Thalisson

Quando Ações Trazem Reações 

Era uma vez um garoto sentado em um banco de praça, cabisbaixo, com as mãos enfiadas nos bolsos e o olhar perdido. Ele acabara de completar a maioridade, mas, ao invés de celebração, vivia dias difíceis. Perdera os pais em um acidente de carro três meses atrás. Como se isso não bastasse, seu único parente vivo, o tio, lhe aplicara um golpe, tomando a fortuna que seus pais haviam deixado para ele — até mesmo a casa. O malandro o expulsou, deixando-o sem rumo, sem dinheiro e sem saber para onde ir.

Depois de horas na praça, ele se levantou e começou a caminhar. A luz noturna tomava conta da cidade, da mesma forma que a escuridão invadia seu coração. Ao parar em frente a um mercado, o gerente, de péssimo caráter, jogou-lhe um balde de água e ordenou que fosse embora, avisando que não queria mendigos na entrada da loja. O jovem se ergueu lentamente, encharcado e humilhado, até que um casal de irmãos, que vinha caminhando pela rua, testemunhou a cena e ficou chocado.

— Cara, qual é o seu problema? — O rapaz confronta o homem, que o olha com desprezo.

— E aí, vai me bater com esse balde agora?

— Vai plantar batatas — ele responde, entrando na loja.

— Como você é otário! Deveria ter um pouco mais de respeito pelas pessoas! — diz a jovem de olhos castanhos enquanto o gerente desaparece no interior da loja.

— Vou contar para toda a vizinhança como você trata as pessoas. Tomara que perca boa parte dos clientes! — grita o rapaz de cabelos bagunçados.

Ele então se aproxima do jovem.

— Tudo bem?

— Tá sim...

— Que babaca! — responde o jovem, enquanto o observa de perto. — Nossa, mas você não me parece um mendigo.

— E não sou. Fui expulso da minha própria casa e agora não tenho para onde ir.

— Vamos lá para casa. Nossos pais não estão lá mesmo... Na verdade, nunca estão — diz o rapaz, sentindo uma tristeza momentânea. — Eu sou o Alex, e essa é minha irmã caçula, Samantha.

— Prazer, me chamo Felipe.

— Prazer, Felipe.

— Vamos então para casa — diz Alex, sorrindo.

— Espera aí, Alex. Posso falar com você por um instante? — Samantha o chama de lado.

— Alex, você acha que isso é uma boa ideia? A gente não conhece ele direito... ele pode ser um assassino.

— Não é, ele é um jovem bom, eu sinto isso. Aliás, parece ter sua idade. Não podemos deixá-lo aqui; tem gente má andando por aí, e se acontecer alguma coisa... Eu, como irmão mais velho, ordeno que você entenda.

— Tá bom, mas, se acontecer alguma coisa, a culpa é sua. — Ela se vira, e ele também.

— Vamos?

— Gente, não quero incomodar vocês. Acho melhor ficar por aqui mesmo.

— Nada disso, Felipe, venha. Temos pizza e sanduíches à vontade.

— E se seus pais chegarem?

— Finjo que você é um amigo. Mas não se preocupe; eles não vão aparecer. Estão na Europa para um simpósio de medicina — responde Alex, com um toque de ironia.

— É isso aí, Felipe, venha. Você não pode ficar aqui.

Chegando em casa, Alex conduziu Felipe até o banheiro, orientando-o a tomar um banho enquanto buscava roupas limpas para emprestar. O banheiro refletia o estilo moderno de toda a a mansão. A mansão de três andares exibe uma arquitetura arrojada, com linhas retas e amplas janelas de vidro do chão ao teto, permitindo a entrada abundante de luz natural. O exterior é revestido em uma combinação de pedra e madeira, conferindo um toque rústico à modernidade. Enquanto isso, Samantha, na cozinha, preparava a mesa com pratos, talheres e até colocava um copo de suco ao lado de cada lugar. Ela não falava nada, mas em seu olhar e gestos parecia existir uma solidariedade silenciosa. Afinal, acabou se sentindo orgulhosa da boa ação que tinham feito. O que ela não esperava era que, do lado de fora, uma pessoa os observavam em meio à escuridão.

Logo, estavam todos à mesa, onde aroma de pizza recém-aquecida. Alex serviu as fatias, e Samantha organizou os copos de suco, tentando amenizar a tensão evidente no olhar de Felipe, que ainda parecia desconfortável. Depois de alguns minutos de silêncio, Alex puxou assunto.

— Muito triste a sua história — comentou ele, observando Felipe com um misto de compaixão e incredulidade.

