Capítulo 05.


Gabriela não fala, Gabriela não sorri, Gabriela quase não anda. Quero matar o Georgio. Olho por cima do ombro, mas eles já sumiram de vista. A garota do meu lado é até bonita, mas não é o tipo do Georgio. Meu irmão precisa de uma garota firme, assim aprende a não fazer as outras de idiotas. Gabriela Rocco é uma moça simpática, mas não muito inteligente. Em dez minutos descubro que não faz nada além de ir ao shopping e ao salão de beleza, isso explica os cabelos lindos e as roupas caras.

— Então você é a dona dos hotéis D'angelo? — Ela estica os lábios em um sorriso de interesse e eu quero revirar meus olhos.

— Sim. — Mexo meu café enquanto ela ainda me olha especulativa. — Minha família é. — Acrescento para que ela saiba que a herança é dividida em seis, isso porque somos todos solteiros.

— Hum. — Gabriela claramente se interessa, o gelato esquecido em suas mãos. — Então Georgio é rico? — Sua voz irritante soa quase incrédula.

Lanço a ela um olhar irritado e a garota se encolhe. É salva quando meu irmão e Logan atravessam a porta. Seus olhos me procuram e ele sorri quando me encontra. Estou com o estômago cheio de borboletas e me sinto um pouco nervosa.

Nós quase nos beijamos. É incrível e um pouco assustador, não sei, sei que eu queria e acho que teria gostado. Meu irmão está sempre atrapalhando. Fecho a cara para ele quando ele se senta do meu lado, praticamente corre para tomar o lugar de Logan.

— Então, o que conversaram? — Questiono a Georgio e estou pronta para espalhar aquele vídeo ridículo que ele fez aos quatorze anos. É bom que ele e Fabrizio sejam gêmeos, posso ameaçar os dois à vontade de uma vez só.

— Nada demais, Sissa. — Me responde de forma simples e desinteressada. Falso igual os dinheirinhos de papel que eu tinha quando criança. Ele pega o meu café sem vergonha nenhuma, mesmo sob meu olhar incrédulo. — Só 'tava contando pro Logan o que aconteceu com Guido Salvatore. — Meu irmão me olha petulante e eu estreito os olhos, sem acreditar que ele fez mesmo isso.

Mas Georgio sustenta meu olhar, dá pra ver que está de picuinha comigo e realmente não acredito em sua ousadia. Me levanto da mesa, puxando Logan pelo braço. — Não fale mais comigo, Georgio. — Rosno as palavras para meu irmão e junto do estrangeiro, deixamos o lugar.

Odeio a história com Guido Salvatore.

Meu maior trauma, minha vergonha eterna. Odeio.

Com quinze anos me apaixonei por Guido, ele não era muito italiano, tinha uma coisa esquisita de querer ser francês, mas com quinze anos eu achava isso super charmoso. Me apaixonei demais por ele. Odeio isso, minha vergonha foi quando quis ter minha primeira vez com Guido.

Claro que meus irmãos quiseram atrapalhar. Foi um horror. Georgio, Fabrizio montaram uma história horrenda para Enzo e Bernardo, que Guido estava me seduzindo e me induzindo a transar com ele. Enzo pegou Guido de calças no chão e eu de peitos de fora, foi a pior experiência da minha vida. Nunca passei tanta vergonha.

Depois disso foi difícil ter um namorado no colégio. Ninguém queria ficar com a garota dos irmãos malucos. Enzo pegou Guido pelo colarinho, estava totalmente furioso. Me deixou de castigo por cinco semanas seguidas, nem podia ver a Tony, além dele ter brigado com ela também, sobre ser tão irresponsável quanto eu por me acobertar nessa história.

Bernardo ficou bem chateado, foi bem pior que qualquer coisa receber aquele olhar decepcionado. Antes dez castigos de Enzo do que um olhar do Bernardo, mas no fim ele sentou-se e conversou sobre eu merecer algo melhor de um cara. Guido já tinha dezoito anos e só não recebeu um processo de Enzo porque seus pais se desculparam e agiram como se eu fosse a pobre e inocente garota sem noção, o que eu meio que era, mas é válido que eu queria fazer sexo com Guido. Tudo bem, eu tinha meio que um cérebro de frango na idade, mas era consensual de toda forma. Foi a situação mais constrangedora que já passei, somado tudo a puberdade e a revolta da adolescência. Passei quase dois meses sem falar com ninguém além de vovô. Meu trauma se chama Guido Salvatore, nem de perto eu quero que Logan saiba sobre essa história horrível.

— Alessia! — Eu paro quando Logan me puxa para si. Suas mãos vão para meu rosto e ele fica surpreso, só então percebo que fiquei tão nervosa que já estou quase chorando.

