Luana Santos

A última flor da estação

"O fim da tarde se estendia em tons laranja e púrpura, criando um espetáculo natural que fascinava qualquer um que tivesse a sorte de estar na colina. Tomas observava o mar do alto, com a câmera pendendo do ombro, como se pesasse cada memória que ele revivia ali. Depois de tantos anos, estar de volta era inquietante e, ao mesmo tempo, familiar. Ele não retornara àquela cidadezinha por acaso; voltara para corrigir o que fora deixado para trás.

Havia um vazio em seu coração que só poderia ser preenchido com o reencontro. Ao longo de sua jornada, ele pensou em Sabrina em muitos momentos. A forma como ela sorria, os olhos brilhantes, a maneira como fazia com que tudo ao seu redor parecesse mais bonito. Sentiu a pressão de todas aquelas lembranças antigas, como se uma onda de nostalgia o atingisse. Ele suspirou, sentindo a brisa fresca que anunciava a tempestade que se formava no horizonte.

Decidido, Tomas caminhou até a pequena floricultura no centro da cidade, que ele sabia que ainda pertencia a Sabrina. Era um lugar modesto, mas aconchegante, onde flores de todas as cores preenchiam as prateleiras de madeira, exalando um perfume suave que parecia encobrir o tempo. As flores eram dispostas com carinho, e o brilho nos olhos de Sabrina ao trabalhar sempre lhe havia transmitido alegria.

Quando ele entrou, o sino na porta tilintou, anunciando sua presença. Ao olhar em volta, viu Sabrina de costas, concentrada em um arranjo de flores. Ela usava um vestido azul claro que combinava com o tom de seus olhos, e o cabelo castanho, preso de forma displicente, balançava enquanto ela se movia com a graça de quem faz aquilo por amor.

Tomas ficou ali, em silêncio, observando-a. Cada movimento dela trazia de volta memórias, como cenas de um filme que ele não queria esquecer. Ele queria muito dizer algo, mas sabia que não poderia simplesmente chegar e pedir desculpas; as palavras não bastariam para remendar tudo o que ele havia deixado desmoronar entre eles. Depois de alguns minutos, ele se aproximou do balcão e notou uma flor que chamou sua atenção: uma peônia cor de pêssego. Lembrava-se claramente de como Sabrina sempre dizia que essa era sua flor favorita.

Com um toque suave, ele pegou a peônia, permitindo que o aroma da flor o envolvesse. Era como um portal que o transportava para momentos mais simples, onde eles eram felizes, despreocupados. Tomas deixou o dinheiro no balcão junto com uma nota que dizia apenas: "Ainda lembro." Com o coração acelerado, ele saiu da loja em silêncio, esperando que aquele gesto falasse por ele.

[...]

Sabrina terminou de organizar o último arranjo e se virou, esperando ver o velho Sr. Alberto, que sempre comprava uma rosa para a esposa. Ao invés disso, encontrou a peônia e o bilhete. Seu coração disparou, e ela sentiu uma mistura de surpresa, raiva e saudade. Pegou a flor e a nota, relendo aquelas palavras várias vezes. A dor da ausência de Tomas a atingiu como uma onda. Queria ignorá-las, mas sabia que aquilo era impossível.

Aquela peônia trazia uma enxurrada de lembranças. Ela e Tomas costumavam passear pela praia, e ele sempre colhia peônias para ela, dizendo que combinavam com o sorriso dela. Sentindo o coração apertado, Sabrina segurou a flor contra o peito, decidida a agir antes que a razão a fizesse hesitar. O calor das lembranças ainda queimava dentro dela, mas a dor da traição e do abandono a fez hesitar.

Ela não sabia se estava pronta para vê-lo, mas, ao mesmo tempo, não conseguia resistir à força daquela memória. Ao final do expediente, decidiu que precisava confrontá-lo, precisava entender por que ele havia ido embora. Quando chegou ao alto da colina, a noite já tinha caído, e o céu estrelado era um contraste com a tempestade que se formava dentro dela. Tomas estava ali, fotografando o mar, concentrado na luz suave da lua sobre as ondas.

