Capítulo 10 - Zander

Se eu não estivesse prestando muita atenção não teria notado a pequena alteração no sorriso de Barbara. Ela para no meio do caminho no momento em que nossos olhares se encontram. Sei que ela está surpresa pela falta das lentes, porém nunca pensei que isso pudesse incomodá-la. Ao invés de se aproximar, ela dá meia volta.

Eu a observo marchar de volta para seu carro, me perguntando o que eu fiz de errado. Tive a impressão de que ela estava me evitando nos últimos dias, mesmo que respondesse minhas mensagens, algo estava estranho nas respostas de Barbara. Talvez eu tenha sido rápido demais, eu sabia que não devia ter deixado ela ir adiante no sábado, por mais que eu quisesse muito.

— Barbara! — Seus ombros se contraem quando eu a chamo, mas isso não a faz parar. Pelo contrário, seus passos ficam mais rápidos, como se ela estivesse desesperada para fugir.

Eu me coloco entre ela e o carro, impedindo-a de continuar. Não sei exatamente o que está acontecendo, mas preciso descobrir antes de deixá-la ir.

— O que houve? — Minha voz sai fraca, o que não vejo como um bom sinal. É a primeira vez que me assusto com a possibilidade de ter ferido os sentimentos de uma garota.

— Eu... — Ela engole em seco e me encara. Seus olhos brilham contra a pouca luz e finjo não notar que ela está prestes a chorar. Seja o que ela tiver para falar, sinto que é importante. — Eu fiquei sabendo de uma coisa no domingo.

Meu sangue gela no minuto que as palavras saem de sua boca. Tenho certeza que ela também nota, pois desvia o olhar para o chão.

— O que você ficou sabendo? — Torço para que ela não repare no modo como meus dedos estão tremendo. Espero que ela não esteja se referindo à mim e Hilary, mas duvido que haja outra coisa que possa ter a deixado assim.

Ao invés de responder Barbara me dá as costas e caminha para um dos bancos próximos ao muro baixo do mirante. Observo-a sentar e depois de alguns minutos me junto a ela.

— Barbara, me conta o que você sabe... — Espero por uma resposta, porém ela apenas puxa os joelhos para cima e os abraça. Cada segundo que passa sem que eu ouça sua voz me deixa mais e mais preocupado. — Se eu fiz alguma coisa para te machucar eu preciso saber. No sábado, eu não tinha planejado nada daquilo, mas não vou mentir porque gostei muito...

— Não foi você, Zander. — Sua voz sai baixa, me fazendo duvidar que seja verdade. Vendo que não acredito nela, Barbara respira fundo e vira em minha direção. — Aconteceu muita coisa depois que a gente se viu.

— O que foi? — Meu pedido sai quase como uma suplica e acabo puxando as mãos dela para mim antes que ela tenha chance de fugir sem me explicar o que está acontecendo.

— Bem... Primeiro meus pais me contaram que eu vou ter um irmão. Você consegue imaginar isso?

— Eu acho que é uma boa notícia, não? — Sua revelação me surpreende. Geralmente notícias como a de um bebê a caminho costumam deixar as pessoas felizes, não é possível que isso tenha deixado Barbara tão assustada. Eu vi seus olhos quando ela chegou e é óbvio que algo em mim a está incomodando.

— Você viu o lugar em que eu moro. — Ela solta uma risada curta e sem humor algum. — Você consegue imaginar o quanto é difícil para uma criança entender porque ela não tem as mesmas condições que os amigos? A primeira vez que um garoto me chamou de lixo foi horrível. Ele tinha acabado de me beijar! Depois disso eu estava preparada para lidar com eles. Não quero que mais alguém passe pela mesma coisa. Meus pais deveriam ter sido mais cuidadosos... Pelo amor de Deus, minha mãe é enfermeira! Não faz sentido.

