Capítulo Quarenta e Cinco

Marshall Aldrin Vamps:

Naquela madrugada silenciosa, meus olhos se encontraram com os de Daniel, e ele gentilmente me ofereceu uma pequena amostra de seu próprio sangue.

— Quer fazer isso agora? Todos estão exaustos. Se alguma coisa der errado —  ele sussurrou enquanto um sorriso caloroso se formava em seus lábios.

—  Nada vai dar errado, pode confiar em mim —  Falei com um sorriso. —  Logo vou estar de volta para você.

Aart estava de pé a uma distância segura. Depois de termos acordado ao romper da aurora, tomei a decisão de passar pela transição. Os olhares de todos se voltaram na minha direção uma última vez, antes que Aart entrasse no quarto. Eu me posicionei na cama, ansiosa pelo que estava prestes a acontecer.

Aart começou a recitar um feitiço para suspender meu coração, e senti a mão de Daniel apertando a minha com firmeza. O ambiente estava tenso e cheio de expectativa enquanto me preparava para a jornada que me aguardava.

— Paralis —  proferiu Aart, e meu coração começou a desacelerar, à medida que a escuridão se aproximava. Os olhos de Daniel permaneceram fixos nos meus, uma promessa de reencontro após o meu despertar.

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Por um breve momento, meu corpo parecia ter se transformado em mangueiras de borracha vazias, como se toda a vitalidade tivesse escorrido. Mas logo essa sensação desapareceu, deixando-me em um estado de completa insensibilidade.

A escuridão envolveu meus olhos, tornando-se mais densa do que nunca, como uma venda grossa, firme e implacável. Ela não apenas cobriu meus olhos, mas todo o meu ser, como um peso avassalador que ameaçava me esmagar. Era uma batalha exaustiva resistir a isso, e eu sabia que seria muito mais simples ceder. Deixar a escuridão me arrastar para um abismo onde as emoções não tinham lugar. Se dependesse apenas de mim, minha determinação não teria durado muito tempo. O antigo eu teria desistido, rendendo-se completamente à escuridão que me envolvia.

Eu vinha enfrentando o sobrenatural por tempo demais, aceitando minha verdadeira natureza. Mas isso não dizia respeito apenas a mim. Se eu escolhesse o caminho mais fácil, permitindo que a escuridão do nada me consumisse, minha família sofreria as consequências.

Eu não os abandonaria e não os deixaria sofrer com minha ausência. Portanto, continuei a lutar contra a escuridão, quase por instinto. Não estava tentando exorcizá-la; simplesmente resistia à sua poderosa investida, recusando-me a ser totalmente subjugado pelo mundo dos mortos que me puxava inexoravelmente em sua direção. Até aquele momento, isso tinha sido suficiente, e teria que ser suficiente novamente. Eu aguentaria até encontrar o caminho de volta ao mundo dos vivos.

Mantive a escuridão da não existência a apenas centímetros de distância. Então, de repente, senti algo. Era como ter membros fantasmas, a sensação de meus braços retornando, e neles, uma mão que me apertava com firmeza.

Duas coisas aconteceram quase simultaneamente, de uma maneira que eu não conseguia discernir qual ocorreu primeiro: o tempo começou a passar novamente, e minha força retornava gradualmente. Senti o controle sobre meu corpo voltando aos poucos, e esses foram os primeiros indícios da passagem do tempo. Soube disso quando consegui mover os dedos dos pés e fechar as mãos. Minha audição ficava mais aguçada a cada instante, e eu podia contar o batimento frenético do meu coração, marcando o ritmo do tempo. Pude ouvir a respiração lenta e constante que emanava de algum lugar próximo a mim. Ela era mais lenta, e concentrei-me nela, pois significava que o tempo estava avançando. Mais confiável do que um pêndulo de relógio, aquela respiração me impulsionava através dos ardentes segundos em direção ao fim.

Meus pensamentos se tornavam mais nítidos, e novos sons eram percebidos com clareza. Ouvi passos leves, o sussurro do ar sendo movido por uma porta que se abria e as vozes de Janet e Taylor, que imediatamente reconheci.

Agora, minha mente tinha muito mais espaço, um espaço que era disputado por duas partes distintas de mim: meu lado bruxo, lutando para não ser apagado facilmente, e o lado caçador e feérico fazendo a mesma resistência.

A mão de Daniel segurou a minha com firmeza.

— Marshall, meu amor? — Daniel murmurou.

— Pai Marshall? — Os gêmeos disseram. — Vamos buscar o sangue.

Com todos os meus quatro lados lutando para prevalecer, consegui reunir e controlar todos eles.

Durante um breve instante, a ausência de emoções era tudo o que eu conseguia perceber. E então, finalmente, abri os olhos e encontrei o rosto de Daniel olhando fixamente para mim, bem diante de mim.

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O cenário à minha volta brilhava com intensidade, e me acomodei no lugar, sentindo a pressa correr pelas minhas veias assim que avistei a bolsa de sangue. Ao meu lado, o Senhor Vamps protegia os outros, incluindo Maxuel.

— Desculpe, sei que isso pode ser desorientador, mas você está bem —  disse Daniel, e eu limpei a boca antes de olhar para ele.

— Estou me sentindo incrivelmente bem —  respondi, sorrindo.

Eu era um vampiro recém-criado, e sabia muito bem o que isso implicava. As emoções e os desejos se intensificam, tornando difícil o controle. Meu lado feérico tentava ser racional, enquanto o caçador sussurrava em cada partícula do meu ser e o bruxo controlava a magia ao meu redor. Era como se todas as partes de mim estivessem intactas.

