Capítulo Trinta e Dois - Steven

A prisão do palácio não era como as de antigamente, com paredes de pedra, grades enferrujadas, tochas nas paredes e correntes para todo o lado. Na verdade, era uma prisão normal e pequena, usada apenas para deter certos suspeitos no palácio até que fossem enviados para Arthenia.

Porém, enquanto descia as escadas que me levaria até aquele lugar, eu me sentia mal e nervoso, pensando na noite certamente horrível que Ivanna tinha passado ali. Mas era preciso. Um pequeno sacrifício que ela estava disposta a pagar para fazer Arabella confessar seus crimes e ser gravada.

Na noite anterior, um pouco antes de passar rapidamente no quarto de Layla e depois ir para o meu próprio, eu estava no escritório do meu pai, tentando focar toda a minha atenção em alguns papéis e esquecer o que tinha acontecido naquele dia e o que aconteceria no seguinte quando Arabella chegou.

Era difícil vê-la de frente e não pensar no que tinha feito. Era difícil manter a calma e não abrir a boca e contar tudo o que eu já sabia.

Durante aqueles dias, nunca soube como consegui atuar tão bem, nem sei de onde arranquei forças necessárias para ainda ser capaz de olhar nos olhos daquela assassina e sorrir. Mas eu fiz aquilo. Fiz porque não tinha outra escolha.

Ela tinha se aproximado da mesa do meu pai e se jogado em uma cadeira, cabisbaixa e muda.

Ele não demorou muito tempo para perceber que ela estava estranha e perguntou o que tinha acontecido.

"Tive que mandar prender uma criada do castelo hoje", ela disse, olhando para o chão como se estivesse realmente triste com aquilo. Meu pai ergueu uma sobrancelha para ela.

"Prender? Quem é e por quê?"

Ela ergueu os olhos para o meu pai.

"É Ivanna, Carl. Lembra-se dela?"

Meu pai assentiu, agora parecendo ainda mais confuso.

"É claro que me lembro. Ela cuidou de você por muitos anos e depois veio trabalhar no palácio. Foi babá de Steven e..." Ele estreitou os olhos para Arabella. "Por que a prendeu afinal de contas?"

Ela passou a mão distraidamente pelo pescoço. Obviamente um gesto proposital para mim.

"Ela me mandou um bilhete, dizendo que queria se reencontrar comigo. Disse que voltou a trabalhar no palácio há algum tempo e... bom, por algum motivo ela só quis me ver agora. Tínhamos conversado por algum tempo quando ela me agrediu. Foi do nada, Carl, ela parecia louca, e tentou arrancar o colar de mim, aquele de pérolas."

Arabella soltou um suspiro pesado.

"Os guardas apareceram quando me ouvirem gritando. Levaram-na sem que eu nem pudesse ver."

Meu pai suspirou, massageando as têmporas. Ele tinha me dito a pouco que já estava com dor de cabeça, devido a todos os preparativos para a confraternização do dia seguinte com alguns dos nobres do país.

"Isso não parece ser o tipo de coisa que Ivanna faria, mas as pessoas mudam. Há dez anos que não a vejo."

"Ninguém está mais chocada do que eu", bufou Arabella, parecendo realmente consternada. "Acredita nisso, Steven? O que será que ela pensou? Que conseguiria fugir? Havia guardas do lado de fora me esperando!"

Eu dei de ombros, ainda olhando nos olhos dela.

"Eu não sei. Sempre existem pessoas loucas."

Então eu continuei meu trabalho, mas foi bem mais difícil com ela ali.

Assim que saí do escritório, fui até a prisão e disse aos guardas que sabia da prisioneira e que ela devia ser alimentada bem até o dia seguinte, quando meu pai analisaria seu caso e decidiria se ela podia ir embora apenas com um aviso de não mais voltar.

Nunca fui um bom mentiroso, mas precisava pelo menos garantir de algum modo que Ivanna ficasse bem até o dia seguinte. Pretendia libertá-la assim que Arabella fosse jogada em uma cela também.

Eu não tinha tido coragem de mandar que os guardas me levassem para ver Ivanna naquela mesma noite, já era tarde e seria estranho, mas planejava no dia seguinte bem cedo ir ter com ela e pegar o gravador reserva. Apesar de um deles estar com Layla, eu sabia que todo o cuidado era pouco quando se tratava de Arabella.

Mas meus esforços, meu cuidado em parecer discreto, tudo isso se provou inútil.

Dolorosamente inútil.

