Capítulo 9

Eu não sabia explicar o motivo de estar me sentindo tão feliz com aquele filho se não me dava bem com a mãe dele. Mesmo assim, cada dia que passava eu me acostumava mais com a ideia de que em breve seria pai. Claro, ainda parecia algo distante demais, faltavam quase sete meses de gestação e ela não tinha qualquer barriga que indicasse que algo estava acontecendo. Se não fosse por ter visto a ecografia com meus próprios olhos, ao vivo, eu mesmo poderia não ter acreditado.

No almoço de domingo, após a primeira consulta de Andressa, mostrei as fotos da ultrassonografia para meus pais e todos pareceram muito agitados com a confirmação da gravidez. Naquele dia, Isabel me contou sobre um aplicativo que mostrava a gestação semana a semana. Ela pediu que enviasse a mãe do bebê o nome para que baixasse e inserisse seus dados, podendo acompanhar todo o crescimento do feto em seu ventre. Ansioso, acabei baixando eu mesmo a ferramenta em meu smartphone, calculando as informações a partir do que estava escrito no exame e da suposta data de parto, em janeiro do ano seguinte. Logo comecei a ler tudo o que lá dizia, sobre o tamanho exato, os sintomas da grávida, os cuidados que precisava ter, etc.

Eu nem imaginava que Andressa tivesse tido algum sintoma além da falta de menstruação, já que era tudo tão recente. Ela, porém, acabou me contando por mensagem sobre ter descoberto justamente por causa de um enjoo causado pelo cheiro de café, embora adorasse bebê-lo. No entanto, o que mais me chamou atenção no tal aplicativo era o fato de que indicava o tamanho do bebê em cada semana. Estando ele quase com dez semanas, ainda tinha o tamanho de uma azeitona.

Acabei enviando essa informação para a loira junto de uma foto de azeitona. Ela pareceu achar aquilo bastante engraçado, de acordo com as figurinhas que me mandou de volta. Isso me deixou aliviado. Significava que dali adiante as coisas entre nós seriam mais fáceis do que no passado. Mas, bem, agora éramos adultos e precisávamos nos comportar como tal, sem implicâncias bestas. Eu poderia ser eu mesmo sem que ela me atormentasse por isso, A partir de então, todas as semanas enviava a imagem do novo tamanho. Virou uma espécie de piadinha entre nós.

É claro que nossa relação não passava disso. Não conversávamos muito, exceto quando, uma vez ou outra, eu mandava essas imagens ou perguntava como se sentia. Pensava que era uma obrigação minha estar presente não só quando o bebê nascesse, mas durante a gestação. Não queria que achasse que eu seria um pai ruim e acabasse me afastando de alguma forma. Ela já me odiava o suficiente.

Haviam se passado já quatro semanas desde a última vez que a vira. Naqueles dias precisaríamos fazer um exame mais complicado que mostrava caso a criança tivesse alguma anomalia, algum defeito genético, esse tipo de coisa. Eu estava nervoso e preocupado, é claro, não queria que meu filho tivesse nenhum problema. Vindo de Andressa, tudo parecia possível. Talvez eu finalmente comprovasse o fato de que ela era uma alienígena ou um ser sobrenatural e a criança nascesse toda deformada.

Na manhã do exame eu estaria ocupado atendendo um cliente importante, então não pude acompanhá-la. Com medo de que pudesse me esconder alguma coisa, combinei de passar em seu apartamento no final do expediente para ver o resultado em mãos. Ela não pareceu gostar da minha insistência, mas acatou meu pedido.

Ainda não havia dito a Matheus que Andressa estava envolvida na história da gravidez. Ele, porém, parecia não se importar mais em saber quem era, a não ser quando nos reuníamos em um grupo maior. Nesses casos, eu virava a nova piada. Todos pareciam crer que a mãe de meu filho era feia demais e por isso eu não queria apresentar. Igor fingia não saber de nada, entrando nas brincadeiras e achando muita graça de me ver naquele estado de constante alerta.

Porém, um dia antes do exame, sem perceber, acabei dando com a língua nos dentes.

— Você vai jogar com a gente amanhã, Ique? – Matheus, me perguntou, da porta de meu quarto. Uma vez por mês nos reuníamos para jogar futebol em uma quadra alugada, atividades que Igor havia levado ao grupo anos antes. – O Átila precisa saber quantos vão.

— Ahm... A quer horas?

— Às 19h.

