Capítulo Vinte - Penelope
"PENELOPE, PELO AMOR DE CRISTO, você pode ficar quieta? Eu nunca vou conseguir terminar de abotoar seu vestido se continuar se mexendo desse jeito!"
Forcei-me a ficar parada ao ouvir a repreensão de Margot, mas era tão difícil! Sentia como se minhas pernas estivessem formigando, me impelindo a mover de um lado para o outro.
"Estou ansiosa", disse baixinho, começando a erguer a mão para o meu cabelo, mas sendo impedida por um tapinha de Margot no último segundo. "Você acha que sua família vai gostar da festa?"
"Agora é tarde demais para pensar nisso, não é?", a princesa disse, enquanto lutava contra os botões do meu vestido. "A essa altura já estão todos no salão de bailes."
Eu mordi o lábio inferior com força. Minha barriga já estava dando voltas.
"Penny, relaxa. Por que eles não gostariam da festa? Tudo está maravilhoso! Não se esqueça de que foi a gente que organizou tudo."
"É por isso mesmo que estou nervosa. Quero que todos gostem e se divirtam."
Margot ficou em silêncio por um instante e eu a ouvi prender a respiração.
"Terminei!", ela exclamou satisfeita, saindo de trás de mim. Ela segurou minha cintura e me fez andar pelo quarto, nos colocando de frente para o espelho. "Penelope, olha só para gente. Já viu coisa mais perfeita no mundo?"
Eu ri e baixei os olhos, mas Margot ergueu meu queixo de leve e fez com que eu olhasse para a minha imagem refletida no espelho.
Ok, eu tinha mesmo de admitir... Estava me sentindo linda.
O vestido lilás que ia até o chão tinha um caimento leve e etéreo. Quando eu me mexia, mais parecia que estava flutuando. Eu não fazia ideia de quantos botões havia nas costas do vestido – muitos a julgar pela impaciência de Margot ao abotoá-los – mas eles faziam com que a frente ficasse bem justa e valorizasse os meus seios. Eu estava usando saltos altos e meu cabelo tinha sido ondulado e produzido por uma cabeleireira incrível, que tinha vindo mais cedo com toda a sua equipe para embelezar as mulheres do palácio.
Me olhando pronta pela primeira vez, achava que nunca tinha estado tão bonita.
"Você tem razão. Estamos mesmo muito lindas. Jane arrasou", disse, me referindo à costureira do palácio que tinha feito os nossos vestidos. Margot, por sua vez, estava usando vermelho escarlate e a cada mínimo movimento a saia de seu vestido parecia cintilar.
O olhar da princesa se encontrou com o meu pelo espelho e nós sorrimos uma para a outra. Me sentia aliviada ao saber que não estaria sozinha lá embaixo com tantas pessoas que eu mal conhecia.
Naquele momento ouvi uma batida de leve na porta do quarto. Antes que eu pudesse atender, Layla entrou com Eloise nos braços, seguida pela prima de Margot, Alexia, e sua namorada.
Alexia e Lily tinham chegado há alguns dias ao palácio, antes do restante da família do rei, que tinham aparecido aos montes na quinta-feira durante o café da manhã. Eu não sabia como aquilo era possível, mas já me considerava muito amiga de Alexia e Lily. Assim como Layla, elas eram muito gentis e divertidas, e Alexia era tão enérgica e parecida com Margot que era impossível se sentir retraída por muito tempo estando perto dela.
"Penelope, seu vestido é lindo!", Eloise disse assim que me viu, pulando do colo da mãe e vindo até mim. A princesinha passou a mão pela saia do meu vestido e me olhou de olhos arregalados. "Você está parecendo uma fada!"
"E você uma princesa", eu disse rindo, me agachando para ajeitar a presilha prateada que afastava a franja de Eloise dos olhos. "Você é a mais bonita de todas."
"Todos já estão lá embaixo", Alexia falou, ajeitando o decote de seu vestido preto. "Nós já podemos ir? Estou morrendo de fome e vi pela escada que tem uma mesa cheia de coisas por lá!"
"Alexia!", Lily disse com um sorriso encabulado. "Você só pensa em comer?"
"Só metade do tempo, querida. Na outra metade eu penso em você", ela disse com um brilho travesso nos olhos.
