Capítulo 13 - Ela te fará tirar a roupa e dançar na chuva
Ela te fará tirar a roupa
E Dançar na chuva
Ela te fará viver a vida louca
Ou tirará sua dor
Como uma bala na cabeça
Ricky Martin
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O clima na casa ficou tenso depois da noite que Nicholas acertou o rosto de Destiny. Amanda se mantinha distante da amiga, e Dess estava fugindo de Nicholas por algum motivo. Quanto a mim, eu estava dividido entre ansiar pelo telefonema de Isaac me dando boas notícias, e me sentir estranho ao perceber que assim que isso acontecesse eu teria que terminar tudo o que tinha com Dess.
Eu tinha me acostumado a tê-la todos os dias, acordar ao seu lado parecia natural e correto. Mas essa não é minha vida, eu não posso fingir que não me importo com nada mais.
O que me restava era aproveitar cada minuto ao seu lado, me sentindo abençoado pela chance de conhecer aquela mulher. E nós poderiamos manter o contato mesmo depois que eu voltasse para Boston, não era algo impossível.
Eu estava sentado em uma das cadeiras da varanda checando meus emails no notebook enquanto Destiny tomava banho. Eu não podia acreditar que ela me convenceu a viver aquela loucura, e o mais impressionante de tudo é que eu estava gostando. Eu nunca mais seria o mesmo, independente do que acontecesse daqui pra frente.
O som de uma notificação chamou minha atenção, eu notei uma chamada de vídeo de minha irmã em meu notebook. Desde que Valerie descobriu minha localização as discussões com minhas irmãs têm sido constantes, mas apesar de tudo, eu não tinha coragem de ignorar nenhuma de suas chamadas. Poderia ser algo urgente!
Eu atendi, e logo o rosto de Valerie surgiu na tela. Ela tinha o semblante cansado e forçou um sorriso assim que me viu.
— Rob...
— Está tudo bem, Valy? — eu questionei um pouco ansioso.
— Rob, eu cansei de brigar — ela suspirou — nós podemos só conversar, como irmãos?
Aquilo me pegou de surpresa, eu não esperava que Valerie pediria uma trégua depois de tudo o que aconteceu.
— Você está bem mesmo? — eu franzi o cenho.
— Eu falei com a Carol, ela me contou que você foi mesmo para o Hawaii à trabalho — ela suspirou — eu sinto muito por não ter acreditado em você.
Eu me senti péssimo por esconder as coisas da minha irmã daquela forma, por mais que tudo seja complicado demais, Carol tem razão, eu não deveria deixá-la lidar com tantas coisas sozinha.
— Sim, eu vim a trabalho. Eu tinha um lançamento em um dos hotéis, e sobre a garota que você ouviu, eu apenas conheci alguém aqui — eu tentei me explicar da melhor maneira possível.
— Você se envolvendo com alguém é algo novo — ela comentou — Como ela é?
— Incrível, eu nunca conheci ninguém como ela — eu admiti.
— Fico feliz por você — ela forçou um sorriso, fazendo com que eu me repreendesse por ficar falando de minha vida enquanto ela parece ter algo para me contar, ou não estaria tão disposta a conversar.
— Como ela está? — Eu questionei finalmente.
— Tem perguntado muito de você, ela sente sua falta — ela desviou o olhar, fazendo com que eu me sentisse mal ao pensar em minha mãe.
Quanto tempo faz desde a última vez que conversei com ela? Dois, três meses?
— Eu vou telefonar para ela ainda hoje — eu garanti.
De certo modo, esse tempo com Dess mudou minha mente. Apesar de não concordar com suas decisões, eu não devo me afastar tanto de minha família. Eu não quero que aquela imagem que Dess formou de mim no primeiro dia que nos conhecemos se torne real, mas estou no caminho exato de me tornar um homem solitário que não vive para nada mais que o trabalho.
Preciso saber dosar as coisas.
— Ela vai gostar — Valy sorriu de forma mais espontânea.
— Assim que eu voltar para Boston eu vou visitá-las — tomei uma decisão.
— Quando você volta? — seu sorriso se alargou.
— Creio que semana que vem — eu ponderei.
Eu acho que terei notícias de Isaac antes disso.
