— Venha, vamos nos sentar. — Aponto para a cama.

Ela caminha na frente e senta em sua cama. Fico de pé por uns segundos, mas logo sento na minha, de frente para ela.

O silêncio que se faz é agonizante, mas para o meu alívio e desespero, a loira toma a palavra.

— Vicente e eu terminamos. — Diz sem rodeios, fitando as mãos que estavam entrelaçadas em cima das pernas.

Tento falar alguma coisa, mas nada sai da minha boca. O que falaria? Pelo seu estado, já imaginava que algo do tipo teria acontecido.

— Lídia... — Respiro fundo antes de me levantar e sentar ao seu lado — Eu realmente não sei o que dizer!

Ela assente e levanta o seu rosto para me encarar. As lágrimas ameaçavam escorrer a qualquer momento.

— Nem eu, Agatha! — Sinto uma pontada no estomago ao ouvi-la me chamar assim.

— Você... Está chateada comigo, não é? — Minha voz quase não sai, devido o nó que se formava em minha garganta.

— Não! Não mais! — Ela nega rapidamente com a cabeça e segura a minha mão — Na verdade, eu estou chateada comigo mesma.

— Por quê? Não faz sentido... — Ela sorri e enxuga uma lágrima que escorreu pelo rosto.

— Águi, o meu namoro com o Vicente foi algo totalmente precipitado. E devo confessar que a maior culpada disso tudo fui eu. — Encaro-a com confusão — Ele foi totalmente sincero comigo, desde o início da nossa amizade. Nunca me escondeu absolutamente nada. Principalmente sobre você!

Meu rosto surpreso a fez abrir um pequeno sorriso.

— Ele tinha chegado há menos de uma semana de Moçambique, com o Théo e outros missionários, e eu do Sul. — Levanta e caminha até a janela — Foi inevitável não criarmos uma amizade, já que os irmãos Ferraço são tão...

— Cativantes. — Respondemos juntas.

— Exato! — Responde sem se virar para mim — Com o tempo eu fui percebendo que algo o incomodava, principalmente quando o assunto ia para o lado sentimental... E eu me perguntava, o que poderia ter acontecido para ele ficar assim. — Lídia vira, ficando de frente para mim — Até que eu tomei coragem e o questionei. No início ele estava relutante em se abrir, mas eu soube convencê-lo — Ri sem humor — E ele me contou toda a história sobre vocês dois. O acampamento, as dificuldades, a mudança para o Canadá, o suposto noivado...

Fecho os olhos e tento aquietar o meu coração. Toda vez que esse assunto vinha à tona, não conseguia controlar minhas emoções.

— Tentei consola-lo de todas as formas, e como uma boa garota apaixonada, prometi a mim mesma que o faria esquecer você! — Ela suspira e volta a se sentar, dessa vez em minha cama — Ele negou veemente quando contei minha "brilhante ideia" — Faz as aspas no ar — Disse que jamais conseguiria amar alguém como amava você.

Meus olhos já marejavam e a respiração estava entrecortada.

— Mas eu não quis dar ouvidos, simplesmente queria amá-lo a ponto de ele esquecer que um dia viveu algo tão intenso com você, sem nem mesmo terem se envolvido realmente. — Ela soluça não contendo a tristeza — Eu o amava tanto, que não me importava com os meus sentimentos! Não me importava se não fosse correspondida totalmente. Só queria tê-lo ao meu lado.

— E ele aceitou... — Digo com a voz embargada.

— Sim... Depois de tanto insistir acabou aceitando. — Dá de ombros — Ele é um ser humano, Águi, não é perfeito e eu acabei aproveitando de sua fragilidade para consegui o que queria... Não estou orgulhosa do que fiz, mas... Talvez faria tudo outra vez!

Fito-a com o cenho franzido.

— E quando você descobriu quem eu era? — Questiono incerta.

— No dia da morte da sua melhor amiga. — Ela desvia o olhar fitando a mesa de cabeceira que tinha um porta retrato com minha foto e a da Hel — Eu estava desconfiada, mas só tive a certeza quando o vi desesperado por você estar sofrendo daquele jeito e ele não poder fazer absolutamente nada. Iria confronta-lo, mas não precisei, pois ele me contou tudo sem eu precisar perguntar.

— No quintal da minha casa... — Agora as coisas faziam mais sentido.

— Sim! Nós discutimos naquela manhã após eu encontrar vocês dois, à noite no quintal. — Volta a me encarar — Mas preferi conversar com mais calma, quando voltássemos para cá. Eu fiquei muito nervosa e, inicialmente, chateada com você. — Ri negando com a cabeça — Até quis terminar, mas ele prometeu que tentaria. E estava cumprido com sua palavra.

Lídia se levanta e senta ao meu lado, pegando minhas mãos.