Margot soltou uma gargalhada.
"Não sei se isso foi brega ou bonitinho. Você bem que consegue misturar as duas coisas, Alex."
"É claro que consigo."
"Acho melhor nós irmos logo", Layla disse animada, pegando Eloise pela mão e nos olhando com um grande sorriso. "Eu não quero perder as melhores músicas! A orquestra que contratamos... Eles são perfeitos!"
Antes de descer para o salão, mandei uma mensagem rápida para Sam. Disse que estava indo para ao baile e enviei uma foto que tinha tirado mais cedo da mesa de doces. Ele provavelmente me mandaria um áudio indignado dizendo como eu era malvada por lhe passar vontade daquele jeito, mas quando se é a irmã mais nova, você tem de aproveitar os momentos em que pode irritar os mais velhos sem levar um cascudo.
Eu tinha dito ao meu pai e a Sam que eles seriam muito bem-vindos no castelo para o baile, mas os dois estavam atolados no trabalho e já tinham compromissos marcados durante todo aquele dia. Era uma pena... Eu já estava sentindo muito a falta deles.
Eu e minhas amigas saímos do quarto em seguida. Nossos vestidos farfalhavam enquanto andávamos e cada uma ajeitava um último detalhe da maquiagem ou do cabelo. Layla não parava de danar com Eloise, que uma hora estava correndo pelos corredores como louca, lhe arrastando pela mão, e na outra pulando por aí e amarrotando o vestido.
"Filhos...", ela sussurrou para mim com um sorrisinho cansado. "Quando você acha que eles já superaram uma fase, vem outra mil vezes pior."
"Se te consola, ela nunca vai te dar tantas dores de cabeça como eu dei para o meu pai", eu disse. "Já te contei que quebrei alguma parte do corpo pelo menos quatro vezes?"
Layla me olhou de olhos arregalados e se virou para Eloise, que nos olhava atenta e bem quieta pela primeira vez desde que tínhamos saído do quarto.
"Você nem ouse seguir esse exemplo, mocinha."
Nós estávamos quase chegando até a escadaria que levava ao salão de bailes quando paramos assustadas. Tia Matilde tinha surgido pela curva do corredor, segurando suas saias cor de vinho com uma mão e agitando o leque com a outra. Ela sorriu de maneira gentil para Layla e as outras e se colocou ao meu lado.
"Pensei que não chegaria nunca mais!", ela sussurrou para mim, se abanando com tanta força que o vento fez meu cabelo balançar. "Não sabe que é de péssimo tom chegar atrasada?"
"Layla está atrasada", eu disse tranquila, sorrindo para tia Matilde.
"Mas ela é a futura rainha! A futura rainha faz o que bem entende."
"Então eu bem que queria ser uma futura rainha...", sussurrei, revirando os olhos.
"O que você disse, Penelope?"
"Que Eloise está uma gracinha", disse. "A senhora não acha?"
Tia Matilde me olhou desconfiada, mas como já tinha alguns problemas auditivos, deixou aquela passar. Graças a Deus.
Quando finalmente chegamos ao salão de bailes, muitas das pessoas lá embaixo paravam o que estavam fazendo para olhar para nós. Era mesmo uma festa íntima, então não havia ninguém no topo da escadaria para anunciar nossos nomes. Para mim, aquilo era uma benção.
Eu já tinha visto como tinha ficado o salão de bailes mais cedo, quando Layla, Margot, Alexia, Lily e eu ajudamos a criadagem a deixar tudo pronto para a noite, mas, mesmo assim, parei um segundo para admirar.
O salão estava coberto de luzes. Tínhamos colocado castiçais em pedestais altos junto às paredes e as chamas das velas tremulavam levemente, conferindo ao ambiente um aspecto mais íntimo e confortável. Os lustres no teto reluziam tanto quanto as estrelas que podiam ser vistas no céu noturno do lado de fora, já que tanto as cortinas quanto as janelas estavam abertas para que o ar da noite entrasse. Havia rosas, muitas e muitas rosas, vermelhas e brancas, espalhadas em grandes vasos na mesa cheia de pratos deliciosos, junto às paredes e aos pés da escadaria. Mesinhas delicadas e circulares estavam dispostas em locais estratégicos, cobertas com toalhas brancas de renda. Ah! E eu não podia me esquecer do piano enorme em um dos cantos do salão, perto de onde a orquestra tocava... Margot tinha dito que algumas tias e primos gostavam muito de tocar, por isso sugeriu que colocássemos o piano ali caso alguém quisesse se aventurar mais tarde.