— Ela ficará em êxtase — minha irmã garantiu — Obrigada Rob.
Uma discussão se iniciou dentro da casa, atraindo minha atenção imediata. Qual o problema de Dess e Nicholas agora?
— Eu preciso ir, mais tarde eu falo com ela — eu me despedi antes de encerrar a chamada.
Fui até a porta da cozinha deixando o notebook em cima da mesa da varanda apenas para congelar ali diante da cena. Mandy estava escorada na parede de braços cruzados e uma expressão enfadonha enquanto Nicholas estava de frente para Dess.
— Você não tem outra opção a não ser me aguentar, Destie — ele a desafiou.
— Você não vai sair com a gente, eu não aguento mais olhar pra essa sua cara! Eu odeio ela! — Dess devolveu em um tom irritado.
— Talvez você se sinta mais à vontade olhando pra minha bunda então — o rapaz retrucou antes de se virar, fazendo a namorada colocar a mão no rosto enquanto balançava a cabeça negativamente.
Eu decidi não interferir, esperando para tentar entender o motivo da discussão.
— Quer saber Nick, olha você para a minha bunda — Dess também se virou, empinando a bunda enquanto Nicholas espalmava a própria nádega em uma provocação infantil.
É incrível como Dess consegue ser uma mulher incrivelmente sedutora e independente em alguns momentos e a mais completa criança em outros.
— Qual é o problema? — eu decidi interferir atraindo a atenção de ambos.
Os dois começaram a falar ao mesmo tempo, tornando a história incompreensível. Eu estou de volta ao jardim de infância!
— Um de cada vez — eu os repreendi, fazendo com que se calassem — Dess, o que aconteceu?
— Claro, comece com a que dorme com você — Nicholas murmurou descontente.
— Dess não quer que Nicholas e eu acompanhemos vocês dois no passeio de hoje — Mandy explicou, fazendo-a revirar os olhos.
— E porque você não quer? — eu questionei minha namorada.
— Ele vai acabar me dando outro olho roxo — Dess apontou a mancha escondida com maquiagem.
— Eu já te falei que foi um acidente. Você disse que tinha entendido — Nicholas revirou os olhos.
— Eu mudei de ideia — Destiny cruzou os braços emburrada.
— Eu não entendi como isso aconteceu — mandy se desencostou da parede, recebendo um olhar pouco contente da amiga.
As duas estão estranhas uma com a outra desde aquela noite, apesar de já terem se passado dois dias. Eu tenho a impressão de que elas tiveram algum tipo de discussão e não conseguiram resolver até agora.
— O que você planeja para hoje? — eu fiz sinal para que Dess se aproximasse.
Ela veio até mim, envolvendo minha cintura em um abraço e descansando o queixo em meu peito aproveitando para olhar em meus olhos.
— Um dia mágico, eu consegui alugar um barco — ela começou.
— Com o meu dinheiro — Nicholas interferiu.
— Então, eu aluguei o barco e vamos conhecer o Napali Coast¹ — ela ignorou a interferência do amigo — poderemos passar o resto da tarde lá!
— E nós vamos junto — Nicholas garantiu.
— Não vão — Dess revirou os olhos.
— O aluguel do barco está em meu nome, Dess — Nicholas cantarolou.
Eu observei os dois, de certa forma, Nicholas sempre conseguia fazer as coisas da maneira que ele queria. Eu aprendi a não me envolver no relacionamento deles, um manipulava o outro facilmente, e eu não queria fazer parte daquilo, apenas aceitava o que quer que decidissem.
— Vamos arrumar as coisas, Mio caro — Dess murmurou descontente — é bom você não se atrasar, Bryce.
Dess parecia chateada de verdade com aquela situação, ela se vestiu em silêncio, colocando um biquíni rosa florido e uma saída de praia combinando. Eu tentava entender o motivo de todo aquele clima estranho, não pode ser por conta do soco acidental do Bryce, os dois estavam ótimos antes.
Desisti de entender aquilo, saímos para aproveitar nosso dia, indo de carro até o local. Nós cruzamos toda a ilha em duas horas, mas logo estávamos acomodados dentro do barco, dando início à nossa expedição.
