Capítulo 26 Beijo inesperado e culpa

Omar

Eu não sabia exatamente como aquilo havia começado. Um segundo estávamos rindo, Emanuelle fazendo caretas para o Heitor, e no outro, ela tropeçou no tapete enquanto tentava pegá-lo de volta do meu colo. Instintivamente, segurei sua cintura para evitar que caísse. O riso morreu na garganta dela, os olhos arregalados, tão próximos dos meus que eu podia contar cada detalhe dourado que brilhava em sua íris.

O mundo ao nosso redor pareceu desaparecer. Tudo o que existia era o calor do seu corpo contra o meu, a respiração acelerada que se misturava com a minha. Os lábios dela estavam tão perto... Um movimento mínimo e eu poderia...

Foi automático. Inclinei-me sem pensar, meu coração batendo tão forte que eu mal conseguia ouvir outra coisa. Quando nossos lábios se tocaram, foi como se o tempo parasse. Suave no início, hesitante, quase como se ambos estivéssemos tentando entender se aquilo estava realmente acontecendo. Então ela correspondeu, seus lábios se movendo contra os meus com uma suavidade que me fez perder o fôlego.

Um pequeno gemido escapou da sua boca, e eu a puxei ainda mais para perto, sentindo seus dedos se agarrarem à minha camisa, como se precisasse de algo para se apoiar. O beijo se aprofundou, meu coração disparando enquanto meu corpo reagia à proximidade, ao calor que emanava dela. Tudo parecia tão certo, tão natural, como se tivéssemos sido feitos para aquele momento.

De repente, Heitor fez um som, um balbucio curioso que quebrou o feitiço. Emanuelle se afastou abruptamente, os olhos arregalados, a respiração ofegante. Eu estava tão atordoado que demorei um segundo para entender o que havia acontecido. Ela levou a mão à boca, os dedos trêmulos.

— Isso... Isso não deveria ter acontecido. — sua voz estava embargada, quase em um sussurro. 

Ela olhou para Heitor, que brincava inocentemente no tapete, completamente alheio ao turbilhão de emoções que nos envolvia.

— Emanuelle... — tentei falar, dar algum sentido ao que eu mesmo ainda estava processando, mas as palavras pareciam presas na minha garganta.

Ela deu um passo para trás, como se precisasse de distância. 

— Eu... eu sinto muito. Isso foi um erro. Não pode acontecer de novo. — seus olhos estavam cheios de arrependimento, mas havia algo mais ali, algo que ela estava tentando desesperadamente esconder.

— Você realmente acredita que foi um erro? — as palavras escaparam antes que eu pudesse impedi-las. Eu precisava saber. Precisava entender o que estava passando pela cabeça dela, porque para mim, aquele beijo havia sido tudo, menos um erro.

Ela fechou os olhos com força, como se lutar contra as próprias emoções fosse doloroso. 

— Omar, nós não podemos... Eu não posso... Isso vai complicar tudo. Não é certo. — havia uma súplica em sua voz, uma mistura de desejo e medo que me atingiu como um soco.

Eu queria gritar, dizer que nada fazia mais sentido do que aquele momento, do que aquele beijo. Que nada parecia mais certo do que ela em meus braços. Mas a dor em seus olhos me calou. Ela estava lutando contra algo muito maior do que eu podia entender naquele momento.

— Certo. — minha voz saiu rouca, e eu tive que limpar a garganta antes de continuar. — Se é assim que você quer... Não vai acontecer de novo.

Ela assentiu, parecendo aliviada e devastada ao mesmo tempo. 

— Obrigada... Eu... preciso de um tempo. — sem esperar resposta, virou-se e saiu da sala, seus passos rápidos ecoando no corredor.

Fiquei ali, parado, o gosto dos lábios dela ainda presente nos meus, o corpo quente onde ela havia estado segundos atrás. Olhei para Heitor, que agora tentava alcançar um brinquedo brilhante no tapete. Ele me olhou, um sorriso inocente no rosto, completamente alheio ao caos que sua mãe havia deixado para trás.

Meus joelhos fraquejaram, e eu me sentei no tapete ao lado dele, a mente girando enquanto tentava entender como um simples momento pôde mudar tudo. Passei a mão no cabelo, frustrado, o desejo de correr atrás dela queimando em mim. Mas eu prometi. Prometi que respeitaria sua decisão.

Peguei um dos brinquedos e o entreguei para Heitor, que riu animado, as mãozinhas batendo no objeto colorido. Tentei sorrir de volta, mas a dor no peito era esmagadora. Como eu seguiria em frente depois disso? Como poderia olhar para Emanuelle e fingir que nada havia acontecido?

— Você não torna as coisas fáceis, sabia? — sussurrei para o bebê, que riu, como se entendesse a ironia da situação. Eu o puxei para o meu colo, abraçando-o com força. Precisava de algo real para me manter ancorado, algo puro e inocente, diferente do turbilhão de emoções que estava me destruindo por dentro.

