VII
Capítulo 07
Amy
Pra minha sorte, minha mãe não fez muitas perguntas quando a pedi para vir me pegar em Los Angeles. Claro, ela estava levemente (ou muito) irritada, mas aquele com certeza era o menor dos meus problemas.
Durante todo o resto do fim de semana, fiquei trancada em meu quarto, pensando no quanto sou uma tonta. Logo eu, que sempre me achei tão inteligente.
— Querida, o jantar está pronto. – Meu pai bateu duas vezes na porta e logo entrou, usando aquele seu suéter de lã azul que faltava correr atrás dele de tanto que ele usava.
— Estou sem fome, pai. – Respondi, jogando uma bola de tênis velha para cima. Coisa que eu estava fazendo havia mais ou menos duas horas.
— É algo em que eu possa ajudar? – Ele sentou na beirada da cama, tocando de leve a minha perna.
Dei um sorriso fraco.
— Eu gostaria que fosse. – Admiti, querendo muito que meu problema fosse algo que meu pai pudesse resolver.
— Sabe, eu lembro quando você ganhou essa bola. – Meu pai puxou assunto. — Foi naquele jogo quando você tinha onze anos.
— Sim. Eu lembro. – Dei um sorriso fraco. — A Julie estava com a gente.
— Sim. E quando voltamos pra casa, foi a maior confusão para decidir qual das duas ficaria com ela. – Meu pai me lembrou daquela briga boba que tivemos na infância. — Vocês brigaram por horas, até que a Julie finalmente conseguiu ganhar o bate boca e ficar com a bola
— E ela me deu de presente no meu aniversário, meses depois... – Lembrei do desfecho daquela situação.
— Sim. E vocês se abraçaram chorando. – Meu pai deu um riso nostálgico. — As melhores amizades são assim, querida. Não existe amizade sem brigas, sem diferenças e sem controvérsias. Sobreviver a tudo isso é o que mostra o quão verdadeira uma amizade é. Lembre-se disso.
— Obrigada, papai. – Abracei meu pai de lado e ele retribuiu.
— De nada, meu amor. – Ele respondeu, beijando o topo da minha cabeça.
Logo eu estava sozinha de novo, pensando no que meu pai havia me falado. Sobre as amizades e sobre as brigas. Era tudo verdade.
Naquela época, Julie havia errado, mas havia se arrependido e pedido desculpas. Agora, era a minha vez de fazer o mesmo. No final das contas, nossa amizade era mais forte do que qualquer briga boba.
Foi com esse pensamento que dormi naquela noite e despertei na segunda, decidida a tentar consertar tudo que havia feito. Me desculparia com Julie e livraria Gabe de qualquer acusação. Não poderia deixar que ele e sua família pagassem pelo preço das minhas ações.
— Amy, a Monica está aqui! – Minha mãe berrou da cozinha. Se tinha uma coisa que ela fazia muito bem era gritar.
— Já vai! – Respondi, terminando de por o meu material na bolsa.
Peguei uma presilha para prender o meu cabelo e desci as escadas bem rápido, vendo Monica de pé ao lado da mesa em que meus pais tomavam café da manhã.
— Vamos? – Perguntei a ela, que assentiu.
— Sim! – Ela respondeu, ajeitando a bolsa no ombro.
— Não vai tomar café conosco, Monica? – Minha mãe quis saber, usando aquela pergunta para fazer o convite.
— Talvez outro dia, obrigada, senhor e senhora Salt. – Monica, como sempre muito educada, agradeceu aos meus pais com toda a sua polidez.
— Tchau pai e mãe. – Acenei para eles me
afastando, escutando o barulhinho que o carro de Monica fez quando ela o abriu com a chave.
— Então, em uma escala de um a dez, o
quanto a Julie está com raiva? – Perguntei, sentando no banco do carona e pondo o cinto de segurança.
— De um a dez? Onze. – Mônica me respondeu, pondo a chave na ignição. — Ela não quer te ver nem pintada, amiga.
— Poxa, obrigada pelo apoio Monica, de verdade. – Ironizei. Sabia que ela não conseguia mentir.
Naqueles oito minutos que passávamos no carro até chegar a escola, fiz Monica dar um resumo rápido da situação. Aparentemente, Julie ainda continuava grudada em Kyle, e no último dia em Los Angeles, pareceu bem próxima de uma das líderes.
— Por favor... – Pedi. – Me diz que essa líder de torcida é a Sheila Croft, aquela que tem uma terceira mama.