Amanda parecia animada pela primeira vez desde que chegou, e Nicholas estava se aproveitando de seu bom humor para se aproximar mais da namorada. Em um primeiro momento, a paisagem não me interessou muito. Eu me sentia curioso para entender o que Dess estava esperando ver de tão especial naquele rio e acabei me distraindo com os topos dos altos picos esverdeados que nos rodeavam. O sol brilhava forte sobre nossas cabeças, me deixando com uma leve irritação por conta do calor.
Mas aquilo não durou muito, quando em uma última curva o mar se abriu à nossa frente, revelando uma paisagem deslumbrante. Era impossível ficar irritado diante de uma cena daquelas, enquanto o barco rodeava a costa rochosa e colorida da ilha, eu me perguntava como era possível existir tanta beleza em um único lugar.
— É lindo, não é? — Dess sussurrou ao meu lado, seguindo meu olhar — meu maior desejo é sobrevoar a ilha em um helicóptero.
— Você nunca tentou? — eu questionei, imaginando como seria a vista de lá de cima.
— Não tive oportunidades — ela negou — Olhe os golfinhos.
Eu acompanhei seu olhar até um ponto do outro lado do barco, onde alguns golfinhos nadavam próximos a nós. De todos os lugares que Dess me apresentou até o momento, aquele era o vencedor.
Eu conseguia entender sua paixão pela ilha.
— Estão prontos para conhecer as cavernas? — nosso guia questionou, apontando para a entrada esculpida na rocha da costa.
Não demorou muito para que a sombra da gruta tomasse conta de nós, a água cristalina nos impulsionava para dentro enquanto alguns raios solares conseguiam penetrar através de buracos nas pedras.
Eu observei Dess aproveitar a paisagem para fotografar tudo o que estávamos presenciando ali, ela não economizou em fotos nossas, mas ao contrário do que eu imaginei, ela ignorou completamente o casal de amigos que estava do outro lado do barco.
O guia parou o barco quando chegamos ao ponto principal da caverna, avisando que ficaríamos ali por cerca de duas horas, e poderíamos aproveitar o tempo da maneira que quiséssemos.
Destiny não hesitou em tirar a saída de praia que usava e pular na água, me instigando a fazer o mesmo. Nós estávamos em uma caverna de céu aberto e os raios de sol que invadiam o lugar aqueciam as águas calmas, transformando o ambiente em um local agradável.
Eu me permiti relaxar na água, fechando os olhos, sentindo o calor do sol banharem meu corpo. Eu não tinha consciência do quanto eu necessitava desse descanso para minha mente, se eu continuasse naquele ritmo eu logo estaria à beira de um colapso e sequer tinha notado.
sorri ao sentir uma agitação na água, não precisei abrir os olhos para saber quem se aproximava. Os lábios de Dess roçaram nos meus antes de se afastar.
— Eu não acredito que consegui te deixar assim — eu abri os olhos para encontrar um sorriso verdadeiro em seu rosto — eu cheguei a pensar que você era um caso perdido.
— Sua terapia é eficiente — eu garanti, voltando a fechar os olhos.
— Eu consegui fazer você relaxar e se abrir comigo, apesar de ter algumas coisas que ainda não compreendo — Ela acariciou meu rosto.
— Tipo? — eu questionei despreocupado.
— O problema que você tem com suas irmãs — ela mordeu o lábio.
Eu abri os olhos, a encarando por um momento, antes de voltar a olhar o céu azul que se abria logo acima. Eu pensei bem antes de responder, eu não queria que ela soubesse todos os detalhes, mas era impossível não responder nada a respeito.
— Eu conto, se você fizer o mesmo por mim — eu decidi.
— O que você quer saber? — ela perguntou antes de dar um rápido mergulho nas águas cristalinas.
Eu aguardei que ela retornasse à superfície, admirando sua calma. Nicholas e Mandy ainda estavam no barco, e pareciam estar em perfeita sintonia pela primeira vez desde que a garota chegou à ilha.
— Qual o seu problema com seus pais? — Eu tentei.
— Problema? Eu não tenho problemas com eles — ela balbuciou um pouco desconfortável.
