Capítulo 18 Recusando proteção

Omar

Eu sabia exatamente quem havia jogado Emanuelle no meio daquele escândalo. Minha mãe. A mulher que me criou, mas que nunca hesitou em usar qualquer coisa como arma, até mesmo um neto que ela queria tanto conhecer. Eu deveria estar surpreso? Não. Mas estava furioso.

Dirigi até a casa de Emanuelle sem pensar duas vezes. Não era a primeira vez que batia naquela porta e sabia que, para ela, minha presença era tão bem-vinda quanto uma tempestade no meio de um funeral. Mas eu não podia deixá-la sozinha nisso.

Bati. Uma, duas, três vezes.

A porta se abriu com um tranco.

Emanuelle estava lá, com o olhar carregado de exaustão e raiva. Seu cabelo, geralmente impecável, caía desajeitado sobre os ombros. Aquele brilho feroz nos olhos dela me atingiu antes mesmo que ela dissesse uma palavra.

— Você tem coragem, hein? — a voz dela veio afiada como uma lâmina. — O que veio fazer aqui dessa vez?

— Eu sei quem foi.

Ela cruzou os braços.

— Claro que sabe. Você mesmo ou alguém do seu círculo nojento.

— Minha mãe. — soltei, direto. — Foi ela quem vazou a história.

O desprezo se intensificou no rosto de Emanuelle. Ela bufou, balançando a cabeça.

— E o que você quer que eu faça com essa informação, Omar? Que eu tenha pena de você? Que acredite que isso te faz menos culpado?

Dei um passo à frente, e ela imediatamente se afastou. Um reflexo automático. Isso me atingiu de uma forma que eu não esperava.

— Eu só quero que saiba que não foi um ataque aleatório. Foi pessoal. Ela quis te machucar.

— E conseguiu. Parabéns pra sua mãe. — ironizou. — Mas, sabe o que é pior? Quem abriu essa brecha para ela foi você. Você e sua covardia de não colocá-la em seu devido lugar. Heitor foi adotado legalmente e agora você e essa cobra-cascavel estão arruinando minha vida!

Engoli em seco. Eu sabia que merecia cada uma daquelas palavras, mas não era por isso que eu estava ali.

— Eu quero te ajudar.

A risada dela foi curta, sem humor algum.

— Você? Me ajudar? Você já fez o suficiente.

— Eu posso dar um jeito nisso. Conter a imprensa, desmentir algumas coisas.

Ela descruzou os braços e deu um passo em minha direção, dessa vez sem hesitação.

— Escuta bem, Omar. A sua existência já é o suficiente pra destruir tudo ao meu redor. Você acha mesmo que tem alguma coisa que possa fazer pra "consertar" isso? — fez aspas no ar. — Você é a causa. Você e sua família podre.

— Eu sei. E é por isso que eu quero compensar de alguma forma.

Ela riu outra vez, mas dessa vez havia algo a mais ali. Um cansaço misturado com incredulidade.

— Sabe o que me irrita mais nisso tudo? — seus olhos se estreitaram. — Você tem essa maldita facilidade em aparecer, falar qualquer coisa com essa cara de quem se acha no controle e, no fim, não muda nada. 

— Eu posso mudar as coisas.

Ela me encarou por um instante, como se buscasse qualquer sinal de verdade na minha afirmação. Então, negou com a cabeça.

— Você ainda acha que pode resolver tudo com dinheiro e influência. Mas tem coisas que você não pode apagar, por mais que tente.

Eu queria dizer que não era assim. Que meu desejo de protegê-la era genuíno. Mas eu sabia que ela tinha razão.

Ela suspirou, passando a mão no rosto, como se quisesse arrancar aquela conversa da pele.

— Vai embora, Omar.

— Não até você me ouvir.

— Eu já ouvi o suficiente! — sua voz subiu, cortando o ar entre nós. — Você não entende, não é? O simples fato de você estar aqui, na minha porta de novo, já é um problema!

— Emanuelle...

— Não! — ela ergueu a mão, mandando-me calar. — Você não tem esse direito. 

Eu sabia que ela estava certa. Mas ainda assim, eu não podia ir embora.

— Você pode me odiar o quanto quiser, mas eu não vou deixar você enfrentar isso sozinha.

Ela riu de novo, mas dessa vez seus olhos brilharam com algo diferente. Algo que me doeu ver.

— Omar, vai pra puta que te pariu e me deixa em paz!

