Dark Paradise

       Eu queria estar morta.

        É nisso que penso enquanto sinto a água acariciar a minha pele, gelando casa fragmento do corpo vivo moldando uma alma morta.

        Não há ninguém além de mim na praia que nos serviu de lar, e o som das ondas quebrando na margem, mesmo que familiar, é distorcido quando meus ouvidos imergem na água. O zumbido é incômodo, quase enlouquecedor, mas ele passa quando começo a pensar na nossa música. A música que estava presente em todas as nossas tardes na praia, em todas as nossas noites de companhia.

        Se eu inclinar o corpo e voltar para a margem sei que poderei ver a casa na costa onde passamos todo o verão, mas não quero fazer isso. Preciso esquecer que ela existe. Todas as vezes que entro naquele lugar e deito naquela cama de casal embaixo da janela tudo o que eu sinto é um vazio desesperador. A falta do seu peso inclinando o outro lado colchão me causa medo, o gelo dos lençóis é como uma lixa cerrando a minha pele. Eu não consigo dormir lá, não consigo fechar os olhos sem ter a sensação de que estou em um paraíso  escuro e frio, onde a beleza ainda existe, mas não tem motivo para ser apreciada.

       Já se passaram anos, e ninguém se compara a você. Nenhuma alma é tão livre, tão entendedora da minha, e quando mais tempo passa, mais desesperada fico. Sei que não encontrarei ninguém como você, e pensar nisso me dá nos nervos, porque começo a temer que você não esteja me esperando do outro lado quando eu partir. Quero ver seu rosto novamente. Não posso me contentar em ficar nesta vida miserável implorando por migalhas de lembranças suas, vasculhando sonhos desconexos que me assombram na maioria das noites.

        Comecei a, com o tempo, não querer seguir em frente. Eu sei que você iria me dizer para superar. Posso praticamente ouvi-lo cantar que tudo ficará bem, mas não consigo me livrar de você. É como uma musica presa na minha cabeça, qual eu tento esquecer mas acabo voltando a cantar. E eu amo essa música.

        Tudo o que penso é em você. Em como você sorria, em como você me dizia que tudo não passava de diversão. Eu amava cada pequeno pedaço da minha vida quando eu estava ao seu lado. Não consigo aceitar que perdi algo que achei que nunca iria encontrar.

        Uma onda quebra acima de mim, me fazendo emergir. Eu olho para o céu e sinto você me tocar, como se a água do oceano incorporasse a sua alma e me abraçasse do jeito que você me abraçava quando andávamos juntos. Está frio, mas não tanto. Eu fecho os olhos e escuto o som da noite, e nesse pequeno momento também vejo o seu rosto.

Eu não quero acordar disso, seja lá o que for. Nunca quis. Mesmo fora daqui, quando meus amigos me dizem que devo seguir em frente, tudo o que quero é continuar imersa no pensamento de que essa praia e essa casa são o meu jeito de falar com você. Afinal este foi o último lugar a te ver vivo, e essa água, que te matou, foi a última coisa a te tocar. Eu nem mesmo me importo que você morreu sem ar, olhando para a casa que amou, pensando que a mulher da sua vida estava dormindo lá dentro, a alguns passos de te impedir de se afogar.

      Eu só quero pensar que, se você morreu aqui, então é aqui que vai ficar, e eu devo permanecer com você.

        Honestamente, amá-lo para sempre não pode ser errado. É ilógico pensar que em algum momento terei como olhar para outra pessoa do mesmo jeito que olhei para você, que toquei você, que senti você. Um amor verdadeiro, quando encontrado, vive para sempre, e é por isso que eu permaneço aqui.

No mar, com os olhos fechados, pensando na nossa canção.

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