CAPÍTULO 9
O silêncio dentro do jatinho atiçava a adrenalina dentro de mim. A noite já havia tomado o seu lugar. Dessa vez não havia lua ou estrelas como testemunhas visíveis do que estava prestes a acontecer.
Não vou forjar um lado autoconfiante. Sou ciente dos riscos que corro, se algo acontecesse comigo, sei o quanto a minha família sofreria.
Todos nós somos responsáveis pela nossa própria escolha. Trilhamos nossos caminhos de acordo com as nossas decisões. Escolhemos ser caçadores não por desejo vil mas porque entendemos que há pessoas inocentes que precisam de nós. Pessoas essas que muitas das vezes confiaram no governo mas foram entregues aos leões. Lutamos contra um sistema podre que engloba tanto o mundo do crime quanto as autoridades políticas corrompidas.
Quantas vezes quem tanto ofereceu proteção entregou de bandeja vítimas que são alvos por ter ou por presenciar o que não devia? Toda essa sujeira podre era evaporada dos olhos da população. Os registros de pessoas vítimas dessa organização criminosa crescem dia após dia, e infelizmente os corajosos que começam a cavar toda essa sujeira para desmascarar acabam perdendo sua vida no processo.
Sou completamente outra pessoa quando se trata de caçar e matar criminosos. Não há uma pequena porcentagem de compaixão dentro de mim. É um mundo totalmente obscuro em que vivo.
Desde o dia em que Hank Bennett me procurou na faculdade, e me disse que a minha mãe biológica fazia parte dessa organização, me vi abraçando também esse chamando. Lutar por aqueles que se veem sem saída, assim como a minha mãe fez.
Meu passado é marcado pela dor de perder quem tanto amei e me amou, pela infância perturbada em um orfanato em que sofri por um bom tempo nas mãos de crianças mais velhas que eu. E não posso esquecer dos pesadelos que me faziam companhia nos meus sonhos.
A partir do momento em que aceitei fazer parte desse mundo de caçar e eliminar quem verdadeiramente merecia não estar respirando, eu abracei o meu lado obscuro.
- Ivan, a conta das bebidas hoje é por sua conta, hem?!! - Otto cortou o silêncio enquanto tirava suas luvas táticas, como tinha por costume usá-las.
- Nem. Morto. - disparou, e arrancou risadas da equipe. - Apenas o Luke e o Ian bebem pelo restante de nós. Ou racham a conta ou cada um paga a sua.
- Que grosso! - Natalie resmunga do banco da frente.
- Fácil resmungar quando não precisa se preocupar com contas, não é? - se defendeu. - Ao contrário de você, baby, sou apenas um mero mortal que batalha arduamente para ter o sustento.
- Sofre com as contas porque assim decidiu. - Natalie rebateu. - A mídia está sempre esbanjando o quanto o seu pai vem crescendo nos negócios.
- Experimente ter um irmão que te sabota ao ponto de fazer da sua vida dentro da casa dos seus pais um inferno, apenas para ter tudo para si.
Vasti estava sentada ao meu lado, se inclinou um pouco para frente e disse:
- Ei, posso dar um jeito nele. É só autorizar.
Ivan arregalou os olhos diante do tom ameaçador de Vasti.
- Definitivamente, não. Ser um anônimo com uma vida comum pode ter suas desvantagens, mas prefiro dessa forma.
- Tem certeza? - Vasti indagou e pude ver o canto dos seus lábios se abrirem um sorriso. - Imagine, não precisar resmungar por não ter grana para pagar bebidas para os seus amigos.
- Vá se foder, Vasti. - Rosnou irritado pelo atrevimento da mesma.
Todos riram.
- Só quis ajudar. - Vasti ergueu as mãos para cima. - Um pouco de incentivo não faz mal a ninguém, oras!
- Sua venenosa. - Samuel se intrometeu. - Quem a escuta até acredita nas suas boas intenções.
- Quanta calúnia contra a minha pessoa! Eu posso te punir, sabia? - fez drama.
- Fique bem longe de mim, sua maluca. - respondeu, provavelmente lembrando-se da cotovelada que levou na última vez que Vasti sem intenção o acertou. - Eu tenho amor à minha vida.
- Seu desejo foi aceito. - disse de forma sonsa arrancando de mim um riso.
Seus olhos me fitaram e imediatamente desfiz o riso antes que sobrasse para mim.