O lugar estava mesmo muito lindo. Me sentia orgulhosa do trabalho que tínhamos feito.
Eu, tia Matilde e minhas amigas descemos lentamente as escadarias. Eu estava tão deslumbrada com o ambiente que nem me preocupei em perder o equilíbrio e sair rolando escada abaixo. Acho que a presença tranquilizadora e confiante de Margot ao meu lado também contribuiu para aquilo.
"Tudo está maravilhoso", eu ouvi uma voz dizer ao meu lado quando cheguei até o salão. Quase dei um pulo para trás quando me deparei com o rosto gentil do rei. "Devo dizer que não esperava tudo isso."
"O senhor sempre me subestima, papai", disse Margot com um meio sorriso, jogando uma mecha de cabelo sobre o ombro enquanto olhava para o rei. "Eu não sempre digo que puxei do senhor o dom para a perfeição e eficiência?"
"É verdade. Deus quisesse que você tivesse aplicado seus dons para a perfeição e eficiência durante a infância... Talvez assim tivesse evitado a quase morte de muitos professores."
O príncipe Steven, que já se aproximava de nós, soltou uma risada.
"Você pediu por essa, Margot."
"Fique quieto, engomadinho."
Enquanto Steven e Margot se implicavam como só irmãos sabem se implicar, eu passei os olhos ansiosa pelo lugar. Se não estivesse enganada, havia um príncipe faltando.
Meu coração deu um pulo no peito quando enfim vi Sebastian afastado em um canto do salão. Ele parecia estar conversando com uma de suas tias, mas como se sentisse o meu olhar nele, voltou-se para mim.
Eu abri um largo sorriso e acenei para ele despistadamente. Sebastian soltou uma risadinha e abriu um sorriso de lado.
"Eu já venho para ficar com a senhora, tia", sussurrei para tia Matilde, já me afastando dela.
"É bom mesmo! Eu tenho de te apresentar ao sobrinho do rei. Ele é filho da duquesa Elinor e tem a sua idade! Talvez você consiga fisgá-lo e..."
"Tia!", exclamei, sentindo as bochechas queimarem. Olhei para o lado para me certificar de que ninguém tinha nos ouvido. "Isso é ridículo. Não estamos mais no século XIX para que eu tenha que fisgar um garoto."
"Mas ele é um ótimo partido... Você se daria muito bem."
A situação era tão ridícula que eu comecei a rir.
"Estou muito bem do jeito que estou, obrigada."
"Mas..."
Antes que ela pudesse dizer mais qualquer coisa, eu me afastei, seguindo Sebastian que àquela altura já tinha se despedido da tia e se enfiado em um canto do salão.
"E então, está sendo tão ruim quanto você pensava?", foi a primeira coisa que eu disse quando o alcancei.
"Eu acabei de chegar. Ainda não tenho um veredito final. Mas a comida está muito boa, isso eu tenho de admitir."
Eu ri.
"Bom, eu não fiquei responsável por essa parte, então não posso me vangloriar por causa dela."
Sebastian sorriu e eu percebi quando seus olhos castanhos repararam no meu vestido. Não sei por que, mas de repente me endireitei e desejei que minha maquiagem continuasse tão bonita quanto estava uma hora e meia antes.
"Você está... ótima", ele disse com um sorrisinho, coçando a cabeça. "Muito mesmo."
"Você também não está nada mal, Alteza. Seus ternos são sempre tão bem passados assim?" Sebastian olhou para a própria roupa no mesmo instante, mas eu soltei uma gargalhada. "Estou brincando com você."
"Engraçadinha..."
Naquele instante eu vi tia Matilde esquadrilhando o salão com os olhos, provavelmente à minha procura. Eu gemi e me enfiei atrás de um vaso de rosas, fazendo sinal para que Sebastian se aproximasse também.
"Parece que tem alguém te procurando", ele provocou, erguendo as sobrancelhas para mim.