— Não, a Julie está bem próxima mesmo é da Margot.
— Poxa, eu disse pra você não me falar! – Cruzei os braços, chegando à conclusão de que a situação era mais preocupante do que eu imaginava.
Monica estacionou o carro na vaga destinada a ela, destravando as portas e me dando liberdade de ir na frente, sem precisar espera-la, já que minha situação era bem emergencial.
Entrei mais do que apressada no corredor dos armários, olhando para os lados desesperada, tentando encontrar Julie na multidão. Sem acha-la em lugar nenhum, tive de pedir paciência aos Deuses e ir atrás da única criatura que poderia saber do paradeiro dela.
— Pois é, e aí eu falei...
Kyle se assustou quando fechei a porta do seu armário em um estrondo e chamei a atenção não só dele, mas a de seu grupinho, para mim.
— O que você quer, garota? – Kyle indagou.
Mesmo um pouco abalada, meu pulso forte ainda era bem eficiente na maioria das pessoas.
— Sumam. – Ordenei aos jogadores amigos de Kyle, que se esvaíram aos poucos, me deixando sozinha com o capitão do time. — Onde está a Julie?
— Por que eu diria pra você? Se enxerga Amy, ela não quer nada mais com você. Ou esqueceu da péssima melhor amiga que você é? – Ele tentou me provocar.
— Eu? Péssima? Não fui eu que expulsei um senhor doente que me conhece desde pequena de casa, porque fiquei com raiva do filho dele. – Se era para apontar dedos, eu apontaria dedos.
— Eu odeio ter que prejudicar o senhor North, mas o Gabe precisa aprender. – Ele me respondeu.
— Aprender o quê? A ficar ressentido? Se tem algum problema com ele resolva com ele, garoto. Não envolva inocentes nisso. Se não, você não é nada melhor que um punhado de lixo. – Disse tudo que a tristeza não me deixou falar aquele dia na praia.
— Terminou? – Kyle indagou. — Legal. Agora vê se me deixa em paz.
Deixando-me plantada como uma muda de coqueiro, Kyle arrumou seu material e saiu andando.
— Meu santo não bate com o dele, mas não bate mesmo. – Falei pra mim mesma.
Continuei a procurar Julie por mais um tempo, até que finalmente minha bexiga gritasse. Aparentemente aqueles dois litros de água que eu tomava todos os dias pela manhã pra ficar bem hidratada estavam querendo sair.
Fui até o banheiro e entrei no primeiro boxe, sentindo aquele alívio maravilhoso de parar de prender o que deveria ser solto.
Depois de fazer o que a natureza quis que eu fizesse, me preparei para sair do boxe, quando escutei a porta abrir e um diálogo entrecortado acontecendo.
— Jura, Jules? Que máximo. – Reconheci de imediato a voz nojenta de Margot. — Então você e o Kyle já se falavam bem antes de tudo acontecer? Achava que o lance de vocês era recente.
— Não, não foi recente. – Ouvi o timbre de voz de Julie dar aquela resposta afirmativa. — Tudo começou na detenção há quase seis meses atrás, pra falar a verdade. Eu tinha chegado atrasada porque dormi demais e ele porque estava no treino. Ficamos apenas os dois uma tarde inteira na sala depois da aula, e acabamos conversando bastante.
— E você não contou pra Amy? – Margot questionou e eu admito que era o que eu também estava querendo saber. Julie nunca tinha me contado isso.
— Eu tentei, mas foi só mencionar o nome Kyle que ela começou a reclamar. Nem me deixou continuar. – Julie contou, sem saber que eu estava ouvindo tudo. — Eu tentei até agir como ela e pensar o mesmo, mas o Kyle me mandou mensagem e continuamos falando por meses a dentro. Pessoalmente, nunca falávamos nada, apenas trocávamos sorrisos.
— Por quanto tempo vocês ficaram trocando mensagens?
— 3 meses. – Tapei a boca para não gritar. Como aquela vaca da Julie me omitiu que estava flertando com Kyle Daniels por 3 meses?! — Quando dei por mim, eu falava com Kyle todo santo dia. Se por algum acaso não nos falássemos, eu sentia uma falta enorme, sabe?
— Awn, que gracinha. – Margot era tão falsa que até seu tom de voz mudava quando ela estava mentindo. — Estavam apaixonados!