O silêncio que veio depois disso pesava mais do que qualquer grito.

Eu a encarei, esperando que houvesse alguma brecha, algum espaço para redenção. Mas tudo o que encontrei foi uma porta se fechando na minha cara.

Eu saí da casa de Emanuelle com o peito apertado, cada passo me afastando de um momento que parecia uma sucessão de falhas minhas. Ela me destratou, e eu nem tentei contestar. Talvez, no fundo, eu soubesse que tinha razão. Mas, apesar da dor, ainda havia algo dentro de mim que não conseguia deixar de tentar. De querer corrigir o erro.

Dirigi até o hotel em que estava hospedado, sem um destino em mente, mas com a cabeça cheia. Cada curva no caminho me fazia questionar minhas escolhas, a situação com Emanuelle, a minha relação com a minha mãe. Ao chegar, entrei no quarto e, antes que qualquer outra coisa, peguei o celular e liguei para ela.

A chamada não demorou a ser atendida.

— O que você fez, mãe? — a voz saiu mais fria do que eu imaginava. Não tinha energia para ser suave.

Ela parecia calma, como sempre. Meu sangue começou a ferver só de ouvir a voz dela.

— O que você está falando, Omar? — perguntou, como se nada estivesse fora do normal.

— Estou falando do que você fez com Emanuelle. Expor a vida dela e a do meu filho para a mídia. Você não tem o direito de fazer isso! — as palavras saíram em um misto de raiva e frustração.

Minha mãe deu uma risada, aquela risada que eu sempre soube que precedia algo insuportável.

— E o que você queria que eu fizesse, hein? Eu precisava fazer algo. O meu neto não pode ser criado por uma mulher que não tem o mesmo sangue que ele.

Fiquei em silêncio por um momento. Não conseguia acreditar no que estava ouvindo.

— Você... você está falando sério? Está falando como se fosse normal interferir assim, destruir uma vida por causa de um laço sanguíneo? — minha voz ficou mais grave, carregada de um desprezo que eu sabia que ela não entenderia.

Ela não se abalou. Nunca se abalou.

— Claro que estou falando sério, Omar! Ela teve o azar de adotar o bebê errado! Esse bebê pertence à nossa família, é nosso! Você não entende isso? — a frieza na voz dela ficou ainda mais nítida. — Eu não vou deixar o meu neto crescer com uma mulher qualquer, sem nenhum vínculo de sangue com ele.

Aquelas palavras me cortaram como uma lâmina. Minha cabeça girava, o estômago revirava. Como ela podia ser assim? Eu nunca percebi o quanto ela era capaz de ir longe em nome do que chamava de "família". Ela não via o amor, o cuidado, o laço de afeto que Emanuelle e meu filho construíram entre si. Para ela, só o sangue importava.

— Você não tem ideia do que fez! — quase gritei, mas me segurei. Eu já estava exausto de tentar fazer ela entender.

— Eu fiz o que era certo, Omar. Sou a única que se importa com o que é melhor para o meu neto. Você vai ver, vai perceber que eu estava certa. E quando isso acontecer, você vai me agradecer. — Ela falava como se estivesse falando com um estúpido, como se não soubesse que eu já a conhecia o suficiente para saber o que se passava na cabeça dela.

Eu não consegui mais ouvir. A raiva era tão intensa que eu não consegui articular mais palavras. Olhei para o celular, agora quente na minha mão. Sem pensar duas vezes, desliguei na cara dela.

O som do clique do desligar foi como um alívio momentâneo, mas a verdade ainda me martelava por dentro. Ela não mudaria, nunca. E eu, no fundo, sabia que nem eu poderia fazer muita coisa para reverter isso. 

Meu filho estava sendo tratado como uma posse. Algo que ela queria de volta, sem se importar com quem já o tinha dado um lar. E, de alguma forma, eu era tão responsável quanto ela. 

Sentei na cama, a mente turbilhonando. Cada palavra trocada com minha mãe me fazia sentir mais sujo. Eu queria que as coisas fossem diferentes, mas sabia que não havia caminho fácil. 

Olhei pela janela do hotel, mas nada parecia reconfortante. A cidade lá fora continuava sua rotina, alheia a tudo que estava acontecendo comigo. Eu poderia sumir, desaparecer, mas o peso de tudo que aconteceu não desapareceria tão facilmente.

Mas o que fazer agora?

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