Eu soltei um suspiro pesado.
"Eu sei", disse. "Tia Matilde quer me apresentar para um desses seus primos nobres... Pretende que eu fisgue o pobre coitado. Dá para acreditar?!"
Sebastian franziu o cenho e arriscou um olhar rápido para o salão de bailes.
"Ela deve estar falando de Geoffrey. Ele é..." Sebastian pareceu pensar por um instante. "Bem desagradável na maior parte das vezes."
Eu soltei um gemido baixo e comecei a estalar os dedos, nervosa.
"Eu vou é morrer de vergonha! Tia Matilde parece ter um prazer enorme em me enfiar em situações constrangedoras." Eu suspirei quando a orquestra começou a tocar uma música particularmente romântica e alguns casais se reuniram para dançar no centro do salão. Steven pegou a mão de Layla e a puxou para a pista junto com Eloise, que riu e dançou entre o pai e a mãe.
Naquele instante um garçom passou perto de mim, equilibrando uma bandeja prateada com taças cheias de champanhe.
Eu hesitei, mas foi só por um segundo.
"Com licença..." Eu parei o garçom e peguei uma taça, virando um gole não tão modesto na garganta antes que pudesse pensar demais.
Como eu não estava habituada a beber, comecei a tossir assim que o líquido desceu por minha garganta. Sebastian deu tapinhas nas minhas costas.
"Isso aí tem uma quantidade considerável de álcool", ele disse. "Você está acostumada a beber?"
"Não", respondi quando consegui recobrar o ar. "Mas acho que vou precisar de algumas taças para conseguir sobreviver à noite."
Sebastian me olhou meio desconfiado.
"Tenho permissão de rir de você se ficar bêbada?"
"Eu não vou ficar bêbada", disse, em seguida girando o líquido na taça e arriscando um gole mais tímido daquela vez. Até que não era tão ruim assim... "Talvez eu só fique um pouco mais desinibida..."
"Você já é desinibida, Penelope."
"Você acha?"
"Você fez amizade com a maior parte da minha família na mesma manhã que eles chegaram aqui. E eles geralmente são bem contidos."
Eu pensei no meu encontro com todos aqueles nobres na manhã anterior. Eles não tinham sido mesmo tão ruins quanto eu pensava, mas ainda não me sentia à vontade com eles como me sentia com Layla ou Alexia por exemplo.
"Não fiz amizade com o tal Geoffrey", disse. "Se tivesse feito, talvez pudesse pedir a ele que me livrasse dessa dizendo a tia Matilde que está comprometido."
"Acho que você perdeu a sua chance."
"Penelope!" Me encolhi quando os olhos de lince de tia Matilde me encontraram a alguns metros de distância. Ela veio na minha direção rapidamente, abanando o leque e distribuindo sorrisinhos discretos a cada pessoa que cruzava seu caminho.
"Por favor, não me abandone", pedi para Sebastian, sabendo que agora seria meio difícil fugir.
"Não sei se vou conseguir te ajudar a escapar dela..."
"E quem é que consegue?"
Sebastian me olhou com um sorrisinho de lado, os olhos castanhos faiscando.
"Não vai ser tão ruim assim."
"Você acha?"
Uma hora e meia depois e eu me joguei em uma cadeira próxima sem cerimônia. Eu não conseguia dar mais um passo com aqueles saltos altos, quanto muito dançar...
Parei um garçom e peguei mais uma taça de champanhe.
"Ah, Penelope, ele não parece estar interessado em você?", matracou tia Matilde no meu ouvido, enquanto eu dava um gole da minha bebida. "E é tão educado! Não é um exímio cavalheiro? Seu pai ficará muito feliz quando eu contar que você dançou com o filho da duquesa três vezes."
"É claro...", respondi vagamente. Eu tinha a impressão de que quem não estava tão feliz assim era Geoffrey, já que eu tinha pisado em seu pé uma quantidade considerável de vezes. Pelo menos ele tinha sido educado o suficiente para não dizer nada. "Mas não acho que ele esteja muito interessado, tia."
"Como não? Ele não para de olhar para você!"