Odeio chorar na frente dos outros. Mas é uma triste verdade que meus nervos estão diretamente ligados aos dutos lagrimais.

— Calma, tudo bem. — Ele acaricia meu rosto com o polegar. — Seu irmão não me contou nada.

— Não? — É quase um choque para mim. Pisco, procurando em seu rosto sinais de mentira, mas não tem nenhum.

— Não. É verdade, ele não disse. Não disse nada, me deixou falando sozinho e saiu. Acho que só queria nos afastar.

Suspiro aliviada. É bom que não tenha falado, mas odeio ainda assim a insinuação do meu irmão. Foi desnecessário e cruel. Logan ainda está me encarando, dá pra ver sua preocupação e fico envergonhada.

— Já passou. — Sorrio para tranquiliza-lo. — É coisa minha e dos meus irmãos. — Faço um gesto de descaso e Logan assente, ainda desconfiado. — Bem, obrigada pelo sorvete, Logan.

— Certo. De nada. — Logan assente novamente e sei que ficamos em um clima meio estranho, pelo quase beijo, eu acho. — Boa noite, Alessia.

Eu sorrio. — Boa noite, Logan. — Dou as costas a ele, seguindo em direção a minha casa. Marcos, um dos seguranças está cantarolando alguma música quando passo por ele.

— Boa noite senhorita D'angelo. — Ele balança a cabeça respeitosamente e eu sorrio. Nem parece que me viu crescer, é sempre muito formal.

— Boa noite Marcos. Está por aqui hoje?

Marcos geralmente fica na nossa casa de campo, que está mais no interior de Verona, San Pietro. Nós gostamos de passar as férias por lá, fora desse tempo a casa fica ocupada por funcionários, como Marcos e Mercia, que foi minha babá por muitos anos. Além de algumas famílias da empresa que Enzo instala por lá, funcionários de anos que moram nas nossas terras sem nenhum custo.

— Fui solicitado pelo senhor D'angelo. — Marcos explica e eu assinto, um pouco curiosa. Era bem raro Enzo tirar os seguranças de San Pietro, normalmente ele sempre contava com os rapazes daqui de Verona mesmo. Eu até tinha mais intimidade com Giovanne, que estava sempre levando meu irmão de um lado para o outro.

Quando entro em casa, Fabrizio está esparramado na sala de estar, mal me olha quando entro e acho que isso se deve ao celular que ele digita furiosamente alguma mensagem. Eu sigo para a biblioteca, onde sei que encontrarei vovô.

Ele sempre está lá lendo algum livro sobre o velho oeste. Vovô adora um romance bem antigo cheio de drama e emoção, quando entro, ele está concentrado, sentadinho em sua poltrona favorita e eu o entendo, a biblioteca é minha parte favorita da casa também. Eu me sento no tapete, ao seu lado e apoio minha cabeça em seus joelhos.

Vovô silenciosamente faz um afago em meus cabelos e eu suspiro, apoiando meus braços sobre sua perna.

— O que foi querida?

— Nada vovô.

Ouço uma risadinha e sorrio com nostalgia. Vovô abaixa o livro e me encara com as sobrancelhas arqueadas.

— Lembro quando era uma garotinha. Algo dava errado e você sempre vinha se deitar em minhas pernas...

— Você me perguntava sempre 'o que foi querida?' não sei como sabia que algo me incomodava, vovô.

Ele solta outra risada baixa. — Porque eu bem que te conheço, garota. Você sempre dizia 'não foi nada vovô'. Mas sempre é algo.

— É mesmo. — Concordo um pouco chateada. — É que Georgio ameaçou contar ao Logan a história com Guido.

— Oh. — Exclamou vovô compreensivo. — E você se sentiu mal?

— Sim vovô, ele é um estranho. Georgio não pode nem de longe sair contando isso aos outros só para se mostrar.

Vovô acaricia meus cabelos. — Sei que ele não fez por mal, querida.

— Independente. — Eu murmuro quase sonolenta pelo afago. — O que ele fez foi mal, sendo intencional ou não.

— Vou conversar com ele. — Prometeu vovô. — Que acha de fazermos uma viagem pra Villa essa semana?

— Não sei vovô. As crianças tem um recital em breve...

— Querida. — Vovô me repreende e sei que realmente quer que eu vá. — Vai ter um casamento em nosso hotel em San Pietro, sabe que estou velho, preciso de companhia.

— Tudo bem vovô. Podemos sair quando voltar do estúdio, tudo bem?

— Maravilhoso. — Ele sorri abertamente e eu me levanto, dando um beijo em sua bochecha. — Amo você.

— Também amo você, vovô. Apesar de ser muito atrevido.

