🐍 01 | ㅤㅤ CHANGES
A SOLUÇÃO QUE OS PAIS DE PADMA ENCONTRARAM PARA NÃO SE afundarem no mar de dívidas e fracasso, foi planejar uma mudança de urgência para os Estados Unidos. O sobrenome que passou anos sendo referência no país, agora era o próprio sinônimo de vergonha, a ponto de que respeito não existisse mais nem mesmo com Kian, aquele que além de ter ganhado diversos títulos de campeonatos mundiais de Muay Thai, também serviu o exército com honra e lealdade. Tudo o que construíram, de repente não era nada mais além de memórias e flashes falhos.
Padma se via perdida, numa crise existencial de questionamento eterno a respeito do seu próprio eu. Todas as vezes que parava na frente do espelho, não conseguia ver sua aparência, apenas um grande borrão, uma construção abandonada. Considerava-se nas novas circunstâncias uma grande fraude.
Kian costumava dizer que dos três novos Madee-Kim, Padma era a única capaz de lidar com a realidade da forma mais real possível. Mas, chegou num momento que ela passou a duvidar da própria capacidade, perguntava-se se realmente saberia lidar com as coisas da forma sabida. Parecia muita responsabilidade para uma adolescente de, agora, dezesseis anos.
Três meses após o firmamento do acordo, todos pensaram que saberiam viver as vidas da mesma forma, agora com o único porém da perda da academia e banimento de Padma das lutas. Não deveria ser tão difícil, eles tinham contato pela populosa Bangkok. Recomeçar não seria impossível, então precisavam tentar.
O que claramente foi uma tentativa falha.
Padma foi expulsa da escola sem motivos plausíveis, seus pais não conseguiram emprego, e o título que Kian esbanjava por aí, já não servia para nada. Precisavam dar o fora da Tailândia o mais rápido possível.
E em meio a lamúrias, choros e diversas conversas que Padma escutou escondida por longas semanas, no final surgiu a ideia "mudar para os Estados Unidos". Uma ideia que gerou certas opiniões na cabeça da adolescente, mas como causadora de toda aquela crise, aceitou de boca fechada o que lhe mandaram. Fez suas malas, se despediu do bairro que cresceu, e entrou no avião com sua família rumo à Califórnia.
Kai inicialmente odiou ter de largar tudo por consequência de Padma, mas no fim a ideia se tornou bastante tentadora quando escutou que iriam reabrir a academia na América, e que, possivelmente, ele poderia dar aulas lá. Coisa que nunca pôde antes porque na Tailândia, tudo que remetesse à imagem dos Madee-Kim, era destinado à ela, Padma. Padma, Padma e Padma.
Hansa, a mais velha dos três, particularmente amou a ideia. Estava no processo de se inscrever na faculdade, então tentar uma graduação em alguma das academias de renome, era um grande passo.
Hansa nunca culpou a irmã mais nova pelo fracasso da família. Não tinha o que culpar Padma. Se os políticos na Tailândia eram tão nojentos, então fizeram o correto de sumir e recomeçar em um novo lugar, onde ninguém sabia quem eles eram. Não eram mais os fracassados de Bangkok, mas sim apenas estrangeiros que iriam passar a serem vistos frequentemente pela nova região tropical nomeada Vale.
Padma precisava, agora, virar a página e seguir em frente.
UM ANO E SEIS MESES DEPOIS
RESEDA, LOS ANGELES.
─ Está ficando linda, mãe.
─ Mais bonita de quando era na Tailândia. ─ Kai murmura baixo com um sorrisinho no canto dos lábios, observando a nova fachada da academia ─ Tem data de inauguração?
Isara, que tinha um sorriso orgulhoso preenchendo seu rosto, finalmente olha para os dois filhos, sentindo ele desaparecer lentamente pela pergunta. Não havia ainda uma data em mente, e aquilo era preocupante já que precisavam urgentemente pagar o gasto de toda a construção que não havia sido nada barata. Investiram toda a reserva financeira no novo projeto, ato arriscado, mas nas atuais condições, a última tentativa.