Eu ergui os olhos para o sobrinho do rei, que era mesmo educado, mas muito enfadonho. Ele não estava olhando para mim, na verdade, eu desconfiava que se dirigia para a ponta mais distante do salão, onde não teria de tentar se esquivar das indiretas da minha tia a respeito de como eu adorava dançar.
"Com licença?", eu ouvi uma voz próxima dizer. Ergui os olhos e me deparei com Margot, que estava acompanhada de um homem mais velho e grisalho. "Srta. Beverley, creio que não tive a oportunidade de lhe apresentar o meu professor de francês, Sr. Thomas Hooper. Ele me dá aulas há alguns anos e somos grandes amigos."
O homem, que estava vestido impecavelmente e exibia um sorriso ofuscante, se inclinou um pouco e depositou um beijinho na mão enluvada de tia Matilde.
"É um prazer conhecê-la, mademoiselle."
Tia Matilde soltou uma risadinha e abriu seu leque, abanando-se com vigor.
"O prazer é todo meu, senhor."
Podia ser só impressão minha, mas eu podia jurar que as bochechas de tia Matilde enrubesceram de leve quando o tal Sr. Hooper a convidou para dançar. Eu tive de beber um gole do champanhe para sufocar a risada que ameaçava subir pela minha garganta ao perceber o olhar encantado da minha tia.
"Ah, mas eu não danço há tantos anos...", ela tentou objetar, prendendo uma mecha solta do penteado atrás da orelha.
"Mais um motivo para aceitar. É quase um crime que uma dama como a senhorita fique sentada durante toda a festa sem se divertir."
"Ora, se o senhor insiste... Penelope, querida, eu já volto."
Ela deixou o leque sobre a mesa e aceitou a mão estendida do Sr. Hooper, que a guiou para o centro do salão.
Eu ergui os olhos para Margot, que olhava para os dois com um ar zombeteiro.
"Eu estou te devendo uma", disse. "De verdade."
"Ah, eu vou me lembrar disso", ela me respondeu com um sorriso travesso. "Thomas é um amor de pessoa e aceitou de boa vontade quando o chamei para vir conhecer a sua tia. Espero que ela seja mais agradável com ele do que é com você..." Nós rimos e alguns primos mais novos de Margot surgiram naquele instante, puxando-a para a mesa de doces. "Eu já volto!"
A observei se afastar. Perto da mesa, vi Sebastian com Eloise no colo. Ele parecia estar contando algo para ela, que o olhava com muita atenção e ria animada vez ou outra. Girei minha taça na mão e sorri enquanto o observava.
"Ele é um jovem maravilhoso", ouvi uma voz dizer naquele instante. Eu dei um pulinho no lugar e ergui os olhos, me deparando com uma mulher de cabelos cacheados e elegantemente vestida parada ao meu lado. Ela também encarava Sebastian. "E também é louco pela sobrinha. Sempre que ela vem ao palácio, passa horas com ela."
"Você conhece o príncipe?", perguntei, pois já tinha notado que ela estava falando comigo.
"Sou a fisioterapeuta dele", a mulher disse, virando-se para mim com um sorriso. "Posso?", ela perguntou, indicando a cadeira que tia Matilde acabara de desocupar.
"Claro!"
Ela se acomodou, bebendo um gole de seu champanhe antes de se apresentar.
"Sou Isabel. Desculpe ter chegado assim de repente. Se não estou enganada, você é Penelope, certo?"
"Isso mesmo", disse. "Como você..."
"Ah, Sebastian vem falando muito de você", ela disse com um sorrisinho. "Pensei que nos encontraríamos qualquer dia desses nos corredores do castelo, mas acabou não acontecendo. É um prazer finalmente conhecê-la."
"O prazer é todo meu", respondi. Me remexi na cadeira, inclinando-me um pouco para a mulher à minha frente. "Desculpe, mas... Sebastian fala de mim?", perguntei, pois de jeito nenhum conseguiria conter a curiosidade a respeito daquilo.
Isabel soltou uma risada.
"Bastante, quando consigo incitá-lo a falar durante nossas sessões. O garoto é dado a longos silêncios e isso às vezes me deixa louca!"
Eu ri, sabendo que ela estava certa. Sebastian não era mesmo de falar muito.
"Você o conhece há muito tempo?", perguntei.