— Credo, como pode um tio fazer algo assim? — acrescentou Samantha, balançando a cabeça. — É um horror!

Felipe baixou o olhar, umedecendo os lábios antes de responder, com um tom contido e grato.

— Agradeço muito a vocês por me convidarem e por terem sido tão bons comigo, mesmo sem me conhecer. Eu... já fazia tempo que não tinha uma refeição assim, com pessoas legais — admitiu, esboçando um leve sorriso, embora seus olhos ainda refletissem o cansaço.

— Não precisa agradecer — respondeu Alex com um sorriso caloroso. — A gente está feliz de ter alguém pra dividir a pizza! E, bom, ninguém merece passar por isso sozinho

Enquanto conversam e se divertem sobre a mesa recheada de comida -Do lado de fora, no entanto, as sombras da noite ocultavam figuras observando a cena pela janela, os olhos fixos e silenciosos, revelando que o refúgio talvez não fosse tão seguro quanto imaginavam.

Quase uma hora após o jantar, eles estavam na sala jogando um jogo de tabuleiro, quando, de repente, as luzes se apagaram.

— Saco! Tinha que acabar a energia logo hoje! — resmungou Alex.

— Pior que a luz de todo o condomínio foi cortada — observou Samantha, olhando pela janela.

— Felipe, vê se o telefone está funcionando — pediu Alex.

Felipe tentou discar no telefone fixo, mas não havia sinal. Os celulares também estavam mudos, sem internet, e o silêncio começou a pesar sobre eles, tornando o ambiente mais tenso. Samantha lançou um olhar apreensivo para a porta, quase como se antecipasse o perigo. De repente, a porta se abriu com um rangido assustador. Um homem entrou, segurando um machado cuja lâmina brilhava na luz fraca da sala. Ele usava uma máscara aterrorizante, cobrindo seu rosto e revelando apenas seus olhos frios, que examinavam o grupo com uma calma sinistra. Samantha deu um passo para trás, enquanto Alex e Felipe se entreolhavam, captando o medo um do outro. Ela tentou falar, mas a voz saiu fraca. O homem apenas segurou o machado com mais firmeza, e um silêncio ameaçador pairou no ar, como se o próximo movimento fosse inevitável.

— Quem é você? o que você quer? - Alex questiona não obtendo nada além de uma respiração ofegante.

— Responde!

— Cara, por favor vai embora você não tem nada o que fazer aqui. - Felipe diz.

— Vim pegar o coração de vocês. - Ele evidencia o machado em suas mãos.

Samantha corre rumo as escadas, em seguida Alex e Felipe também. O homem adentra de vez na mansão, e tranca a porta e sorri levemente.

— O que a gente faz, Alex? – Questiona Samantha enquanto seguem no corredor do segundo andar

— Não sei, vamos nos esconder e tentar sair da casa para podre pedir ajuda. - Um assobio começa a ser ouvido, deixando todos mais aflitos.

— Para meu quarto, vamos. - Alex ordena. Ao entrar ele olha percebendo que está sem chave a porta e se questiona pelo fato dela ter sumido.

— Samantha, se esconde no banheiro e tranca a porta! Felipe, você entra no armário — ordenou Alex rapidamente, tentando manter a calma. — Eu vou me esconder atrás dessa cortina.Alex correu ao ver uma bandeja de metal a pega entregando-a para Felipe.

— Segura isso, caso precise se proteger — disse ele, enquanto pegava uma faca de serra que estava sobre a bandeja.

Samantha já estava no banheiro, trancando a porta com mãos trêmulas, enquanto Felipe entrava no armário, tentando se ajeitar no espaço apertado. Com a faca firme na mão, Alex se posicionou atrás da cortina, controlando a respiração e esperando em silêncio pelo próximo movimento do invasor.

O homem abre a porta lentamente.

— Sempre a mesma coisa. Correm para cima, se escondem e quando eu os acho, imploram para não matá-los. Mas sabe, sempre os mato, um por um, e cada morte mais pior que a outra.

Samantha observa tudo pela fechadura; sua respiração ofegante revela a apreensão que sente. Ele se abaixa e olha debaixo da cama. Em seguida, caminha tranquilamente até o armário, abrindo cada porta lentamente. Felipe sente o nervosismo crescer, sabendo que está prestes a ser descoberto. Quando o maníaco está prestes a abrir a porta onde ele se esconde, Alex sai de seu esconderijo e desfere a faca de serra contra as costas do homem, mas o colete à prova de balas impede que a lâmina o fira. A faca desliza pela superfície rígida, e o maníaco se vira, alarmado.