- Podem ficar tranquilos que a bebida fica por minha conta. - a ouvimos e o pessoal comemorou.
- E a próxima fica pela minha. - falei, e as comemorações aumentaram.
- Muito bom tudo isso. - Otto comentou. - Mas há um detalhe que estamos deixando passar nessa operação. - disse chamando a nossa atenção.
- Continue. - falei.
- Não é estranho o fato dessa mercadoria que eles tanto falam na gravação ser transferida tão rapidamente? - Otto expôs sua dúvida.
Mal sabia ele que era a minha também.
- Eles podem estar suspeitando que possivelmente há um infiltrado entre eles. - Kenzie se pronunciou. - Ou podemos estar indo diretamente para uma emboscada.
- O local é deserto. Perfeito para uma armadilha. - Ivan comentou.
- Há um detalhe interessante na planta do local. - Peguei a planta que continha todo o mapeamento da área e estendi para o banco da frente, Ivan cantou rapidamente. - A planta antiga mostra três entradas mas a que circula e qualquer um pode ter acesso só mostra duas. A entrada oculta fica na mata e será por lá que uma parte da equipe entrará, a outra seguirá com o plano inicial.
- Quem garante que eles não sabem desse detalhe oculto? - Samuel indagou.
- Não posso dar garantias. - sou sincero.- Mas quero acreditar que esse detalhe é apenas de nosso conhecimento. A única planta que revela essa passagem está em nossas mãos, graças ao conhecimento do Ian. Que pode resgatá-la dos arquivos do sistema da prefeitura da cidade. - expliquei. A área por fazer parte das terras mais antigas da cidade a qual estávamos indo, teve sua planta registrada na Internet.
Ian, como um excelente hacker entrou no sistema sem deixar rastros e além de pegar uma cópia ele fez com que a planta sumisse do sistema.
- Algum questionamento? - perguntei.
Diante do silêncio que antecedeu, voltei a me refugiar nos meus pensamentos. Voltei a fitar através da janela do jatinho a noite, e sem intenção alguma, minha mente trouxe a lembrança dela.
Seu olhar brilhante me lembrava o céu. Maria kristal carregava a cor do céu nos seus olhos.
Apreciá-los simplesmente me fascinava.
Eu havia verdadeiramente encontrado um cristal.
O jato havia pousado em uma pista de voo usada para aviões ilegais. Onde não havia o menor risco da polícia local nos ter detectado pelo radar, a Van metálica enviada pela organização já estava à nossa espera. Descemos do jatinho carregando nossos equipamentos, o homem responsável por trazer a Van se prontificou a andar ao meu lado para falar:
- O Sr. Bennett me encarregou de acompanhá-los. - informou, assenti.
- Ivan, pode repassar o plano para o Sr.?
- Fernando Barcelos. - Se apresentou.
- Seja bem-vindo, Fernando. - estendi a sua mão e selamos o nosso cumprimento. - Enquanto você fica por dentro da operação irei finalizar os últimos detalhes.
- Certo. Obrigado. - Me afastei dele e fui em direção a Van.
Minha equipe se equipava usando equipamentos que seriam de extrema importância. Pontos de comunicação, máscaras estilo ninja, óculos de visão noturna, colete, rastreadores para que nossa localização esteja sob o olhar de Ian. Assim como os demais, coloquei minha pistola no coldre e escolhi uma semiautomática com um silenciador. Arma de porte grande possuía a minha fascinação e usar o silenciador nesse caso, era uma forma de não ter a minha localização entregue rapidamente para o inimigo a longa distância.
Sutileza e sagacidade dominavam uma parte de mim.
Devido ao último acontecimento em que infelizmente a vida de George foi tirada, dessa vez optei por adotar mini câmeras noturnas que além de gravar em tempo real a imagem apareceria para Ian, nas telas do equipamento tecnológico que o mesmo ficaria sob supervisão.
- A câmera dará acesso a Ian para registrar ou informar qualquer coisa que seja suspeita. - falei.
Além do equipamento usávamos roupas pretas apropriadas para o frio da noite, feita sob material de qualidade, mantendo assim nosso calor corporal.
- Quem pegou os alicates? - Samuel indagou.
- Eu. - Ivan e Natalie responderam juntos, ambos possuíam duas mochilas onde continha material reserva caso fosse necessário usar.
- Tudo pronto. - Fernando avisou.