─ Seu pai ainda não sabe... ─ ela morde os lábios, tensa ─ Kian disse que estava estudando o local mas, ainda não sei de nada.
─ Estudando o local? ─ Hansa tomba a cabeça para o lado, confusa ─ Como assim?
Isara não queria falar sobre o que havia escutado pela vizinhança, principalmente após tomar a decisão de mudar os filhos de escola mais uma vez, agora que os negócios iriam se concentrar numa zona específica.
Não era mentira para ninguém que o Vale era dominado pelo Karatê. Quando chegaram, ano retrasado, assistiram a ascensão da luta marcial e odiaram ver o que ela, aos poucos, foi se tornando nas mãos de pessoas que claramente não tinham preparo para ensiná-la. O resultado foi uma briga que fez com que um adolescente perdesse o movimento das pernas, uma informação que lhe deu calafrios e jurou de pé juntos que nunca contaria para Padma.
Ah, Padma.
Padma se destruiu. Se tornou outra pessoa; quieta, distante e relutante com as próprias escolhas. Durante esse um ano, com seus pais trabalhando e juntando dinheiro para abrir a nova academia, ela pode fugir de assuntos que envolvessem o Muay Thai. Ainda era um gatilho muito grande falar sobre dentro de casa. Se tornou uma palavra proibida para si. Lhe dava arrepios, enjoos, e a fez com que tivesse medo até dos próprios sonhos.
Padma, agora, era apenas uma adolescente de dezesseis anos que estudava pela manhã e tirava notas medianas, por ter dificuldade com o inglês. Felizmente seus pais não pegavam no seu pé com isso.
Falando na citada, na mesma hora o carro de Hawk, seu pai, estaciona em uma das dezenas de vagas recém pintadas na frente da nova academia. Padma sai do veículo com a mochila pendurada sobre os ombros, e com a mesma expressão morta de sempre. Até tenta oferecer um sorriso para os pais, pela conquista, mas para ela, aquilo era o início de mais um pesadelo.
─ Oi, mãe. ─ Diz baixo, oferecendo seu melhor sorriso.
─ Demoraram, onde estava?
─ O carro deu problema ─ Hawk deu de ombros, levando as mãos na cintura assim que seu olhar caiu para a fachada da academia ─, e também, porque tenho boas notícias.
─ É, e quais são?
Quando ele se vira para encarar a família, Padma já consegue prever a fala.
─ Podemos abrir a academia.
─ O que? ─ Isara arregala os olhos, Kai abre um sorriso grande. ─ A-achei que iria demorar mais.
─ Acontece que, após meu pai falar com algumas pessoas aqui da região, acabou descobrindo que as pessoas começaram a rejeitar o Karatê. ─ Isara olha de relance para Padma, mas a adolescente parecia viajar dentro da própria mente, não dando bola para a conversa ─ E se estão rejeitando a única arte marcial praticada por aqui...
─ Então é uma chance para surgir outra. ─ Kai complementa, já tendo vislumbre de um futuro que seu nome pudesse ser reconhecido pela cidade ─ Genial!
─ Mas, por que, de repente, começaram a rejeitar o Karatê? ─ Hansa franze o cenho.
─ Acho que houve um acidente. Um garoto foi jogado da escada e se machucou gravemente ─ Padma é puxada para fora dos pensamentos com a frase, piscando lentamente ao absorver a informação ─ Eu disse que esses americanos fariam merda em algum momento.
─ Então... eu vou poder dar aulas? ─ Kai perguntou esperançoso, querendo de alguma forma, provocar alguma reação em Padma.
─ Kian acha que sim.
─ Padma também.
Os ombros da adolescente se enrijecem pela fala da mãe.
─ O que?
─ Não estamos na Tailândia, filha ─ Isara põe uma mecha do cabelo rebelde de Padma atrás da orelha, já sentindo o clima pesar ─ Você pode lecionar, tem diplomas, certificados...