Felipe aproveita a distração e sai do esconderijo, acertando a cabeça do maníaco com uma bandeja e, em seguida, atinge-o no rosto. Aproveitando a confusão, Felipe e Alex correm, cada um fugindo para um lado: Felipe desce as escadas para o andar de baixo, enquanto Alex segue para o terceiro andar da casa.

Felipe se esconde no depósito da casa, atrás de alguns produtos inflamáveis. Ao observar uma ripa solta em uma das prateleiras, ele a puxa com cuidado até soltá-la completamente.

— Ele que pense que vai me machucar — murmura para si mesmo, determinado.

Enquanto isso, Samantha decide sair do banheiro pela janela, subindo até o telhado. Ela caminha lentamente para evitar qualquer barulho. Ao se aproximar de uma janela, leva um susto ao ver o maníaco dentro do cômodo. Prendendo a respiração, ela se esconde. Ele percebe um movimento e decide olhar pela janela, mas não a vê. Quando ele sai do cômodo, Samantha aproveita para descer com muito cuidado.

Alex, por sua vez, nota que todas as portas e janelas estão trancadas.

— Merda, ele estava vigiando a gente o tempo todo.

— Estava mesmo — uma voz fria responde de repente. Alex se vira e vê o maníaco segurando um machado.

— Todos os anos escolho minhas vítimas. Esse ano vocês são elas. Um casal de irmãos deveria ser mais fácil, mas vocês são mais espertos do que eu pensava. Dane-se; eu sempre consigo o que quero.

— Qual o seu problema? Deixa a gente sair!

— Meu problema é que sinto uma excitação ao matar — diz ele, avançando lentamente enquanto Alex recua. — Uma sensação momentânea ao ver a vida saindo dos olhos das pessoas, me fascina!

— Seu doente!

O maníaco avança com o machado em mãos, olhos fixos em Alex, que tenta manter a calma enquanto recua. A lâmina brilha ameaçadoramente sob a luz fraca do cômodo.

— Está com medo, garoto? — provoca o maníaco, com um sorriso cruel nos lábios.

— Infeliz — Alex responde, tentando esconder o nervosismo.

De repente, o maníaco desfere um golpe com o machado, mirando a cabeça de Alex, que se abaixa no último instante, sentindo o ar deslocado pela lâmina. Antes que o homem possa levantar o machado novamente, Alex se lança contra ele, tentando desestabilizá-lo. Os dois caem no chão em uma luta intensa, o machado escorrega das mãos do maníaco e desliza para o canto do cômodo. Aproveitando o momento, Alex tenta pegar a arma, mas o maníaco é mais rápido: ele agarra o tornozelo de Alex e o puxa para trás, fazendo-o cair de bruços. Alex se contorce e, com um chute bem dado, atinge o rosto do homem, que rosna de raiva e cambaleia por um momento. O jovem atira um vaso que encontra no homem e tenta se levantar, mas o homem pega um dos cacos da cerâmica quebrada e passa na perna dele fazendo um corte. Ele cai novamente e vai se rastejando de costas até chegar a uma parede.

— Vocês sempre lutam... mas nunca conseguem — o maníaco diz, com a respiração pesada, enquanto pega novamente o machado no canto do quarto. Com o machado erguido e em suas mãos novamente, o maníaco avança lentamente, saboreando a tensão.

Samantha pegou a chave que estava escondida em uma planta ao lado de fora e abriu a porta. O vigilante entrou primeiro, e ao chegar na sala, deparou-se com uma cena horripilante. Ele não portava arma de fogo, apenas uma arma de choque. O maníaco, então, tirou uma faca de seu bolso e atirou no vigilante, atingindo sua garganta. O homem caiu de joelhos, um jorro de sangue escorrendo. Samantha gritou e desmaiou ao testemunhar a brutalidade.

Felipe, que já vinha descendo as escadas, se deparou com a cena, mas em silêncio conteve o susto e permaneceu imóvel.

— Agora é a sua vez — disse o maníaco, preparando-se para atacar Alex. Mas antes que conseguisse desferir o golpe, Felipe surgiu com a ripa de madeira que havia arrancado da prateleira. Em um movimento rápido e preciso, golpeou o maníaco na nuca. O homem urrou de dor, desequilibrando-se e soltando o machado. Aproveitando a chance, Alex se lançou sobre o maníaco e, junto com Felipe, o empurrou ao chão.

