Capítulo Oito - Steven

As paisagens esbranquiçadas de Steinorth passavam com rapidez pela janela do carro enquanto eu me dirigia ao norte, serpenteando por vales e montes conforme a neve caía lentamente.

Poucas casas de campo eram vistas naquela região, aliás, o condado de Crownworth - apesar de ser o maior - era o mais inabitado e frio do país. Levou pouco mais de uma hora para que eu enxergasse pequenos sinais de fumaça no céu, indicando que eu estava chegando perto do meu destino.

Lancei um olhar ansioso para o GPS do carro e observei que estava a poucos quilômetros de Sunville, um pequeno vilarejo de noventa habitantes a sessenta quilômetros de Arthenia.

Sem conseguir conter, pensei que em um penhasco bem próximo daquele lugar pacato e silencioso, minha mãe tinha sido encontrada morta há dez anos...

Inconscientemente diminui a velocidade do carro, passando uma das mãos pelos cabelos enquanto fitava a estrada a minha frente com ansiedade.

Pela centésima vez, me perguntei o que diabos eu estava fazendo, mas agora estava próximo demais do vilarejo para simplesmente sucumbir à covardia e ao desânimo e dar meia volta.

Agora que já estava ali, iria em frente.

Voltei a acelerar.

Mais cedo, naquele dia, eu tinha esperado que meu pai saísse para a cidade e Arabella se refugiasse em seu escritório para descer até o estacionamento do palácio, procurando entre algumas dezenas de carros e limusines o automóvel preto e discreto que seria o último a chamar alguma atenção dentre todas aquelas variedades de automóveis.

Aquele tinha sido o primeiro carro que comprei quando tirei minha carteira de motorista aos dezoito anos, embora o tivesse usado muito pouco, devido a minha ida à universidade pouco tempo depois.

Infelizmente, enquanto deslizava pela cabine e começava a ligar o carro - me sentindo bastante como um adolescente fugindo de casa, devo acrescentar - uma batida na janela fez com que minha alma quase se desprendesse do corpo.

"Aonde você pensa que vai? E por que diabos não me chamou?", Alexia perguntou em alto e bom som, com o nariz grudado na janela do carro e olhando feio para mim.

Sem escolha, abaixei o vidro da janela.

"Eu...", comecei a dizer, mas nem uma única ideia original pareceu pipocar em minha mente naquele instante. Era como se eu tivesse sido pego fazendo algo muito errado pela pior pessoa possível: minha prima. "Eu estava... Bom, tenho alguns assuntos a tratar em Arthenia", balbuciei. Alex ergueu uma sobrancelha para mim. "Meu pai pediu. Sabe como é... Não tenho escolha."

Aquilo soou tão ridículo e forçado até mesmo aos meus ouvidos que me surpreendi que Alexia não soltasse uma gargalhada cínica na minha cara.

"Sabe, você é um péss..."

"O que você está fazendo?", perguntei em tom de acusação, antes que ela dissesse qualquer outra coisa. "Me espionando?"

"A que ponto tedioso minha vida teria de chegar para que eu me propusesse a espionar você?", ela rebateu, revirando os olhos muito verdes para mim. "É claro que eu não estava te espionando. Estou caminhando com Layla."

Então eu lancei um olhar para o retrovisor do carro e vi Layla parada a poucos metros de distância, parecendo bastante chateada por ter sido deixada sozinha no meio de um estacionamento.

"Você é uma péssima anfitriã...", resmunguei para Alex.

"A casa não é minha para que eu seja a anfitriã", ela respondeu rapidamente, com sua língua afiada. "Agora, sem mentiras, onde está indo?"

"À cidade", menti, fingindo procurar alguma coisa no porta-luvas.

"Ok, certo. Fazer o quê?"

"Alexia, pare de ser intrometida..."

"Podemos ficar aqui o dia todo Steven", ela respondeu cantarolando.

"Conheci uma garota", soltei entredentes, sabendo que aquela seria a única coisa capaz de chocá-la o suficiente para que não dissesse mais nada. Devo dizer que minha tática deu certo. Alexia ficou muda. "Estou indo encontrá-la."

"Às nove da manhã?"

Bufei, desejando pela milésima vez na vida jogar Alexia de uma das torres do palácio.

"Ela é uma pessoa matutina. Inclusive para encontros."