Apertei a ponte do nariz, fazendo os cálculos para ver se era possível. Como não me pareceu que ficaria muito tempo vendo os exames, achei que não fazia mal concordar.

— Pode ser. Combinei de ver o resultado do exame da Andressa às 18h, mas acho que dá tempo de vir em casa e trocar de roupa antes.

Achei que Matheus iria embora em seguida, porque certamente não me dei conta de ter dito o nome da demônia em voz alta, mas ele continuou encostado no batente da porta, de braços cruzados, me encarando com uma expressão de curiosidade.

— É só isso? – eu quis saber.

— O que foi que você disse?

— Eu disse que vou.

— Não. Depois disso. – Meu amigo descruzou os braços e deu um passo à frente. – O que foi que você disse sobre resultado de exame?

— Eu disse que precisava ver os exames da mãe do meu filho, um exame meio complicado de explicar.

Estava completamente absorto e não compreendi aonde ele queria chegar.

— Não foi isso que você disse, Henrique – Matheus falou, sentando-se na minha cama. – Você disse o nome dela. Da mãe do seu filho. – ele sorriu. – É Andressa.

Engoli em seco, só então percebendo o erro que tinha cometido. Se não tivesse me espantado tanto com a revelação, talvez ainda pudesse fingir que era outra pessoa, mas minha expressão provavelmente demonstrava toda minha falta de jeito.

— Puta-que-pariu! – ele gritou, rindo, com as mãos em frente à sua boca. – Não essa Andressa! Não a minha Andressa! – Não pude deixar de fazer uma careta por ele ainda se referir a ela como sua quando eles sequer namoraram de verdade. – Puta que pariu, seu merda! Você engravidou a Andressa? A Andressa da Carolina? Andressa Becker? Puta que pariu, mano!

Ele se inclinou um pouco para frente e me deu um soco no braço, coisa que adorava fazer desde que nos conhecemos, quando troquei do turno da manhã para o da tarde, já que era o horário de minha prima e sua melhor amiga estudavam, e passamos a ser colegas de turma.

— Não acredito! Eu aqui achando que você tinha vergonha porque era um trubufu e você na verdade tinha pegado a Andressa. Caralho! Mas agora eu meio que entendo porque de tanto segredo.

Eu continuava em silêncio, como sempre, enquanto ele proferia todo tipo de palavrões e interjeições, sendo que eu nem havia confirmado nada ainda.

— Porra, Henrique! Mano! Vocês viviam batendo boca, como foi que isso aconteceu? Eu não consigo imaginar vocês dois juntos, sério mesmo. Não que ache que você não consegue pegar ninguém, não é isso, ainda que seja um pouco verdade. Eu sei que você gosta de ser o come quieto, mas, mano! É sério isso? Você tinha que ter me contado uma coisa dessas. Cara, eu não ia ficar chateado, nada a ver, águas passadas. Mas, porra, sério, a Andressa?

Eu apenas suspirei. Matheus falava pra cacete, o que era muito doido, porque eu quase não falava. Ele parecia só ler meus pensamentos, muitas vezes respondendo por mim.

— Tá, mas, sério? Essa Andressa?

— É, porra, essa Andressa – confirmei, enfim. Que outra alternativa eu tinha? Mais cedo ou mais tarde ele descobriria mesmo.

— Meus Deus! – ele se levantou da cama e começou a andar de um lado a outro, rindo como um demente. Nem queria imaginar como seria a hora que contasse aquilo para o resto dos nossos amigos. Ele finalmente parou e me encarou. – Faz um tempão que não vejo essa garota. Quer dizer, mulher, ela já tem o que, vinte e sete, né? Caralho! Ela continua tão gata quanto no colégio? E tão maluca quanto antes?

— Igualzinha. – Um demônio loiro de olhos azuis, quis acrescentar.

— Tá, mas... Foi só uma vez mesmo ou vocês já tinham feito isso antes?

— Quê?! Não, claro que não! – desviei os olhos para a janela do quarto, me sentindo um pouco constrangido. – Foi só daquela vez. E só porque a gente estava muito bêbado. Eu acho até que ela nem lembra do que aconteceu.

— E você lembra?

— Ô, se lembro! – eu ri, sem querer pensar, mas já pensando, porque era algo que não dava para controlar.

Ele soltou uma gargalhada, entendendo tudo e muito mais.

