13

Beniamino

Eu sabia o que acontecia em sua vida, mesmo antes de ouvi-la dizer. Ainda assim, senti o estômago amargo quando as palavras corajosas exalaram de seus lábios. Ela não falava, não por temer por si, mas pelas pessoas que gostava. Talvez por isso nunca criava um vínculo, temerosa de trazer a desgraça sobre outro alguém.

Deus, viver sua vida deve ter sido um pesadelo. Apesar de todos os defeitos de Paolo, quando ele estava incomodado comigo, ele batia em mim, não nos meus irmãos, não onde machucaria mais.

Não sou seu filho biológico, tenho certeza disso, porque sou diferente dos meus irmãos. Eles são mais... sofisticados, aristocráticos. Eu me assemelho a um bruto, de formas gigantes. Sempre me perguntei com quem minha mãe dormiu. Mesmo assim, Paolo me tratou igual aos outros. Era duro quando queria ser, era até gentil quando queria. E mesmo quando era duro, sempre dizia, após uma surra, que estava ensinando uma lição porque se não o fizesse, seus inimigos fariam quando pusessem a mão em mim. E não me deixariam vivo.

Eu considerava Paolo Carbone meu pai, mesmo diante de todos os horríveis e cruéis defeitos. Ele era temeroso com as mulheres. Cruel com os homens. Mas, foi protetor com os filhos dentro da sua possibilidade.

Romagna foi pior com a filha dele. Submeter Chiara a uma vida de silêncio... Como eu faria para quebrar isso?

— Um cigarro, Senhor? — Juan acende um ao meu lado, enquanto se encosta na SUV escura.

Nego, sem vontade de fumar.

— Eles estão atrasados — resmungo ao meu parceiro.

Estamos na ponte da Boca Del Rio. Há uma loja de mariscos perto e o cheiro característico incomoda meu estômago. O lugar está vazio, pouca gente andando até os barcos ancorados. Há algumas mansões do lado contrário a água, e um homem de bicicleta cruza por nós.

Nosso olhar bate por um segundo. Depois, ele segue seu rumo. Percebo que Juan põe discretamente a mão no coldre, pronto para um embate, mas não acredito que Filippo seja burro o suficiente para criar uma armadilha.

Não agora.

— O barco saiu de Galveston ontem — murmurei a Juan. — Eles viajaram longe da encosta. Devia levar mais tempo, mas Filippo garantiu que sua nova lancha faz o trajeto em um dia.

— E o senhor vai esperar?

— Não tenho nada para fazer, você tem?

Andamos novamente pelo cais. O Oviedo era bonito para caramba e eu pensei que um dia talvez quisesse morar ali. Ou colocar uma das minhas mulheres ali, para poder aproveitar o ambiente.

Quando finalmente percebemos o iate de Filippo se aproximando, aguardamos que atracasse e subimos a bordo. Um dos homens de armas de Filippo me cumprimentou discretamente.

— Desculpe o atraso. Problemas — resumiu.

— No golfo?

— Vicenzo já sabe, senhor. Quando cruzamos perto de PortLand nosso barco foi atacado.

— Como escaparam?

— Fomos mar adentro. Não podia perder a chance de pegar essas armas — ele resumiu tudo. — Onde estão?

— Num caminhão perto daqui. Protegidas. Não foi fácil conseguir. Com as disputas no Oriente Médio, quem fabrica está focando em fornecer para lá. Ganham mais com isso.

— Sei disso. Mas, meu senhor quer o oeste do Canadá. Ele precisa de armamento para isso.

Eu sabia.

— Onde está meu dinheiro?

— Tudo em maletas em notas contadas no porão. É muito dinheiro, precisamos de uma guarda maior para tirarmos daqui.

Assenti. Não precisei dizer nada para que Juan puxasse o celular e começasse a conversar do outro lado da linha com meus soldados.

— E como vai Chiara Romagna? — o homem indagou.

Percebi um tom de carinho em sua voz. Acredito que Chiara era bem quista dentro do clã.