Eu suspirei me sentindo um pouco frustrado por toda aquela situação, ela não podia compreender que meu desejo era conhecê-la tanto quanto ela me conhece?
Dess segurou minha mão, me puxando na direção oposta do barco, onde tinha algumas pedras perto da parede da caverna.
— O que você quer saber, Mio Caro? — ela perguntou, se apoiando em uma das pedras.
Eu a ajudei a subir para que se sentasse ali de forma confortável enquanto pensava em sua pergunta.
— Eu não sei, parece que tem algo aí que você não quer que ninguém descubra — eu expliquei me sentando ao seu lado.
Dess riu, observando os dois amigos à nossa frente, Mandy tinha jogado Nicholas do barco e ele estava tentando puxar a namorada para dentro da água, como um casal harmonioso.
— Eu sei o que todo mundo espera que eu diga — ela suspirou.
— O que?
— Esperam que eu culpe os dois, esperam que eu diga que meus pais foram ruins comigo durante minha infância, e essa é a minha maneira de me vingar — ela suspirou — mas pra falar a verdade, eu acho que eles fizeram o melhor que puderam.
— Eles não foram maus pais, então? — eu tentei entender o que se passava em sua mente.
— Na medida do possível — ela divagou — eles nunca deixaram faltar nada para mim, sempre me deram tudo o que eu pedia, e sempre tive tudo do bom e do melhor.
— Mas isso não era o suficiente? — eu deduzi.
— Na maioria das vezes eu não queria um celular novo, roupas novas, sapatos e tudo o que me davam, eu queria ter uma rotina normal — ela suspirou — eu mal via meu pai em casa e minha mãe estava sempre ocupada. Depois que os dois se separaram pela milésima vez, eu já estava saturada daquilo.
— A relação deles é tão ruim assim?
— Eles são ótimos quando estão separados — Dess sorriu — Parecem feitos um para o outro, mas é só tentar fazer dar certo que tudo vira do avesso. Eu nasci quando eles estavam separados. Então voltaram, se casaram, se divorciaram, foram morar juntos alguns anos depois, se separaram outra vez.
Eu pensei em como uma criança poderia crescer em uma situação tão inconstante, não deve ter sido fácil.
— Quando meu pai decidiu voltar de vez para a Itália, eu percebi que tinha acabado mesmo — ela continuou — o problema foi que de certa forma, acabou para mim também. Antes eu conseguia um pouco de atenção de um ou de outro, depois meu pai passou a me ligar de vez em quando e eu fui passar algumas férias com ele em Milão, e minha mãe teve que trabalhar ainda mais e também não tinha tanto tempo para mim. O tempo que ela tinha, era para me comparar com outra garota que ela considerava um exemplo perfeito de como uma jovem com futuro deveria ser. Ela sempre me cobrava as mesmas qualidades e tudo mais, foi quando decidi tentar fazer direito, pensei que fosse a coisa certa.
Eu acompanhei seu olhar que observava Amanda, ela olhou em minha direção antes de abaixar o rosto, tentando disfarçar o rubor que tomou conta de sua face.
— Eu não sei porque tentei — ela suspirou — eu nunca consegui me igualar a ela.
— Você não deveria tentar se igualar a ela, deveria tentar ser você — eu sugeri — e não diga que é o que você está fazendo agora, nesse momento você está apenas vivendo sem rumo.
Dess absorveu minhas palavras voltando a observar a amiga. Ela exibia um olhar quase que decepcionado, fazendo com que eu me sentisse mal por ter trazido o assunto à tona, mas ela precisava disso.
— As vezes eu penso que deveria ser mais como ela. No fim, ela sempre conseguiu tudo, conheceu um cara legal, tem um relacionamento beirando a perfeição — Dess começou a brincar com os próprios dedos — mas parece que nem ela sabe a sorte que tem, se soubesse...
— Você não tem que ser como ela, Dess — eu neguei, descendo das pedras para entrar na água, estendendo a mão para ajudá-la em seguida — Você é perfeita da maneira que é, Amanda é... ela é superestimada.
— Você é a primeira pessoa que pensa isso — ela deu uma risada nervosa, desviando o olhar.