— Mas eu não sou você e nunca serei, Águi! — Fecha os olhos enquanto uma lágrima rola — Eu não quero prendê-lo a mim. Não quero tê-lo dessa forma!

— Não faça isso, Lídia! — Aperto suas mãos — Eu sinto muito por tudo isso! Sinto muito! Prometo que não ficarei no caminho de ninguém! E depois que tudo isso passar — Digo me referindo à viagem — Eu me afastarei e...

— Não quero perder a sua amizade, Agatha, não diga bobagem! São coisas da vida... Nem sempre a gente entende.

— Isso é loucura! — Levanto e começo a andar de um lado ao outro — Ele pedirá a sua mão em casamento! Você mesmo viu a aliança!

Ela ri negando com a cabeça.

— Parece que eu me enganei, assim como ele se enganou ao pensar que você estava sendo pedida em casamento naquela lanchonete. — Me oferece um sorriso triste. A loira caminha até sua mesa de cabeceira e retira algo de lá. Despois se aproxima de mim — Agatha, você sempre foi o único e verdadeiro amor da vida do Vicente, e isso não mudou! — Abre minha mão e coloca o objeto na palma.

Perco a voz ao ver do que se tratava.

— Você... — Não consigo terminar a frase, pois um soluço ingrato sai dos meus lábios.

— Eu o recuperei assim que você entrou no banheiro. Ainda não tinha conhecimento do real significado, mas sabia que era importante para você.

— Você o guardou esse tempo todo! — Ela assente com um sorriso nos lábios. As lágrimas começam a rolar mais uma vez, sem ao menos pedir permissão para tal.

— Não desista dele! Não perca a oportunidade de ser feliz ao lado de quem você ama!

Ela desatarraxa o cordão e o coloca em meu pescoço. Automaticamente minha mão toca o pingente prata em formato de estrela. Fito seus olhos e ela dá de ombros.

— Obrigada! — Envolvo-a em um abraço. Abraço repleto de emoção, gratidão e compaixão.

— O que está acontecendo aqui? — Olhamos para a porta, onde Lara nos olhava com incerteza e confusão.

— Acho que vou dar uma espairecida. — A loira me fita mais uma vez antes de saí do quarto — Pense no que conversamos.

— Tá bem, agora você vai me explicar o que aconteceu aqui. — Aponta para a porta, assim que ficamos sozinhas.

Caminho até a cama e me sento, ainda digerindo minha conversa com a Lídia.

— Terra chamando Águi! Oiiii! — Balança a mão na frente do meu rosto.

— Eles terminaram, Lara! — Minha voz sai desanimada.

— Vicente e Lídia? — Questiona embasbacada. Eu simplesmente assinto — Uau! — Senta na cama ao meu lado — Ela deve estar arrasada, que situação! — Suspira — E como você está?

Encaro minha amiga sem saber o que responder.

Como eu estou?

— Eu não sei! — Seguro o pingente mais uma vez, chamando a atenção de Lara.

— Espera aí... — Ela aponta e eu assinto mais uma vez — Como ele foi parar aí de volta?

— Lídia.

Conto tudo o que aconteceu há pouco. Lara me escuta em silêncio, como de costume.

— E foi isso! — Dou de ombros me jogando na cama.

— Então isso significa que vocês dois poderão ficar juntos, Águi! — Exclama com animação.

— Lara, para! — Sento-me novamente encarando-a — Confesso que criei um pouco de esperança também, mas a nossa amiga está precisando de nós. Apesar de tudo, a Lídia o amava de verdade e está sofrendo com o término.

— Eu sei, que idiota eu sou! — Comenta com um suspiro — Que situação complicada!

Retiro o colar e o fito por um tempo.

— Não me diga que irá desistir novamente! Águi, vocês foram...

— Não, Lara! Não estou desistindo de nada novamente, pois já tinha feito isso! — Pego minha bíblia e coloco o colar lá dentro — Estou colocando diante do meu Pai. Apenas Ele sabe o que é melhor para nós dois e, sinceramente, para mim o mais importante é fazer o Seu querer, por mais que isso doa na maioria das vezes é seja bem difícil.

Suspiro e me levanto.

— Eu ainda não consigo entender o que Ele quer, só sei que passamos por tantas coisas que contribuem para não estarmos juntos... Estou começando a achar que essa é a vontade de Deus também!

— Águi, — Lara se levanta e me abraça — Eu concordo com você em colocar diante de Deus, está certíssima! Mas não permita que a esperança morra novamente, amiga! Às vezes todas essas dificuldades que vocês estão enfrentando para ficarem juntos, estão servindo para mostrar que absolutamente nada poderá separar o que Deus uniu!

— Amém! — Afasto-me dela — Mas Deus ainda não uniu nada! — Pisco e sigo para o meu guarda-roupa — Vou tomar um banho e finalmente descansar um pouco. Mais tarde nos reuniremos com o pessoal!

