Capítulo 24

O restaurante do hotel em que marquei o almoço com a Kate está lotado. Escolhemos um péssimo horário para esse encontro, mas tudo bem. Precisamos resolver logo isso. Ela é sempre muito pontual e, na hora marcada, ela surge desfilando seu corpo esbelto elegantemente pelo salão. Ela é realmente muito linda, tem tudo o que um homem na minha posição poderia desejar. Fama internacional, dinheiro, beleza e é muito talentosa na cama, além de ser louca por mim. Mas isso não foi suficiente para me fazer esquecer a minha princesa, e é isso que eu pretendo deixar bem claro para ela.

Hi my love! — Aproxima-se de mim e deposita um beijo em meus lábios, eu logo a afasto.

— Olá, Kate. Em português, por favor.

— Como preferir, querido. Não parece muito feliz em me ver. Pensei que teria uma recepção mais calorosa. Não está com saudades? — Ela fala ao mesmo tempo que leva um morango que eu degustava anteriormente aos lábios, mordendo-o demoradamente e insinuando-se descaradamente para mim em pleno restaurante.

— Não vou fingir nada aqui porque estamos em público, Kate. Você sabe muito bem que não pretendo levar essa história de casamento a frente, e eu estou aqui para que não reste nenhuma dúvida sobre isso.

— Você parecia bem interessado em continuar enquanto estava me comendo e depois posando para fotos ao meu lado. É isso que eu sempre fui, não é, Johnata? Um troféu para exibição. Pois saiba que eu é que não quero mais isso. E pode esperar a conta, querido, pois vou cobrar por cada aparição minha em público com você, e garanto que o rombo em sua conta não será dos menores — Seu tom de voz já está acima do que eu gostaria, e as pessoas já começam a no olhar e comentar baixinho. Droga, isso não vai prestar.

— Kate, eu nunca disse que era sério. Somos bons juntos na cama, você é uma mulher linda, mas eu não a amo. Um casamento por contrato não nos faria felizes, e eu jamais poderia amar você. Meu coração já tem dona, e é com ela que eu pretendo me casar.

— É mesmo, John? E ela já sabe que você está voltando para a Inglaterra comigo?

— Não estou voltando com você. Eu vou voltar porque sou obrigado a ficar à disposição do clube até o término do contrato. Mas vou sozinho.

My love, você não sabe de nada mesmo, não é? Eu fechei um contrato com o marketing do seu clube. Com o acordo entre eles e a Yokohama Rubber Company, seu mais novo patrocinador, um novo rosto se fez necessário. Eu e você seremos os modelos para apresentação do novo look do time.

Então é isso, eu sabia que o Wagner não tinha me contado tudo. Após encará-la estático por alguns minutos, levanto-me da mesa e quase corro em direção à saída. Sinto que me falta o ar, e respiro fundo assim que o vento toca em meu rosto.

Agora estou totalmente ferrado.

Conheci a Kate três anos depois que cheguei à Inglaterra, quando fui convidado para estar em um desses eventos de moda e a vi na passarela. Ela é uma mulher muito linda, não posso negar, e me senti atraído por ela desde o primeiro instante que seus olhos encontraram os meus. Terminamos aquela noite em meu quarto de hotel, enroscados como se há tempos nos conhecêssemos.

Cultivamos uma bonita amizade à distância e, quando tínhamos a oportunidade de nos encontrar, fazíamos sexo como se não houvesse amanhã. Para mim, nunca passou disso, mas ela se apaixonou. Sempre aparecíamos juntos em eventos, e a mídia se encarregou de todo o resto. Nos nomearam namorados, e ela gostou. Eu também era famoso, e estava naquela fase de queridinho da mídia. Essa nossa relação era muito interessante para ambos.

Quando o Wagner veio com a ideia do noivado, eu senti que a coisa toda estava indo longe demais. Mas eu queria voltar para o Brasil, e ser o novo assunto das revistas de fofoca, ao lado da renomada modelo Kate Moss, deixar-me-ia ainda mais popular. Na cabeça do meu amigo, isso valorizar-me-ia.