"Desde que ele tinha doze anos, eu acho."
"Puxa, é bastante tempo! Vocês devem ser próximos."
"Se quer saber, quase o considero como parte da família. Depois de conviver tanto com uma pessoa, é impossível não se afeiçoar a ela. Também me dou muito bem com Margot. Quando comecei aqui, ela costumava passar todo o tempo ao lado de Sebastian durante as sessões."
Certa melancolia me invadiu quando imaginei um Sebastian mais novo durante uma sessão de fisioterapia enquanto Margot permanecia ao seu lado.
Eu engoli em seco e ergui os olhos para Isabel.
"Desculpe, é claro que você não precisa me responder de não quiser, ou puder, aliás, mal nos conhecemos. Mas... Sebastian, ele tem qualquer chance de..."
Eu hesitei.
"Voltar a andar?", Isabel perguntou com delicadeza. Eu assenti devagar. "Bom, a ciência ainda não encontrou um modo de regenerar a medula efetivamente... É claro que esse cenário pode mudar daqui alguns anos, mas como profissional de fisioterapia, o que posso dizer é que na minha área o que fazemos é tentar diminuir ao máximo as sequelas desse tipo de lesão e tentar dar uma vida melhor e mais confortável aos pacientes."
Eu assenti e olhei para Sebastian, que continuava brincando com Eloise. Me lembrei de como ele pareceu incomodado nas ruas de Arthenia, como parecia hesitante em sair de casa...
"Deve ser muito difícil", confessei baixinho, "estar em uma situação como essa."
Isabel suspirou.
"Não é fácil. Acredito que a parte mais complicada de quando passamos por situações difíceis seja controlar nossas emoções e pensamentos para que eles não nos consumam. Nem sempre é fácil, mas acho que tudo fica bem melhor quando temos as pessoas certas ao nosso lado. Sempre pensei que nada tem o poder de nos influenciar tanto quanto as pessoas que escolhemos manter por perto, tanto para o bem quanto para o mal." Isabel então olhou para mim e abriu um pequeno sorriso. "Sabe, eu não devia estar te dizendo isso, mas pelo que Sebastian vem me falando de você, acredito que seja uma boa pessoa, Penelope. Acho que a sua amizade é muito importante para ele. Conheço Sebastian há muito tempo e sei que ele não deixa qualquer um se aproximar com facilidade. Você está fazendo bem a ele."
Eu não soube o que dizer, mas naquele momento foi como se algo muito bom e quente se espalhasse pelo meu peito. Eu sorri e olhei para Sebastian, que em tão pouco tempo tinha feito mais por mim do que qualquer outra pessoa fora da minha família.
"Ele também me faz muito bem", confessei sem medo. Talvez fosse o efeito daquele champanhe, mas de repente eu não conseguia parar de sorrir. Nem dava a mínima por estar revelando aquilo para uma mulher que acabara de conhecer. "Me faz bem de um jeito que... Não consigo explicar."
Isabel sorriu para mim e apertou minha mão de leve.
"Posso ver que você não parece ser alguém que o magoaria."
"Não faria isso com uma pessoa que gosto", disse no mesmo instante, estranhando as palavras dela. Porém, antes que pudesse dizer qualquer coisa, Isabel falou:
"Se me dá licença, deixei meu marido esperando na mesa. Foi ótimo te conhecer, Penelope."
Ela então se afastou, lançando um sorriso rápido e gentil para mim antes de se virar.
Sem me dar conta do que estava fazendo, me levantei da mesa também e comecei a atravessar o salão na direção de Sebastian. Eloise já tinha desaparecido pela multidão, brincando com outras crianças, e decidi que ele parecia sozinho e isolado demais naquele canto, quieto e longe de todo mundo.
Eu estava quase chegando até ele quando Margot surgiu, me pegando pela mão.
"Você disse que tocava piano, não é? Que tal nos mostrar um pouco do seu talento?"
"Eu não sei se essa é uma boa ideia...", disse, tentando me esquivar dela, mas Margot já tinha me feito sentar diante do piano antes que eu pudesse dizer qualquer coisa. "Eu não sou tão boa assim."
"Com certeza é melhor que qualquer um que tenha o sobrenome Arthenia", ela disse. "Minhas tias dão o seu melhor, mas são um verdadeiro desastre nessa coisa. Você pode tocar a música mais romântica que conhece?"