O mesmo ocupou o volante e esperou que todos tomassem assento. A Van era grande, adaptada para possuir espaço para nós e os equipamentos de controle que Ian iria usar. Todos em seu devido lugar, e com seus cintos de seguranças, o carro é ligado e toma seu rumo.
A Van é estacionada em um local deserto, perto do local para onde marcharemos. Saltamos para fora do carro com nossas armas em punho.
- Otto, você vai liderar a equipe que passará pela cerca. - aviso. - Qualquer coisa é só comunicar pelo ponto, pessoal.
Ian abre a porta da Van e colocando apenas uma parte do corpo para fora, avisa:
- Já entrei no sistema de segurança. - assinto. - Tem homens armados do lado de fora em pontos cegos, fora de vistas humanas. E dentro há uma pequenina quantidade. Parecem aguardar por algo.
- Isso tem cara de emboscada. - Fernando diz e cospe no chão. - Já vi esse filme e geralmente ele não acaba bem.
- Se for, não estaremos despreparados. - Natalie o responde e engatilha a sua arma. - É tudo ou nada. Eu não vim aqui para morrer.
- Que o amado Deus nos guarde. - ouvi Fernando falar e se benzer. Só então notei os traços latino presentes.
- Pessoal, aparentemente os homens que estão à vista parecem tranquilos. Não demonstram estarem esperando a nossa visita. - Ian diz olhando a tela do Tablet. - todavia, a vigilância nunca é demais.
Ian voltou a fechar a porta da Van e nós entramos na mata, indo na direção da nossa missão. Revestidos de coragem e um espírito de fortaleza avançamos sem pestanejar.
Paramos ao lado de uma escotilha quadrada e das extremidades de concreto vinha uma corrente dos dois lados que a mantinha fechada. Ivan pega o alicate para cortar a corrente, e Natalie começa a cortar a tela de alambrados feita a aço.
O barulho da corrente quebrando e depois sendo retirada e jogada para o lado, preenche o ambiente que no momento é marcado pelo nosso silêncio. Ivan começa rodar a roda da escotilha para abri-la e Natalie termina de abrir a tela, dando passagem para a equipe Beta passar.
A escotilha é aberta, uma lanterna é entregue a cada um. lumino a escuridão que cerca dentro da escotilha e sou o primeiro a descer usando a escada. Ivan vem atrás de mim, assim como Kenzie e Fernando. Os outros cinco seguirão por cima, fazendo a varredura do perímetro e exterminando o inimigo.
Continuamos andando pelo corredor escuro até chegar em um portão de ferro que estava fechado por uma corrente. Ivan mais uma vez usa o alicate para que a porta possa ser aberta. Prosseguimos atentos, ratos passam correndo pelos cantos assustados com a nossa presença.
Graças a luz da lanterna vemos os empecilhos que há no corredor, ferramentas antigas de trabalho e caixas lacradas cobertas por poeira. Conforme andávamos era possível sentir uma ventilação no local, e vozes distantes começaram a tomar forma.
- Já faz trinta minutos, Dalton. Essa parada é muito estranha. - o sujeito de sotaque americano diz.
- Eles virão, Alex. Estamos apenas guardando a mercadoria.
- Eu não sei, não. Há muito armamento para algo que não sabemos do que se trata. - O tal Alex de sotaque americano responde nervoso.
- Você está sendo paranoico! - Uma terceira voz se pronuncia. - Não é a primeira vez que fazemos algo assim.
- Acontece que as vezes anteriores eu não tinha uma má intuição. Se tratava apenas de proteger e esperar a mercadoria ser entregue.
- Você está se ouvindo? - Dalton solta uma risada esganiçada enquanto fala. - Está com medo do que está naquele salão? Só porque seus olhos não viram o que há, não quer dizer que sairemos mortos daqui.
- Vai tomar um ar ou fumar um cigarro, mas só volte quando estiver melhor. - A terceira voz disse.
- O moleque tá pirando. - Dalton diz. - Hoje pela manhã atacou uma das meninas por não aceitar a cheirar o bagulho.
- Como não fiquei sabendo desse comportamento?
- Seu irmão pediu e informou que contaria. Afinal, ambos saíram em direção ao seu escritório. Achei que soubesse.
- Não, nada disso foi relatado.
O silêncio voltou.
Confesso que ouvi-los disparou um alto alarme vermelho dentro de mim. Fazendo-me estar ainda mais atento ao que estava para acontecer. Não que as missões anteriores não fossem perigosas ou altamente suicidas, ao ponto de quase perdemos nossas vidas. Como inclusive aconteceu com o integrante da minha equipe, o George.