Entrei na dele e deixei as coisas acontecerem, até eu me dar conta que a minha princesa estaria entre os leitores da notícia. Não pensei duas vezes para vir atrás dela.

Agora estou aqui neste impasse, vivendo aquilo que eu tentei evitar a todo custo antes de conhecê-la. Tenho que escolher entre o amor e o sonho da minha vida.

Se eu voltar à Inglaterra até o término do meu contrato, que é de um ano, eu vou perdê-la. Se eu ficar para tê-la comigo, terei que abrir mão de toda uma vida como jogador, e do sonho que lutei para realizar.

Não é fácil um homem chegar onde cheguei e fazer a fortuna que fiz em apenas sete anos de trabalho. Se bem que, no meu caso, era uma mistura de prazer e obrigação, pois o futebol sempre foi a minha paixão desde menino. Sempre soube que eu seria um jogador, pois eu nunca me vi fazendo outra coisa. E o plano era não me apaixonar por mulher nenhuma, para nunca ter que escolher entre meu sonho de estar nos campos e o amor de uma mulher.

Tudo caminhava perfeitamente como eu havia planejado, até eu conhecer Koany Vasconcelos, a garota que bagunçou o meu mundo e se apossou do meu coração.
Como um vírus sem antídoto conhecido, ela me contaminou, e com ela eu fui muito feliz. Meus melhores sorrisos foram para ela, meus pensamentos enquanto eu estive longe eram todos voltados a ela. E se ela me pedisse o ar que eu respiro, eu o cederia. Eu a amo mais que tudo nesta vida, e não ficarei sem ela, nem por todo o dinheiro do mundo.

Com apenas uma videoconferência, eu decido para sempre o resto da minha vida. E se querem saber, estou me sentindo melhor do que eu poderia imaginar. Agora é seguir em frente e terminar tudo exatamente como planejei. Não tem mais volta, está feito.

Meu telefone vibra insistentemente sobre a mesinha de centro, é ela. A foto de contato que mantive gravado ainda é aquela que eu tirei dela no dia em que ficamos pela primeira vez, quando ela dormia linda e saciada sobre o meu peito. Ela ainda tinha as bochechas rosadas depois de nos entregarmos na melhor noite de amor e sexo de toda a minha existência.

Meus dedos coçam, querendo atender a chamada, mas eu me obrigo a recusar. Não quero falar com ela. Não consigo, não hoje.

Koany

O que não nos mata nos deixa mais fortes para seguir em frente, mas o destino só pode estar de brincadeira comigo. Quando eu penso que finalmente terei meu final feliz, descubro que o homem para quem eu entreguei tudo de mim está mais uma vez longe de ser totalmente meu. Pensei que, ao me procurar, ele já estivesse com sua vida totalmente resolvida. Ledo engano o meu.

Fiquei furiosa ao ver aquela mensagem, mas desta vez não serei covarde. A primeira coisa que eu farei amanhã ao acordar será procurá-lo e exigir que ele assuma de uma vez por todas que não está livre para mim, e assim colocamos um ponto final nesta história. Na verdade, eu acho que é disso que precisamos para seguir em frente.

Acordo bem cedo e vou direto para a cozinha, estou faminta. Vasculho os armários em busca de alguma coisa para comer, mas está vazio. A geladeira não se encontra diferente, pois eu não comprei nada ainda depois que voltei de Governador Valadares. Sendo assim, faço a minha higiene matinal, coloco um jeans com tênis bem confortável e saio em direção à garagem, preciso fazer compras.

A lembrança do café que tomamos juntos e tudo o que fizemos depois, a forma como nos entregamos no dia anterior, tudo vêm em minhas lembranças, e eu me amaldiçoo por me sentir assim, ansiando por ele.

Estaciono o carro e sigo em sentido contrário ao supermercado, logo ali bem próximo tem uma banca de revistas. Não sei explicar o porquê, mas eu sinto como se estivesse sendo puxada para aquele lugar. Ao parar em frente ao local e avistar a pilha de jornais a minha frente, eu posso entender exatamente o porquê. Eu sabia que havia alguma coisa lá que eu deveria ver, eu sentia. Chamem do que quiser, eu chamo de sexto sentido.