"Devo perguntar como a conheceu?", Alex perguntou. "Isso parece meio difícil já que você não sai de casa e não vem a Arthenia com frequência..."

Aquilo tudo era tão ridículo que eu tinha certeza absoluta que Alexia não podia estar acreditando em uma só palavra do que eu dizia. Pelo contrário, parecia estar se divertindo às minhas custas.

"Não. Você não deve", respondi secamente.

"Ok, certo", ela disse dando de ombros, fechando a cara para mim. "Divirta-se no seu encontro." E ela me deu as costas, caminhando para longe.

Não resisti ao impulso de colocar a cabeça para fora do carro e perguntar:

"Tão fácil assim?"

"É claro", Alex respondeu com um sorriso travesso, agora se aproximando de Layla, que pareceu feliz em não ser mais deixada sozinha. "Você acha que eu impediria um milagre desses? De jeito nenhum. Vá em frente."

Revirei os olhos, me jogando no banco do carro novamente.

Nada no mundo poderia melhorar mais minha autoestima do que uma conversa com Alexia...

Naquele momento a vista do pequeno vilarejo se abriu diante de mim depois que fiz uma curva em um pequeno monte, expulsando quaisquer outros pensamentos que poderiam me distrair do que eu realmente estava fazendo.

Mas o que eu estava fazendo afinal de contas? Eu não fazia ideia...

Uma das frases daquele último bilhete que tinha recebido ecoou em minha mente:

"O caminho se desdobrará para você de maneira bastante clara. Pessoas sabem coisas, Alteza, viram e viveram coisas, e o que descobrir te levará até a próxima pista e estas até a verdade."

Bom, eu esperava que quem quer que tivesse escrito aquilo tenha dito a verdade. Era a única coisa na qual eu podia me agarrar naquele instante.

Eu pretendia dirigir pelo pequeno vilarejo e chegar ao lugar onde tudo tinha acontecido, que não poderia ser muito distante dali. Eu sabia que o penhasco era constantemente visitado por turistas e pessoas do país, que depositavam flores no lugar durante o ano todo. Além do mais, eu já tinha visto algumas fotos na Internet do lugar.

Saber daquilo, do carinho que as pessoas ainda nutriam pela minha mãe, atingia meu coração mais do que eu seria capaz de explicar. O sentimento de culpa me invadia toda vez que pensava que nunca tinha ido até ali, embora soubesse que aquilo era mais uma forma de proteger a mim mesmo do que qualquer outra coisa.

Eu estava passando pela rua principal do pequeno vilarejo quando ouvi um som estranho e percebi que um dos pneus da frente do carro tinha passado por cima de uma pedra pontuda escondida pela neve rala. Com um resmungo encostei e desci para olhar o pneu.

Por sorte a rua estava totalmente vazia e as únicas pessoas que consegui ver foi um grupo de três garotos brincando na neve mais adiante. Mesmo assim, por medo de ser reconhecido, ergui o colarinho do casaco e afundei o queixo no cachecol.

Eu tinha acabado de checar que na verdade o pneu não estava furado quando um cheiro doce e irresistível entrou pelas minhas narinas, fazendo com que minha barriga roncasse e eu lembrasse que, na pressa em sair do castelo sem ser visto, não tinha tomado nada a não ser um café quente.

Olhei por sobre a lataria do carro e percebi que do outro lado da rua havia uma pequena padaria aberta, completamente vazia e exalando cheiros divinos.

Enquanto minha mente insistia para que eu entrasse no carro e seguisse minha viagem para lugar nenhum, minha barriga - sem dúvida mais insistente - pedia que eu aproveitasse a oportunidade da padaria estar vazia e sentasse para comer alguma coisa.

Bom, não me orgulho em dizer que a fome venceu.

Tentei evitar o pensamento insistente de eu que estava fazendo aquilo de propósito, simplesmente para evitar o inevitável: encarar pela primeira vez o lugar em que a pessoa mais importante da minha vida tinha morrido. Mas, afinal de contas, quem gostaria de ver uma coisa dessas?

Entrei na padaria silenciosa com o máximo de discrição possível, mantendo a cabeça baixa. A última coisa que eu queria era ser reconhecido e que a notícia se espalhasse. Preferia que minha visita a Sunville continuasse sendo um segredo, assim como toda a minha busca pela verdade.