Ainda é difícil para nós. George foi o primeiro a deixar a equipe. Gostaria de estar errado em relação a sua morte, mas as evidências dizem o contrário.
O corredor nos levou a uma escada de comprimento médio, abri a porta de madeira puída coberta por camada fina de poeira pelo tempo que o lugar ficou inutilizável. O corredor estava silencioso e como se dividia em dois, Ivan e Kenzie seguiram pela esquerda e Fernando e eu seguimos pela direita.
Através do ponto ouvimos que do lado de fora tiros começam a ser disparados, Ian também dava instruções ao grupo de fora. Fernando permaneceu na sua posição quando um quarteto de homens armados atravessaram o nosso caminho, nos abrigamos atrás da parede, nos protegendo das balas disparadas em nossa direção. Atiramos de volta e vi o exato momento em que derrubamos dois. Um com um tiro no peito e o outro na fronte.
- Desgraçados! - Fernando urrou e encostou-se na parede. Quando o olhei vi que havia sido atingido de raspão no braço.
- Você está bem? - indaguei, e voltei a atirar, derrubando mais um no processo.
- Estou. - respondeu, e voltou a atirar.
Mais três homens se juntam no confronto tentando nos encurralar. Pude visualizar eles por poucos segundos mas mesmo assim pude identificá-los. Eram gangues de rua. E o fato de estarem aqui me fez pensar que foram contratados apenas para nos esperarem. E lembrando da conversa que aconteceu com Dalton, Alex e a terceira voz, entendi que seja o que for que tenha naquele salão é simplesmente uma surpresa preparada unicamente para nós, se sairmos vivos.
Volto a carregar a minha arma, e disparo contra o único sujeito que tentou fugir. Com o caminho livre, avançamos. Havia um cômodo grande e uma porta de dois lados, Kenzie passou pela porta ao lado de Ivan.
- Tudo tranquilo? - perguntei,me referindo a passagens deles.
- Nada que não déssemos conta. - Kenzie respondeu.
Fiz sinal para eles indicando que subiriamos a escada feita de concreto. Com as armas em punhos nos dirigimos a escada e marchamos como verdadeiros predadores atrás das nossas presas. Estávamos totalmente em alerta e qualquer barulho menor que fosse não passaria despercebido por nós.
Antes de alcançarmos os últimos lances da escada, tiros são disparados em nossa direção, Kenzie tendo seu campo de visão limpo disparou, acertando o sujeito que nos esperava.
- Câmbio, equipe Alfa na escuta?- o respondi de forma formal. - Há apenas mais dois sujeitos a serem abatidos. E ambos estão atrás dessa porta à sua frente. - escuto Ian nos informando pelo ponto.
- Câmbio, entendido. - respondi. - Sabe nos informar o que há no salão?
- Há um sinal lá dentro. Mas infelizmente não estou conseguindo rastrear e nem acessar. O sinal está bem protegido.
- Ok, entendido.
Fernando e Ivan se colocaram ao lado da porta de dois lados, Kenzie retirou a granada de luz e eu fiquei atrás dela para lhe dar cobertura. Fiz uma contagem com os dedos e no três a porta foi aberta e duas granadas de luz foram lançadas. Depois da explosão de luz, ouvimos os gritos angustiantes e entramos.
Rapidamente, Fernando e Kenzie abate os dois sujeitos que gritavam desesperadamente com as mãos nos olhos.
- O perímetro do lado de fora limpo. - Vasti avisa pelo ponto.
- Perímetro do lado de dentro limpo também. - Ivan avisa.
Ivan pega da mochila um dispositivo que detecta explosivos. Depois de passar pela porta e termos a certeza que estava tudo bem, abro a porta e o que vejo me faz paralisar por completo.
- Ratos malditos! - escuto Ivan praguejar.
- Aí meu Deus! É o Júlian. - Kenzie leva as mãos à boca ao ver a cena.
Júlian era o nosso informante. Ele havia conseguido se infiltrar na máfia Dragão Sangrento não fazia muito tempo. Qualquer informação que pertencia aos negócios da máfia ele passava.
E vê-lo crucificado na parede com o pescoço cortado e seu peitoral coberto por cortes profundos, respondia algumas coisas. Primeiro, ele ficou em silêncio até a morte. O que explica o fato de ter sido torturado de forma tão violenta.