— Tenho certeza que não sou — eu garanti — Se você entender, enxergar todo o talento que você tem... Dess, você tem tudo para ser alguém incrível. A única coisa que você precisa é parar de agir como se nada disso importasse.
— Mas não importa... — ela mordeu o lábio inferior, olhando para baixo.
— Se você acreditasse mesmo nisso, não teria passado tanto tempo tentando chamar a atenção — eu encaixei meu dedo em seu queixo, a obrigando a olhar pra mim — Porque é isso o que eu vejo quando olho para você, alguém com um potencial incrível, jogando tudo no lixo apenas para conseguir um pouco de atenção daqueles que nunca lhe deram.
— Eu não quero mais falar disso — ela balbuciou tentando voltar a abaixar a cabeça.
— Não precisamos falar mais nada — eu garanti antes de me inclinar e depositar um beijo carinhoso em seus lábios.
Um barulho acabou atraindo nossa atenção, Nicholas tinha conseguido derrubar a namorada na água, e os dois passaram a brincar juntos ali.
— Eu odeio olhar os dois e notar como tudo está errado — Destiny suspirou.
— O que você quer dizer? — eu franzi o cenho.
— Deixa pra lá — ela forçou um sorriso — eu contei minha história, Mio caro. Sua vez.
Meu sorriso morreu ao lembrar do nosso acordo, a última coisa que eu queria era conversar acerca da situação de minha mãe, principalmente aqui.
— Eu sei que eu falei...
— Ethan, você não pode desistir — ela exclamou — não é justo!
— Eu não estou desistindo, apenas não quero estragar o clima agora — eu pedi.
— Mais tarde então? — ela perguntou incerta.
— Sim — eu garanti antes de voltar a beijá-la.
Dess se desvencilhou de meus braços, nadando para longe de mim entre risos, me obrigando a persegui-la. Dess conseguia apagar todas as preocupações de minha mente e me transportar para um estado de tranquilidade de espírito, era como se nada mais existisse neste mundo.
— Hey casal, vocês vão voltar com a gente ou pretendem ir nadando pra casa? — Nicholas gritou, atraindo nossa atenção depois de um tempo que estávamos ali.
A volta para casa foi mais leve do que antes. Dess se aconchegou em mim durante a viagem de barco, e quando enfim voltamos ao carro, ela pediu que Nicholas dirigisse.
Ao chegar em casa, Dess se limitou a me arrastar para um banho demorado, demonstrando todo o cansaço que sentia.
— E então, você vai me contar a história da sua família? — ela questionou de olhos fechados enquanto eu massageava seu couro cabeludo, espalhando espuma ali.
— Pensei que você tivesse esquecido — eu comentei despreocupado.
— Você desistiu? — ela suspirou — a briga foi tão feia assim?
— Não teve briga — eu neguei — pelo menos não diretamente.
Dess inclinou a cabeça para trás enquanto eu passava a mão em seu cabelo ajudando a água corrente a tirar todo o shampoo ali acumulado.
— O que aconteceu então? — ela perguntou.
— Nós sempre nos demos bem como família — eu comecei — estávamos sempre juntos, Valerie principalmente sempre foi muito próxima a mim.
Dess se virou em minha direção com o olhar atento, esperando que eu continuasse a narrativa. Eu pensei por um momento antes de continuar, não tinha como enfeitar a situação para melhorar um pouco o que aconteceu, era péssimo, então decidi ser direto.
— Nós éramos assim pelo menos até o último ano da faculdade — eu prossegui — quando minha mãe descobriu a leucemia.
Eu senti Dess ficar tensa diante da revelação, ela me lançou um olhar preocupado. Ela passou a ensaboar meu corpo, tentando disfarçar o clima tenso que havia se formado entre nós.
— No início nós nos unimos, eu a acompanhei em todos os exames, fui atrás de todos os possíveis tratamentos para que ela ficasse bem.
— Ela não ficou? — Dess franziu o cenho, me olhando com um pouco de pena.
— Ela recusou os tratamentos — eu gemi — ela desistiu de sua vida sem nem tentar.
Destiny me observou por alguns instantes sem saber o que dizer em seguida, eu soltei um longo suspiro antes de terminar de vez aquela história.
