Capítulo 5 - Sonho ou pesadelo?
Houve dias em que acordei abruptamente, um tanto assustado. Todas as vezes ela estava tão perto. Conseguia até sentir sua respiração, seu cheiro. Ah... Teu cheiro. Tão inebriante. A pior parte era acordar e perceber, que por mais uma vez era apenas um sonho. Era como se escapasse por entre meus dedos e eu não pudesse fazer nada.
Já havia se passado uma semana desde que voltei para casa, e mesmo que a lembrança da morte de meu pai e o sentimento de luto estivesse muito presente em mim, aquela já era a quarta noite seguida em que eu
sonhava com a Laís. Eu ainda não havia tomado nenhuma decisão em relação a ir em busca dela ou não, e talvez fosse isso que tivesse me provocando esses sonhos e até mesmo pesadelos.
Em uma das noites em que sonhei com ela, ela estava mais linda do que nunca. Seu rosto já era de uma mulher crescida, diferente daquela garota a qual me apaixonei seis anos atrás, e que conseguiu a proeza de me deixar mais apaixonado seis anos após. Seus cabelos continuavam louros como se fossem banhados a ouro toda manhã, lisos e compridos. Sua pele branca como leite, deixando suas bochechas visivelmente vermelhas ao primeiro sinal de vergonha. Aqueles olhos verdes como esmeraldas, mas claros e transparentes como as águas do Caribe capazes de me permitir enxergar sua alma, junto daquele sorriso fatal...fizeram minhas pernas bambearem ao vê-la vindo em minha direção, vestida naquele mesmo vestidinho florido de quando nos conhecemos. Ela se aproximava cada vez mais, e a cada passo que ela dava, era como se eu estivesse a conhecendo de novo. A sensação era a mesma. Eu estava me apaixonando mais uma vez, e pela mesma garota, que agora havia se tornado a mulher mais linda a qual eu já havia sonhado. Mas esse sonho se tornava um pesadelo quando de repente surgia um cara e a beijava bem na minha frente, me fazendo acordar totalmente assustado, com aquela sensação de realismo, que aquilo tinha acontecido de fato. Sabe quando você sonha e parece que aquilo realmente aconteceu? Pois então, acho que você pode me entender. Era assim que eu me sentia. E eu precisava fazer alguma coisa, ou eu continuaria tendo esses sonhos e pesadelos por mais não sei quanto tempo.
Resolvi tomar um banho para tentar afastar as lembranças daquele pesadelo horrível, lavar os resquícios daquilo que vinha me assombrando nos últimos dias.
Após sair do banho, encontrei minha mãe tomando café, e então fui acometido a uma lembrança de infância. Lembrei que ela sempre tomava café antes do almoço, e fiquei surpreso ao ver que ela ainda mantinha esse costume. Mas algo além do hábito dela me chamou atenção. A expressão dela. Ela estava com uma expressão vazia no rosto. A xícara ia até seus lábios e voltava a pousar na mesa repetidas vezes, mas sua expressão continuava a mesma. Vazia. Como se fosse algum robô programado para fazer aquilo no modo automático. E então percebi o quanto ela devia estar se sentindo a falta de meu pai. Há quanto tempo ela não devia sair de casa? O dia estava tão bonito... O que custava levá-la para passear por aí em volta da cidade? Um pouco de diversão não mata ninguém, ao contrário de ficar só em casa tomando café... E acho que até mesmo eu precisava sair um pouco. Eu estava na mesma cidade, mas ao mesmo tempo numa nova cidade. Eu precisava conhecer tudo de novo que a cidade tinha para me oferecer. Agora só restava convencer minha mãe a vir comigo.
- Mãe? - a chamei com cuidado para não assusta-la.
Aos poucos ela pareceu ter notado minha presença e ter despertado do transe.
- Oi, meu filho! Está com fome? O almoço já está pronto há um bom tempo, mas eu não quis te acordar. Você estava dormindo tão profundamente... - ela puxou uma cadeira para que eu pudesse sentar.
Também notei que ela não tinha perdido outro costume, ela continuava me mimando como se eu ainda tivesse sete anos. Mas não posso negar que no fundo eu sentia saudade desse carinho de mãe.
- Estou, sim, mãe - respondi sorrindo.
Logo ela voltou trazendo minha comida favorita, novamente me acometendo a lembranças de minha infância. Ela preparou o seu famoso Macarrão com salsicha, e como se não bastasse ela trouxe um copo cheinho de suco de maracujá. Como eu senti falta desse mimo...
Estava realmente tudo muito delicioso, nada melhor do que nossa comida favorita acompanhada do nosso suco favorito. Mas meu foco naquele momento era outro: tirar minha mãe de casa para um passeio.