Os dois uniram suas forças para mantê-lo imobilizado, mas o homem conseguiu tomar a ripa de Felipe e a usou para acertar o rosto do jovem, fazendo-o cair com a boca e o nariz sangrando. Em seguida, ele socou Alex repetidamente. Samantha acordou e, ao perceber o que estava acontecendo, agarrou a arma de choque do vigilante e partiu para cima do desgraçado que tentava matar seu irmão. Disparou uma carga elétrica nele, mas o maníaco, em um acesso de raiva, a pegou e a jogou contra a parede. Em seguida, agarrou seus cabelos, pressionando sua cabeça contra a superfície e tentando estrangulá-la. Ela lutou para se soltar, mas a força dele era avassaladora. Alex e Felipe, ainda tontos pelos golpes, tentavam se levantar, mas o maníaco lançou Samantha sobre a mesa de jantar, que estava a quase três metros de distância. Ele pegou o machado e seguiu em direção a Alex. Mas, nesse momento, dois policiais entram pela porta, atirando no homem, que caiu ao chão.

Um dos policiais foi verificar como Samantha estava, ele ajuda ela a descer da mesa, ela está ferida visto os cacos de vidros dos pratos e copos que estavam sobre a mesa e enquanto o outro ajudava Felipe e Alex a se levantarem. Alex vai caminhando até sua irmã e abraça, enquanto Felipe se escorou no sofá. Um dos policias sobe a escadas para ver se a casa está segura ou se há mais alguém dentro da mesma, enquanto o outro policia vai ver como está o vigilante que infelimente está morto. Nesse momento, o maníaco se levanta e lança o machado contra os irmãos que estavam de costas. Felipe gritou, alertando-os, sem pensar, ele salta na frente e, sentindo a lâmina cravar em suas costas enquanto o policia disparava contra a cabeça do homem, finalmente o fazendo cair.

— Não! — gritou Samantha ao ver Felipe cair no chão.

— Calma, vai ficar tudo bem — disse Alex, tentando acalmá-la enquanto segurava sua mão com firmeza.

— A ambulância está chegando — avisou um dos policiais, conferindo novamente se o maníaco estava realmente morto.

Samantha olhou Felipe, que estava pálido e respirando com dificuldade.

— Felipe, mantenha os olhos abertos — disse Samantha, com a preocupação.

Felipe, com esforço, tentou focar no rosto daqueles que o acolherem a em sua casa, mas a dor e a confusão o deixavam cada vez mais perdido.

— Eu... estou aqui — ele respondeu, tentando sorrir, mas a expressão de dor se mantinha.

— Obrigado por tudo. Às vezes, uma ação simples pode desencadear uma reação inesperada. - Ele fala fechando os olhos. - Samantha deixa algumas lágrimas caírem.

Assim que a ambulância chegou, os paramédicos correram até Felipe, avaliando rapidamente suas feridas. Alex e Samantha ficaram ao lado, ansiosos, enquanto observavam as equipes de emergência trabalharem.

Um ano depois.

Alex estaciona o carro e, ao sair, vê Samantha e Felipe aparecendo de mãos dadas para recebê-los.

— Temos uma novidade! — anunciou Samantha, um brilho nos olhos.

— Que vocês estão namorando? — Alex perguntou, já sorrindo.

— Era óbvio que isso ia acontecer. Eu sabia! — disse ele, rindo.

Eles riem juntos, a tensão do passado finalmente se dissipando em sorrisos e afeto.

— Obrigado, Alex, por abrir as portas da sua casa para ajudar alguém que não conhecia — disse Felipe, olhando para ele com gratidão.

— Felipe — Alex o interrompeu com uma expressão brincalhona. — Da próxima vez que você me agradecer, eu te jogo na rua!

Os dois riram novamente, e a leveza do momento fez Samantha segurar a mão de Felipe um pouco mais apertado.

— Então, o que vamos fazer hoje? — Felipe perguntou, mudando de assunto com entusiasmo.

— Bom, vocês dois podem sair hoje. E quando você voltar, Felipe, a gente conversa sobre o emprego que estou ajeitando para você. Também temos uma reunião para discutir com o advogado que vai resolver a sua situação em relação ao golpe que seu tio lhe deu.

— Tudo bem! — respondeu Felipe.

Samantha e Felipe saem para um passeio de bicicleta enquanto Alex se senta no jardim, aproveitando o sol quente e tomando um suco. Ele abre o laptop, mergulhando em seus projetos.

MORAL:

A moral desse conto enfatizar a importância de solidariedade e compaixão entre as pessoas, além de destacar a capacidade humana de lutar pela sobrevivência e de apoiar uns aos outros nos momentos mais sombrios e perigosos. 

User: @escritortgg

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