John Wilder está afastado dos estádios, mas nem por isso deixa de bater um bolão. Em um dia, ele foi clicado em um restaurante no Leblon quando chegava de mãos dadas na companhia de sua médica para jantar, e no outro, desfrutando de um demorado almoço com sua linda noiva, a modelo Kate Moss.

Esta era a manchete que estava estampada no jornal desta manhã, e logo abaixo duas fotos feitas à distância. Em uma, eu estava com a mão entrelaçada a dele, entrando no restaurante. A outra foto registrou o momento exato em que ela chegava e o beijava na boca, como se fosse sua dona. Sinto meu peito queimar e meus olhos se encherem de lágrimas. Lágrimas essas que eu afasto imediatamente, limpando-as indelicadamente com as costas das mãos. Não vou chorar por ele, nunca mais. Se eu soubesse que esse noivado ainda existia, eu jamais o teria aceitado de volta em minha vida, muito menos em minha cama.

Compro o jornal para me martirizar um pouco mais, e sigo para dentro, disposta a terminar as compras. Coloco tudo no carro e volto para casa. Dirijo em modo piloto automático, ainda sem acreditar em tudo o que está acontecendo.

Ele poderia ter feito qualquer coisa, menos mentir para mim depois de tudo o que eu disse a ele. Talvez nosso tempo já tenha passado, e tudo o que eu precisava era deste choque de realidade para acordar para a vida.

Koany

Sabe aquele dia em que todas as pessoas decidem que vão se machucar? É hoje.

Assumi meu plantão às sete horas da manhã. A emergência está lotada e, a cada trinta minutos, pelo menos um paciente dá entrada.

Cafeína, preciso de cafeína. Caminho em direção à máquina de café para me servir de uma dose, preciso ficar bem acordada para vencer esse dia de merda. E o pior ainda está por vir. De hoje, o Johnata não me escapa, ele não vai poder fugir para sempre.
Decidi ontem à noite, após passar horas ao telefone conversando com a Karen e depois com o meu irmão. Contei a eles tudo o que aconteceu depois que voltei para o Rio, e a reação deles não poderia ter sido outra.

— Eu disse que ele ia te quebrar novamente, amiga — Ela fala do outro lado, me fazendo lembrar de sua expressão quando pronunciou estas mesmas palavras para mim dias atrás.

— Eu sei, Karen. Não fiquem preocupados comigo, não sou mais uma menina, sei me cuidar. Precisávamos passar por esta etapa para podermos começar uma outra, sem assuntos pendentes, mal resolvidos — Falo suspirando, mais para mim do que para ela — Eu estou bem, juro. Assim que aliviar um pouco a minha jornada aqui, eu vou aí ver vocês, eu prometo.

— Você sabe o que nós pensamos a respeito de você continuar aí sozinha, né? Seu irmão não fala em outra coisa. Ele gostaria muito que você aceitasse a proposta de montar a clínica aqui e ficar pertinho da gente.

— Eu estou pensando, amiga. Com carinho, juro. Fica bem, dê um beijo no Jaime e na Sue por mim.

— Tchau, princesa, se cuida.

"Dra. Vasconcelos, comparecer à sala de traumas".

Deixo o meu café pela metade e sigo rapidamente para o local solicitado, a situação não estava nada boa por lá. Um grave acidente envolvendo dois carros de passeio deixou três feridos, e um em estado grave. Assumo o controle da situação, na qual dois médicos e três internos já davam início aos procedimentos necessários para salvar aquelas vidas.

— O paciente um já foi estabilizado e será encaminhado para fazer os exames investigativos — Diz um de meus colegas.

— O dois também está estável, por hora só observação — Diz o outro.

— Agora sei porque me chamaram com tanta urgência, há fraturas em várias partes do corpo deste senhor, e eu nem preciso de raio X para constatar que ele precisa de cirurgia. Doutores, preciso de um de vocês para me auxiliar e uma equipe com três enfermeiras. Teremos uma longa tarde de trabalho. Vamos logo fazer aquilo que mais gostamos, salvar a vida deste homem antes que ele sangre até morrer.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top