Daniel me abraçou, e um gemido escapou dos seus lábios quando retribuí o gesto.

— Parece que você está mais forte que eu agora —  ele resmungou, com um sorriso envergonhado.

— Não perdi nenhuma das minhas facetas, todas estão aqui, até mesmo o lado bruxo—  murmurei, e todos olharam para mim, chocados.

— Isso é possível? Ele é quatro coisas ao mesmo tempo —  Janet disse, confusa. — Então, Marshall é um quadribrido?

— Sim, Marshall é uma quebra significativa na natureza —  explicou Geovane, enquanto Kit olhava para o namorado com uma expressão perplexa. — Seria possível criar uma nova linhagem de vampiros com ele.

— Ele é alguém incrivelmente poderoso agora —  acrescentou Kit, seus olhos brilhando.

Kelsey se aproximou.

— O que você lembra da transformação?— Kelsey perguntou enquanto se aproximava.

— Senti o mundo dos mortos me puxando para o outro lado e tive que resistir ao impulso de me entregar —  respondi, estalando a língua. — E então abri os olhos e pude ver tudo.

— Incrível —  sussurrou Paul com os olhos brilhando. — Você se tornou uma nova espécie.

Fiquei um pouco envergonhado com a ideia.

— Espere —  disse, tentando me concentrar. — E minha mãe, Tony e os outros? Me contem tudo o que perdi. Quanto tempo fiquei inconsciente?

— Nada mudou muito, na verdade. Você ficou inconsciente por pouco mais de três dias, o que é um pouco mais do que o normal —  respondeu o Senhor Vamps. — Mas, como agora é uma espécie única na natureza, isso explica a incomum duração do processo. Seus pais estão na casa do seu avô, ligando todos os dias para saber como você está, e Kraes Dramar deixou o seu braço direito para se manter informado, devemos notificá-lo agora.

— Tenho que ligar para a minha mãe e os outros! —  exclamei, e Daniel apertou minha mão.

— Eu vou cuidar disso, não precisa se preocupar —  tranquilizou-me Daniel, beijando minha testa com ternura. — Apenas descanse e comece a se acostumar com o seu novo corpo.

— Lembre-se também de avisar o rei das fadas, ele estava preocupado com a sua recuperação, e Maxuel também estava. E mande uma mensagem de fogo durante esse tempo para mantê-los atualizados —  acrescentou Lilly antes de saírem do quarto, me deixando em silêncio enquanto eu tentava me adaptar a essa nova versão de mim mesmo.

Uma nova espécie... Será que isso tinha alguma relação com o que meu pai mencionou sobre o mundo estar em desequilíbrio? Parecia que eu era uma grande anomalia na natureza.

Olhei para minha mão, onde o anel da minha herança de caçador sobrenatural brilhava, e depois para o meu pulso, onde a pulseira do arco encantado que o Senhor Vamps me deu estava intacta. Então, um brilho surgiu dos meus dedos, revelando a magia da minha linhagem bruxa.

À medida que a magia da minha linhagem bruxa fluía pelos meus dedos, eu me sentia ainda mais conectado a cada parte do meu ser. Era como se eu estivesse tocando em uma fonte de poder que estava adormecida dentro de mim até agora. Meus sentidos pareciam mais aguçados, minha percepção do mundo estava mais nítida do que nunca.

Enquanto eu me maravilhava com essa nova descoberta, uma pergunta começou a ecoar na minha mente: Será que todas essas partes de mim, a vampira, a feérica, o caçador sobrenatural e o bruxo, poderiam trabalhar em conjunto de alguma forma? Seria possível harmonizar essas diferentes facetas e explorar todo o seu potencial?

Perdido em pensamentos, comecei a lembrar das histórias que meu pai costumava me contar quando eu era criança. Ele falava sobre um antigo pergaminho, uma profecia esquecida que mencionava um ser poderoso, capaz de trazer equilíbrio ao mundo sobrenatural. Seria eu o destinatário dessa profecia? Seria minha existência a chave para resolver os desequilíbrios que meu pai mencionará?

Enquanto eu mergulhava em reflexões profundas, Daniel retornou ao quarto com um celular na mão. Seus olhos encontraram os meus, cheios de preocupação e carinho.

— Conversei com a sua mãe e os outros. Eles estão aliviados em saber que você está bem, mas estão ansiosos para vê-lo —  explicou Daniel.

A gratidão encheu meu coração enquanto pegava o celular das mãos de Daniel e fazia a chamada para minha mãe. A voz dela soava emocionada do outro lado da linha, e prometi que em breve a visitaria. Fiquei aliviado ao ouvir que todos estavam bem e que as coisas não tinham mudado drasticamente durante meu tempo de inconsciência.

Enquanto conversava com minha mãe, minha mente continuava girando em torno da profecia e do meu papel no mundo sobrenatural. Seria uma jornada desafiadora, e eu estava apenas começando a entender as possibilidades que minha nova condição oferecia.

Quando finalmente desliguei o telefone, Daniel sorriu para mim e se aproximou.

— Você está prestes a embarcar em uma jornada incrível, Marshall. E não importa quão desafiadora seja, estaremos ao seu lado —  disse ele, com um olhar cheio de determinação.

Eu assenti, sabendo que o caminho à minha frente seria repleto de desafios, mas também de descobertas e aventuras. Era hora de abraçar o que eu era, um Quadribrido, e descobrir meu verdadeiro propósito no mundo sobrenatural.

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Gostaram?

Até a próxima 😘

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