Quando cheguei até os guardas que vigiavam as portas de aço da prisão naquela manhã, perguntando se eles podiam me indicar em qual cela estava presa a mulher que tinha agredido minha madrasta no dia anterior, todos eles, os quatro, me olharam de maneira estranha.

"Perdoe-nos, Alteza", disse um dos guardas, depois de fazer uma pequena reverência. "Mas a prisioneira morreu em algum momento da noite passada. Encontramos seu corpo agora a pouco e ele já estava frio. Comunicamos o ocorrido ao rei e ele mandou que preparássemos o corpo para ser levado para Arthenia e disse que procuraria por parentes da mulher. Se não os encontrar, ela será enterrada no cemitério municipal da cidade."

Por algum tempo, tudo o que fiz foi olhar para o guarda na minha frente, como se ele tivesse dito algo errado ou se eu tinha entendido bem.

Cinco segundos se passaram até que eu desse um passo para trás, fraquejando.

"Alteza? O senhor está bem?"

Não respondi, ao invés disso assenti com a cabeça e estendi a mão, sinalizando para que ele ficasse onde estava. Eu precisava respirar.

"O corpo já foi levado?", perguntei, embora não conseguisse saber mais tarde de onde encontrei forças para pronunciar as palavras.

"Sim, Alteza. Ele ficará no necrotério até sabermos se alguém da família dela recorrerá para enterrá-lo em outro lugar."

Ivanna estava morta.

Morta? Não, aquela era uma palavra forte demais. Não podia ser real.

Eu a tinha visto no dia anterior. Ela tinha falado comigo, tinha até sorrido em um momento quando Layla fez algum comentário sobre como era esquisito estar do outro lado daquele espelho falso, podendo ver tudo, mas não sendo vista.

Ela estava morta. A mulher com quem eu tinha me correspondido todas aquelas semanas e que me havia contado a verdade a respeito do passado. A mulher que tornou possível eu entender o que tinha acontecido com a minha mãe.

Estava morta.

"Como isso aconteceu?", perguntei, mas minha voz não passou de um sussurro desesperado. Os guardas não devem ter ouvido. "Como aconteceu?", perguntei, dessa vez mais alto. "Como ela morreu?"

"Ainda não sabemos, Alteza", disse o mesmo guarda de antes. "Ela era uma mulher velha. Pode não ter suportado ficar presa e acabou falecendo. Ou... bom, perdoe-me, Alteza, mas há inúmeras possibilidades."

Arabella é a maior de todas as possibilidades, eu queria berrar, e é claro que ninguém aqui, nem mesmo meu pai, se importaria em mandar investigar seu corpo e descobrir a real causa da morte, não é?

Queria perguntar se eles tinham encontrado algo quando a pegaram e a levaram para Arthenia, mas aquilo seria improvável e chamaria ainda mais atenção.

Arabella tinha estado ali ontem. Eu sabia que, se perguntasse aos guardas, eles diriam que eu estava certo, mas, diante do que estava acontecendo, eles poderiam pensar que eu estava acusando a rainha de ter feito aquilo.

Ela deve ter encontrado um modo de pegar o gravador, pensei. Minha mente girava procurando respostas, por mais que elas fossem inúteis agora. Talvez ela tenha até mesmo forçado Ivanna a entregá-lo.

Eu precisava ver Layla.

Precisava do gravador e precisava contar a ela o que tinha acontecido.

Os nobres chegariam dentro de pelo menos uma hora e tudo já estava indo para o buraco.

E Ivanna estava morta.

Eu me ergui, dando as costas aos guardas e caminhando para fora daquele lugar claustrofóbico.

A dor estava ali, escondida em algum lugar dentro de mim e esperando para atacar, mas eu teria de lidar com ela mais tarde.

De um jeito ou de outro, eu faria aquilo tudo acabar naquele dia.

Não sei como não consegui correr até o quarto de Layla.

Na verdade, eu meio que corri sim quando me vi no último corredor.

Estava dobrando uma esquina a toda velocidade quando senti meu corpo se chocar com um menor e mais leve. Antes que eu pudesse digerir o que tinha acontecido, fui soterrado com um enxame de palavrões que fariam um praguejador profissional corar.

"Você tem problema, Steven?!", disse Alexia, se agarrando em mim para se equilibrar e em seguida me dando um tapa no braço. "O que você pensa que isso aqui é? Uma pista de corrida? Vê se olha por onde anda!"

"Desculpe, Alexia", falei, sem nem me importar em olhar para ela. "Eu preciso ver Layla e..."

Mas então Alexia enfiou algo na minha cara, fazendo com que o meu campo de visão fosse coberto por um pedaço de papel.

"Chegou tarde. Ela já foi."