***

— Águi! — Sinto as mãos de Lari me sacudindo.

— Já estou acordada! — Retiro o lençol do rosto.

— A maioria das pessoas já estão lá no lago. — Diz me ajudando com o tecido enrolado em minhas pernas.

— Que horas são? — Pergunto bocejando.

— Quinze para as 23h. — Arregalo os olhos e corro para o banheiro.

Diferente de muitas mulheres, eu consigo me arrumar em tempo recorde, com direito a banho e maquiagem. Mas dessa vez não rolou maquiagem.

Descemos a escada rapidamente. Ainda tínhamos dois minutos antes de iniciarmos a oração grupal.

— Pensei que não viria! — Gabriel zomba assim que me aproximo dele.

— Não sabia que já tinham chegado. — Comento, feliz em tê-los conosco novamente.

No dia seguinte, após a reunião com o pastor André, Biel pegou o primeiro voo para estar ao lado de Samanta.

— Chegamos há duas horas. — Sorriu, entregando-me o microfone — Esse povo é todo seu! 

— Boa noite a todos! — Saúdo chamando a atenção dos que estavam dispersos — É muito bom estarmos todos aqui reunidos mais uma vez! Estamos entrando em nossa segunda semana de propósito, e já podemos contemplar o agir de Deus em nosso meio! — Olho para Sam, que tomara o seu lugar ao lado do esposo, e abro um sorriso — A missionária Samanta é uma das provas de que Deus está atento aos nossos clamores.

Os irmãos glorificam e exaltam a Deus. A presença do Senhor era nítida naquele local.

— Sintam-se à vontade para entrar na presença do Pai! Oremos! — Fecho os olhos e inicio o momento de clamor — Querido Deus, estamos aqui neste momento, em uma só voz, para clamarmos a Ti! Te exaltamos pelo fôlego de vida que nos foi dado hoje! Por mais uma oportunidade de estarmos vivos! Sabemos que nada do que acontece em nossas vidas é por acaso, não acreditamos nisso, pois cremos que nossas vidas já estavam diante de Ti antes mesmo de sermos formado no ventre de nossas mães.

Meu coração se enche de alegria e gratidão. Meus olhos ardem denunciando as lágrimas de felicidade, e quando volto a falar, minha voz sai embargada.

— Obrigada por cuidar tão bem de nós, Pai! Obrigada por escrever a história de cada pessoa que se encontra aqui nesta noite! Somos a sua igreja, o corpo de Cristo, que se coloca à disposição para obedecer às ordenanças dadas pelo nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo! Toma as nossas vidas diante de Ti, nos prepare e nos molde conforme o seu querer, para cumprirmos com perfeição aquilo que o senhor nos determinou.

Abro os olhos e fito o céu estrelado com um sorriso no rosto.

— Tu és o Deus onipotente, onisciente e onipresente! Neste momento, clamamos pelos nossos irmãos espalhados pelos quatro cantos dessa terra. Clamamos por àqueles que precisam do teu socorro! Visite os missionários, os cristãos perseguidos, aqueles que estão em subsolos te adorando, pois não podem erguer a voz em alto e bom som, como estamos fazendo neste momento. Receba cada clamor e adoração que está sendo feita pela tua igreja! De Leste a Oeste! De Norte a Sul! Que a sua presença invada os lares oprimidos, os hospitais, os cárceres, os cativeiros, os gabinetes e que o seu nome seja glorificado!

Fecho os olhos novamente, ergo a mão livre para o céu e começo a recitar .

— Teus, ó Senhor, são a grandeza, o poder, a glória, a majestade e o esplendor, pois tudo o que há nos céus e na terra é teu. Teu, ó Senhor, é o reino; tu estás acima de tudo. A riqueza e a honra vêm de ti; tu dominas sobre todas as coisas. Nas tuas mãos estão a força e o poder para exaltar e dar força a todos. Agora, nosso Deus, damos-te graças, e louvamos o teu glorioso nome.

Brados de louvor e glória são dados ao Todo Poderoso.

— Ó profundidade da riqueza da sabedoria e do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos, e inescrutáveis os seus caminhos! "Quem conheceu a mente do Senhor? Ou quem foi seu conselheiro?". "Quem primeiro lhe deu, para que Ele o recompense?". Porque dEle, por Ele e para Ele são todas as coisas. A Ele seja a glória para sempre! Amém. — Finalizo com Romanos 11, do versículo 33 ao 36.

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Oii, gente!! Parece que a Lídia não é a "trouxa" que pensávamos que fosse... 🤭

Infelizmente não conseguirei responder os comentários de vocês agora, mas prometo que assim que possível o farei! 🙏🏼

Att.
NAP 😘