Ele ouviu os passos dela e se virou, surpreso. Sabrina estava ali, segurando a peônia na mão e com uma expressão dura no rosto. Ele notou que as lágrimas estavam prestes a escapar, e um aperto no peito o fez querer correr até ela.

— Eu deveria estar brava, sabia? — ela disse, cruzando os braços, sua voz tremendo. — Você desaparece por anos e acha que uma flor resolve tudo?

Tomas abaixou a câmera, sabendo que precisava ser sincero. Ele sentia que a chuva que começava a cair refletia a tempestade dentro de ambos.

— Não acho que resolve, Sabrina — ele disse, mantendo a voz baixa. — Mas era a única coisa que eu conseguia pensar... algo que eu poderia fazer que fosse verdadeiro.

Ela desviou o olhar, tentando esconder a mistura de emoções que a invadiam. Ele sabia que as palavras não bastariam, então deu um passo em direção a ela, aproximando-se lentamente, e estendeu a mão para tocar a dela.

— Você foi a única coisa verdadeira na minha vida, Sabrina. Eu sei que fui egoísta. Achei que precisava me afastar para me encontrar, mas o que eu encontrei foi um vazio. A distância só me fez perceber o quanto você era o que mais importava.

A chuva começou a cair mais forte, e Sabrina abaixou a cabeça, permitindo que as gotas se misturassem às lágrimas que escapavam. Tomas sentiu um nó na garganta ao ver a dor que causara. A culpa e o arrependimento eram quase insuportáveis, mas ele se manteve ali, esperando que, talvez, o silêncio e a presença dele pudessem dizer o que faltava.

— Você não pode simplesmente voltar e esperar que tudo seja como antes — ela disse, a voz embargada. — Eu não sou mais a mesma.

— Eu sei — ele respondeu. — Mas eu mudei também. O tempo longe de você me ensinou que algumas coisas não podem ser substituídas.

Eles ficaram juntos sob a chuva, sentindo o peso dos anos que haviam passado e as palavras que jamais tinham sido ditas. Quando Sabrina levantou o olhar, havia algo nos olhos dela que ele não conseguia decifrar. Era como se ela estivesse travando uma batalha interna, entre a dor do passado e a esperança de um futuro diferente.

— Eu não posso prometer que vou te perdoar — ela disse, com a voz rouca. — Mas talvez... eu possa tentar.

Tomas sorriu, segurando a mão dela com firmeza. Naquela noite, caminharam lado a lado até o centro da cidade, sem uma palavra a mais. O silêncio entre eles era carregado, mas havia um entendimento tácito de que o passado ainda os unia de alguma forma.

[...]

Nos dias seguintes, Tomas e Sabrina se encontraram novamente, e aos poucos foram reconstruindo a confiança um no outro. Eles começaram a se falar mais, a compartilhar pequenos momentos, a reviver as lembranças que tanto os haviam marcado. O tempo não curou todas as feridas, mas ajudou a suavizá-las. Cada encontro se tornava mais significativo, e eles se sentiam mais confortáveis um com o outro.

Certa tarde, enquanto caminhavam pela praia, Sabrina parou e olhou para o mar. As ondas quebravam suavemente na areia, e o som a acalmava.

— Lembra da nossa promessa de construir castelos de areia? — perguntou ela, um sorriso leve nos lábios.

Tomas riu, lembrando-se da infância e das aventuras na praia.

— Claro! E sempre acabávamos molhados e cobertos de areia. Era a melhor parte.

— Eu sempre quis que aquele momento durasse para sempre — ela disse, olhando nos olhos dele. — Era simples, mas feliz.

— E se tentássemos construir um novo castelo? — sugeriu Tomas, com um brilho no olhar.

Sabrina hesitou por um momento, mas logo sorriu, a ideia a animando.

— Vamos! — exclamou ela.