─ Eu não quero.
Hawk e Isara se entreolham, sabendo que aquele momento chegaria em algum momento.
─ Padma... seria interessante que toda a família trabalhasse na academia.
─ Se vocês querem que eu arranje um emprego, tem uma cafeteria perto do shopping que aceita currículos. ─ É rápida em se contrapor, sentindo Hansa lhe encarar tristemente ─ Eu não volto a praticar Muay Thai mais. Se Kai quer tanto, coloquem ele.
─ Padma...
─ Eu não sirvo mais para isso. ─ Ela sente um bolo de choro preso ao pé da garganta ─ O Muay Thai morreu para mim quando assinei aquele acordo.
─ É aqui o lugar que te falei.
─ Phaya Nak? É coisa do Kreese, tenho certeza.
Fazia quase três meses que uma nova construção estava começando a chamar atenção dos moradores do Vale. A princípio, pensaram ser uma nova concessionária que tentaria bater de frente com a marca dos Larusso, mas tudo mudou naquela maldita noite.
Demetri estava a caminho de casa, levemente amedrontado com a ideia de encontrar algum membro do Cobra Kai durante seu caminho e correr risco de levar mais uma surra; quando uma grande placa com o desenho de um dragão azul chamou sua atenção.
Phaya Nak ─ centro de treinamento de artes marciais.
Só de fazer a leitura completa do letreiro, seu coração errou uma batida. Era irônico o surgimento de um novo dojô desconhecido bem na semana que boatos sobre o cancelamento do campeonato regional de Karatê apareceram para apavorar os praticantes. Demetri não era um dos melhores lutadores, mas a notícia o afetou.
Ele não pensa muito quando corre até a casa de Samantha Larusso, apavorado com o que tinha a visto. Foi necessário apenas algumas palavras, e em questão de alguns minutos os dois adolescentes estavam reunidos frente à estrutura moderna, que chamava a atenção de qualquer curioso.
Aquele prédio não se assemelhava ao Cobra Kai. Era moderno demais para ser de Kreese.
─ Sam? ─ Demetri sussurra quando para para fazer a leitura de outra placa, próxima a porta de entrada do lugar ─ Isso não é um dojô.
─ O que? ─ ela se aproxima, piscando aturdida, lendo a mesma frase que Demetri havia lido. A cada linha que seus olhos passavam por cima, eles aumentavam de tamanho.
"Se procura inovação, segurança e qualidade, escolha o Phaya Nak para fazer parte da sua vida. Aulas de Muay Thai com professores e campeões mundiais tailandeses."
"Sua segurança é nosso lema."
─ Isso é...
─ Péssimo! ─ Demetri a corta. ─ Isso é péssimo, péssimo, péssimo! Se o Cobra Kai já está arranjando problemas, o que uma nova arte marcial no vale pode fazer? Sam, você tem noção que se começarem a praticar, nunca mais vai ter Karatê no vale.
─ Ei, calma ─ ela levanta a mão, percebendo que o garoto começava a ficar cada vez mais vermelho ─ Ainda não houve uma audiência, e tudo não passa de rumor. O vale é o coração do Karatê. Uma nova arte marcial não pode mudar isso... eu acho.
─ Mas... ─ a voz dele parecia por um fio, Samantha conseguia sentir o medo ─, e se conseguirem?
A Larusso rezava para que não. Já tinham problemas demais. Não precisava de mais um para acrescentar naquela equação já complexa.
Ela respira fundo, e solta o ar de maneira enigmática, olhando pela última vez para a estrutura.
─ Meu pai não vai deixar.
─ Imagina toda sua família ter que se mudar para outro país porque você sente que estragou tudo? Aí Padma, você tem um lugar no meu coração minha linda, eu te defenderei, tá!
─ Até amanhã, pessoal. Acredito que o cronograma de postagem seguirá como estou fazendo agora; Sexta, sábado e domingo. Caso eu não consiga postar, vou tentar avisar com antecedência :)
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