— E aí, minha mãe pediu que eu ajudasse o Kyle como tutora em Filosofia. – Tapei minha boca de novo. — Eu explicava a matéria e ele ficava me olhando sabe... como nenhum garoto jamais me olhou antes. Estudávamos 3 vezes na semana juntos, falávamos todos os dias... então, a gente ficou na feira de ciências.
Safada! Todo mundo quase morrendo com a empolgação do Arnold explicando o ciclo do nitrogênio e ela se agarrando com o Kyle. Eu mandei mensagem pra ela no dia e ela dizendo que estava se preparando pra apresentação do nosso projeto. Julie era muito sonsiane!
— Kyle quis que contássemos pros nossos amigos de imediato, mas eu disse que não sabia qual seria a reação dos meus amigos. Ou dos dele. – Julie confessou. — No fundo, eu sempre senti medo que a Amy me abandonasse. Medo bobo, né?
Aquele foi o fim. Abri a porta do boxe e deixei que as duas me vissem, e Julie não pode esconder a surpresa. Ela tentou ir embora, mas eu não permiti.
— Julie, vamos conversar, por favor. – Implorei, com a voz mais calma que eu pude.
— Eca. Ela estava urinando e pegou em você sem lavar as mãos, credo.
— Por favor, Julie. – Insisti, mesmo querendo dar uns bons tapas em Margot, resolvi adotar prioridades. — Cinco minutos. Depois você não precisa mais olhar na minha cara se não quiser. Por favor.
Julie deu um suspiro e olhou para Margot.
— Margot, será que você pode...
— Tudo bem, amoreco. Qualquer coisa me
chama. – Margot me deu um sorriso falso e saiu.
— Amém. Chega o ar tá mais leve. – Em outra situação, talvez Julie pudesse ter rido, mas com a nossa relação ultimamente, ela não teve qualquer reação com minha piada. — Você nunca me contou nada disso.
— Não. Porque eu sabia que você me julgaria. – Julie respondeu, sem enrolar como ela normalmente faria. — Sua opinião sobre o Kyle sempre foi bastante formada. Você fez isso mais do que claro desde que começamos a namorar.
— Jules, eu sei que errei, mas se eu errei, foi por achar que ele não era bom pra você. Quer dizer, pra mim o Kyle ainda é um idiota... – Julie girou os olhos. — Mas ele realmente gosta de você. Eu não entendi bem aquela conversa que escutei dele depois do jogo...
— Ele estava falando da prima dele. Ela tinha vindo passar a semana com a família dele. – Julie explicou o contexto daquela conversa.
— ah... – Respondi baixinho. — Julie, eu queria dizer que sinto muito. Se eu fiz tudo o que fiz é porque sua amizade era a coisa mais importante pra mim. Deixei que minha opinião precipitada me cegasse e me impedisse de ver o quão ele te faz feliz. Quem tem que descobrir isso ou não, é você.
Fui me afastando aos poucos, abrindo a porta do banheiro.
— É só isso. – Dei um sorriso fraco e saí antes que ela me desse qualquer resposta.
Não sabia se ela me perdoaria ou não, só sabia que ela não era a única a quem eu tinha de me despedir apropriadamente.
— Arnold, viu o Gabe? – Parei em frente a ele, que estava lendo seus mangás bastante entretido.
— Vi ele no pátio. – Arnold estava tão concentrado que nem olhou pra mim.
— Ok, obrigada. – Saí correndo para onde ele tinha me instruído.
Abri os portões que davam acesso ao pátio e vi a multidão de alunos espalhados por lá, esperando a aula começar. Procurei Gabe com o olhar e nada de encontra-lo.
— O Gabe está pra lá. – Um dos jogadores do time tocou meu ombro, dando esse aviso. Antes que pudesse responder, o vi voltando até seus amigos (entre eles, Kyle) e começarem a gargalhar.
Ignorei a reação daqueles idiotas e segui a direção que me foi dita, ainda intrigada.
E tudo aconteceu muito lentamente.
Vi Gabe sentado em uma das mesas, com Margot sobre seu colo, e os dois se beijavam freneticamente.
Eu não consegui me mover. Fiquei parada, escutando as risadas de Kyle e de seus amigos ecoarem pelos meus ouvidos.
— O quê? Achou que ele gostava de você? – Kyle sussurrou em meu ouvido, e por mais que eu odiasse chorar, não consegui segurar e senti minhas lágrimas caírem.
O sentimento era de culpa, e o pior, de uma culpa merecida.
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