Eles correram para a areia, rindo enquanto começavam a moldar o castelo com suas mãos. Conversaram e brincaram, deixando as preocupações de lado. O castelo tomou forma, e, mesmo que a estrutura fosse efêmera, a alegria que sentiam era genuína.

A cada dia que passava, Sabrina sentia que havia um novo início se formando entre eles. No entanto, havia ainda questões não resolvidas, e uma parte dela se preocupava com o que aconteceria quando a realidade voltasse a se impor.

Um dia, enquanto tomavam café na floricultura, Sabrina resolveu tocar no assunto.

— Tomas, você realmente acha que conseguimos voltar ao que éramos? — perguntou ela, com um olhar sério.

Tomas pensou por um momento, lembrando-se das dificuldades que enfrentaram.

— Eu não quero que as coisas sejam exatamente como antes. Eu quero construir algo novo, baseado no que aprendemos. As experiências que tivemos nos moldaram, e talvez isso seja um bem.

Sabrina assentiu, ponderando suas palavras.

— Concordo. Mas precisamos ser cuidadosos, porque ainda há feridas. Não podemos simplesmente ignorar tudo o que aconteceu.

Tomas a encarou, a sinceridade em seus olhos refletindo o que ele sentia.

— Eu sei. E estou disposto a enfrentar isso. Não quero que você sinta que precisa carregar esse peso sozinha. Estamos juntos nessa.

Sabrina sorriu, sentindo um calor se espalhar por seu coração. A conexão entre eles estava ressurgindo, mais forte do que antes. Era um novo começo, mas um que não poderia se basear em promessas vazias.

— Podemos tentar ser amigos novamente antes de qualquer coisa? — ela sugeriu. — Queria que a amizade voltasse a ser a base de tudo.

— Isso me parece perfeito — respondeu Tomas, sentindo que essa era uma abordagem sensata. — Vamos recomeçar devagar.

Os dias se transformaram em semanas, e, aos poucos, a amizade que construíram começava a florescer. Eles compartilhavam risadas, confidências e momentos de vulnerabilidade. Sabrina sentiu que a dor do passado estava lentamente se dissipando, substituída pela esperança.

Certa tarde, enquanto caminhavam pela cidade, passaram em frente ao parque onde costumavam brincar quando eram crianças. As árvores frondosas e as flores em flor despertaram um desejo nostálgico em Sabrina.

— Olha! — exclamou ela, apontando para o balanço que ainda estava lá. — Lembra de como sempre competíamos para ver quem conseguia ir mais alto?

Tomas sorriu, a lembrança trazendo à tona uma onda de alegria.

— Como esquecer? Você sempre me vencia!

Sabrina fez uma careta, indignada.

— Eu só ganhava porque você deixava!

Eles se dirigiram até os balanços, e, assim que se sentaram, começaram a balançar, rindo e desafiando um ao outro a ir mais alto. A adrenalina e a felicidade de se sentirem jovens novamente preenchiam o ar.

— Eu adoro como conseguimos ser nós mesmos novamente — disse Sabrina, enquanto balançava.

Tomas a olhou, seus olhos brilhando.

— Eu também. Isso é tudo que eu queria.

O sol começou a se pôr, tingindo o céu de rosa e laranja, e a sensação de renovação era palpável. Aqueles momentos simples, livres de preocupações e mágoas, eram a essência do que significava estar juntos.

Mas, enquanto desfrutavam da companhia um do outro, a sombra do passado ainda pairava sobre eles. Tomas sabia que, para que essa nova fase desse certo, precisava contar a verdade sobre o que havia acontecido quando se afastou. A culpa o consumia e o impedía de se sentir completamente livre.

Naquela noite, depois de se despedirem, ele decidiu que era hora de ser honesto. O vento soprava frio e a lua iluminava seu caminho enquanto ele caminhava em direção à floricultura. Ele queria se certificar de que Sabrina soubesse tudo.