Segundo: O autor da tortura não é apenas um criminoso perigoso, é um psicopata. Gosta de sentir e causar medo na vítima.
Me aproximei do cadáver e pude ver uma pequena câmera presa na corrente de pescoço de Julian. Esse era o sinal que Ian havia falado.
A luzinha vermelha piscava, em um ato de fúria arranquei aquela maldita câmera e joguei contra a parede. Fazendo-a se partir aos pedaços.
- Maldição! - urrei, sentindo-me impotente.
Levei as mãos à cabeça e andei de um lado para o outro. As engrenagens da minha cabeça rodava, trabalhando, em busca de uma linha racional para entender que tipo de jogo é esse.
- Filhos da puta! - escuto Ivan praguejar lançando seu ódio para fora.
Ao olhar em sua direção vejo o mesmo retirando da boca de Julian um bilhete. Ivan se recusa abrir para ler e passa o papel para Kenzie que está ao seu lado. Otto adentra o salão com os demais e as reações de choque percorrem todo o salão.
- Quero que lembre desse sentimento de impotência, incapacidade e fraqueza. Eu irei descobrir a sua identidade e por último, quando os seus estiverem sendo caçados, irei aguardar vê-lo se afogar no mar de medo. Atenciosamente, Z.
A ameaça ecoou na minha mente, erguir meus olhos para Julian e sentir a raiva dominar-me.
- Ei, Dom. - Vasti, tocou o meu ombro. - Precisamos ir.
Sentir urgência na sua voz e pude enfim perceber que Ian nos alertava pelo ponto.
- Eles estão vindo. - Ian, falou mais uma vez.
- Não temos tempo para pegar o corpo, infelizmente. Precisamos ir.
Com pesar deixo o corpo de Julian para trás.
- Vocês tem apenas quinze minutos para saírem daí. - Ian retornou a falar.
Toda a equipe fugia pela passagem da escotilha.
Otto fazia a frente e eu seguia por último.
O escuro que nos cercava refletia como um espelho os meus sentimentos. Sedento por vingança. Desejando mais do que nunca acabar com esse banho de sangue. Alexander Zorkin, iria cair, assim como seu império. Erguido através de vidas inocentes, lavagem de dinheiro e tráficos.
Alexander Zorkin nada mais era que o próprio Demônio na terra.
*
O sol amanheceu brilhante, clareando a beleza do céu e todo o fenômeno da natureza. Fechei meus olhos com a claridade que adentrava o meu quarto através dos vidros da sacada. Eu havia esquecido de fechar as cortinas. Olhei para o relógio que estava ao lado do abajur e vi que estava longe de tocar, eram cinco e vinte da manhã. Apesar de ser cedo, eu estava com as minhas energias renovadas. Na noite anterior decidi dormir mais cedo que o habitual.
Depois de arrumar a minha cama e deixar o meu quarto organizado, separei minha roupa. Vestido tubinho preto, ombro a ombro de mangas que chega a até o antebraço, e um decote bem discreto. Os sapatos optei pelo scarpin nude de bico fino e a bolsa com alça de ombro da mesma cor. Escolhi a banheira e os sais perfumados para o banho, e ao sair senti que todo o meu corpo estava relaxado.
Depois de secar-me, escovei os meus dentes, coloquei um roupão rosa e calcei minha rasteirinha. Antes de descer para a cozinha, peguei meu celular no quarto e continuei meu caminho.
Enquanto iniciava os preparativos coloquei uma música que tanto amo, e que também faz parte de uma fantasia mega romântica que tenho. Dança-lá, olhando nos olhos da pessoa que um dia irei amar. Essa música tem um poder especial de alfinetar o íntimo da minha alma. Trazendo os sentimentos puros à superfície, na esperança de que um dia alguém possa ser digno de tê-los.
Can't Help Falling In Love do Elvis Presley ecoa pela cozinha, e confesso que fico toda emocionada ao ouvi-lo.
Eu devo ficar?
Seria um pecado
Se eu não consigo evitar
Me apaixonar por você?
Cantarolo totalmente conectada com toda a vibração que a música proporciona. A letra da canção tocava profundamente em mim, o que sempre arrancava as minhas lágrimas. Pisco meus olhos sentindo minhas lágrimas surgirem.
