Capítulo 8
O ar parecia rarefeito, até mesmo as moscas insistentes no cômodo estavam em silêncio assim que Sam pisou no último degrau da escada. Jaque e Logan não sabiam o conteúdo da conversa entre ela e Jon, porém imaginavam pela feição da morena que não havia sido fácil para nenhum dos lados. Manu que até o momento estava alheia ao silêncio, parou de tagarelar para olhar Jon.
- Olha, a tia Sam acordou!
Quando a criança a mencionou, Samanta olhou em seus olhos e sentiu uma estranha conexão com ela, poderia ser a familiaridade com Adam, ou talvez a vontade de ter essa familiaridade com Manu, instintivamente, ela desviou o olhar e observou a tensão na sala. Obviamente, Kimberly estava extremamente desconfortável com toda a cena, ainda sim, mantinha-se firme por causa da filha.
- Boa noite.
- Sam, o que houve para você desmaiar desse jeito? Se alimentou mal hoje?
- Acredito que não seja essa a questão. Mais fácil uma descarga de emoções.
- Sim, sim... Vou fazer uma torrada para você.
- Não estou com fome, Jaque.
- Mas, vai comer, ora essas. Venha me ajudar, Logan.
- Claro, amor... Já vou.
Ao passar pela amiga, Jaque lhe deu um beijo no rosto e sussurrou 'Aguente firme'. Logan deu um beijo em sua bochecha e seguiu a noiva na direção da cozinha. Jon estava observando suas reações, ela não sabia antes, mas, realmente precisava dele ali.
- Oi, Manu. Eu sou a Sam.
- Eu sei, meu pai falava muito de você.
- É mesmo? O que ele dizia?
- Que você é maravilhosa, e, que ele te achava a mulher mais linda do mundo, depois de mim.
- Depois de você, sei... - Sam disse dando uma piscadela sincera para a menina. - E, você está na escola?
- Sim, eu tenho aulas todos os dias.
- Isso é muito bom, princesa.
- Sam? - Jonathan disse assim que a viu sorrir para a menina, chamando a sua atenção para ele. - Quer tirar um momento para falar com Kimberly?
- Por enquanto, não. Obrigada. Estou cansada, então vou só esperar a Jaque preparar a minha torrada, comer e deitar.
- Tem que escovar os dentes, senão dá bichinhos.
- Sim, Manu. Eu vou escovar os dentinhos antes de dormir, senão os bichinhos vão cavar buracos neles.
- Aí não vai ter dentes para comer comidas gostosas, não é?
- É isso aí, princesa.
- Sam, sua torrada.
- Obrigada, Jaque...
Como já estavam na mesa da sala de jantar, com Manu desenhando algo e fingindo não prestar atenção no ambiente ao redor, Jaqueline apenas trouxe um prato para a morena enquanto Logan servia um copo de suco de laranja.
- Desse jeito eu vou me sentir uma inválida.
- Desmaio não é brincadeira, querida. Você precisa se alimentar melhor.
- Já disse que não foi por causa da alimentação, eu estou me alimentando bem.
- Sim, comendo como um passarinho.
- Nem tanto, ela come até bem, talvez seja pouca água.
- Será, Jon?
- Hei! Eu estou bem, aqui, e, estou bem. Foi só um lapso, gente, tá tudo bem.
- Ahham! - Foi o coro de reprovação que foi na direção da morena. Kimberly e Manu estavam cada uma distraídas nos próprios pensamentos.
Kimberly observava os movimentos de Sam, tentando constatar o que fez Adam se apaixonar por ela tão perdidamente. Era linda como uma boneca, realmente, tinha grandes olhos castanhos escuros, longos cabelos castanhos ondulados, o nariz arrebitado e os lábios cheios, mas isso existe aos montes. Havia um brilho diferente nela. Algo que fazia com que a atenção da sala se voltasse para ela assim que entrava. Algo que faria qualquer pessoa ceder a vez para ela falar.
Talvez tenha sido isso que Adam viu nela afinal. Uma mulher por quem valia a pena lutar.