Quando chegou, a loja estava fechada, mas ele se lembrou que Sabrina costumava ficar até mais tarde para organizar as flores. Ele hesitou por um momento antes de tocar a campainha. Ouviu passos se aproximando, e, em seguida, a porta se abriu.

— Tomas! — ela exclamou, surpresa ao vê-lo. — O que você está fazendo aqui?

— Eu preciso falar com você — ele disse, sua voz firme, mas cheia de emoção.

Sabrina notou a seriedade em seu olhar e assentiu, permitindo que ele entrasse. A atmosfera estava carregada de expectativa, e o cheiro das flores os envolvia, criando um espaço aconchegante e seguro.

— O que aconteceu? — ela perguntou, fechando a porta atrás dele.

Tomas respirou fundo, tentando encontrar as palavras certas.

— Eu sei que minha partida te machucou, e eu realmente sinto muito por isso. O que eu fiz foi covarde. A verdade é que eu estava lutando contra meus próprios demônios e não sabia como lidar com eles. Quando você mais precisava de mim, eu estava longe.

Sabrina o olhou, a expressão em seu rosto mostrando que estava ouvindo atentamente.

— Continue.

— Depois que eu fui embora, percebi que a vida sem você não fazia sentido. Eu passei tanto tempo tentando me encontrar que, no final, só me perdi mais. A culpa e o arrependimento foram meus companheiros constantes. E é por isso que voltei. Eu não quero que a nossa história termine aqui. Quero uma chance de fazer isso certo.

As lágrimas começaram a escorregar pelo rosto de Sabrina. Ela estava assustada e aliviada ao mesmo tempo. O peso que sentia em seu coração parecia um pouco mais leve.

— Tomas, isso é muita coisa para processar. Eu realmente não esperava que você voltasse e que estivesse aqui agora, abrindo seu coração.

— Eu não quero que você pense que estou aqui apenas porque estou me sentindo culpado. Eu quero que você saiba que você é importante para mim. E que, se você me der uma chance, eu prometo que farei o possível para reconstruir a confiança que destruí.

Sabrina sentiu um misto de sentimentos. Parte dela queria se afastar e proteger seu coração, mas outra parte queria acreditar na sinceridade de Tomas. Ela precisava de tempo para refletir, para entender o que realmente queria.

— Eu não posso prometer que será fácil, Tomas. Existem muitas cicatrizes, e não posso simplesmente ignorá-las.

— Eu não espero que seja fácil. Estou disposto a esperar o tempo que for preciso — disse Tomas, dando um passo mais perto.

— E se eu não conseguir? — perguntou Sabrina, a voz trêmula.

— Então eu estarei aqui, pronto para apoiar você. Quero que saiba que, independentemente do que aconteça, você sempre será importante para mim.

As palavras de Tomas eram um bálsamo para a dor que ela sentia. Naquele momento, Sabrina percebeu que a amizade deles estava se transformando em algo mais, uma conexão que poderia superar até mesmo as feridas mais profundas. Ela estava disposta a tentar, a dar uma nova chance àquilo que havia sido tão precioso.

— Eu preciso de tempo, mas acho que posso tentar novamente — ela disse, a determinação começando a surgir em sua voz.

Tomas sorriu, a esperança brilhando em seus olhos.

— Isso é tudo que eu peço. Um passo de cada vez.

Naquela noite, sob a luz suave das flores e a certeza de um novo começo, eles encontraram um espaço seguro um para o outro. A chuva que caía lá fora era um símbolo de renovação, de vida nova. E, no fundo de seus corações, havia a certeza de que, embora o caminho à frente fosse incerto, eles estavam prontos para enfrentá-lo juntos.

[...]

A jornada de Tomas e Sabrina estava apenas começando. Com cada passo que davam, eles redescobriam o que era amar e serem amados. E, mesmo que o futuro fosse imprevisível, sabiam que poderiam contar um com o outro, sempre dispostos a se apoiar, independentemente dos desafios que a vida pudesse lhes trazer."


User: Lady_Killer150

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top