Vovô bufa inconformado e eu rio, saindo da sala. Georgio ainda não havia voltado, Bernardo não estava em casa e Enzo eu nem esperava encontrar. Já eram quase nove horas e não sei se ele ainda estava no escritório ou se estava com alguma mulher por aí.

Com Enzo nunca se sabe, afinal.

Na manhã seguinte, esperei até um pouco antes do horário para ver se Logan iria bater em minha porta, mas não houve sinal algum dele e dei a espera por encerrada. Sai vinte minutos atrasada para chegar a aula de balé, um pouco decepcionada por ele ter desistido da visita, mas o recado foi entendido, de toda forma era melhor assim. Quando cheguei ao estúdio, havia uma fileira de mães impacientes e crianças ansiosas, sorri e beijei cada uma delas, desculpando-me com suas mães.

Do outro lado da rua meus olhos flagraram um homem encostado em um carro de luxo preto. Era conhecido por mim, já o havia visto uma ou duas vezes aqui em frente. Sempre durante a entrada e saída, talvez fosse algum acompanhante. Meus olhos contaram cada uma das crianças, em dúvida se seria algum pai ou avô, mas estavam todas certinhas, nenhum aluno novo. Ele sustentou meu olhar, mesmo quando eu o encarei e dei de ombros, caminhando para dentro com os pequenos e dando aquele momento esquisito por encerrado.

Minha aula como sempre foi divertida e produtiva, eu amava as crianças e era um privilégio que elas me amassem de volta. Cada uma tinha sua peculiaridade, seu próprio jeitinho de ser e de amar, em especial a pequena Rita. Rita era filha de um italiano e uma mexicana, os pais faleceram e agora ela morava com a avó materna. Abuelita. Achava uma graça como ela sempre chamava a avó. Eu me sentia ligada com Rita, pela nossa história ser tão parecida, por isso cuidaria pessoalmente para que ela tivesse a oportunidade de crescer e continuar estudando o balé, enquanto quisesse. Afinal, ser rica tem que servir para alguma coisa.

Quando cheguei em casa, vovô já estava com as malas prontas e eu somente separei alguns documentos, nós íamos tanto a San Pietro, que eu preferia deixar um guarda-roupa completo por lá mesmo.

— Pronta, querida? — Vovô gritou do andar debaixo e eu puxei a malinha de mão.

— Não tem ninguém em casa, vovô?

Meu avô revirou os olhos.

— Aqueles paspalhos dos meus netos... — Bufou. — Venha, vamos, vou deixar toda minha herança pra você e deserdá-los. Nem para se despedirem...

— Acho que está realmente velho vovô. — Eu comento entrando no lado do motorista.

Recebo um olhar atravessado e quero rir de sua cara. — O que quer dizer?

— Está reclamando como um velho. — Pontuo seriamente, olhando-o de rabo de olho.

— Menina abusada. — Ele reclama outra vez e rio. — Só por isso vai daqui até San Pietro ouvindo música velha.

Suspiro teatralmente e nós sorrimos um para o outro. E realmente, durante as duas horas de carro vovô me faz ouvir uma seleção mista de músicas dos anos '60. Desliga o som quando chegamos ao condado de San Pietro e pegamos a pequena estradinha de terra que vai nos levar a Villa D'angelo. Quando passamos em frente ao hotel, podemos ver que está uma bagunça, muita agitação e funcionários apressados. Mal encontro espaço para estacionar, então vovô e eu decidimos seguir até a vila antes de qualquer coisa, tem uma casa na vila que foi construída exclusivamente para o nosso uso. É bem menor que o hotel, mas ainda é uma casa grande demais para só nossa família.

Sigo dirigindo pela estrada até chegar a mansão e quando estaciono em frente, Mercia rapidamente surge na porta, os cabelos estão presos em um coque bem feito e ela usa roupas coloridas como sempre. Sorrio com carinho, abraçando-a cheia de saudade.

— Menina! Olha só você, está muito magra! – Sua voz é severa mas cheia de amor. Eu rio. – Vem, eu preparei uma macarronada maravilhosa, agora pouco. Está divina! Você também, Lorenzo, venha comer!

— Mulher, eu preciso emagrecer. – Vovô praticamente rosna as palavras, no entanto sem deixar de seguir a governanta.

— Essa barriga não vai embora nem com mágica, Lorenzo. – É a resposta atravessada de Mercia. Logo um dos rapazes tiram nossas coisas do carro e nós seguimos minha babá.

— Precisamos ir até o hotel.

Ela revira os olhos, faz um gesto negativo com os dedos. – Comida primeiro, trabalho depois. – Ordena seriamente.

Nós concordamos, é claro, não somos loucos de discutir com Mércia e nem de recusar sua comida.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top