— No começo eu insisti, procurei psicólogos, especialistas, panfletos, tratamentos experimentais e promissores, mas nada parecia mudar a sua mente. Então eu não consegui mais, eu me recuso a ver a mulher forte e decidida que eu conheci e me inspirei a minha vida inteira, assumir a derrota daquela maneira. Eu não consigo vê-la frágil e debilitada como ela está.
— Quando foi a última vez? — Dess questionou.
— Não sei ao certo, alguns meses eu acho — eu suspirei — Sei que deixei muitas responsabilidades em cima de minha irmã mais nova, ela tem lidado com isso sozinha, mas... É difícil.
Dess me envolveu em um abraço, descansando sua cabeça em meu peito. Eu logo retribui, aproveitando o carinho que emanava daquele gesto.
— Sei que deve ser difícil, mas você deveria tentar consertar as coisas quando voltar para casa — ela comentou.
— Você não entende — eu suspirei.
— O que eu entendo é que se acontecer algo e você estiver longe demais, você se culpará por muito tempo — ela insistiu — Você deveria tentar resolver.
Eu descansei meu queixo no topo de sua cabeça pensando em suas palavras. No fundo eu sei o quanto ela está correta, mas me faltavam forças para tomar aquela atitude, apesar do que falei para minha irmã mais cedo, eu sequer tinha coragem de telefonar depois de tanto tempo.
— Minha irmã me pediu para ligar para ela mais tarde — eu acabei soltando — disse que ela tem perguntado sobre mim.
— Você deveria fazer isso — Dess se afastou erguendo o olhar em minha direção.
— Eu disse que faria, mas...
— Não será tão difícil — ela me interrompeu fechando o registro de água — vamos nos vestir e você pode resolver isso.
— Agora? — eu pisquei atordoado.
— Sim, agora — ela sorriu — e depois nós dois podemos fugir um pouco, passar a noite em algum lugar diferente, esquecer tudo o que aconteceu. O que me diz?
— Você não vai me deixar escapar, não é? — eu questionei me secando já fora do Box.
— Não — ela sorriu enquanto se enrolava em sua toalha — Vamos acabar logo com isso, Ethan.
Nós fomos para o quarto trocar de roupa antes de sair. Eu torcia para que Dess se distraísse e esquecesse sobre o telefonema, mas eu mal tinha vestido minhas calças quando ela estendeu o celular para mim, com um olhar astuto me fazendo suspirar em resignação.
— Vamos Ethan, o primeiro passo é o mais difícil — ela me ofereceu um sorriso encorajador.
Eu me sentei à beira da cama, discando o número da casa de minha mãe, Dess se ajoelhou atrás de mim, beijando meu rosto enquanto envolvia meu pescoço com seus braços.
— Quer que eu saia? — Ela começou a se afastar.
— Não — eu neguei segurando seu braço.
Eu queria tê-la ali, caso contrário eu provavelmente desligaria no segundo toque e diria que não tinha ninguém em casa. Destiny passou a massagear meus ombros, tentando me manter relaxado enquanto eu aguardava. Eu estava prestes a desligar o telefone quando uma voz fraca soou do outro lado.
— Alo? — minha mãe atendeu.
— Mãe?
— Rob? — a surpresa em sua voz foi perceptível, fazendo com que eu me sentisse culpado por fugir de minha família por tanto tempo.
— Sim, sou eu — Dess intensificou a massagem em meus ombros — estou ligando para saber como você está.
— Eu estou bem, filho — pude sentir um sorriso em sua voz — estou com saudades, sua irmã me disse que você está viajando.
— Sim, tive um trabalho para fazer no Hawaii — eu narrei — eu posso te visitar quando voltar.
— Mesmo? — sua voz soou um pouco mais forte, carregada de esperança fazendo minha culpa aumentar ainda mais.
— Sim, eu não tenho certeza sobre quando eu voltarei para Boston, mas vou te ver — eu garanti.
— Eu vou te esperar, posso fazer o pão que você tanto gosta — ela sugeriu — talvez eu possa conhecer sua namorada? Valy me falou dela...
— Não sei, talvez — eu respondi sem saber como explicar minha situação com Dess — eu preciso ir agora.