Apesar dos protestos, Kimberly e Manu foram para o hotel da cidade, Jon queria que elas ficassem, Jaque também não mostrou objeção depois de ver Sam reagir bem à presença da pequena e indiferente à da mulher, mas, se sentindo rejeitada ela achou melhor ficar no hotel mesmo. Jon foi levá-las enquanto os residentes da pequena casa tinham o que comentar uns com os outros.
- Logan, você realmente não sabia dela?
- Por tudo que é sagrado, Sam, eu não tinha ideia. Era um segredo muito bem guardado da parte do Adam e do Jon, eu nunca nem havia ouvido falar em alguma colega de curso dele chamada Kimberly.
- Você não mentiria pra mim, não é?
- Claro que não, Jaque. Estou dizendo, nunca ouvi nem mesmo falar nelas.
- E o fato de ela conhecer Jon só leva a crer que realmente eles se conheciam antes, porque será que ele teve tanta dificuldade para encontrá-las?
- Talvez eles se conhecessem mas, sempre houvessem ficado distantes, Adam separava muito as partes da vida dele.
- Sim, e, amanhã a pobrezinha vai conhecer Ellen.
- O que houve entre vocês, afinal? Foi isso que te fez desmaiar?
- Em parte. Ela é uma bruxa. Veio me pedir o meu anel de noivado...
Durante alguns dos minutos seguintes, Sam contou para a amiga tudo o que aconteceu em seu encontro com Ellen e a forma como havia finalizado. Enquanto isso, do outro lado da cidade, Jon estava com Manu chutando a parte traseira de seu banco e sorrindo para ela, cantavam juntos uma música infantil.
- Você leva jeito com crianças.
- Eu trabalho para elas e por elas... Não faria sentido se não levasse.
- Você se surpreenderia com a forma como as pessoas fazem algumas coisas apenas pelo lucro. Eu sei...
- Não conseguiria agir assim, e, ademais, eu amo crianças. De verdade. Acredito que tenha sido um dos motivos de Adam ter me escolhido ao invés de Logan.
- Ele escolheu muito bem, você sempre se deu bem com Manu. E, a julgar pela sua interação com Samanta, você está apaixonado por ela, correto?
Sem graça e com as bochechas vermelhas, ele apenas começou a prestar atenção na estrada. Ainda fugia do seu conhecimento, como todos pareciam perceber que ele faria das tripas coração por ela, e, ela parecia ignorante a tudo o que ele sentia. Seus sentimentos se chocavam uns contra os outros varrendo quaisquer sombras de racionalidade para um lugar escuso. Ele nunca saberia o que era o amor real, se não houvesse cruzado caminhos com ela.
A verdade é que independente do conhecimento dela, Jon sempre faria de tudo para vê-la feliz, antes isso significava não disputar seu amor com Adam, atualmente era amenizar os golpes que a vida daria duramente nela. Seus dedos prenderam ainda mais no volante e foi a hora de ele começar a direcionar o assunto para campos mais seguros.
- Amanhã vai levar Manu para conhecer Ellen, não é?
- Oh, sim, a terrível mãe de Adam. Como ela é afinal?
- Bom, terrível em noventa por cento do tempo. Mas, há nela alguma consideração pelo que concerne ao Adam e à vida dele de forma geral. Ele foi com certeza o único amor daquela mulher, independente dos dois maridos que teve, o filho era a única coisa que realmente importava para ela.
- Entendo.
- Mas, não se preocupe, ela vai amar Manu, assim como todos nós amamos. Ela só precisa de tempo para conhece-la melhor e você vai ver como vão se dar bem.
Pelo menos era o que ele esperava. Jonathan não era um dos maiores fãs de Ellen, ela realmente podia ser uma pedra no sapato de qualquer um e a julgar por tudo o que ele viu Samantha passar durante a vida, sabia que ela não engoliria a história de seu filhinho prodígio ter tido uma filha e ela não ter sido comunicada.
- Porque demorou tanto a entrar em contato?