Pegue minha mão
Tome minha vida inteira também
Porque eu não consigo evitar
Me apaixonar por você
O trecho final marca de forma sentida ao deixar os meus lábios. Porque de forma estranha meus pensamentos trouxeram o rosto dele. Balancei a cabeça negativamente, afastando a imagem do meu gentil e cavalheiro chefe. Soltei uma respiração profunda. Na tentativa de me livrar da sensação que abordou o meu coração.
Desliguei o fogo, e comecei a montar a mesa. Suco de laranja, torradas, ovos mexidos, croissant e waffles com morango e banana e calda de chocolate...
- Hmm... cheguei em um momento oportuno. - Alicia aparece na porta usando um conjunto preto de corrida, os cabelos presos em um rabo de cavalo e a tira esportiva de elástico rosa se destacava em sua cabeça. - Acordou inspirada hoje?
- Digamos que disposta. - falo, e nos sentamos à mesa.
Alicia atacou uma torrada e pude ouvi-la suspirar altamente à medida que mordia.
- Eu amo essa música... - comenta, a música atual era do Frank Sinatra, My Way. - E também amo o seu gosto musical.
- Obrigada, e cuidado para não se engasgar. - Dou risada ao vê-la falar de boca cheia.
À medida que a música vai se aproximando do refrão a intensidade da melodia vai aumentando. A voz de frank sinatra preenche nossos ouvidos e foi inevitável não cantarmos juntar o trecho:
Sim, houve momentos
Tenho certeza que você soube
Quando eu fiquei mal
Mais do que podia mastigar
Mas por tudo isso
Quando havia dúvida
Eu devorei e cuspi
Enfrentei tudo isso e continuei de pé
E fiz isso do meu jeito
Dramáticamente, Alicia pegou o garfo e fez de microfone. Uma interpretação única e sendo modesta nós cantamos muito bem acrescentando a apresentação de palco presente. Interpretando a letra da música de um jeito tão nós mesma.
- Bravo! Perfeito! - A voz e as palmas de Melanie nos assustam, o que acaba nos interrompendo. - The Voice está perdendo esse talento.
- Vaca. - Alicia rebate a ironia de Melanie.
Eu apenas dou risada da situação.
A música chega ao fim, estico a minha mão em direção ao balcão e pego o meu celular, a fim de encerrar a minha playlist no momento.
- Vem, junte-se a nós. - A convido.
- Aproveita que hoje a Kristal está inspirada. - Alicia comentou e levou à boca um pedaço do waffles. - Deve ser o amor.
- O que é que não estou sabendo? - Melanie indaga e senta-se à mesa.
A mesma estava vestida elegantemente para o seu trabalho na The work post.
Depois de limpar a garganta, Alicia diz:
- Dominic Ford, a divindade da beleza grega, está caidinho pela Kristal.
- É sério? - Melanie comenta chocada.
- Não, não é. - nego.
- Nem tenta negar sua descarada. Eu vi o jeito que ele te olha. - Alicia tenta me desmentir.
Mas finjo não saber do que ela fala e de forma natural, mudo o assunto.
- O que a trouxe aqui, Melanie?
- A saudade. - responde e faz um biquinho teatral.
- Óbvio, de mim. - Alicia responde e pisca um olho.
- Por incrível que pareça, também. - Mel brinca, tentando atiçar a loira. - Mas também pensei. Já faz algum tempo que não saímos juntas e pensando nisso pensei em vim aqui pessoalmente e convidá-las para ir hoje a noite na balada.
- Eu topo sem pensar duas vezes. - Alicia diz no automático. - Só vou precisar cancelar com o carinha do tinder.
Automaticamente a olhamos surpresa.
- Você havia nos dito que havia parado com esses encontros feitos por um aplicativo. - falei.
- Pois é, e ainda lembro das palavras que usou: Irei dar uma chance para os da minha cidade.
Sorrindo de forma amarela, disse:
- Não foi bem assim. Eu disse em um momento de sonolência que não marcaria mais um encontro às cegas e sobre isso que você lembra, Melanie, foi dito em um momento de puríssima frustração pelo bolo que levei.
- E? - indaguei.
- E se vocês olharem bem, verá que as minhas palavras ditas naquela noite possui uma brecha.
- Aí, Alicia desisto. - Melanie soltou e voltou a comer.
- Mas e você, Kris?
Espetei meu garfo no ovo, levando um bocado a boca. Tentando ganhar tempo para responder a pergunta de Alicia. Porque se há algo que eu sei muito bem, é que negar um convite delas é algo quase impossível de acontecer. Elas sempre ganham.
- Infelizmente...