— Você me liga outro dia? — aquele tom esperançoso voltou a tomar conta de sua voz.
— Sim, eu volto a te ligar — Dess depositou um beijo em meu ombro antes de descansar a cabeça ali — Até depois, Mãe.
— Até — ela se despediu.
Eu respirei fundo, soltando o celular em cima da cama. Não foi tão ruim como eu esperava, Dess tinha razão, o primeiro passo é sempre mais difícil.
— E então? — ela acariciou meu rosto com a ponta dos dedos.
— Obrigado por isso — eu me inclinei beijando a ponta de seu nariz, recebendo uma leve careta em troca.
De certa forma foi um alívio falar com minha mãe depois de tanto tempo e eu devia tudo aquilo à Destiny.
— O que me diz, Mio caro — Dess contornou meus lábios com suas unhas pintadas de vermelho — Vamos colocar em prática nosso plano de fuga?
— Como você planeja essa fuga, Angel? — Eu fechei os olhos deixando seu aroma floral me envolver.
— Assaltar a geladeira, entrar no carro, encontrar um lugar calmo, passar a noite lá só eu e você... — ela começou a pontuar, beijando meu rosto entre as palavras.
— É um ótimo plano, o que mais faremos? — Eu questionei.
— Eu tenho algumas ideias envolvendo o banco de trás do meu carro, o que você acha? — Ela se afastou com um brilho travesso no olhar.
— Eu acho perfeito — Eu me levantei buscando uma camisa enquanto ela corria em direção à porta do quarto.
Eu segui Dess até a cozinha, animado com seu plano. Apesar de não me importar muito com a presença do Bryce e da namorada, eu sentia falta de estar apenas com minha garota. Ela franziu o cenho ao notar Nicholas sentado no sofá com uma expressão fechada enquanto se concentrava na tela do celular.
Dess deu de ombros e seguiu até a cozinha, passando a inspecionar a geladeira enquanto eu a abraçava, tentando lhe roubar um beijo.
— Cai fora, Roberts. Eu preciso me concentrar — Ela gargalhou, tentando se desvencilhar de mim.
— Volta aqui — eu a segurei, arrancando uma risada espontânea da garota.
Eu consegui prendê-la contra a bancada da cozinha, roubando um beijo demorado dela. Suas mãos subiram por minha nuca, envolvendo meus cabelos impedindo que eu me afastasse. Eu estava prestes a colocá-la sentada em cima da bancada quando fomos interrompidos.
— Que merda você está fazendo? — A voz furiosa de Mandy vindo da sala fez com que nos afastássemos.
— O que é isso, Mandy? — Nicholas questionou com a voz um pouco abatida.
— O que está acontecendo? — Dess sussurrou se afastando de mim.
— Você está vasculhando meu celular? — Mandy acusou o rapaz.
— Eu quero saber que merda é essa — Nicholas questionou com a voz um pouco falha, demonstrando que seu controle estava por um fio.
Eu não conseguia entender o que tinha acontecido ali, mas Dess parecia imaginar o que Nicholas encontrou.
— Com que direito você mexeu no meu celular? — ela rosnou, avançando em direção ao namorado, tentando tirar o aparelho de suas mãos.
— Direito? Depois de toda essa merda que eu li, a única coisa que você tem a dizer é "com que direito eu mexi na droga do seu celular"? — Nicholas parecia incrédulo.
— É o meu celular, você não deveria mexer nele — A garota retrucou, finalmente alcançando o aparelho.
— É tudo o que você sabe dizer? — Nicholas elevou a voz — Você não vai nem tentar negar o que eu li?
— O que você esperava que fosse acontecer, Nicholas? — mandy cruzou os braços — desde o início eu te avisei que nosso relacionamento corria perigo, você se importou? Não! Você só quis saber de acompanhar a Dess, porque parece que ela sempre foi mais interessante pra você do que eu!
— Você não pode estar falando sério — ele soltou — a culpa é minha?
— Você tinha toda a droga de um futuro pela frente, você deixou tudo isso para se tornar um nada — mandy desdenhou — até mesmo sua mãe pensa isso. Você decepcionou todo mundo quando tomou essa atitude, não se importou com nada além de você mesmo!