- Geralmente Adam é quem me procurava para falar sobre Manu. Quando se passaram dois meses desde a última visita, pensei que algo poderia estar errado, então liguei e mandei mensagens, mas, sem o retorno dele, eu não tomei nenhuma atitude. Agora que sei o porque ele não ter respondido, fico triste, poderia ter dado à Manu a chance de se despedir dele.
Jonathan entendia. Nesta altura da vida, ainda sentia falta de seu pai como se ele tivesse falecido ontem... Mesmo já fazendo quase vinte anos. A única lembrança que ele tinha do pai, era o álbum de fotos que a mãe lhe deu assim que completou dez anos. Jon não tinha ideia de como aquilo havia sobrevivido tanto tempo, mas, lá estava. O mesmo sorriso, os mesmos olhos, o cabelo preto e rebelde apontando para cima como o de um bad boy.
- Deveria ter conseguido encontrar vocês antes, em parte é minha culpa vocês não terem visto ele antes de ser enterrado. Fui comunicado poucas horas depois do acidente. Mas, eu não conseguia pensar direito e tinha a Sam que ficou catatônica... Enfim.
- Não se culpe por isso, você sabe como ele nos escondia bem... E, como ninguém sabia, não há culpa.
- Qualquer dia falaremos melhor sobre isso. Poderia ter me procurado, você sabia onde eu estava...
- Não quis te incomodar, Adam sempre disse que você só deveria ser acionado em caso de ele sumir por seis meses.
Tudo emaranhado como a teia de uma aranha, se não estivesse frustrado com as mentiras, Jon estaria perplexo pela complexidade das histórias que Adam contava e como seus planos eram bem amarrados. Seus olhos foram para o letreiro do hotel. A senhora sorridente atrás do balcão lhe era familiar, porém ele não se lembrava exatamente de onde a vira. Como havia se mudado da cidade há tantos anos, talvez fosse apenas uma lembrança da infância... Alguém que fez parte de sua vida enquanto ainda morava em Saratoga.
- Boa noite. Preciso de um quarto duplo, por gentileza.
- Uma cama de casal e uma de solteiro?
- Não, senhora. Duas camas de solteiro.
- Jon... A Manu gosta de dormir comigo, se tiver um quarto com uma cama de casal, prefiro.
- Temos sim, senhora. Só um momento.
Enquanto a senhora foi verificar os registros, ele pegou a mala do carro e colocou a seus pés, Manu começava a demonstrar cansaço e já queria cama.
- Ei, não durma ainda... vai perder toda a diversão.
- Como assim, tio Jon?
- Vamos tomar um banho gostoso e o tio vai ler uma história para você ainda. Não durma, raio de sol...
- Meu pai me chamava assim.
Os pequenos olhos azuis cheios de lágrimas encararam Jon e ele só pôde pegá-la no colo e ninar até que ela deixasse de ter aquela expressão pidona.
- Porque meu pai não veio ainda? Estou com saudade dele.
- Amanhã falamos sobre isso... Ok?
- Certo.
- O quarto está pronto, número 12 no segundo andar.
- Obrigado, senhora. Vou subir com elas e já vou embora.
- Não precisa se apressar, filho. Está tudo bem.
- Obrigado!
De banho tomado, história lida e assim que Kimberly saiu do chuveiro, Jon olhou para ela, sem entender como Adam poderia ter cometido o erro de engravidá-la quando tinha Samantha nas mãos. Ele não conseguia compreender, porém, não queria julgar também, então mudou a linha de pensamentos para um terreno mais assertivo.
- Precisamos contar à Manu, ela está fazendo perguntas e vai querer respostas o mais breve possível.
- Sim, mas... Adam era o herói dela, não sei como dizer que ele não virá mais aos seus aniversários ou que não a levará mais para passear... Isso dói demais em mim, mas, não posso dizer.
- Pensaremos em algo a esse respeito. Você a conhece melhor que ninguém, e, é uma mãe incrível, sei que quando for a hora você saberá.
Sorrindo para o homem, sem saber como agradecer, deu um beijo em sua bochecha e se despediram. Amanhã seria um dia intenso e ela não tinha certeza de como gostaria de encará-lo.
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