O silêncio na casa era opressor, cada segundo se arrastando enquanto eu tentava processar o que tinha acabado de acontecer. Como eu não percebi antes? Como não vi que estava me apaixonando por ela? O beijo só trouxe à tona o que eu estava tentando negar. Ela não era apenas a mãe adotiva de Heitor, por quem lutava pela guarda do pequeno. Ela era a mulher que fazia meu coração bater descontroladamente, que fazia o mundo ao meu redor desaparecer.

Mas para ela, aquilo foi um erro. Um deslize. Algo a ser esquecido.

Respirei fundo, tentando aliviar o nó na garganta. Precisava ser forte, por mim, por ela... e principalmente por Heitor. Prometi estar ali por eles, e não podia permitir que meus sentimentos complicassem as coisas. Se Emanuelle precisava de distância, eu daria. Se ela queria fingir que aquele beijo nunca aconteceu, eu respeitaria. Mesmo que isso me matasse por dentro.

Mas como eu seguiria em frente sabendo que experimentei o gosto da felicidade e tive que deixá-lo escapar?

Ouvi passos suaves no corredor. Meu corpo ficou tenso, os músculos enrijecendo enquanto a presença dela se aproximava. Tentei parecer tranquilo, jogando um brinquedo para Heitor enquanto fingia estar completamente concentrado na brincadeira.

Emanuelle entrou na sala com o rosto sereno, o mesmo sorriso leve que sempre usava. Como se nada tivesse acontecido. Ela se agachou ao lado de Heitor, seus dedos deslizando suavemente pelo cabelo do bebê enquanto pegava um dos brinquedos.

— Você está todo bagunçado, hein, mocinho? — sua voz estava alegre, calma. Se eu não soubesse o que aconteceu minutos atrás, acreditaria que ela estava totalmente despreocupada. Ela me olhou rapidamente, seus olhos mal encontrando os meus antes de voltar a atenção para o Heitor.

Eu senti um aperto no peito. Como ela podia fingir tão bem? Eu ainda estava tentando respirar direito, minha mente presa na lembrança daquele beijo, e ali estava ela, brincando com Heitor como se nada tivesse mudado. Como se o mundo não tivesse virado de cabeça para baixo.

Limpei a garganta, tentando manter a voz firme. 

— Ele tem energia pra dar e vender. Acho que vai ser atleta quando crescer. — me forcei a sorrir, torcendo para que não parecesse tão falso quanto eu sentia.

Ela riu suavemente, um som tão familiar, tão confortável, que quase me fez esquecer do turbilhão que eu estava sentindo. 

— Se puxar pra você, vai mesmo. — o comentário veio acompanhado de um sorriso casual, sem nenhum sinal de desconforto.

Meus dedos se apertaram contra o tapete. Ela estava realmente fingindo que nada aconteceu. Não havia hesitação em sua voz, nem aquele brilho de emoção que eu tinha visto logo após o beijo. Como ela conseguia fazer isso?

— Você é boa nisso. — As palavras escaparam antes que eu pudesse me controlar. Ela parou, os ombros ficando tensos por um segundo, mas recuperou rapidamente a compostura.

— Boa no quê? — ela fingiu inocência, seus olhos fixos em Heitor enquanto ajudava o bebê a empilhar alguns blocos coloridos.

Respirei fundo, tentando manter a calma. 

— Em agir como se nada tivesse acontecido. — minhas palavras saíram baixas, controladas, mas carregadas com todo o peso que eu estava sentindo.

Ela congelou por um momento, seus dedos parando no meio do movimento. Vi seu peito subir e descer em uma respiração profunda antes de finalmente me encarar. Seu olhar era firme, determinado. 

— Nada aconteceu, Omar. Não sei do que você está falando.

Eu ri, um som amargo que saiu antes que eu pudesse controlar. 

— Certo... Vamos fingir, então. Se é isso que você quer.

— É exatamente o que eu quero. — seu tom era firme, quase frio. Mas eu conseguia ver através daquela máscara. Havia algo mais ali, uma vulnerabilidade que ela tentava desesperadamente esconder.

Balancei a cabeça, sentindo um cansaço repentino. 

— Tudo bem, Emanuelle. Vamos fingir. — eu disse as palavras que ela queria ouvir, mas sabia que não conseguiria seguir em frente tão facilmente.

Ela me olhou por um segundo a mais, como se quisesse dizer algo, mas voltou a atenção para Heitor, pegando-o no colo com um sorriso brilhante. 

— Vamos trocar essa fralda, campeão. — sua voz estava alegre, natural. Uma atriz impecável no papel de mãe despreocupada.

Fiquei ali, observando enquanto ela saía da sala com Heitor nos braços, o bebê rindo animado. Ela estava realmente determinada a fingir que nada aconteceu. Que aquele beijo não significou nada.

O problema era que, para mim, aquele momento significou tudo.

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