— Porra, meu, por que não aproveita pra tentar outra vez? Eu soube que o apetite das grávidas pode ficar ainda maior. Ela tá solteira, né?

— Tá doido? Com aquela maluca? Nem morto! – falei. – Ela me odeia, não vou nem tentar essa possibilidade. É capaz de me processar por assédio só por ter me aproximado.

Matheus voltou a rir. Logo ele me deixou sozinho, o que achei estranho, dada sua personalidade curiosa. Achei que faria mais um monte de perguntas, mas ele tinha outras coisas em mente.

Pouco tempo depois, comecei a receber mensagens no grupo do futebol. Aquele imbecil já havia ido contar tudo e recebi milhões de parabenizações. Até fotos de Andressa rolaram. Algumas montagens ridículas de nossos rostos nos corpos de outras pessoas, nuas, transando, é claro. Apenas então Igor precisou confessar que já sabia de tudo, inclusive antes de mim. Foi até difícil dormir naquela noite.

Por isso, quando cheguei no apartamento de Andressa no dia seguinte, estava extremamente constrangido, como se só de olhá-la já pudesse ouvir as brincadeiras de meus amigos. Se ela soubesse daquelas imagens, eu certamente seria enforcado em breve.

Foi ainda pior quando entrei em sua sala e me deparei com aquela decoração. Não havia estado lá desde a fatídica noite. Tentei não focar no local onde a havia beijado, porque sabia que se olhasse para lá, imediatamente lembraria de sua língua em minha boca e suas unhas cravadas em meus ombros, daquela expressão diabólica em seu rosto, louca de desejo, da dancinha saindo do jeans. Meu coração se acelerava só de pensar no assunto. Era ridículo, porque sabia que aquilo nunca aconteceria outra vez e que passaria o resto de minha vida sem graça lembrando daquele momento e tendo sonhos eróticos. No entanto, a certeza de não haver uma repetição não fazia com que me deixasse menos nervoso.

— Tá vendo? – ela disse, depois que me acomodei em uma cadeira e olhei os resultados que atestavam o bem-estar de nosso filho. – Tudo na mais perfeita ordem, senhor Altermann. Nada com o que se preocupar.

— Prefiro ver com meus próprios olhos – respondi, sem querer encará-la.

Porém, logo fui puxado de volta para a realidade ao escutar o interfone. Para minha surpresa, quando Andressa atendeu, falou o nome de seu ex-namorado, Bernardo, o que chamou minha atenção. Imaginei que haviam voltado, no entanto, ela não pareceu contente com a visita, tendo desligado sem deixá-lo subir.

— O que o seu ex tá fazendo aqui? – eu quis saber. – Vocês voltaram?

— Claro que não! – Ela até pareceu ofendida. – Eu lá tenho cara de idiota.

Inconscientemente segurei um sorriso, porque eu achava que sim e ela fez uma careta de desgosto ao notar minha expressão. Fomos interrompidos pelo barulho de três batidas na porta. De alguma forma Bernardo havia conseguido subir.

— Como diabos você entrou? – ela perguntou, assim que abriu a porta.

— Por que é que você não me contou que tá grávida?!! – ele quase gritou, sem parecer ter me visto sentado à mesa bem atrás dele.

Me levantei de imediato. Não fazia ideia de como havia sido aquele relacionamento, mas não ia dar a ele a chance de fazer alguma coisa contra Andressa. Senti um pouco de arrependimento quando constatei que ele era mais alto e bem mais forte do que eu, porém continuei ali, sem me mexer.

— Porque vocês já terminaram há muito tempo – eu disse, fazendo-o se virar para mim. – e porque você não é o pai dessa criança.

— E quem é você? – Bernardo perguntou, girando e me olhando dos pés à cabeça.

Vendo a expressão assustada de Andressa, resolvi inventar uma mentirinha dizendo que era seu namorado. Eu sabia que aquele tipo de cara só acreditaria em outro homem para controlar uma mulher. Porém, ela não entendeu meu plano e, ao mesmo tempo, disse que eu era o pai do bebê, o que eu havia acabado de explicar.

Bernardo não pareceu acreditar, então ela entrou na brincadeira e inventou que estávamos juntos há meses, logo colocando-o para fora. Não pude deixar de notar que, ao contrário de como agia comigo, ela fora gentil e carinhosa, falando baixo e tocando em seu braço para acalmá-lo. Ficou claro que Andressa ainda tinha sentimentos por Bernardo, embora não quisesse mais estar com ele. Eu até a entendia, porque mesmo Fernanda tendo feito aquela maldade comigo, eu ainda pensava nela.