Me sentei em uma mesinha circular de costas para o balcão, fechando os olhos por um instante e apreciando o calor que o lugar oferecia. Lá fora estava tão frio que qualquer pessoa parada ao ar livre por tempo demais se tornaria um boneco de neve.

"Bom dia senhor, posso ajudar?"

Ergui ligeiramente a cabeça e me deparei com um senhor muito velho e encurvado, que equilibrava seus óculos de armação grossa na ponta do nariz, enquanto segurava um bloquinho de papel com uma mão e uma caneta com a outra.

"Poderia me trazer uma xícara de café? E..." Meu olfato se pronunciou naquele instante e eu senti o inconfundível aroma de cookies saindo do forno. "O senhor tem cookies?"

O velho homem sorriu.

"Minha mulher faz os melhores da região. Um instante, por favor."

Enquanto o senhor ia até o fundo da padaria, eu me recostei na cadeira e comecei a pensar no que eu deveria fazer depois dali.

Não era como se eu tivesse um plano ou algo assim. A mulher que escrevera os bilhetes - e agora eu estava certo que se tratava de uma mulher devido aos pronomes que ela usou no último bilhete - disse que o caminho se desdobraria para mim, certo? Bem, eu tinha certeza que aquele lugar não me traria respostas. O mínimo que faria, eu estava certo, era mexer com os meus sentimentos já confusos e trazer uma boa dose de melancolia. Como se eu precisasse de mais disso na minha vida...

Bem, mas agora que eu estava ali, influenciado pela opinião de alguém que eu não conhecia, de certo não deixaria que a viagem fosse uma perda total. Aproveitaria alguns bons cookies de chocolate e iria até o penhasco depositar minhas próprias flores.

Poucos minutos depois, o senhor voltou com uma xícara de café e um prato repleto de cookies recém-saídos do forno.

"Muito obrigado", eu disse a ele, já ávido para provar um daqueles cookies.

"Estranho, eu sinto que já o conheço...", o senhor disse de repente, ajeitando os óculos e olhando atentamente para mim.

"É mesmo?", perguntei, erguendo um pouco mais o colarinho do casaco. O cookie, a caminho da minha boca, foi esquecido.

"Espere um pouco..." O senhor se inclinou para mim e estreitou muito os olhos. "Mas o senhor é... Oh, Deus!" Ele se ergueu em um salto, como se tivesse visto um fantasma. "O senhor é o príncipe Steven!"

Me encolhi, olhando para os fundos da padaria.

"Por favor, se o senhor puder falar baixo..."

"Ora, é claro, mil perdões Alteza..." Ele se curvou em uma reverência profunda. "É uma honra tê-lo em meu humilde estabelecimento."

"A honra é minha", eu disse, percebendo o quanto as mãos do pobre homem tremiam de excitação. "Não quer se sentar?", sugeri a ele.

"Com o senhor, Alteza?", ele perguntou, como se eu tivesse lhe oferecido uma grande quantia em dinheiro.

"É claro."

O velho senhor se sentou na cadeira defronte a minha, trêmulo.

"Senhor, sei que pode ser indelicado pedir, mas o senhor poderia não comentar com ninguém que estive aqui?", pedi educadamente, precisando garantir aquilo.

"É claro", ele confirmou antes que eu terminasse de falar, com veemência. "Oh, se minha mulher soubesse que o príncipe comeu os cookies dela..." Seus olhos se perderam, sonhadores por um instante. "Mas de jeito nenhum contarei, Alteza. Tem a minha palavra. E, por favor, me chame de Julian."

"Obrigado, Julian", falei, analisando-o e sentindo uma pontada de confiança e simpatia pelo homem. Talvez ele realmente mantivesse a boca fechada. Um pouco mais aliviado, tomei um gole do meu café e mordi um cookie. Céus... Era realmente divino.

"Alteza", Julian disse, como se não conseguisse conter. Ele se inclinou para mim. "Sei que isso não é da minha conta, mas o senhor... O senhor veio para ver o memorial de sua mãe?"

"Memorial?", perguntei, aturdido, sem saber o que aquilo significava.

"Oh, é claro que o senhor ainda não ouviu falar..." Julian sussurrou, aparentemente mais para si mesmo do que para mim. "Erguemos uma pequena placa na beira do penhasco há algum tempo, quando... quando o aniversário de morte da rainha completou dez anos. É algo simples, mas deixamos algumas escrituras."