Eu peguei o que Alexia segurava e percebi que era um papel de carta endereçado a mim. Quando abri e li as palavras, pensei que o chão aos meus pés a qualquer momento se abriria e me engoliria.

Eu até preferia que aquilo acontecesse.

"Eu não acredito que ela fez isso", disse Alex, parecendo chateada. "Por mais desesperada que Layla pudesse estar com seja o que lá que tiver acontecido com sua família, ela deveria ter me acordado e avisado..."

Conforme relia as palavras na carta, o desespero tomava cada vez mais conta do meu peito.

Se eu não soubesse sobre Arabella e tudo o que descobri a respeito dela durante aquelas semanas, eu poderia acreditar na carta de Layla. Poderia achar estranho, misterioso, mas acreditaria e esperaria que ela me explicasse tudo mais tarde em uma ligação.

Mas agora?

Eu teria de ser o maior dos tolos para acreditar naquilo, além do mais, Layla e eu tínhamos um plano. Algo grande que aconteceria naquele dia.

Se ela tivesse de sair de repente daquele jeito, ela me acordaria e me daria o gravador, para que eu pudesse terminar o que nós tínhamos começado.

Com o coração aos pulos, eu me desviei de Alexia e entrei no quarto de Layla de súbito, varrendo o espaço com os olhos.

Não havia nada ali. Nenhum sinal dela.

Era como se ela nunca tivesse existido.

Mas como Arabella tinha descoberto? Como tinha chegado a ela e não a mim, que era cem vezes mais provável de saber alguma coisa?

Mas antes que eu conseguisse responder aquelas perguntas, uma possibilidade bem mais gritante e assustadora fez com que meu coração parasse e meu corpo paralisasse.

E se Arabella tivesse feito com Layla o mesmo que tinha feito com Ivanna?

O mundo ao meu redor se encolheu e eu me senti sufocar.

De repente a imagem de Layla morta, jogada em algum lugar, me fez perder o chão.

Só percebi que Alexia tinha ido atrás de mim quando vi seu rosto se aproximar do meu.

"Steven, sei que gosta dela, mas não precisa ficar assim. Layla é do tipo que, se tem alguém que ama passando por algum problema, ela larga tudo e vai ajudar. Relaxa. Em algumas horas ela vai ligar e vocês podem conversar."

Eu neguei com a cabeça, fechando os olhos com força.

Eu estava sozinho de novo. Na estaca zero e sem um norte.

Ivanna estava morta. Layla... Eu não queria acreditar. Eu não podia.

Eu queria ir até Arabella naquele momento. Queria segurá-la e sacudi-la até que me dissesse o que tinha feito com Layla.

Queria gritar. Queria fugir.

Tudo estava arruinado.

As duas pessoas que sabiam sobre tudo, que estavam do meu lado, de algum modo tinham sido descobertas. Só restava eu.

Sem provas. Sem gravações.

Mas com a verdade.

Havia uma dor dilacerante rasgando o meu peito e ela eu não conseguia mandar embora, mas o desespero de minha mente eu podia afastar. Podia tentar.

Cerrei as mãos em punhos e me endireitei, garantindo para mim mesmo, para aquela parte assustada e quebrada de mim, que depois que dissesse tudo o que precisava talvez pudesse forçar Arabella a me dizer onde Layla estava. Se é que estava viva.

Era o único conforto que teria naquele momento.

"Precisamos nos arrumar para a confraternização", eu disse, e aquela voz não parecia a minha, porque tudo em mim estava automático, duro e frio. "Não podemos chegar atrasados."

"Desde quando você se importa com isso?", perguntou Alexia, me olhando como se eu fosse outra pessoa.

"Hoje é diferente. Você vai entender."

E então sai do quarto, prometendo a mim mesmo que não estava deixando Layla para trás, que não estava simplesmente aceitando o que tinha acontecido com ela.

Mas eu faria o que precisava ser feito, iria até o final. Precisava acabar tudo por meu pai, pelos meus irmãos, por Layla e pela minha mãe.

E, principalmente, por Ivanna.

_____________________♥️___________________

Oii gente! Tudo bem com vocês?

Minhas aulas finalmente terminaram e agora eu tenho mais tempo para escrever, aleluia! O livro está na reta final e não pretendo demorar muito para liberar os capítulos, temos mais três sem contar com o epílogo!

Me contem o que acharam desse capítulo narrado pelo Steven! Ele é mais curtinho, mas super necessário para o que está por vir no próximo capítulo. Estão preparados para isso? Por que eu não estou... kkkk

Bom, espero que tenham gostado! Mil beijos e até mais.

Ceci.

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