Eu franzi as sobrancelhas para ela, me perguntando o que estava acontecendo. Margot bufou e se inclinou para mim, sussurrando no meu ouvido:
"Eu ia te contar mais cedo, mas acabei me esquecendo. Sabe Alexia?"
"É claro que sei."
"Ela vai pedir Lilian em casamento e eu quero criar um clima especial."
Não consegui disfarçar meu choque. Levei uma mão à boca, mas o gesto rápido foi o bastante para me deixar zonza.
Droga... Quanto de champanhe eu tinha bebido?
"É sério?"
"É claro que é sério! Olhe só para Alexia, ela está tão tensa que não sei como Lilian ainda não perguntou o que há de errado com ela."
Eu vasculhei a multidão com os olhos e encontrei Alexia ao lado da namorada, que ria e conversava com Layla e Steven.
"Eu não quero ser a responsável por arruinar um pedido de casamento com uma música horrível diante de toda a sua família", falei. "Droga, Margot, caso não tenha percebido, eu já passei um pouco da minha cota de champanhe e duvido muito que vou conseguir tocar algo coisa que preste com os dedos lentos desse jeito."
"Eu acho que você precisa é de mais champanhe. Pessoas bêbadas não ficam assim tão preocupadas com o que qualquer um possa pensar delas." A princesa pegou uma taça de um garçom que passava por perto e me fez dar um gole. "Está se sentindo mais confiante agora?"
"Não."
"Que pena, mas pelas minhas contas você está me devendo um favor, o que não te deixa outra escolha senão fazer o que eu pedir. Já vou dar o sinal para Alexia. Obrigada por isso, você é incrível!"
Ela me deu um beijo no rosto e rapidamente escapuliu do meu alcance, me deixando com vontade de jogar um daqueles vasos de rosas na cabeça dela.
Me virei para o piano e respirei fundo, me obrigando a ficar calma.
"Vai ser emocionante", pensei comigo mesma. "Quem não gostaria de tocar durante um pedido de casamento? Vai ser lindo."
Me obriguei a respirar fundo e pousei os dedos nas teclas com leveza, tentando olhar as coisas pelo lado positivo. Poderia ser pior, eu ainda podia estar aguentando tia Matilde me empurrando na direção de cada garoto solteiro da nobreza.
"Margot sempre consegue o que quer", ouvi uma voz familiar dizer perto de mim. "Não dá para fugir dela."
Eu ergui os olhos e sorri para Sebastian, que tinha se aproximado sem que eu o notasse.
"Bom, eu a estava devendo um favor. É melhor pagá-lo agora antes que ela tenha mais tempo para pensar sobre isso e acabe me pedindo algo dez vezes pior."
Sebastian riu e ajeitou os óculos daquele jeito dele. Algo em mim se remexeu.
Voltei os olhos para o piano e fitei as teclas. Vasculhei minha mente em busca de uma canção bonita, mas nada surgiu. Na verdade... Eu hesitei antes de tocar a primeira nota, mas assim que o som surgiu, ecoando pelo salão, vi que não tinha outra escolha a não ser continuar.
A orquestra parou de tocar e eu me concentrei no piano. Fechei os olhos e deixei com que a música me guiasse, que penetrasse fundo na minha alma e tocasse o meu coração.
Enquanto estivesse ali, envolta pelo som, estava em paz. Nada poderia me atingir, não havia nada que me preocupasse.
Notei que o salão tinha ficado em absoluto silêncio enquanto eu tocava, mas não deixei que aquilo me intimidasse. Continuei buscando as teclas, tocando o melhor que podia apesar da névoa que lentamente tomava conta dos meus pensamentos.
Quando enfim a canção terminou, eu abri os olhos e a primeira coisa que vi foram os olhos do príncipe me encarando. Ele sorriu e eu retribuí.
"Não conheço essa música", ele disse baixinho.
"É porque fui eu quem compôs."
Antes que ele pudesse me responder, vi Alexia segurar a mão de Lily e puxá-la para o centro do salão. Instintivamente, segurei o braço de Sebastian. Era tão emocionante!
