações nervosas.

── Como está a Sally? ── Ele peguntou. Riley apertou mais fortemente seu punho atrás das costas. ── Ainda está viva ou alguém a matou primeiro do que eu? Seria uma pena se isso tiver acontecido. Estava ansioso para por as minhas mãos nela novamente.

Adams gostaria de poder xinga-lo, mata-lo com as próprias mãos. Ver aquele sorriso sádico no rosto dele, a forma como Dwayne estava se divertindo, a deixava furiosa.

Como se pudesse ler os pensamentos dela, Dwayne abaixa a mordaça. Riley umedece os lábios antes de falar, encarando-o com olhos selvagens.

── Vai se foder. ── Ela o responde, rangendo os dentes e cuspindo saliva no rosto dele.

── Olha ela ai, a Riley Adams que eu conheço. ── Dallas ri. ── Depois de todo esse tempo, a matadora nunca foi embora. Ou deveria te chamar de "A Viúva"? Ah é, eu esqueci. Você e aquele vaga-lume idiota não chegaram a tanto. Não deu tempo pra isso, nós matamos ele antes.

── Você tem sorte da minhas mãos estarem presas, Dwayne. ── Ela diz.

── Não, é você que tem sorte da gente precisar de você, Adams. ── Responde o Dallas, mais sério. ── Se não fosse por isso, pode ter certeza que a história seria outra.

Soltando o cabelo dela bruscamente, enquanto a jogava para trás, Dwayne se ergue e Riley pode vê-lo totalmente agora, vestindo um uniforme azul, uma velha roupa da FEDRA que também foi customizada para parecer algo pertencente aos Jericos.

Dwayne tinha a pele branca, cabelos pretos escuros e o maxilar marcado. A parte do seu rosto queimada que estava no pescoço, era escondida pela gola alta da roupa. Ele ainda enxergava daquele lado, mas sua sobrancelha havia sumido e sua pálpebra estava caída por conta do ferimento cicarrizado. Sua pele era uma série de entalhe de enxerto mal feito.

Enquanto Dwayne se afasta um pouco, a mesma porta pela qual ele entrou é aberta mais uma vez e dessa vez um homem mais velho entra. Todas as cabeças se voltam para ele, vendo-o ser guiado por uma jovem de cabelos ruivos até seu assento na tribuna. O homem já está bem velho, andando curvado, precisando de ajuda para se locomover.

Todos se curvam, ficando de joelhos quando ele entra, até mesmo Dyani e Kai são forçados novamente ── o rapaz resmunga em descontentamento, mas segue sem tentar ir contra as vontades dos Jericos.

── Padre Matthias. ── Exclama Dwayne. Ele fingi estar feliz em finalmente ter seu líder presente, mas Riley nota a forma como ele range os dentes em descontentamento. ── É bom finalmente ter o senhor com a gente.

Padre Matthias não responde de imediato, sendo levado até seu assento e descansando em sua alta poltrona que fica no meio. A batina que ele veste é preta, mas está desgastada, então sua cor é quase cinza agora. Não há o colarinho branco em torno do pescoço, a roupa é totalmente escura.

Riley demora a levar o olhar até o rosto do homem, mantendo-se de joelhos agora que conseguiu se equilibrar sobre eles novamente depois que Dwayne a derrubou. A jovem que acompanha o padre ficou atrás da cadeira dele, esperando.

── O que tem pra mim, Dwyane? ── Ele questionou com sua voz áspera e desgastada pela idade. O homem começou a tossir e a garota entregou para ele um pano branco. Quando termina, Matthias continua. ── Qual é o motivo da perturbação?

── Os indígenas da cidade, a filha do Adriel, ela trouxe algo para você, meu senhor. ── Dwayne responde e seu braço se estende na direção de Riley e ele a ergue bruscamente, a colocando em seus próprios pés. Adams recebe aquilo como uma deixa para erguer o olhar.

Demora uns segundos, mas logo os olhos claros de Riley se encontram com os de Matthias. Olhos esses que são acometidos pela doença. Cego. O homem que ela teme está parcialmente cego. Um de seus olhos está quase totalmente branco e o outro está parcialmente assim.

Ela nota as feições dele, analisa meticulosamente o rosto enrugado, cheio de rugas e marcas. Ele tem barba e cabelo branco, esconde muito do homem que ele já foi, mas Riley consegue reconhece-lo. Consegue encontrar o homem por baixo do padre Matthias ali, aquele que ela temeu mais do que temeu Dwayne. Aquele que sempre realmente sempre foi a peça que faltava em seu passado, seu verdadeiro assunto inacabado.

Riley nunca se esqueceria dele, da mesma forma que nunca se esqueceria daquele dia. O dia que ela conheceu o homem que ele realmente era, o dia onde tudo se desfez. O fim de sua inocência e o começo de todos os males em sua vida.

AUTHOR'S NOTE. 𓏲࣪ ☄︎˖ ࣪

I. Vocês não imaginam o quanto foi difícil terminar esse capítulo, foram duas semanas escrevendo apenas ele e parecia que nunca chegava no fim. É realmente mais difícil escrever caps 100% originais e tenho encontrado certa dificuldade agora que estamos na reta final da fanfic.

II. O próximo capítulo terá um flashback e alguns dúvidas de vocês devem ser respondidas. Após isso, só terá mais um capítulo para encerrar o arco dos jericos (por enquanto) e então entraremos no último ep de The Last Of Us.

III. Os comentários e os votos de vocês sempre são bem-vindos, nunca se esqueçam disso. ♡

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