Eu não sabia o que dizer. Aquilo tocou bem fundo e eu me comovi pelo gesto, de repente ansioso para sair dali e ir ver o memorial.

"Vocês fizeram?", perguntei. "As pessoas de Sunville?"

Julian assentiu com entusiasmo, torcendo as mãos nodosas com um sorriso no rosto.

"Nós e mais alguns habitantes de um vilarejo vizinho contribuímos para a construção. O lugar recebe muitos visitantes por ano e a pequena cruz que deixamos ali na época do ocorrido ficava soterrada por flores de todos os lados... Precisávamos de algo um pouco maior."

Eu pisquei, tentando afastar aquela ardência que tinha tomado conta dos meus olhos.

"Julian, eu realmente não sei como agradecer...", disse, sentindo meu coração inchar de felicidade, mas também de uma dor incômoda e tão conhecida por mim. "É realmente algo maravilhoso da parte de vocês... Tenha certeza que isso vai ser divulgado pelo portal oficial da Família Real com os devidos agradecimentos, e também insisto que aceitem um reembolso pela construção do memorial."

Julian abriu ainda mais seu sorriso, balançando a cabeça em recusa à minha oferta.

"Apenas sua gratidão já é o suficiente Alteza", ele disse. "A rainha Louisa... Ela era uma mulher admirada por todo o país e pelo mundo. Era tão gentil e doce com aqueles que necessitavam...", ele suspirou, os olhos de repente marejados, "o senhor deve saber."

"Sim, eu sei", sussurrei com um pequeno sorriso, meus olhos se perdendo por um instante quando a imagem dela me veio à mente. "Ela era uma mãe maravilhosa também", me peguei dizendo, sem perceber. "Até melhor do que era uma rainha, arrisco dizer."

"Não tenho dúvidas, Alteza", Julian disse, e me surpreendi quando sua mão encobriu a minha em um gesto carinhoso. Não o repeli. Seu carinho era palpável. "O senhor se parece muito com ela."

Eu sorri, soltando uma risadinha.

"Dizem que Sebastian, meu irmão, é o mais parecido."

"Isso, de fato, eu terei de concordar", o senhor disse também rindo. "Os olhos são os mesmos."

"O senhor chegou a conhecê-la?", perguntei, mesmo sabendo que aquilo talvez fosse improvável.

"Ah, isso é algo que eu não saberia responder..."

Ergui os olhos para Julian, não entendendo o que aquilo queria dizer. O olhar do senhor pareceu se perder por um instante atrás dos óculos de armação grossa.

"Perdão, mas não entendo o que isso quer dizer...", disse a ele.

"Isso é algo que nunca contei a ninguém, Alteza, nem mesmo a minha esposa", ele disse então, os olhos se obscurecendo e focando em mim. Eu me remexi na cadeira, o coração batendo forte. "Apenas uma vez, há muitos anos e um pouco depois da morte da rainha, uma velha senhora apareceu por essas paragens fazendo perguntas. Ela era gentil e parecia abatida. Contei-lhe então algo que sempre voltava a minha mente."

"O quê?", perguntei, me inclinando sobre a pequena mesa. "Contou-lhe o quê?"

"No dia em que a rainha foi encontrada morta, uma moça apareceu por aqui", disse ele, a voz retumbando nos meus ouvidos. "Como o senhor sabe, era um verão quente e ela usava óculos escuros e tinha um lenço vermelho na cabeça. Estava vestida com cores alegres e era bastante gentil. Me pediu um prato de cookies."

Àquela altura, o zunido do sangue nos meus ouvidos quase tornava impossível que eu ouvisse o que Julian dizia.

Um lenço vermelho...

"Durante todo o tempo em que ficou aqui, ela não tirou os óculos ou o lenço. Tudo o que eu podia ver dela era a formato do rosto e os traços iguais aos de tantas outras mulheres..." Julian então abaixou a cabeça, fitando as mãos com nervosismo. "Ela não falava muito, embora sorrisse. Quando perguntei o que fazia uma mulher tão linda em um lugar isolado como esse, ela só disse que estava esperando alguém para um passeio. Apenas isso. Então seu telefone tocou e ela disse que estava a caminho, pagou a conta e não a vi mais. Imagino que seu carro estava estacionado em um lugar mais a frente, pois apenas ouvi o barulho do motor sendo ligado e o carro se distanciando."