Mesmo assim, sua reação me fez pensar que talvez ela não tivesse contado nada a ele com a esperança de que pudessem voltar a namorar em algum momento. Ou talvez por vergonha de admitir que havia estado com outro homem logo em seguida, como se ela mesma o estivesse traindo. Essa constatação me fez lembrar por que motivo havíamos brigado na noite em que fizéramos sexo. Ela parecia magoada com o ex, entretanto o havia defendido, como se ela tivesse culpa pela traição.

— Por que você não contou a ele desde o início? – perguntei, curioso.

— Por que é que eu deveria contar? – Ela me encarou, falando daquele jeito debochado que eu tanto odiava.

— Talvez justamente para que ele não imaginasse que era o pai? – falei.

Só me dei conta de que havia aumentado meu tom de voz, parecendo irritado, quando a escutei esbravejar:

— Acho que tenho o direito de não sair contando para todo mundo como você fez.

Era esse o tipo de atitude que tínhamos um com o outro, sempre em alerta, esperando o pior. Estávamos sempre preparados para uma possível discussão e qualquer aumento de voz, qualquer expressão irritada já era motivo para reagir na mesma medida.

— Por que eu esconderia isso se em algum momento todo mundo vai acabar sabendo? – falei, ficando incomodado com seu modo de se expressar. – Mais cedo ou mais tarde todo mundo vai saber. – Apontei para seu abdômen. – Você não acha que vai esconder a barriga para sempre, acha? Agora ela tá pequena, mas uma hora vai crescer. E como pensa que vai esconder uma criança depois que ela nascer?

— Não seja ridículo, Henrique! Você sabe que é bem pior pra mim do que pra você. É muito mais fácil porque você não precisa fugir de ser julgada. Como eu vou dizer para todo mundo que engravidei pouco mais de uma semana depois de terminar um namoro de mais de dois anos? Você sabe os que vão dizer.

— Ninguém tá te julgando, Andressa – comentei, me aproximando. – Só você que tá fazendo isso.

Eu não queria ser grosseiro. Havia prometido a mim mesmo controlar meu ímpeto de ser um babaca, mas ela parecia gostar de ficar me provocando.

— Você vai ter que aceitar em algum momento que vai ser mãe, que vai ter um filho. Que nós vamos ter um filho. Você sequer aceita que é meu. Admita, preferia mil vezes que fosse desse Bernardo do que de mim, não é? Ainda me odeia por coisas que foram ditas e feitas quando éramos os dois adolescentes e imaturos. A gente cresceu. Eu ao menos cresci, porque você continua a mesma de sempre.

Imediatamente me arrependi de minhas palavras, porém não havia como apagar o que havia dito. Agora que havia começado, precisava ir até o fim.

— Mas tudo que você faz é mentir e fingir que nada tá acontecendo. Sem contar que continua me respondendo as coisas com estupidez mesmo quando eu tento ser o máximo gentil.

Ok, eu não era realmente a gentileza em pessoa quando se tratava de Andressa, mas estava ao menos tentando. Imaginei que a qualquer instante explodiria e tentaria me atacar. Eu nem sabia por que continuava gritando daquela maneira. Era como se aquelas discussões me trouxessem algum tipo de prazer inexplicável. No entanto, a loira não me respondru nada, me encarando de uma maneira muito esquisita.

— Você é teimosa e nunca escuta nada do que te dizem. Você só escuta a si mesma. Acha que o mundo gira em torno no seu umbigo, por acaso? Você já tem vinte e sete anos, não tem mais idade para ficar fazendo draminha adolescente.

De repente, o que eu menos esperava naquele momento aconteceu. Da mesma forma que havia calado sua boca naquela madrugada de abril, Andressa pulou para frente e me beijou. Quer dizer, tentou me beijar, porque o que realmente aconteceu foi que eu não estava, de forma alguma, esperando por aquilo, então acho que acabei mordendo seus lábios na tentativa de dizer mais alguma palavra.

Eu a teria chamado de louca em seguida se a loira não tivesse se afastado com o lábio inferior entre os dentes de uma maneira tão sexy que me fez recordar nossa noite de insensatez. Se ela me queria, quem era eu para reclamar de alguma coisa?

Acho que vai rolar mais uma noite de insensatez aqui, minha gente! O que acham?

Vote e comente.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top