— Eu me importei com você — Ele gritou com a namorada — eu fiz de tudo para que déssemos certo, mas parece que não importa se eu não me tornar a merda de um advogado esnobe, não é?
— Fez de tudo para que déssemos certo? Jogando todo o seu futuro no lixo? Largando tudo para vir morar com minha melhor amiga? — Ela esbravejou — Fazendo uma tatuagem com ela? Até onde eu sei você deve estar apenas esperando uma oportunidade para terminar na cama dela, como os outros.
Eu segurei o braço de Dess que fez menção de ir até a amiga, mas aquilo não foi o suficiente para impedir que ela se envolvesse na discussão.
— Mandy, já chega! — ela rosnou.
— Você pode falar o quanto você quiser que não existe a menor possibilidade dele ser infiel, Dess — mandy encarou a amiga — Mas eu sei que não é assim, e se você for mesmo minha amiga, vai ficar do meu lado nessa.
— Eu já te falei o que eu penso — Dess cruzou os braços.
— Que seja — Amanda murmurou com desprezo, antes de virar as costas e subir as escadas, nos deixando para trás.
Eu não sabia bem como agir depois de tudo o que presenciei, mas algo me disse que nossos planos para a noite foram afetados.
— Você sabia? — Nicholas se virou para Dess depois que Mandy saiu de nosso campo de visão.
O olhar do rapaz exalava fúria e eu soube a resposta assim que olhei para ela. Tudo o que aconteceu até aqui já foi péssimo e eu vejo que vai piorar.
— Nick, não é como você imagina — Dess balbuciou.
— Eu fiz uma pergunta simples, você sabia ou não? — ele rosnou se aproximando da garota, que pela primeira vez desde que a conheço, parecia realmente assustada.
— Nick, eu pedi mil vezes pra ela te contar — seus olhos se encheram de lágrimas — eu falei que ela...
— É claro que você sabia — ele deu uma risada debochada — é óbvio que sim... O que você fez? Mandou ela pensar bem antes de escolher aquele maldito engravatado?
Ele ergueu a voz fazendo Dess se encolher enquanto finalmente deixava sair as lágrimas que estava tentando segurar.
— Nick, você precisa entender, eu queria que ela te contasse — ela tentou se aproximar do rapaz, mas foi duramente repelida.
— Entender? Você devia ter me contado! — ele apontou o dedo para ela.
Eu odiava ver Dess naquela posição, odiava vê-la tão frágil e temerosa. Mas sabia que não poderia fazer nada no momento, Nicholas estava fora de si, e se eu me envolvesse poderia piorar a situação.
— Não era direito meu contar — ela implorou.
— Direito? Eu pensei que você fosse minha amiga — ele voltou a erguer a voz — eu acabei com a raça do Tobias quando ele te traiu. Eu fui expulso da faculdade para fazer o Sr Jones pagar pelo o que fez com você! Eu nunca esconderia algo assim de você!
Ele marchou em direção à porta da frente sem olhar para trás, Dess se colocou em movimento tentando alcançá-lo.
— Nick, eu não sabia como te contar, eu cometi um erro — ela segurou a mão do rapaz.
— Um erro? Quando você vai parar de tentar provar que a única coisa que você sabe fazer é errar? Todo mundo já percebeu isso, você pode parar agora — ele lhe lançou um olhar duro antes de voltar a falar — você me queria fora da sua casa e conseguiu.
Dess o soltou, ele imediatamente saiu da casa, batendo a porta atrás de si. Eu não tive dúvida nenhuma ao caminhar até onde ela estava e puxá-la em minha direção, a envolvendo em um abraço.
— Vai ficar tudo bem, Angel — Eu acariciei sua cabeça ao ouvir um soluço abafado da garota.
— Ele me odeia — ela escondeu o rosto em meu peito — ele era a única pessoa que sempre estava comigo e eu o perdi.
— Ele está chateado, assim que se acalmar vocês vão resolver as coisas — eu garanti beijando o topo de sua cabeça — ele não vai te deixar, tenho certeza que ele sempre estará presente para te apoiar.
Dess não respondeu mais, se limitou a permanecer em meus braços apreciando o silêncio e conforto que eu transmitia.
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