Permaneci em silêncio, a cabeça girando.

Se alguém me perguntasse sobre a última vez em que vi minha mãe, eu daria todos os mínimos detalhes com precisão.

Ela estava conversando com a babá enquanto eu brincava com Sebastian e Margot chorava por algum motivo perto de um castelinho de brinquedo. Quando ela estava prestes a sair, se virou para nós e deu um beijo em cada um.

Quando chegou a minha vez, ela disse:

"Ajude a Srta. Morie a cuidar de seus irmãos, sim?", ela disse em tom doce, bagunçando meus cabelos. "Daqui a pouco e você é quem estará tomando conta deles."

Eu não disse nada, mas também a dei um beijo no rosto.

Então ela saiu da sala, sua saia de verão rodopiando enquanto ela amarrava um lenço novo e vermelho na cabeça, para afastar algumas mechas do cabelo volumoso do rosto.

Nunca mais a vi. Nem no funeral, no qual seu caixão se manteve lacrado.

"Ela..." Eu engoli em seco, tentando organizar meus pensamentos. Meu coração batia tão rápido e forte que cheguei a me preocupar. "Ela disse que estava esperando por alguém?", perguntei a Julian, que assentiu. "Por que... por que o senhor nunca contou isso às autoridades?"

Eu lutava para manter minha voz estável, mas era praticamente impossível.

"Nunca soube se era realmente ela, Alteza", ele disse, e sua voz estava tão carregada de remorso que não tive outra escolha a não ser me solidarizar pelo velho senhor. "A delegacia de polícia mais próxima fica a uns trinta quilômetros e eu nunca saberia o que dizer... Nunca foi divulgada uma foto da rainha do dia em que morreu e eu sinceramente nunca tive certeza. Parecia uma mulher comum naquela tarde e eu só fui desconfiar de algo quando a rainha foi encontrada morta perto daqui pouco tempo depois."

Ela era uma mulher comum..., pensei com amargura. Era extraordinária em suas ações, com certeza, mas era simples e gentil com todas as outas pessoas ao seu redor, especialmente os plebeus. No meio deles, usava as roupas que a deixavam confortável e poderia facilmente se misturar a multidão com suas palavras simples e gestos comuns.

Não tinha como Julian saber. Eu sabia disso, mas mesmo assim aquela consciência deixava um gosto amargo em minha boca.

"Mas, Alteza", Julian disse, e seus olhos se encontraram com os meus como se ele buscasse uma confirmação, um conforto. "O senhor com certeza viu sua mãe naquele dia, não é? O senhor poderia dizer se era realmente ela."

Eu engoli em seco, sem saber o que dizer.

"Ela só disse que estava esperando alguém para um passeio. Apenas isso."

Quem ela estava esperando? Como se sentia tão feliz e confiante poucos instantes antes de tudo acontecer? Será que não desconfiava de nada?

Aquela era a confirmação que eu precisava. A confirmação que eu temia.

A mulher dos bilhetes estava certa. Minha mãe não estava sozinha naquele dia. Ela esperava por alguém.

Pelo seu assassino.

Deus... Era tudo verdade. Só podia ser.

Eu precisava urgentemente ficar sozinho. Precisava pensar e tentar encontrar sentido naquilo tudo. O ar parecia faltar aos meus pulmões e era como se o eixo da minha vida estivesse inclinado, fazendo com que tudo o que eu acreditava a respeito da morte da minha mãe fosse colocado a prova.

Era uma sensação mil vezes mais forte do que aquela que eu tinha experimentado ao ler pela primeira vez o bilhete que me foi entregue há dois dias. Era avassalador e desnorteante.

"Alteza?"

Despertei de meus devaneios, olhando para Julian, que me observava com apreensão.

Então, como um raio ao me atingir, soube o que eu deveria dizer.

"Não era ela", afirmei, e, pela primeira vez, uma mentira minha soou convincente. "Não me lembro muito sobre aquele dia, mas tenho certeza de que não era minha mãe. Ela não estava usando as roupas que você descreveu."

Julian então suspirou sonoramente, seus músculos relaxando na cadeira quando ele se recostou nela. Ele levou uma mão ao rosto cansado.