Sem perceber, Barbara se aproxima de mim e apoia o queixo em meu peito. Sinto os tremores em seu corpo e por instinto envolvo meus braços ao seu redor. Nunca imaginei o quanto sua infância deve ter sido diferente da minha, mas saber que as pessoas se desfizeram dela devido ao lugar onde ela mora me faz ter raiva. Ela não deveria ser tratada diferente por um simples endereço e se as pessoas não são capazes de enxergar o quão doce e especial Barbara é, eles não a merecem em suas vidas. Estremeço por dentro ao pensar no que pode acontecer se o plano de Hilary não funcionar. Eu perderei a confiança de meus pais, porém pior que isso é a ideia de que Barbara pode não me perdoar e eu não terei como culpá-la. Aposto que ela está farta de mentirosos e por mais que eu queira ser diferente deles, não estou muito longe. Deveria contar a ela toda a verdade, mas não tenho coragem.

— Minha mãe costuma dizer que tudo acontece por alguma razão. — Não sei porque solto isso, mas assim que falo percebo que era o certo. Posso praticamente ouvir minha mãe repetindo as palavras como ela sempre faz quando algo inesperado acontece.

— Talvez eu tenha esquecido o celular no dia que o carro quebrou por uma razão. — Ela ergue o rosto e sorri para mim. — Se eu estivesse com o celular naquela tarde provavelmente não teria te encontrado.

— Que bom que seu carro quebrou. — Rindo, inclino o rosto o suficiente para beijá-la, porém Barbara vira o rosto pouco antes de meus lábios alcançarem os seus e acabou beijando a ponta de seu nariz.

— Você realmente acredita nisso?

— Não. Eu sei o quanto é caro reparar um carro. — Sei que ela está se referindo ao que falei antes, mas não consigo evitar fazer uma piada. Há algo mais a incomodando e eu só posso torcer para que ela me conte logo assim posso consertar.

— Estou falando sobre nós dois nos conhecermos. Você acha que tem um motivo para isso?

— Claro. Não acredito em coincidências.

— Nesse caso eu vou começar a acreditar que tudo na minha vida aconteceu para que eu pudesse te encontrar. — Ela zomba, mas posso senti-la relaxar em meus braços.

— Foi tão ruim assim? — Pergunto antes de perder a coragem. Não quero pressioná-la, mas tudo em Barbara me deixa curioso.

— Você não faz ideia. Também tive muitos momentos bons e tenho sorte por ter pais tão legais, mas nem o amor deles é capaz de me fazer esquecer algumas coisas. Acho que perdi a conta de quantos insultos ouvi ao longo do colegial... Se você me conhecesse naquela época com certeza não ia querer falar comigo.

— Por causa do cabelo verde?

Ela me encara surpresa por eu lembrar do que falou durante o jantar.

— Não. Porque teve um tempo em que eu realmente acreditei no que as pessoas diziam. E naquela época você só teria se aproximado de mim por uma coisa, mas logo ia perder o interesse como a maioria dos caras. — Sua voz diminui e sinto a dor por trás de cada palavra sua. Ela tem vergonha do que fez, posso perceber pelo jeito que evita meu olhar.

— Eu não teria. — Puxo seu queixo para que ela me encare.

— Como você pode ter certeza? Eu mudei muito ao longo dos anos.

— Você precisa confiar em mim. — Isso parece ter algum enfeito em Barbara, porque ela permite pela primeira vez na noite que eu a beije.

Sem pressa, eu a puxo para ainda mais perto e suas mãos vão para meu cabelo no mesmo momento em que nossas bocas se encontram. Assim que sinto o contorno de seus lábios contra os meus lembro da noite de sábado e acabo intensificando o beijo. Passei os últimos dois dias tentando não pensar em Barbara, ou na estranha falta que ela fez, e tento mostrar isso para ela através do beijo. Quero que ela saiba que falei a verdade quando pedi para que ela confiasse em mim.

— Preciso que você confie em mim. — Repito quando ela se afasta. Seus olhos encontram os meus e sinto o peso do que estou pedindo. — Barbara, eu preciso de tempo para te contar uma coisa. Você acha que pode esperar?

Ela faz que sim timidamente e ao invés de me aliviar, minha culpa aumenta. Tenho certeza que ela não vai me perdoar quando descobrir que estou mentindo. É provável que ela me odeie pelo resto da vida, mas eu tenho que correr o risco. Não posso continuar escondendo quem eu sou por muito mais tempo; ela vai acabar descobrindo e eu prefiro que seja por mim, desta forma tenho uma pequena chance de me explicar.

— Você também pode confiar em mim. — Ela pisca.

— Obrigado.






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