Alicia me interrompe.
- Não será possível...- Cruzes, a garota decorou minhas desculpas.
- Precisa mudar o disco, Kris. Suas desculpas parecem as mensagens gravadas de um correio de voz. - Melanie diz e dá de ombros.
- Eu tenho direito a um "não"? - indaguei.
- Não. - responderam juntas.
- Você entendeu. Não há para onde fugir. - Melanie continua.
- Vamos nos divertir. E se der podemos terminar a noite aqui, assistindo um filme.
- Tudo bem, eu topo. - respondi e tomei mais um gole do meu suco. - Bom, irei me adiantar. Quero chegar cedo hoje porque haverá uma reunião no primeiro horário, e quero organizar a sala com antecedência.
- Nos falamos por mensagem, qualquer coisa. - Alicia comentou.
Assinto, e levanto-me pegando o celular da mesa.
Antes de sair totalmente da cozinha, escuto Melanie cochichar com Alicia:
- É sério que Dominic Ford está interessado na Kris? Conta esse babado!
- Eu ouvi! - grito enquanto subo as escadas e escuto as sonoras gargalhadas delas.
Aos passos ritmados sigo em direção ao meu quarto. Em questão de trinta minutos estava totalmente pronta, havia mais uma vez escovado meus dentes, hidratado a minha pele, maquiado-me e me vestido de forma totalmente profissional. Na bolsa estava meus pertences pessoais e uma agenda que precisei dar uma olhada nos eventos que aconteceriam no dia de hoje.
A sala de reuniões estava pronta. Os equipamentos que seriam usados haviam sidos testados para que não apresentasse uma falha na hora que fossem usados. Verifiquei cada relatório, buscando ver se tudo estava correto.
Jasmine, a secretária do vice-presidente também me ajudou com a parte externa. Confirmar a presença de todos na reunião. Por outro lado, também estava responsável em atender os pedidos das pessoas que estariam presentes.
Dominic havia chegado cinco minutos atrás. Passou sem dizer um bom dia. Estava sério e compenetrado demais nas questões interiores e por esse detalhe não fiquei ressentida com essa questão. Se havia uma coisa que eu era muito boa, era ler as pessoas. Não sei dizer, talvez fosse a energia tensa que facilitava a leitura.
Olho a tela do meu celular e ao ver que faltavam quinze minutos para a reunião começar, decido ir ao escritório e avisar. Bati na porta duas vezes, ao ouvir a permissão para entrar, abro a porta e encontro Dominic sentando na sua cadeira, concentrando em algo importante no seu computador.
- Bom dia, Senhor Ford. O senhor West não irá comparecer na reunião de hoje, apesar de não revelar o motivo, avisou que era pessoal e se desculpou pela ausência. - Aviso, usando um tom extremamente profissional. - Falta apenas treze minutos para a reunião começar, a sala já está pronta.
- Os relatórios foram checados? - perguntou sem dirigir o olhar a mim.
- Sim, senhor.
- Ok, entregue a jasmine. - disse, frio, distante e totalmente diferente do Dominic que foi comigo nos dias anteriores. - Não irei precisar de você na reunião.
- Sim, senhor. - respondi, sentindo uma queimação no peito pela forma indiferente que me tratou.
Sai da sala e fiz o que mandou.Telefonei para Jasmine e a avisei sobre a ordem do Senhor Ford. A coitada veio literalmente correndo buscar os relatórios que estavam prontos em cima da minha mesa. Concentrada no meu trabalho não vejo o tempo passar, e tão pouco vi o momento que o Sr. Ford passou. Ao terminar, faço uma pausa. A garganta secou e a fim de me movimentar um pouco, devido ao desconforto que sinto no corpo pelo tempo que fiquei sentada, decido ir até a cozinha.
Eu tinha a minha própria garrafa de água, mas como havia dito eu precisava me movimentar. Ao chegar na cozinha encontro Jasmine sentada com um mini copo de água mineral a sua frente.
- Oi, não está na reunião? - indaguei e depois de pegar um mini copo também.
- Fui dispensada também. Portanto, já deixei a água deles lá.
- Isso já aconteceu antes? - indaguei, achando a situação estranha.
- Não, a secretária anterior tinha o contato bem limitado e totalmente profissional. A Lilian, como posso dizer, era bem invasiva. Só que ela era de uma forma bem sutil.
- Uau, não consigo nem imaginar como era conversar com ela.