"Graças a Deus, Alteza", ele murmurou em um soluço. "Durante todos esses anos me perguntei se ficar em silêncio foi a escolha certa, mas o que eu poderia fazer? A mulher parecia um pouco com a rainha e no mesmo dia sua mãe foi encontrada morta perto daqui. Mas eu não tinha certeza. Não vi o carro dela nem o seu rosto direito. Quis por um tempo tentar contatar o rei, mas eu não sabia como e pouco tempo depois as investigações pararam. Então aquela senhora apareceu fazendo perguntas, mas assumi que fosse apenas uma curiosa. É provável. Não sabe o alívio que estou sentindo agora..."

Em um gesto calmo eu apartei a mãe dele, tentando reconfortá-lo.

"Eu entendo, Julian. Não se preocupe."

Depois daquilo não levou muito tempo para que eu conseguisse ir embora sem parecer muito suspeito ou indelicado. Terminei o café e decidi levar os cookies para a viagem.

Com um abraço, me despedi do senhor que tinha me dado a resposta que eu precisava e definitivamente não esperava.

Enquanto dirigia de volta à Arthenia, não pude deixar de pensar em como o destino tinha me ajudado naquele dia. O que era estranho, pois eu não acreditava em destino.

Minha cabeça dava voltas e tentava encontrar explicações, ao mesmo tempo em que meu subconsciente começava a aceitar o fato de que a morte da minha mãe realmente não havia sido tão simples e casual como todos pensavam.

Mas, principalmente, eu não conseguia deixar de pensar em quem teria feito aquilo.

A mulher dos bilhetes disse que eu conhecia o assassino, e aquilo era o que mais me apavorava e me deixava agoniado. Tinha começado a olhar para todos ao meu redor com desconfiança, perguntando-me se o assassino ainda estava ali, ao meu lado sem que eu pudesse ver. Mas como era possível? Ninguém ao meu redor poderia ser um assassino, ninguém teria motivação para tal.

Eu me sentia como se estivesse à beira da loucura, tentando encontrar respostas e me deparando com uma parede sólida.

Eu precisava urgentemente escrever outro bilhete, precisava contar o que tinha descoberto e perguntar àquela mulher misteriosa se ela sabia sobre a informação de Julian. Seria por isso que ela tinha me enviado até lá? Imaginava que eu acabaria entrando naquela padaria e encontrando respostas tantos anos depois da morte da minha mãe?

O tempo pareceu voar enquanto eu dirigia de volta, meus pensamentos ocupando tanto a minha atenção que tive medo de acabar fazendo alguma besteira na estrada.

Quando finalmente enxerguei o contorno da grande Arthenia ao longe, o céu estava escuro e trovões ameaçadores soavam. Uma chuva muito forte caiu instantes depois, obstruindo minha visão por mais que os para-brisa trabalhassem.

Chegando ao pé da colina onde o castelo se erguia impetuoso, percebi que a estrada estava bastante acidentada, e uma verdadeira correnteza descia dali. Devagar e com dificuldade, comecei a subir a estrada, relâmpagos clareando o céu a todo instante.

Eu não estava muito longe do palácio quando, de repente, enxerguei algo na beira da estrada que fez meu coração tropeçar dentro do peito e minhas mãos escorregarem do volante.

Encolhida perto do meio-fio, com as duas mãos tapando os ouvidos e chorando desconsoladamente, Layla Bennett estava sob a chuva forte, parecendo confusa e abandonada.

Meu corpo reagiu sem que eu tivesse consciência dos meus movimentos.

Desci do carro sentindo o frio e a chuva forte me atingir, mas o calor e a adrenalina que corriam por cada uma das minhas veias faziam com que aquilo não fosse nem um pouco importante.

Tirei o casaco que vestia e o estendi acima da cabeça, correndo aos tropeços até onde Layla estava sentada, chorando tanto que até mesmo o som dos trovões não eram capazes de abafar seu desespero.

"Layla!", gritei, me aproximando dela com dificuldade. "Layla..."

Quando cheguei até ela, percebi que seus olhos estavam fechados com força e que ela balbuciava algo incompreensível, as lágrimas se misturando com as grossas gotas de chuva.

"Layla venha cá", eu disse, passando um braço ao redor de seus ombros gelados e tentando levantá-la.

"Não!", ela gritou desesperadamente, os olhos ainda fechados com força. Sua expressão tomada pelo medo mais genuíno que já vi na vida me atingiu no peito como uma faca. "Não! Me largue, Joseph..."