- Mãe... - comecei devagar. - Eu vi na televisão que inauguraram uma nova praça não muito longe daqui... O que a senhora acha de me acompanhar num passeio?
- Não, obrigada! - negou prontamente, me deixando até meio atordoado.
- Por que não? A senhora não saiu de casa desde que voltei. A senhora merece se divertir um pouco - tentei argumentar.
- Porque não, Lucas. Eu não quero - ela pareceu ter se aborrecido.
E quando ela me chama de Lucas é porque o negócio tá sério... Mas no fundo eu sabia o porquê dela estar assim. A morte do meu pai com certeza a afetou profundamente e talvez fosse isso que a deixou, assim, tão relutante para sair de casa. Eu não podia deixar aquilo continuar. Já que a culpa de tudo isso estar acontecendo era minha, eu precisava fazer algo...
- Não, mãe. Não aceito seu não como resposta. A senhora precisa passear e a senhora vai passear comigo. A senhora tem uma hora para se arrumar e se não estiver pronta até lá, vou te levar do jeito que estiver - então cruzei os braços e me joguei no sofá. Provavelmente fiquei parecendo um garotinho fazendo birra quando quer algo. Mas se para tirar minha mãe de casa eu precisava parecer uma criança mimada e imatura, não me importaria em prestar esse papel.
Ao contrário do que pensei, achando que ela ia voltar a se recusar a ir, contrariando totalmente minhas expectativas, ela simplesmente foi para seu quarto e trancou a porta. E eu só torcia para que ela tivesse ido se arrumar em vez de chorar. Ela tem estado muito emotiva. E é por isso que eu precisava fazê-la se divertir, pelo menos um pouco.
Permaneci sentado no sofá, aguardando algum sinal de vida dela do outro lado da porta do quarto e sempre atento ao relógio, pois eu havia dado uma hora inteira para ela se arrumar. Era o suficiente. Para minha total surpresa - havia sido uma semana repleta de surpresas -, ela ficou pronta ainda faltando vinte e cinco minutos.
- Mãe... Você está linda! - mais uma surpresa para a cota de surpresas.
- Para de me bajular, Lucas. Não sei que idéia é essa de querer sair, assim, de repente - além de emotiva, ela também estava bem mal-humorada.
Eu só esperava que esse mal-humor passasse logo...
- Então, vamos? - ignorei a maneira exótica dela de agradecer ao meu elogio e me levantei, pronto para sairmos.
Mas antes...
- Espera! Aonde estamos indo mesmo? - ela indagou arqueando umas das sobrancelhas.
Apenas coloquei o óculos de sol, dei um sorriso de canto e disse:
- Estamos indo nos divertir, Baby.
(...)
- Eu. Nunca. Mais. Ando. Em. Um. Troço. Desses. Na. Minha. Vida! - minha mãe exclamou pausadamente, ofegante, após sairmos da montanha russa.
Apesar de ter protestado, havia algo diferente em sua voz. Não somente na voz, mas também em sua expressão. Ela finalmente parecia estar se divertindo, ao menos um pouco, e isso já me causava um certo alívio, pois quando chegamos, o único lugar que tinha diversão próximo de nós era o letreiro acima de nossas cabeças que dizia "Parque de diversões. Sejam bem vindos!".
Ri de seu comentário e ficamos andando ao redor das atrações daquele parque...
Passamos a tarde inteira brincando e as doses de adrenalina após sairmos de cada brinquedo me deu uma fome daquelas. Avisei a minha mãe que iria em uma barraquinha comprar dois cachorros-quentes, ela assentiu, e eu fui para a fila - que estava bem extensa, aliás -. Enquanto esperava na fila, fiquei observando todas aquelas pessoas se divertindo e acabei rindo de novo quando avistei minha mãe sorrindo de verdade desta vez, vendo o sofrimento das pessoas no brinquedo que acabamos de sair. Ela não merecia ficar em casa, sofrendo, mas logo tive parar de prestar atenção nela e passar a prestar atenção no meu pedido.
- Dois cachorros-quentes, com muito catchup, por favor! - pedi ao garoto que estava como responsável da barraquinha.
- Aqui estão, senhor - logo ele me entregou meu pedido e agradeceu a preferência.
Paguei o lanche e quando estava me virando para voltar para perto de minha mãe, acabei deixando os cachorros-quentes caírem no chão. Eu perdi o controle total dos movimentos do meu corpo. Eu estava paralisado. Era ela. Logo ali, em meio àquele monte de gente passando para lá e para cá, ao lado de uma máquina de refrigerantes, parada. Era ela. Igual aos meus sonhos.
Era a Laís!
Linda, loura e radiante.
Era ela.
Mas então, como o pior e mais realista pesadelo que vivi, de repente surge um cara sorrindo. Um cara sorrindo que, simplesmente a beijou. E então, ela simplesmente retribuiu seu beijo.
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