- Digamos que difícil. Ela parecia obcecada pelo senhor Ford. Era estranho a forma como ela tentava saber alguma coisa em relação a ele, se tinha algum relacionamento ou interesse por alguma mulher. - Ao ouvi-la sentir um arrepio percorrer o meu corpo. - Cá entre nós, eu particularmente, acredito que a Lilian nunca teve boas intenções ao trabalhar aqui.
Jasmine dá de ombros e volta a beber a sua água.
- Você está aqui. - uma voz masculina e desconhecida nos pega de surpresa.
- Ruan, o que faz por aqui? - Jasmine se levanta e o cumprimenta com um abraço amigável.
- Vim ver meu pai. - respondeu. - Quando não encontrei você, imaginei que estaria aqui.
- Seu pai está em uma reunião. Vem, junte-se a nós. A propósito, essa é a Maria Kristal, secretária do senhor Ford.
- Prazer em conhecê-la, Maria Kristal.
- Igualmente, Ruan.
Selamos nossa apresentação com um aperto fraterno de mãos.
- Porque não estão acompanhando a reunião?
- Dispensadas. - Jasmine respondeu.
- Está aí uma pergunta que amaria saber a resposta. - falei.
- Vocês tem compromissos no horário de almoço? - Ruan indagou.
- Olha, estou livre. - respondi.
- Eu também. - Jasmine respondeu e olhou para o seu celular quando o mesmo apitou, avisando que havia chegado ao fim a cronometragem.
- Você estava cronometrado o horário da reunião? - indaguei surpresa.
- Uhum, é mais para um lembrete. Ultimamente ando esquecendo das coisas.
- Pode ser estresse. - Ruan comentou.
- Pode ser? Eu não tenho dúvidas quanto a isso. - disse risonha. - Nos vemos no horário do almoço.
Jasmine se levanta, joga o copo vazio na lixeira e sai nos deixando sozinhos. Tanto eu quanto Ruan nos levantamos juntos.
- Bom kristal, foi bom te conhecer. Irei ver o meu pai, agora.
- Também foi um prazer conhecê-lo, Ruan. - Ele assentiu e saiu apressado, mas parecia que sua pressa era mais para ver uma morena, de olhos castanhos e alta, chamada Jasmine.
Sorri percebendo o olhar tímido dele em direção a ela. Tentando não demonstrar seus sentimentos por ela.
Terminei de beber a minha água e joguei no lixo.
- Você está aqui. - Sua voz me alcançou fazendo-me virar para olhá-lo. Não sei ao certo, mas parecia conter uma carga de alívio no seu tom. - Está tudo bem?
- Está. - respondi, vi seu olhar me olhar por inteira.
Ao tentar passar por ele, sua mão segura o meu pulso gentilmente.
- Eu sei que pareço estar distante mas a verdade não é o que parece.
Suspirei fundo.
- Então qual é a verdade, Sr. Ford? - falei séria.
Seus olhos fitaram o meu rosto com um toque de admiração.
- Infelizmente, não posso revelar. - respondeu, desviei o meu olhar cortando o nosso contato. - Maria, por favor, olhe pra mim... - pediu gentilmente.
Engoli em seco, sentindo uma certa súplica no seu pedido.
- Eu não posso contar o motivo de agir assim. Mas quero que saiba que em nenhum momento estive brincando com você. Pelo contrário, eu quero o seu bem.
Ao ouvi-lo, o mirei, mas dessa vez com a guarda baixa. Mas nas entrelinhas eu havia entendido a sua mensagem.
- Então, por favor, não tente acender em mim um sentimento por você. Sabendo que não é possível prosseguir.
Saí da sua presença e segui para a minha mesa. Antes dele retornar levei a sua sala as correspondências a fim de evitar o contato por hora. O mais estranho foi notar que o pequeno diálogo causou uma tristeza em mim, me fazendo perceber que sem notar eu estava criando uma certa expectativa em relação ao que estava começando a sentir.
5409 palavras.
Heelloooo meus amoreeees...
Espero que estejam bem. Peço desculpas pela demora dos capítulos mas com o tempo corrido as vezes nem consigo escrever ou até reeditar os capítulos já escritos.
Se vocês curtem um boooom romance, deixo a indicação desse outro livro meu: Casamento por Contrato. Esta disponível no meu perfil e se me lembro bem deve conter uns 23 capítulos. 💖 Convido vocês a conhecerem o Sr. Black e a Srta. Martins.
❤️
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