Seus gritos então se transformaram em soluços enquanto ela tentava se afastar de mim, usando as unhas e a pouca força que tinha para me ferir.

"Me largue, por favor..."

"Layla!", eu gritei, tentando fazê-la acordar daquele estado catatônico. Um trovão estrondoso ecoou naquele instante, fazendo com que ela levasse as mãos aos ouvidos em desespero, chorando. "Layla, sou eu, Steven. Layla, por favor..."

Mas ela não conseguia me ouvir. Seja onde quer que ela estivesse, era em lugar bem distante dali, onde só o barulho da tempestade era ouvido.

Sem escolha, a peguei no colo à força, não me incomodando com suas agressões que aos poucos se tornavam mais fracas.

Corri o máximo que pude com ela nos braços e a coloquei no banco do passageiro do carro, entrando logo em seguida e ligando o aquecedor no máximo.

Nós dois estávamos encharcados até os ossos.

Layla agora tinha parado de se debater, mas continuava chorando. Era um choro tão profundo e parecia vir tão de dentro de sua alma que meu coração pareceu capaz de se romper. Eu daria qualquer coisa para fazê-la parar de chorar daquele jeito.

"Layla, por favor", sussurrei baixinho, torcendo para que ela se ligasse a minha voz, e não a tempestade que caía do lado de fora. "Layla..."

Eu segurei os braços dela, que ainda estavam tampando os ouvidos.

Com cuidado afastei seu cabelo encharcado dos olhos, deslizando uma mão por seu rosto com carinho.

"Layla, sou eu, Steven, o primo de Alexia e o irmão de Margot e Sebastian..." Eu não sabia como aquilo poderia ajudar, mas eu queria que ela me reconhecesse, que parasse de repetir aquele nome que parecia lhe causar tanto medo... Joseph. "Você pode me ouvir? Por favor, não tenha medo."

Continuei acariciando-a com cuidado e receio de assustá-la até que sua respiração se normalizou, seus tremores diminuíram e suas lágrimas cessaram.

Lentamente, ela abriu os olhos.

"Steven?", ela sussurrou, em um fiapo de voz.

A onda de alívio que invadiu meu peito naquele instante me fez estremecer. Eu pensei... Eu nem sei o que pensei. Nunca tinha visto uma pessoa naquele estado.

"Ah, Layla, graças a Deus..."

Eu estava prestes a abraçá-la quando me lembrei de que aquilo talvez não fosse uma boa ideia.

"Vou te levar para o castelo. Só... preste atenção em mim, o.k? Esqueça a tempestade. Escute a minha voz."

Ela assentiu levemente, tão levemente que se não a olhasse com tanta atenção não teria percebido.

Com as mãos trêmulas eu liguei o carro, mas, de repente, Layla segurou minha mão, fazendo com que eu olhasse para ela.

"Não me leve para o castelo", ela pediu baixinho, os olhos cheios de lágrimas. "Não quero que me vejam assim... Eu não quero..." Um relâmpago cruzou o céu, iluminando a cabine do carro tão completamente que eu pude ver cada gota de chuva que escorria pelo rosto molhado e abatido de Layla. Ela se encolheu, recolhendo a mão, mas eu a segurei.

"Não vamos para o castelo", prometi, apertando sua mão fria como gelo. "Fique tranquila. Fique comigo."

Ela assentiu novamente e virou o rosto para o vidro da janela, descansando a cabeça na poltrona do carro.

Durante todo o trajeto, vi as lágrimas rolando por seu rosto e seu peito sacudir com os soluços contidos.

Minha mão permaneceu entrelaçada na dela, assim como todos os meus sentimentos, inexplicavelmente ligados com os dela, que pareciam carregar tanta dor...

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Oii gente! Espero muito que vocês tenham gostado desse capítulo! Com ele já dá para montar muitas teorias, hein?

E esse final??? O capítulo nove vai dar o que falar, além de ser MUITO amorzinho❤️

Ah, antes que eu me esqueca, criei um twitter dedicado especificamente aos meus livros e recomendações de outras histórias! Sempre vamos poder bater um papo diário por lá ❤️ Obrigada a LetsSilvaa por ter dado essa sugestão maravilhosa! O link vai estar nos comentários.

Vejo você no próximo capítulo!

Ceci.

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