— Ela é Chiara Carbone, agora.

— Oh, sim... sinto muito se o ofendi. Apenas, a senhora era muito querida por todos. Certa vez levei um tiro, e havia pessoas do FBI aguardando na emergência, não podia ir para lá. Cheguei entre a vida e a morte até a casa em Montreal, e a senhora removeu a bala e cuidou da ferida. — Ele levantou levemente a blusa, mostrando a marca na barriga. — Não fosse a senhora, eu não estaria aqui hoje. Por falar nisso, peço licença um momento.

Entendi que ele estava indo buscar algo. Aguardei, e quando ele retornou, tinha uma bolsa consigo.

— Olivia mandou. Coisas que a senhora esqueceu. Seus livros de cura, suas anotações de ervas.

Todo o tom do homem era extremamente respeitoso.

— Obrigado — disse, pegando a sacola de pano.

Começa o movimento do lado do barco. Posso ver carros se aproximando. São Lupis Sanguinaris, e minha tranquilidade também expõe isso ao homem de Filippo.

— Capo Filippo quer saber quando conseguirá mais armas? — ele pergunta.

— Por quê?

— Ele está conseguindo um acordo com os Sérvios.

— Seria uma boa ajudá-los nisso. A bratva está tentando tomar meu território.

— Como somos da mesma famiglia agora, pode contar conosco para expulsá-los.

Sabia disso. Esse foi um dos motivos de ter me casado com Chiara.

— Fico feliz em ouvir isso.

— Se tudo der certo, teremos paz em breve. Avançando sobre o território de Vicenzo Carbone, expulsando os russos...

Ele puxou um cigarro. Posso ver a movimentação agora do caminhão. Um entra e saí dos meus homens e dos homens Romagna. Nem eu nem o homem de armas de Filippo fizemos nenhum gesto para ajudar. Apenas assistimos enquanto eles zanzavam com caixas de madeira.

— Para mim não basta avançar no território de Vicenzo. Eu quero a cabeça dele em uma bandeja. Não descansarei até vê-lo morto. Nenhum de meus irmãos aceitaria menos que isso.

— Eu entendo — ele dá uma tragada.

A dor pelo que aconteceu a Caterina destrói nossa honra há muitos anos. Sei que a culpa recai mais sobre Dominus, mas eu não me sinto menos incomodado por saber que minha irmã foi estuprada dentro do grupo de Vicenzo.

As caixas com dinheiro começam a subir do porão. Juan acena para mim. Ele conferiu algumas delas. O pé de cabra em sua mão denota isso. O dinheiro começa a substituir as armas dentro do caminhão.

— Quantos caixotes?

— Vinte e cinco.

— Certo...

Ele deu outra tragada.

— Soubemos a Colômbia está perdendo território para a Venezuela.

— Com o governo protegendo o narcotráfico é de estranhar que Nico ainda consiga suster boa parte do seu território.

— Filippo quer saber se deve se preparar para uma guerra no Sul, em breve.

Eu também me perguntava isso. Dei um tapinha amistoso no homem, não tinha uma resposta e isso ficou claro.

O cigarro dele terminou exatamente no momento que as caixas foram substituídas.

— Conseguiu o caminhão de combustível?

Só então ele pareceu se lembrar que havia mais em nosso acordo de troca de favores.

— Claro. Está apenas esperando esse caminhão sair para se aproximar. Tudo discreto, sem chamar a atenção.

Houve um cumprimento formal, e então me despedi. O caminhão com o dinheiro já havia partido, protegido por uma frota enorme dos meus soldados. Eu caminhei até minha caminhonete, Juan estava ali, ao meu aguardo. Não falamos nada enquanto ele abria a porta e eu entrava.

Quando o carro partiu, eu abri a sacola. Havia mais que livros de ervas lá. Um diário fofo, com detalhes cor de rosa surgiu diante dos meus olhos. Quis abrir, mas não tive coragem. Então o guardei. Era estranho pensar que minha esposa já foi uma adolescente...

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