"Nós nos conhecemos há muito tempo", ouvi Alexia dizer, sua voz ressoando pelo local em completo silêncio. "Quando te vi pela primeira vez naquele Natal, de algum modo, soube que era você. Eu ainda não sabia daquilo na época, mas conforme os anos se passaram, essa sensação só cresceu mais e mais dentro de mim, de um modo que eu nem sei como explicar." Observei quando Lilian levou uma mão aos olhos, parecendo tentar conter as lágrimas que ameaçavam rolar por suas bochechas. Me perguntei se ela já sabia o que estava acontecendo. "Lily, você sabe que sou péssima com palavras, por mais que tenha o hábito de falar demais..." As duas riram e eu percebi o quanto Alexia estava emocionada também. "Você sabe como eu te amo, sabe como é importante para mim, por isso, aproveitando que estamos aqui cercadas por tantas pessoas que amamos, eu queria saber..." E ela juntou as saias com uma mão, se ajoelhou no chão e revelou uma caixinha vermelha, na qual um anel delicado e brilhante se encontrava. "Você gostaria de ser minha esposa?"
Lilian chorava tanto que eu duvidava que qualquer um fosse conseguir ouvir sua resposta, mas todos entenderam quando ela assentiu e ergueu Alexia para envolvê-la em um abraço.
Vivas soaram de todos os lugares. Vi Eloise pular no lugar empolgada e Margot olhar para a cena com um misto de orgulho e satisfação. Todos começaram a aplaudir quando Alexia deslizou o anel pelo dedo de Lilian.
Naquele momento percebi que apesar de serem da nobreza de Steinorth e carregarem tantos títulos importantes, aquelas pessoas não passavam de uma família normal e repleta de carinho e amor como todas as outras.
A orquestra então começou a tocar uma música animada. Várias pessoas se aproximaram para dar os parabéns a elas, em seguida voltando para o centro do salão para dançarem. Perto das escadarias, vi tia Matilde conversando com Sr. Hooper, enquanto enrolava uma mecha do cabelo na ponta do dedo e ria a cada palavra que ele dizia.
Olhei para Sebastian e percebi que ele encarava o centro do salão, onde todos dançavam. Vi Geoffrey tirar Margot para uma dança.
"Estou pensando em escapar um pouco", eu disse casualmente, me sentindo muito corajosa e confiante enquanto me levantava do banco em frente ao piano. "Quer vir junto?"
Sebastian me olhou e ergueu as sobrancelhas, mas havia um pequeno sorriso em seus lábios.
"Onde?"
"Qualquer lugar. O castelo é grande demais, não vamos nos limitar."
"Tem certeza de que não quer ficar? Sabe, eu conversei com Geoffrey antes de você começar a tocar e ele disse que gostou de você. Talvez te convide para outra dança quando terminar com Margot."
"Ah, não acho que ele vá fazer isso. Na verdade, eu pisei tanto no pé dele que me surpreende que ainda esteja conseguindo andar sem mancar."
Sebastian riu e balançou a cabeça. Eu fiz menção de ir até às portas do salão.
"Você vem?"
Ele me olhou por um longo segundo. Daria qualquer coisa para ler seus pensamentos naquele instante, mas no fim aquilo não importou, pois ele guiou a cadeira de rodas para perto de mim e me olhou.
"Tudo bem. Eu te mostro o caminho."
Eu sorri e deixei que Sebastian me conduzisse para fora do salão de bailes.
_____________________❤️________________
Oii gente! Tudo bem com vocês?
Esse capítulo ficou gigante e eu demorei mil anos para escrever e revisar tudo, mas estou feliz e acho que deixei do jeitinho que queria para vocês <3
Me contem aqui nos comentários o que acharam desse capítulo! Estou muito ansiosa para ler tudinho!
Notícia boa: o capítulo vinte e um já está quase totalmente escrito e pretendo postá-lo na quarta ou na quinta, por isso fiquem ligados para não perderem o que aconteceu depois que a Penny e o Sebastian deixaram o salão! Ahh, muito amor eu já garanto...
Outra coisa é que se você ainda não sabe, estou postando uma nova história aqui na plataforma chamada Invisible String! Vou amar te ter por lá.
Muitos e muitos beijos e até logo!
Ceci.
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